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“Queremos ser a empresa de energia para os Millennials”

Bruno Suzart, brasileiro que desembarcou no Japão em 2016 para trabalhar na Shizen Energy, hoje retorna ao nosso país como country manager e fala sobre estratégia e impacto social no processo de geração de energia renovável.

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Quem não se lembra do terremoto que provocou um tsunami devastador no Japão em 2011? Além de mortes e muita destruição, o desastre, que ainda causou um acidente na usina nuclear de Fukushima, acabou servindo de inspiração para três executivos que na época trabalhavam em uma usina eólica. Apenas três meses após o tsunami, eles largaram seus empregos e fundaram a Shizen Energy. 

Na época, o Japão precisou desconectar mais de 50 usinas nucleares e o foco da Shizen, desde então, tem sido o de propagar energia renovável para suprir essa necessidade e também renovar a matriz de geração de energia do país. O brasileiro Bruno Suzart, que em 2016 tinha apenas 23 anos e se mudou para o Japão para trabalhar na Shizen, hoje conta com orgulho os avanços da empresa que está desembarcando por aqui. Como country manager no Brasil, Suzart compartilha com HSM Management os planos de investimento da empresa em nosso país, e destaca o papel social da Shizen no desenvolvimento das comunidades em que a empresa se instala.

**1. Por que investir em energia renovável?**

A necessidade de energia no mundo todo continua crescendo. O Brasil deve dobrar sua capacidade de produção em vinte anos, por exemplo. Do ponto de vista do capital, novos investimentos em geração de energia serão em grande parte impulsionados por fontes e tecnologias de geração com boas capacidades de retorno financeiro, e que atendam a requerimentos de financiadores e investidores. Um mercado em crescimento, em que os custos caem e a demanda cresce continuamente é, certamente, um bom negócio. As matrizes renováveis provavelmente vão capitanear o investimento em geração de energia nas próximas décadas. Isso é um pouco da lógica que precisamos usar para trazer investimentos para o setor. Os motivos mais importantes, entretanto, não estão ligados à otimização da distribuição de capital, mas sim à nossa responsabilidade em relação à qualidade de vida no planeta. Não é só o trabalhador que pode deixar de passar anos dentro de uma mina de carvão, mas também a família que pode respirar ar limpo, que não vai precisar se mudar para evitar o alagamento causado por uma megausina, que vai poder beber água limpa, comprar peixe no supermercado sem medo de contaminação, e por aí vai. Na verdade, as fontes renováveis abriram caminho para uma revolução na forma como produzimos e consumimos energia, tornando possível trazer de volta a produção de energia para os locais onde há demanda, regressando a um modelo descentralizado. Esse tipo de investimento faz justamente o que temos tentado criar com o nosso trabalho: conectar o capital global e impactar positivamente as comunidades, gerando novas oportunidades de emprego e negócios. É uma nova economia a ser construída. E, claro, há o aquecimento global. Queremos fazer o possível e o impossível para aplacar os efeitos do processo, e descarbonizar a nossa produção de energia é um passo necessário. 

**2. A Shizen está chegando no Brasil. Conte-nos como foi o processo de decisão para a entrada no país e por que escolheram Brasília como primeira cidade a receber esse investimento.**

Já chegamos! Temos uma subsidiária, parceiros, e uma usina fotovoltaica que acaba de ser conectada ao sistema em Brasília. Há poucos mercados com capacidade acima de alguns gigawatts para desenvolvimento de nova geração renovável no mundo, e dentro dos mercados não membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil é o que está na melhor posição para receber um investimento nosso. Alguns fatores impulsionaram nossa escolha: a diferença entre os custos de capital (o capital no Japão é relativamente barato), mudanças regulatórias incentivando a instalação de novas usinas, o fato de ser um mercado relativamente novo, em que nem todos os investidores e outros participantes do mercado de infraestrutura têm capacidade ou incentivo o suficiente para entrar, e, obviamente, o fato de eu ser brasileiro. Isso passa batido às vezes, mas a disponibilidade de conexões pessoais em novos mercados é um catalizador importantíssimo para o desenvolvimento de negócios. Em suma, alto potencial no mercado, ainda muito do know-how da indústria para ser descoberto, e poucos players internacionais, de forma que nossa intervenção pode gerar bastante valor. O Brasil foi o segundo mercado em que decidimos investir. Hoje temos projetos na Indonésia e desenvolvimentos na Malásia, no Vietnã, nas Filipinas, nas Ilhas Salomão, nos Estados Unidos e outros. De forma similar, e apesar de Brasília ser estrategicamente importante, do ponto de vista de track record, decidimos instalar nosso primeiro projeto em Brasília por conta da disponibilidade de conexões pessoais, que acarretaram na criação de uma parceria com uma empresa local, que foi coinvestidora no processo. Enxergamos Brasília como uma das localidades com maior potencial de instalação fotovoltaica, ainda, como quase todo o Brasil, inexplorada.

