Se a única certeza que temos nesta fase de transição entre a era industrial e a do conhecimento é a de que estamos imersos na incerteza, melhor voltar ao que nos faz humanos e a nossas motivações. Esse foi o grande alerta dos palestrantes brasileiros e estrangeiros no Fórum HSM Gestão & Liderança 2014, realizado nos dias 1º e 2 de abril, feito sob diferentes óticas.
Com o tema “Liderança e gestão em um mundo de rupturas”, o evento realizado em São Paulo explorou temas como colaboração, valores, confiança e criatividade, detalhando o desafio de atravessar o que pode ser comparado a um pântano de complexidade. “Talvez tudo pareça um fracasso quando ainda estamos no meio do caminho, e mais ainda quando fazemos algo pela primeira vez”, disse, como consolo, Rosabeth Moss Kanter, professora da Harvard Business School, em sua palestra no Fórum.
Para ela, se a linha de chegada pode mudar de lugar a qualquer momento, o que ganha importância é o modo de chegar a ela, que passa pelo propósito da organização abraçado pelas pessoas (isso serviria de bússola para o líder) e pela resiliência (a melhor qualidade diante das prováveis surpresas do trajeto). Na opinião de Fábio Barbosa, presidente do Grupo Abril, o modo de atuar nessas circunstâncias também é “manter os olhos na bola durante o jogo”, sabendo que o resultado será consequência. O tipo de cultura que oferece a uma organização um melhor modo de chegar foi, portanto, o tópico quente do evento. A pergunta nas entrelinhas era: o que garante vantagem competitiva em um mundo de commodities?
**DOS HÁBITOS À CONFIANÇA**
De acordo com Charles Duhigg, jornalista do The New York Times, a cultura é formada pelo conjunto de hábitos das pessoas, e os hábitos mais importantes para o negócio devem ser estimulados por meio de recompensas que as gratifiquem emocionalmente. Essa fórmula é bastante conhecida da psicologia comportamental, mas o que Duhigg destacou foi a necessidade de as organizações cultivarem ativamene os hábitos pelos quais desejam ser reconhecidas. Como recordou Marco Tulio Zanini, o sociólogo Émile Durkheim ensinou que a força do hábito é maior do que a força da lei. Sócio-fundador da firma de consultoria Symballéin, especializada em diagnóstico de culturas, Zanini destacou que nossa época é de transição da ética do dever para a do pós-dever, um momento intermediário em que as incertezas e a complexidade são mais agudas. Segundo ele, o individualismo é mais forte e os contratos, mais instáveis. Com isso, as relações ficam mais sujeitas à quebra de confiança, o que obriga a organização a buscar mais controle e monitoramento. A confiança se estabelece, para o palestrante, como consequência do pacto entre as partes. Nesse sentido, ele questiona: “Que tipo de vínculo nossas organizações têm produzido?”. Na visão de Zanini, liderar é cuidar do outro sem criar dependência, e a liderança deve ser produtora de vida: prosperidade, geração de empregos e aumento de renda são alguns dos exemplos. Luiz Carlos Cabrera, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) e do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBCG), argumentou que o líder sustentável –capaz de focar o resultado econômico justo e de promover a perenidade da organização– é quem gera essa confiança. Assim, o lucro é justo quando a sociedade o considera merecido, e faz por merecer a empresa que promove o crescimento individual e o coletivo. O líder sustentável tem genuíno interesse pelas pessoas e cultiva os hábitos de elogiar, celebrar pequenas vitórias, delegar, ensinar e formar sucessores. Com isso, obtém colaboração.
**COLABORAÇÃO E PRODUTIVIDADE**
O palestrante Yves Morieux, sócio e diretor do Boston Consulting Group (BCG), foi contundente no Fórum HSM: “A colaboração é a única ferramenta que permite lidar com a complexidade”. Na colaboração, o comportamento de cada pessoa aumenta a efetividade do comportamento das demais, criando sinergia horizontal e fazendo conexões entre as áreas, como se fossem sinapses do sistema nervoso. Também Clay Shirky, professor do programa de telecomunicações interativas da New York University, destacou a colaboração como vetor da cultura desejável. Segundo ele, quando participam de um projeto espontaneamente, as pessoas trabalham com amor e atingem a excelência. Foi assim que, em tópicos médicos, a Wikipedia, produzida por amadores motivados, superou a Medpedia, alimentada por profissionais remunerados. Tal concepção vale tanto para as redes de colaboração em âmbito mundial como para o espaço, nas empresas, em que as opiniões e ideias dos funcionários são compartilhadas. A tecnologia de redes trouxe às grandes empresas a possibilidade de reunir as pessoas, estimulando novos hábitos que impactam a cultura.
