Empreendedorismo
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Use a startup como professora

O convívio de companhias maduras com empresas novatas revela o que pode ser aprendido nessa relação – e como

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> Vale a leitura porque… 
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> … muitas empresas brasileiras ainda se concentram na aquisição das melhores práticas do mercado e se esquecem de que, com o atual ritmo de mudanças tecnológicas, as próximas práticas são tão ou mais importantes. … algumas organizações estão tratando de buscar as próximas práticas na convivência com startups, que as ajudam a reinventar processos, comportamentos, olhares e culturas.

A rapidez com que o mercado consumidor tem mudado nas últimas décadas traz uma questão ímpar para as companhias consolidadas: “Como não ficar obsoleta?”. Muito mais gestores andam sendo assombrados pelo fantasma da Kodak, empresa conhecida como inovadora que, um dia, demorou para admitir que deveria se reestruturar diante do surgimento das câmeras digitais e sucumbiu. Um número crescente de empresas, como Telefônica Vivo, Natura, Itaú Unibanco e Tecnisa, busca proteger-se dessa ameaça criando vínculos com startups – seja em parcerias comerciais, seja em corporate ventures. 

Os empreendedores, familiarizados com mudanças de  tecnologias e comportamentos, estão virando professores. O que essas empresas perseguem, na verdade, é uma forma mais fácil de vencer o desafio da inovação, que, além de urgente e importante, parece ser permanente. Elas reconhecem que inovar é algo que flui naturalmente nas organizações novatas enquanto, em casa, esbarra em processos, burocracia e uma cultura de resultados de curto prazo. 

Nem mesmo as empresas com departamentos e orçamentos voltados para a inovação estão livres do pesadelo da falta de agilidade, como afirma Arthur Garutti, diretor do AceleraCorp, o braço da Aceleratech que faz corporate ventures e programas imersivos com executivos, em que estes tocam projetos como se fossem startups. “As grandes organizações andam angustiadas, porque as ideias não transitam o bastante para gerar inovação.”

> **COMO APRENDER COM UMA STARTUP**
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> **1. VISUALIZE OS GANHOS INTANGÍVEIS** Conforme-se com o fato de que nem todos os esforços de aprendizado trarão retorno financeiro. Romeo Busarello, da Tecnisa, avisa: “Muitas relações não mexem o ponteiro de venda, mas alteram o ponteiro institucional, da marca e da cultura motivacional”. 
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> **2. NUNCA LIMITE O FOCO AO CORE BUSINESS** Olhe para todas as partes de seu negócio que a startup pode impactar.  “A lição pode estar onde menos se espera”, diz Flávio Pripas, diretor do Cubo.  Por ser tão distinta de uma grande empresa, a startup tem o potencial de fazer diferença em qualquer área. 
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> **3. SELECIONE PELOS PROBLEMAS** Quando for se aproximar de startups, dê preferência às que abordam problemas observados em sua organização. 
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> **4. TENHA VISÃO DE LONGO PRAZO** Pensar em uma relação de longo prazo, seja de corporate venture, seja de parceria comercial, facilita o aprendizado, porque tira a ansiedade quanto ao êxito da startup; mesmo as que fracassam têm algo a ensinar. 
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> **5. GARANTA O APOIO DOS EXECUTIVOS SENIORES** Será muito difícil conseguir colocar em prática algum aprendizado com uma startup se a alta direção não apoiar essa ideia. 
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> **6. DISPA-SE DE PRECONCEITOS** Empreendedores tropeçam  em processos e em gestão; não deixe isso  iludi-lo de que eles não têm nada para ensinar.

> **Tecnisa**
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> O Fast Dating foi lançado em 2011 como uma plataforma da construtora para inovar com fornecedores. Já foram feitas reuniões com cerca de 600 empresas, 90% das quais startups – e 40 negócios foram fechados. Nas conexões com essas empresas, a Tecnisa renova a cabeça de sua equipe. Após adaptações necessárias, adquire o produto ou serviço. 
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> **Natura**
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> A Natura tem várias iniciativas com startups, como concursos e hackatons, por meio das quais se conecta com novas redes de relacionamentos e tem ganhos na cultura de inovação e no modo de trabalhar. Em 2016, fará o Hackaton Ekos Mãos na Mata, em Belém (PA), onde soluções serão prototipadas para aproximar a marca e a  Amazônia do consumidor.