**3. Como será a operação brasileira da Shizen? O modelo de negócio será similar ao que há hoje no Japão?**

No Japão, onde começamos, há um incentivo por parte do governo chamado Feed-in Tariff. Basicamente o governo força as concessionárias de energia a assinar contratos de vinte anos com as novas usinas de geração renovável, a preços fixos. Isso gera um nível de segurança suficiente para que desenvolvedores construam e investidores decidam adquirir projetos. O Japão iniciou em 2012 com uma tarifa próxima de R$ 1,50 por cada kWh, que é bastante alta. Hoje, sete anos depois, há mais de 70 GWp instalados no Japão. Para efeito de comparação, o Brasil tem 2 GWp instalados em energia solar. Hoje o preço do Feed-in Tariff no Japão está perto de R$ 0,55 por kWh, ainda bastante alto em comparação com o resto do mundo. Com uma garantia de que os projetos construídos terão um contrato que compra 100% da energia a esse preço por vinte anos, as empresas têm bastante espaço para desenvolver novos projetos. Ainda, a disponibilidade de alavancagem com juros baixos, sem necessidade de geração de passivo para desenvolvedores ou investidores ajuda a retirar mais risco do modelo de negócios. Daí para frente as usinas fotovoltaicas são tratadas mais como um produto financeiro de baixo risco, comparável a um Fundo Imobiliário, e há uma separação bem clara entre os papéis de cada stakeholder no desenvolvimento e na construção dos projetos. No Japão somos quase que um one-stop shop, fazemos o desenvolvimento das usinas, a construção, a operação, a manutenção, a gestão dos ativos, e somos investidores. No Brasil o mercado ainda não é tão maduro, e nosso entendimento é que podemos adicionar mais valor focando no risco inicial dos projetos, na fase de desenvolvimento, e nos valendo da nossa disponibilidade e custo de capital para ter uma vantagem competitiva. Outra coisa que diferencia o mercado brasileiro é que, na nossa estratégia, decidimos não investir em projetos de geração centralizada, que são os projetos em que desenvolvedores competem nos leilões de venda de energia, e assinam contratos de longo prazo com as concessionárias no Brasil (similar ao Japão, porém com o leilão no meio). Decidimos entrar no mercado de geração descentralizada aqui, ou seja, cada contrato, cada usina, tem um cliente individual. O esforço comercial para esse modelo é obviamente maior, mas também é a nossa competitividade, dado que a maioria dos participantes no mercado não tem a mesma experiência, ou disponibilidade de capital que temos. Oferecemos aos nossos clientes um benefício direto de redução de custos com energia, e assumimos o risco de operação das usinas fazendo os investimentos com capital próprio. Nossos clientes não precisam investir nada, nem se tornar gestores de usinas. Esse trabalho fica todo conosco. Na verdade, o mercado de contratos bilaterais não é novidade, só é diferente do que existe do outro lado do mundo para nós. Há mais risco envolvido, e depende ainda mais de conexões já existentes com clientes em potencial. Mas estamos conscientes e preparados para superar o desafio!

**4. Já existe um plano de expansão da Shizen no Brasil?**

Sim! Queremos instalar 20 MWp em usinas solares nos próximos meses (mais ou menos umas 6.000 casas). Até 2022, nosso plano é fazer dez vezes isso, que seria mais ou menos um investimento acumulado de quase 1 bilhão de reais nos próximos dois anos. Isso geraria cerca de 300 GWh por ano depois de instalado, o suficiente para abastecer mais ou menos 0.001% do que consome a cidade de São Paulo em um ano, ou 85.000 toneladas de carbono por ano. Também temos interesse em expandir para áreas correlatas, como transmissão e distribuição, outras fontes renováveis, mobilidade, e nos envolver com negócios indiretamente conectados, como construção civil.