> **A resiliência da veriz**
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> Para a telecom norte-americana Verizon, o mundo mudou em 29 de junho de 2007, dia em que o iPhone foi lançado no mercado. Segundo a palestrante Rosabeth Moss Kanter, um de seus diretores disse: “Não fazemos a menor ideia de como reagir a isso!”. A empresa mudou muito para reagir ao iPhone, como ela dividiu com a plateia: “Eles deixaram de trabalhar em silos para obter rapidez e simultaneidade nos processos, e o então presidente da empresa, Ivan Seidenberg, foi humildemente ao Google fechar uma parceria, assim como procurou um parceiro para fabricar o dispositivo em si”. Flexíveis, as duas empresas abriram as informações necessárias uma à outra para fazer frente à ameaça iPhone. E, em 11 meses, apresentaram o Droid, com o sistema operacional Android do Google. “Eles foram até conservadores nas previsões, mas o produto superou o iPhone em vendas e o Android tem agora desempenho superior no mercado. Com resiliência, pode-se dar a volta por cima em qualquer área”, concluiu, no evento, a professora.
> **Valuation: A dúvida é a regra**
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> A dúvida e as incertezas do mundo atual também deram o tom do Seminário HSM “Damodaran on Valuation”. Aswath Damodaran, professor da Stern School of Business, da New York University, levou ao público do evento uma perspectiva prática, realista e até desapegada sobre a avaliação de empresas para fusão ou aquisição, a “valuation”. O professor afirmou que “valuation” é algo que se aprende fazendo e que se permanece aprendendo ao longo do tempo. Não é arte, porque pode ser ensinada, mas também não é ciência, pois seu resultado não é exato. Daí por que algumas pessoas não acreditam no conceito e por que outras, avessas à incerteza, não suportam trabalhar na área. “As avaliações são sempre subjetivas”, salientou Damodaran, “porque você já tem uma opinião sobre a empresa antes de avaliá-la, e isso se reflete nos cálculos.” Ele confessa que avalia a Microsoft há quase 30 anos e sempre chega à conclusão de que ela está sobreavaliada; no entanto, é incapaz de avaliar a Apple, pois gosta demais da marca.
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> E ainda provocou: “Quem remunera você, o vendedor ou o comprador do negócio?”. Segundo ele, nunca se é totalmente isento. Ao investidor que se considera racional, ele alertou: “Você é um ser humano! Vai sentir-se tentado, por exemplo, a comprar ações só porque todos estão comprando”. Vale mais um aviso: o melhor comprador de uma empresa é o “estratégico”, pois já se decidiu pela compra antes de saber o preço. Tendo como objetivo determinar o preço de uma empresa no presente, a valuation pode ser um antídoto contra a adoção de comportamentos tão humanos. Ricardo de Almeida, professor da área de finanças da FIA, do Insper e da HSM Educação, ressaltou a importância de compreender os modelos de avaliação, tanto o próprio como o utilizado pela outra parte na transação, tendo em mente que o objetivo maior é o crescimento do negócio. Os dois professores deram muitos exemplos de valuation, como os de Tata Motors, Amgen e Natura, e apresentaram didaticamente três abordagens de avaliação:
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> **• Intrínseca:** relaciona o valor de um ativo com o valor presente dos fluxos de caixa futuros esperados para esse ativo, como na avaliação de fluxo de caixa descontado.
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> **• Relativa:** examina o preço de ativos similares ao ativo em avaliação, segundo variáveis como lucro, fluxo de caixa, valor contábil ou faturamento.
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> **• Contingente:** utiliza modelos de apreçamento de opções para calcular o valor de ativos que têm características de opções semelhantes
**LÍDERES CRIATIVOS = VANTAGEM**
Christer Windeløv-Lidzélius, CEO da Kaos Pilot, renomada escola de design de negócios e inovação social da Dinamarca, defendeu a tese de que, quando produtos e serviços viram commodities, a vantagem competitiva depende de líderes criativos. Ao público presente no Fórum HSM, ele disse apostar no aprendizado colaborativo para formá-los. É o que faz sua escola. Sem aulas nem disciplinas, recebe 35 alunos por ano, que trabalham em equipe durante três anos. “O ponto de vista deles vai do ‘eu’ ao ‘nós’ e da instrução à inspiração”, comentou o CEO da Kaos Pilot.