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Amadurecimento profissional ativo para os 50+

Em 1969 o médico americano Robert Butler, gerontologista e psiquiatra, estudou o preconceito contra idosos e cunhou o termo etarismo. Fazia algum sentido então, já que o mercado era dominado por jovens. Mas e agora, que a tendência se inverteu?

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Você já ouviu sobre este conceito de ficção científica antes? É um coquetel químico que rejuvenesce todo o seu corpo, dos olhos ao cérebro, devolvendo tudo a um estado mais jovem. Charlatanismo? Você está certo em ser cético. Mas uma equipe de cientistas que inclui pesquisadores da Harvard Medical School e do Massachusetts Institute of Technology falou desse coquetel recentemente na revista *Aging*. Segundo ele, seis coquetéis químicos conseguiriam, em menos de uma semana e sem comprometer a identidade celular, “restaurar um perfil de transcrição genômica jovem e reverter a idade transcriptômica”. David Sinclair, de Harvard, diz que os preparativos para os testes em humanos estão em andamento. Aconteça ou não o tal “milagre”, esse esforço é uma prova do entendimento da ciência sobre a necessidade de manter a capacidade produtiva e a autoestima das pessoas 50+ ou 60+, uma necessidade delas mesmas e da sociedade, o que inclui as empresas.

É algo bem diferente do que vemos hoje. Um dia o indivíduo é um executivo C-level com um ganho mensal que cobre seus gastos; outro dia, não consegue mais se recolocar – ou consegue atuar por um salário que chega a ser um quinto do anterior, muitas vezes um salário de estagiário.

O Censo Demográfico divulgado em 2023 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) confirmou o envelhecimento acelerado da população brasileira – os 60+ já compõem mais de 15% da população total do País. E a projeção é de que representem 30% até 2050. Só que as empresas não parecem ter processado o fato ainda: continuam a expelir quem amadurece, supostamente em busca de energia inovadora jovem e mais barata, seja formalmente, seja por meio de práticas de etarismo (ou ageísmo), preconceito contra um grupo etário – no caso, os de idade avançada –, equivalente a racismo, sexismo, capacitismo ou homofobia que vemos afetar outros grupos minorizados.

Na perspectiva da autoliderança, é a pessoa 50+ ou 60+ que tem de tomar uma atitude – além de reivindicar seus direitos com as empresas, é claro. __HSM Management__ ouviu dois especialistas a esse respeito e divide as orientações a seguir, antes e durante.

__O que fazer antes.__ Alexandre Waclawovsky tem recebido consultas de pessoas até com 39 anos sobre como se preparar para esse futuro mais desafiador. O primeiro ponto é entender, e aceitar, que há poucas oportunidades dentro do estereótipo dos contratos CLT, porque isso permitirá acelerar a preparação de oportunidades diferentes. Waclawovsky, conhecido como Wacla, nem esperou chegar aos 50 para agir, inclusive: ele conta que trabalhava na HBO respondendo por inovação e transformação tecnológica para América Latina e, aos 48 anos, resolveu sair. E processou essa experiência escrevendo o livro *Invente o seu Lado I – A arte de inovar numa época de incertezas*. Pouco depois, fundou a Senior 45!60, aceleradora de startups por meio de pessoas experientes – ele mesmo atua como CMO as a service para startups. Ou seja, Wacla se planejou bastante para a virada de chave. Fora isso, ele enfatiza a importância de sempre cultivar relacionamentos e investir em hobbies (que sempre podem virar uma atividade profissional).
Para Fran Winandy, sócia da Acalântis, consultoria boutique que atua com projetos de RH e diversidade etária, não basta deixar de pensar em contratos CLT; é preciso trocar a ideia de emprego pela de trabalho. Winandy complementa com outros preparativos fundamentais: (1) tornar-se um lifelong learner – cada um tem de achar o próprio jeito de aprender permanentemente, (2) Investir no autoconhecimento, (3) preparar as finanças e (4) repensar seu próprio preconceito contra líderes e pares mais jovens. De acordo com a especialista, cultivar os relacionamentos não pode ser networking apenas; o convívio maior com familiares e amigos é crucial para o trabalho fluir na segunda fase da vida.