> **TELEFÔNICA VIVO**
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> A aceleradora da Telefônica Vivo, Wayra Brasil, foi criada em 2012. Os produtos e serviços das startups residentes sempre têm inovações que se encaixam nas áreas que a operadora quer trabalhar. Das 49 startups que já estiveram na Wayra, sete forneceram algo para o portfólio da telecom e outras têm algum produto ou serviço em análise. 
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> **ITAÚ UNIBANCO**
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> O Cubo, criado pelo Itaú Unibanco e pela Redpoint e.Ventures em 2015, conecta empreendedores a investidores, mentores, pesquisadores e grandes empresas. Os fundadores e seus parceiros ficam próximos a um laboratório de novas ideias, acompanhando as teses que as startups estão desafiando e entendendo melhor os consumidores jovens.

**O CONHECIMENTO TRANSMITIDO**

As principais lições que as startups ensinam às empresas maduras não costumam aparecer publicamente. São ofuscadas pelos resultados tangíveis dos contatos. Enumerando, as lições-chave abrangem próximas práticas, mudança de comportamentos e mentalidades nas pessoas, nova cultura organizacional e projeção do futuro. 

Entre as próximas práticas, que começam a ser vistas como tão importantes quanto as melhores práticas, destaca-se, por exemplo, o enxugamento de processos (e consequente ganho de agilidade), a começar pelo processo de inovação. “As grandes percebem que conseguem conduzir um projeto sem fazer três orçamentos, um mês de avaliação e ‘n’ minutas de contrato”, conta Garutti. Em vez disso, aprendem a tentar, errar e tentar de novo. Os gestores das empresas maduras também entendem que precisam estar mais no campo, conversando com clientes. “Veem que isso é mais útil que pesquisa de mercado e mais valioso  que ficar no computador e contratar terceiros”, diz Garutti.

O Itaú Unibanco, que criou o espaço de startups Cubo com a Redpoint e.Ventures, identifica várias práticas aprendidas na convivência com as startups, como afirma Erica Jannini, superintendente de gestão de tecnologia da informação (TI) do banco, entre as quais a agilidade nas decisões, a gestão dos recursos por escassez e a capacidade de escalar produtos rapidamente. 

O que acontece com comportamentos, mentalidades e cultura organizacional na aproximação com startups? “É como se fizéssemos um refresh na companhia”, explica Romeo Busarello, diretor de marketing e ambientes digitais da Tecnisa, que criou o Fast Dating, um pitching periódico em que gestores da incorporadora recebem propostas de startups. O refresh ocorre porque os gestores abriram-se ao novo, e a cultura também está mudando com as iniciativas do Fast Dating que foram incorporadas, como a digitalização de todo o catálogo de vendas, em substituição ao papel, que aumenta a orientação digital. 

A maior produtividade por pessoa, alavancada pela sede de aprender, é outra mudança cultural almejada nessas trocas. “Por causa da cultura organizacional diferenciada, é comum que algumas poucas pessoas de uma startup consigam fazer o mesmo trabalho que muitos profissionais de uma grande empresa, e, às vezes, fazem mais e melhor”, diz Flávio Pripas, diretor do Cubo. 

