Entrei no mercado de trabalho no final da década de 1990. Naquela época, já havia uma piadinha bem estabelecida sobre a quantidade de horas que alguém trabalhava por dia. Algumas pessoas se orgulhavam da quantidade de e-mails recebidos. Outras, da quantidade de reuniões que recebiam o convite para participar. No fim das contas, existia um sentimento de pertencimento em “tanta coisa”, ou em ser uma pessoa tão necessária para a empresa.
Existia um pouco de vaidade nisso. E um pouco de inveja a esses humanos tão “bem-sucedidos e necessários”. Nunca falamos, mas que pensamos… ah, pensamos.
Passados 25 anos, acho que houve uma mínima mudança de direção. No entanto, quase tudo se tornou muito mais intenso.
Continuamos nos gabando (ou querendo nos gabar) de sermos tão necessários para a vida do trabalho, com um senso utilitarista. Embora haja aí um sentimento interessante de fazer parte, também precisamos olhar o outro lado: quando a gente tem mil e-mails, mil reuniões, mil mensagens no WhatsApp para responder, a saúde mental escorre pelo ralo.
Isso ocorre porque oito horas por dia acabam não sendo suficientes para lidar com tudo isso, e a vida do trabalho invade os outros campos do nosso cotidiano mais particular. Deixamos a vida utilitária (como dizia Santo Agostinho) tomar conta de nós. A outra vida, aquela do fruir (nas palavras do mesmo autor), nos escapam pelos dedos. É o mesmo que dizer que deixamos de lado outras coisas que nos dão prazer e que também alimentam nossas ideias, criatividade, capacidade de resolver problemas, aproveitar a vida.
## Exaustão como meta
Numa sociedade que exalta os cansados de diversas maneiras, estamos à beira do precipício. A gente corre o risco de entrar numa espiral sem fim de trabalho e, ao olhar para traz, se arrepender do que recolheu. Podemos ainda olhar para traz e não se lembrar de nada, mergulhados na exaustão que subjugamos em nosso cotidiano.
O cérebro também está exausto e nos causa umas peças: doenças neurológicas, perda de memória, [síndrome de burnout](https://mitsloanreview.com.br/post/revisitando-o-burnout-a-luz-da-covid-19-parte-4-de-4) etc. Atire a primeira pedra quem nunca.
Claro que para toda regra há uma exceção, mas acho válido que a gente não “chegue lá” às escuras, sem refletir de verdade sobre o que precisaremos abrir mão para isso. Sempre é bom lembrar que se a empresa em que você trabalha não é sua, e um dia, sem prévio anúncio, você pode receber um sincero “muito obrigado” e “boa sorte” nos seus próximos desafios. Assim, vale a pena permanecer no modo exausto?
## Pessoal e profissional: demarcações
Meus amigos tiram um pouco de sarro de mim. Explico: nunca deixo nada pessoal nas empresas em que trabalho. Se o “muito obrigado” chegar, estarei pronta para ir, sem ressentimentos.
As razões são várias e podemos nos encontrar em vários outros artigos para esse debate, mas cito os principais: __(1)__ tem hora que grito alto que estou cansada. Grito mais para eu mesma me ouvir do que para qualquer outra pessoa me escutar. Afinal, mudar começa em nós. Meu superpoder atual é dizer “não”; __(2)__ Fui buscando áreas em que posso me destacar, ser feliz e contribuir com coisas que acredito. Isso não me limita à empresa que trabalhe hoje (embora eu ame muito mesmo essa empresa); __(3)__ a vida não é só trabalho. Se essa parte não estiver boa, eu tenho um plano b.
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