__O que fazer durante.__ Para Winandy, a palavra-chave é inovação. Se o salário é baixo demais, uma alternativa é inovar, propondo às empresas modelos mais flexíveis. Há os que decidem empreender – o que requer muitos cuidados devido aos riscos. E tornar-se conselheiro, mentor, consultor, coach e professor continuam sendo alternativas para profissionais com muita experiência executiva. Para Wacla, trabalhar como executivo em tempo parcial para startups é uma possibilidade ganha-ganha, em que ambos os lados aprendem muito.

Em que contexto for, a aliança com os jovens {veja quadro abaixo} é algo que o executivo experiente precisa aprender a fazer logo.

Por mais alianças com os jovens por Augusto Júnior
Eles também sofrem de etarismo. Se os jovens forem mais bem compreendidos pelos mais velhos, isso pode virar uma relação ganha-ganha para ambos

Como os jovens veem a convivência com gestores experientes no trabalho? São etaristas? Lidero uma comunidade de jovens lideranças que hoje já são cerca de 300 pessoas atuando em posição de destaque nas maiores empresas do País, antes de escrever o texto fui conversar com alguns deles para ter uma percepção dos desafios que enfrentam. O que ouvi pode facilitar alianças intergeracionais futuras:

Acontecimento 1 – O jovem empreendedor e o questionamento da autoria. No ambiente dinâmico das startups, um jovem compartilhava um caso de sucesso em um evento, quando um interlocutor lançou a pergunta: “Quem está realmente por trás desse projeto?”. Esse caso ilustra uma preocupação comum: a desconfiança na capacidade dos jovens de liderar e inovar.
Acontecimento 2 – Desafios de uma jovem coordenadora de RH em um ambiente de fábrica. Desde que foi nomeada para o cargo, sofre com a desconfiança contínua de um gerente que exercita o microgerenciamento. Esse cenário demonstra a relutância em aceitar os jovens em posições de liderança, atribuindo-lhes estereótipos de inexperiência e incompetência.
Acontecimento 3 – Superintendente jovem em conflito com expectativas hierárquicas, em um órgão governamental. Ele é frequentemente desacreditado por seus subordinados e pares, devido à percepção de sua idade como um obstáculo para liderar. Comentários sarcásticos, como “será que sabe o que está fazendo?”, refletem uma resistência arraigada ao reconhecimento da capacidade dos jovens de liderar.
Nos fatos citados eu consigo identificar ao menos quatro implicações, duas explícitas e duas implícitas.
1. Desvalorização do potencial. A desconfiança em jovens líderes mina seu potencial e sua inovação, afetando a capacidade da organização de se adaptar e crescer.
2. Inibição da expressão. Os jovens podem sentir-se inibidos para partilhar ideias e perspectivas, o que prejudicam a diversidade de pensamento e a colaboração.
3. Estereotipação e preconceito. Jovens são frequentemente associados a estereótipos de inexperiência e incompetência, perpetuando preconceitos inconscientes que influenciam decisões e estimativas.
4. Dificuldade na gestão intergeracional. A falta de compreensão entre gerações diferentes pode prejudicar o trabalho em equipe e a harmonia organizacional.

A meu ver, algumas abordagens proativas e inclusivas de empresas e líderes poderiam redirecionar esses conflitos e preparar o terreno para alianças futuras:
Mentoria e desenvolvimento contínuo. Estabelecer programas de mentoria que conectam jovens talentos a líderes experientes, proporcionando aprendizado mútuo. Ou até inovando, como vi uma indústria em Sorocaba que criou o mentoring reverso, usando jovens como consulta para os VPs da empresa.

Avaliação baseada em entregas. Avaliar o desempenho e as competências dos indivíduos com base em objetivos tangíveis, em vez de idade ou tempo de casa.
Criação de espaços de diálogo. Facilitar conversas abertas sobre etarismo e seus impactos, promovendo uma cultura de respeito e compreensão mútua.
Eis meu convite para o encontro de gerações, em que uma ajude a outra. Aceita?

Artigo publicado na HSM Management nº 159.

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