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A reinvenção da mobilidade corporativa

A arquitetura da gestão de frotas está sendo redesenhada em direção a soluções ecossistêmicas e exige um novo protagonismo

Paulo César Teixeira

É jornalista, colaborador de __HSM Management__ e __MIT Sloan Review Brasil__, autor dos livros Esquina...

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A mobilidade corporativa vem sendo redesenhada. A histórica necessidade de reduzir custos se acentuou e somaram-se a ela novos e significativos desafios, como os de acelerar o passo em direção à economia de baixo carbono, acompanhar a revolução digital e se adaptar a comportamentos desenvolvidos durante a pandemia.

Essa transformação começa a ficar mais visível na gestão das frotas corporativas – mais em algumas empresas do que em outras, mas num movimento setorial que não deixa dúvidas. “O novo cenário exige uma alteração da arquitetura tanto para a frota utilizada pelos colaboradores como para a frota comercial”, afirma Paulo Resende, coordenador do Núcleo de Infraestrutura e Logística da Fundação Dom Cabral (FDC). Porque requer adaptação constante, o novo desenho é mais flexível e colaborativo, baseado num ecossistema de players diversos que compartilham, processam e integram informações para entregá-las de modo consolidado aos gestores responsáveis pela área.

O processo é global, mas ganha contornos específicos no Brasil, onde, segundo Resende, o transporte representa 65% da totalidade dos custos logísticos atuais das empresas – o restante corresponde a itens como armazenagem, burocracia, gestão de estoques etc. Além de elevado, esse percentual segue crescendo. Até 2025, deverá atingir 80%. Enquanto áreas como armazenagem ou transporte de longa distância lograram baixar os custos nos últimos anos, o transporte só vê seus custos aumentarem, na esteira das dificuldades de deslocamento dos veículos nas grandes cidades brasileiras, e a projeção é que aumente ainda mais a densidade do tráfego.

Uma das principais razões para isso é a crescente urbanização do País – a projeção é que, até 2030, 80% dos brasileiros viverão em áreas urbanas. É um grande salto em pouco tempo, considerando que hoje o percentual gira em torno de 70%. Cidades de médio e pequeno porte já sofrem as mazelas do trânsito. “Conheço um município de 40 mil habitantes no sul mineiro que instalou semáforos para administrar os engarrafamentos do começo da manhã e do final da tarde. Isso seria impensável até há pouco tempo”, relata Resende, da FDC.

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## Novos desafios impulsionam redesenho
Os líderes de mobilidade das empresas – sobretudo, gestores de frotas e CFOs – têm se movimentado em busca de um novo modelo ao ver o aumento de complexidade em três frentes:

__Revolução tecnológica__. Os ciclos de revolução tecnológica estão cada vez mais curtos, o que reduz os prazos de validade de boa parte das soluções adotadas e aumenta a dificuldade de manter atualizados os sistemas. A estimativa é que soluções necessitem de atualização a cada três ou cinco anos, segundo Breno Davis Campolina, diretor-executivo de gestão de frotas da Localiza&Co.

Por exemplo, os instrumentos de telemetria atualmente disponíveis nada têm a ver com os sistemas de geolocalização com GPS bastante utilizados no passado recente. Agora, é possível não só acompanhar as rotas de deslocamento dos veículos, com controle de quilometragem e gastos de combustíveis, como também monitorar a atividade do condutor, tendo acesso a detalhamentos como ritmo de aceleração, freadas bruscas, análise de rotação do motor e angulação de velocidade na curva. A partir da análise desses dados, é possível fazer uma gestão estratégica da frota utilizando as informações para tomada de decisão, ganho de eficiência e geração de valor para o negócio.

O controle tecnológico atual permite estabelecer as melhores rotas, possibilitando à companhia perceber rapidamente qualquer problema – e se posicionar para corrigi-lo de forma imediata. A explicação é de Márcio Mazallo, CEO e fundador da Capta Mobilidade, plataforma de mobilidade corporativa integrada ao sistema de vale-transporte. A startup opera o aplicativo MobGo com objetivo de ajudar as empresas a diminuir as emissões de carbono no deslocamento de seus funcionários, priorizando o transporte coletivo. “Se não existir uma mecânica de controle no dia a dia, haverá aumento de custos e também de emissões de carbono”, assegura Mazallo.

__Novos comportamentos__. Os hábitos de mobilidade das pessoas mudaram na pandemia de covid-19, com substituição de meios de transporte público e coletivo por meio próprio, muitas vezes alugado ou compartilhado. Agora, outros acontecimentos estão contribuindo para que os novos hábitos permaneçam mesmo sem o mesmo risco de contaminação por coronavírus.

Isso se refletiu na maneira como as empresas gerenciam a mobilidade de seu pessoal, segundo Campolina.Como o diagrama na página ao lado mostra, cresceu o interesse corporativo em carros por assinatura e compartilhados, bem como soluções de micromobilidade (patinete, bicicleta e e-bike) e ridesharing (carros de aplicativo e táxis). A resposta das empresas fica evidente no desenvolvimento de soluções como o “mobility budget”, segundo a qual a empresa oferece verba de mobilidade e cada colaborador usa como preferir, e no crescimento do carro por assinatura, que é uma locação escalável.