**5. Li um material de vocês que diz o seguinte: “Nosso empenho não termina apenas com a criação de energia, cuidamos de tudo aquilo que está ao redor da energia que criamos, da qualidade de vida de comunidades às indústrias locais”. Na prática, o que isso significa?**

Isso na verdade é provavelmente a parte mais importante do nosso propósito, especialmente por conta de onde queremos estar no futuro. Tudo começou com um programa que chamamos de “1% para a comunidade”. A geração de energia e especialmente os projetos que temos desenvolvido são extremamente conectados às comunidades onde eles são instalados. Ao longo do tempo começamos a aprender como lidar com as comunidades locais, o que era importante, o que fazia diferença, e também como os nossos projetos impactam a vida das pessoas. São dezenas ou centenas de empregos durante a construção, e mais outros durante a operação dos projetos, isso sem falar na quantidade de impostos pagos, dinheiro disponível em bancos locais, disponibilidade de energia etc. O “1% para a comunidade” foi a nossa prova de que o relacionamento com essas comunidades era essencial para o sucesso dos projetos. Começamos a doar, ou melhor, investir, 1% da renda de cada projeto para as comunidades onde eles foram construídos. Isso resultou em várias coisas interessantes. Hoje somos sócios de uma cervejaria, de fábricas de chips feitos com vegetais locais, uma loja de sucos (bem incomum no Japão) e um instituto focado em escolas. Conforme o nosso entendimento sobre o nosso papel na indústria melhorou, aprendemos que na verdade o que queríamos fazer não precisava estar limitado a gerar energia. Aprendemos que, inclusive por meio do “1% para a comunidade”, o valor que geramos de verdade está em mudar a maneira como as pessoas se relacionam com a energia. Isso modifica completamente a cara do nosso trabalho. Passamos a nos preocupar não só com o custo da terra onde construímos, mas também com as estradas próximas, a produção agrícola ou de piscicultura local, passamos a educar as comunidades, e estamos numa fase em que o propósito da empresa passa, e tem que necessariamente passar, por construir comunidades que sejam compatíveis com energias renováveis. Hoje temos parcerias com empresas que constroem e gerenciam bibliotecas e livrarias, que vendem móveis feitos de materiais reciclados, escolas, marcas de produtos de beleza, gente que compartilha dos nossos valores e de nossa cultura. Uma das vertentes desse tipo de parceria é que estamos construindo casas que usam menos energia, procurando gerar mais disponibilidade de renda para famílias no norte do Japão. Entender o impacto na qualidade de vida de uma família, que agora pode deixar de usar casaco dentro de casa ou que pode deixar os filhos lerem um livro até um pouco mais tarde, é o nosso jeito de fazer negócios.

**6. Qual o sonho grande da Shizen? Qual legado a empresa deseja deixar para o mundo?**

A Shizen quer ser a empresa de energia para os Millennials. O mercado de geração, transmissão e distribuição de energia é um mercado que já existe há mais de 150 anos e que muda pouco. Há inovação, novas tecnologias e processos, de forma limitada, mas você não associa jovens, processos disruptivos e o futuro do trabalho a conglomerados gigantescos de concessionárias provedoras de serviços públicos e de infraestrutura, incluindo energia. Queremos mudar isso. Energia é um assunto importante demais e é necessário criar uma ponte entre a geração de gerentes e líderes hoje, e a geração que vai realmente receber o planeta nas mãos para gerir. Queremos usar a energia para empoderar comunidades, a caminho da transição energética para um mundo 100% provido por energia renovável. Temos um plano meio megalomaníaco de estar em 196 países até 2030, e para isso temos que acertar a mão em como tornar o nosso modelo de negócios replicável. Queremos ser uma companhia totalmente autogerida, formada por pessoas conectadas com nosso propósito. Fundamentalmente, queremos ser uma plataforma de aceleração de modelos de negócio que propaguem energia renovável e ajudem a manter o planeta azul, queremos usar nossos recursos e experiência aqui no Japão para ativar indivíduos ao redor do mundo que se conectem com a nossa missão, que muito mais que lucrativa, é justa..

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