Uncategorized

A ética é um bom negócio?

Está errado acostumar os gestores à ideia de que ser ético não custa nada e até melhora as vendas
Filósofo, professor titular da cadeira de ética e política da Universidade de São Paulo e autor, entre outros livros, de A Sociedade contra o Social, vencedor do Prêmio Jabuti.

Compartilhar:

Vamos falar de ética? vai ser este o tema de minha primeira coluna. E começo pela pergunta: a ética é um bom negócio? Muitos dizem que sim, recomendando aos empresários que sejam éticos porque isso contribui para a boa imagem de sua empresa. Mas respondo que não. com todas as letras: a ética não é um bom negócio. Justamente porque ética não é negócio. A conduta ética é inegociável. Muita coisa é negociável na vida, a começar por preços e salários. uns e outros se decidem no mercado, num jogo entre oferta e procura. tudo bem. segundo a doutrina que eu critico, a ética ajudaria as empresas a passar a consumidores e fornecedores a imagem de que elas respeitam os empregados e a natureza, de que seus produtos são bons, de que podemos confiar nelas. tudo isso é positivo. cumprir leis e princípios morais é bom. Nada contra, se isso beneficiar a imagem da marca. Mas basta você falar em vantagem que sai do mundo da ética.

A ética é sempre um mau negócio. porque, em princípio, a ética é um mau negócio. Ética quer dizer: eu honro a palavra, faço o que é certo, mesmo que isso me coloque no prejuízo, mesmo que vá à falência. porque, se eu educar as pessoas a serem éticas quando isso lhes é vantajoso, como farei que sejam éticas quando trouxer desvantagens? Alguns pensadores da ética formularam uma pergunta: e se o príncipe herdeiro matar o rei, subindo assim ao trono? Esse malfeito, o maior dos malfeitos, porque é um regicídio e um parricídio, ficará impune. Esse é o grande exemplo da ação errada que dá lucro total a quem a pratica. quem discute essa pergunta patina. uns invocam deus, que punirá o patife. Outros dizem que ele dá um mau exemplo aos próprios filhos. Mas patinam.

Há uma diferença entre fazer algo por princípio ético e por prudência. É prudente não matar o rei. Recomendar a conduta ética porque é um bom negócio está no horizonte “é prudente ser ético”. O argumento é fraco; vale no varejo, não no atacado. Não resolve o caso em que, matando o rei ou roubando muito, não há perigo de eu ser punido. Não educa contra a corrupção enorme, contra a maldade infinita. Fazer algo por princípio ético é outra coisa. Significa que, mesmo indo à falência, farei o que é certo. Responderei pelos danos que causar ao ambiente, aos consumidores, aos trabalhadores. É difícil? É. Mas não é errado. Errado é acostumar as pessoas à ideia de que ser ético não custa nada e até melhora as vendas. A educação ética tem de nos preparar para as perdas. E é claro que dá algo em troca, algo positivo –que podemos chamar de consciência limpa, de paz de espírito, de satisfação em fazer o bem. É isso o que temos de valorizar, não o balanço favorável no fim do ano.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Quando a IA desafia o ESG: o dilema das lideranças na era algorítmica

A inteligência artificial está reconfigurando decisões empresariais e estruturas de poder. Sem governança estratégica, essa tecnologia pode colidir com os compromissos ambientais, sociais e éticos das organizações. Liderar com consciência é a nova fronteira da sustentabilidade corporativa.

Inovação
O SXSW 2025 transformou Austin em um laboratório de mobilidade, unindo debates, testes e experiências práticas com veículos autônomos, eVTOLs e micromobilidade, mostrando que o futuro do transporte é imersivo, elétrico e cada vez mais integrado à tecnologia.

Renate Fuchs

4 min de leitura
ESG
Em um mundo de conhecimento volátil, os extreme learners surgem como protagonistas: autodidatas que transformam aprendizado contínuo em vantagem competitiva, combinando autonomia, mentalidade de crescimento e adaptação ágil às mudanças do mercado

Cris Sabbag

7 min de leitura
Gestão de Pessoas
Geração Beta, conflitos ou sistema defasado? O verdadeiro choque não está entre gerações, mas entre um modelo de trabalho do século XX e profissionais do século XXI que exigem propósito, diversidade e adaptação urgent

Rafael Bertoni

0 min de leitura
Empreendedorismo
88% dos profissionais confiam mais em líderes que interagem (Edelman), mas 53% abandonam perfis que não respondem. No LinkedIn, conteúdo sem engajamento é prato frio - mesmo com 1 bilhão de usuários à mesa

Bruna Lopes de Barros

0 min de leitura
ESG
Mais que cumprir cotas, o desafio em 2025 é combater o capacitismo e criar trajetórias reais de carreira para pessoas com deficiência – apenas 0,1% ocupam cargos de liderança, enquanto 63% nunca foram promovidos, revelando a urgência de ações estratégicas além da contratação

Carolina Ignarra

4 min de leitura
Tecnologias exponenciais
O SXSW revelou o maior erro na discussão sobre IA: focar nos grãos de poeira (medos e detalhes técnicos) em vez do horizonte (humanização e estratégia integrada). O futuro exige telescópios, não lupas – empresas que enxergarem a IA como amplificadora (não substituta) da experiência humana liderarão a disrupção

Fernanda Nascimento

5 min de leitura
Liderança
Liderar é mais do que inspirar pelo exemplo: é sobre comunicação clara, decisões assertivas e desenvolvimento de talentos para construir equipes produtivas e alinhada

Rubens Pimentel

4 min de leitura
ESG
A saúde mental no ambiente corporativo é essencial para a produtividade e o bem-estar dos colaboradores, exigindo ações como conscientização, apoio psicológico e promoção de um ambiente de trabalho saudável e inclusivo.

Nayara Teixeira

7 min de leitura
Empreendedorismo
Selecionar startups vai além do pitch: maturidade, fit com o hub e impacto ESG são critérios-chave para construir ecossistemas de inovação que gerem valor real

Guilherme Lopes e Sofia Szenczi

9 min de leitura
Empreendedorismo
Processos Inteligentes impulsionam eficiência, inovação e crescimento sustentável; descubra como empresas podem liderar na era da hiperautomação.

Tiago Amor

6 min de leitura