É um exemplo motivador para o pessoal corporativo. Jannini, do Itaú Unibanco, confirma esse impacto cultural. “Com o Cubo, estamos nos conectando com pessoas cheias de energia e que querem tornar o mundo melhor. Entendemos que podemos apreender muito disso ao nos aproximarmos dos empreendedores”, observa a superintendente. “Existe um valor de transgressão interessante nessa mudança cultural”, complementa Garutti, da Aceleratech, garantindo que isso tem chegado aos níveis mais seniores da hierarquia. A lição final é sobre o futuro. Como as startups provavelmente estão desenvolvendo hoje os grandes negócios de amanhã, as empresas maduras esperam, com a nova rede de relacionamentos, conseguir antecipar desejos e necessidades de amanhã. Luciana Hashiba, gerente de inovação da Natura, resume os aprendizados: “Há ganho no modo de trabalhar, em um novo olhar, no aspecto cultural e nas conexões com novas redes”.

**A FORMA DE TRANSMISSÃO**

As empresas maduras aprendem com as startups de diversas maneiras, todas baseadas nas trocas entre pessoas. A Telefônica Vivo, por exemplo, tem uma aceleradora de startups dentro de casa, a Wayra, e promove o aprendizado intensivo conduzindo projetos de inovação aberta com a participação de pessoas dos dois lados. No segundo semestre de 2015, expandiu horizontes ao não limitar mais o aprendizado às startups da aceleradora. 

Como conta Renato Valente, que dirige a Wayra e é country manager da Telefônica Open Future (TOF) no Brasil, a telecom criou a gerência de desenvolvimento de negócios e alianças estratégicas para identificar quaisquer startups interessantes e promover a aproximação delas com as áreas de negócios da companhia. No caso do Itaú Unibanco, seus colaboradores são incentivados a frequentar o Cubo, onde há coworking e treinamento de startups, e lá eles costumam conversar com os empreendedores sobre metodologias de gestão e tendências do mundo digital. 

Contratar as startups como fornecedoras tem sido uma forma de acelerar a transmissão de conhecimento. Foi o que fez o Itaú quando contratou a Fhinck, residente do Cubo, para implantar um projeto que simplificasse rotinas administrativas de uma área usando tecnologia. Também foi o que fez a Natura, que, em 2014, selecionou cinco startups para montarem um showcase e contratou uma delas, a Já Entendi, para capacitar sua força de vendas com sua solução pedagógica desenvolvida para adultos. 

Um modo recorrente de as empresas maduras absorverem o conhecimento das startups ainda tem sido a criação de desafios de inovação para estas vencerem, como se fossem gincanas – variam de concursos a hackatons. O Natura Campus realizará seu segundo hackaton em 2016. Segundo Garutti, muitos executivos estão fazendo esse contato com startups individualmente. “Hoje se vê muito diretor virando investidor-anjo como pessoa física ou participando de programas para passar suas experiências aos empreendedores, para ser oxigenado por eles.” 

**NOVAS PARCERIAS**

Como nas boas salas de aula, em que tanto o aluno como o professor saem ganhando, também nesse caso as startups se motivam a ensinar porque aprendem. “As startups precisam atuar no mercado, e as companhias podem ensiná-las a fazer isso”, diz Hashiba. Valente acrescenta: “O principal desafio delas é cruzar o abismo entre os early adopters de um produto e o mercado de massa, e as startups podem aprender a fazer isso com as grandes organizações”. 

Ao que parece, o mútuo aprendizado está se tornando uma característica das empresas contemporâneas, tanto que um dos principais role models corporativos atuais, o Google, está abrindo um campus para startups residentes no Brasil. 

Como diz seu diretor, André Barrence, o campus contribuirá para fortalecer o ecossistema e a cultura de startups no Brasil – e, lógico, em sua própria organização. Arthur Garutti alerta, porém, que a empresa madura deve conscientizar-se do risco existente na aproximação que não envolva corporate venture: ela pode fazer toda a troca de aprendizados com uma startup e, de repente, vê-la sendo comprada por um concorrente.

> Você aplica quando… 
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> … define um modo estruturado de conviver com startups em aceleradoras, próprias ou terceirizadas, hackatons, pitchings ou patrocinando espaços de coworking e treinamento. … expõe seus colaboradores ao convívio com os empreendedores, formal e informalmente, determinando os temas que abordarão, que podem ser problemas da empresa ou ilações sobre o futuro.

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