E se “o primeiro fator para os novos comportamentos foi sanitário e já passou”, segundo Campolina, um novo fator se tornou globalmente relevante: a inflação do carro. “Como a inflação fez dobrar o TCO (sigla em inglês de custo total de propriedade), as soluções de locação de curto prazo, assinatura e compartilhamento estão com altíssima demanda, porque trazem mais economia”, diz o diretor-executivo de gestão de frotas da Localiza & Co.

Outro fator que fortalece os novos hábitos é o modelo de trabalho híbrido, por reduzir a frequência de deslocamento dos profissionais. No que diz respeito aos automóveis para uso executivo, isso tem levado à substituição do modelo convencional de um automóvel para cada executivo por uma frota compartilhada. “Não existe mais razão para que um veículo não possa atender duas ou mais pessoas”, como enfatiza Levy Patriani, gerente corporativo de facilities do Grupo Fleury.

E a mesma lógica se aplica à frota comercial, que, no caso do Fleury, é o atendimento domiciliar dos clientes. Enquanto um enfermeiro está cuidando de um cliente, o motorista pode conduzir outro profissional da equipe até um novo endereço. E o conceito de flexibilidade possibilita ainda que, sob certas circunstâncias, o próprio enfermeiro dirija o veículo. Isso reduz a alocação de pessoal, a depender da disponibilidade de pontos de estacionamento na região – item que pode ser aferido com precisão por instrumentos tecnológicos.

__Nova equação de custos__. A urbanização crescente impacta os custos da mobilidade corporativa em várias frentes, desde o consumo de combustível até o desgaste precoce de peças dos veículos com o “arranca e para” das pistas entupidas, sem mencionar o próprio estresse dos colaboradores. Numa metrópole como São Paulo, por exemplo, o tempo gasto pelo trabalhador entre a casa e o trabalho e vice-versa dobrou nos últimos dez anos (uma pessoa perde, em média, duas horas ao dia para ir e voltar do trabalho).

Reduzir esses custos virou apenas uma parte da nova equação da área. Na verdade, é preciso reduzi-los sem perder em prontidão (preferencialmente ganhando agilidade) e incluir outra parte, cada vez mais significativa, de adequação aos requisitos ESG (sigla em inglês para as variáveis referentes a meio ambiente, justiça social e boa governança). Isso leva as empresas a medir custos antes não contabilizados, como o das emissões de gases de dióxido de carbono, e a se responsabilizar por cortá-los.

Um exemplo vem da Korn Ferry, empresa global de executive search. “Pelo menos uma vez por mês, temos uma call com o pessoal da matriz nos Estados Unidos para reportar as informações referentes ao inventário de carbono”, afirma Carlos Eduardo Basile, CFO para a América do Sul da Korn Ferry, Além disso, o escritório da empresa no Brasil precisa enviar um relatório completo por escrito sobre o tema uma vez por ano para a sede em Los Angeles, com documentos comprobatórios dos dados relatados.

Como cortar custos ESG? A principal medida a ser implementada no horizonte de médio prazo é a substituição da frota movida a combustíveis fósseis, altamente poluidora, por veículos movidos a etanol ou elétricos. Mesmo nas empresas que têm maior emissão de carbono de outras fontes do que de sua frota, a opção por veículos que não usem derivados de petróleo tem ganhado importância pela mensagem que envia aos stakeholders, de geração de valor ESG.

Isso inclui veículos movidos a etanol e eletrificados. O custo dos veículos elétricos ainda é 20% a 30% mais elevado que a média, mas gestores de várias empresas, como Fleury, já buscam um ponto de equilíbrio financeiro também para eles no futuro próximo, prevendo mais cobranças dos stakeholders.

Esses desafios listados, sem dúvida, estão acelerando a adoção de uma nova arquitetura de mobilidade pelas empresas.

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## Arquitetura ecossistêmica

O que traduz esses desafios no dia a dia é um conjunto cada vez mais variado de serviços e atividades. Isso, num momento em que “tudo que as companhias querem é não ter dor de cabeça com a administração da frota”, como observa Basile, da Korn Ferry, Então, o que era uma mera decisão de terceirização ganha contornos bem mais estratégicos e ambiciosos, de uma nova arquitetura apoiada em três pilares:

__Terceirização estendida__. A frota corporativa alugada dobrou de tamanho no Brasil nos últimos cinco anos e compreende hoje 20% do total dos veículos das empresas. Continua a crescer, caminhando para o percentual de mercados maduros, como França e Noruega, que varia entre 70% e 80%, e a se aprofundar:a relação inclui agora a integração dos dados, que transforma terceirizacão em ganhos de produtividade com o uso de APIs.

__Novos parceiros__. Outros provedores de serviços de mobilidade, como empresas de benefícios, passam a integrar o ecossistema.

__Novas lideranças__. Os executivos que tomam decisões da área, sobretudo o CFO e o gestor de frotas, migram do propósito de reduzir custos para o de gerar valor, adotando uma visão mais colaborativa e ecossistêmica, e um novo comportamento pessoal em relação a transporte – que dê o exemplo aos demais.

O FUTURO DA MOBILIDADE CORPORATIVA está mudando diante dos nossos olhos. As empresas que estão na vanguarda desse movimento conseguirão aproveitar antes a redução de complexidade e a geração de valor. E as demais? Quem viver verá.

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