Nos últimos anos, temos visto um fenômeno silencioso ganhando espaço nas discussões sobre saúde mental: a epidemia da solidão. No SXSW 2025 este foi, mais uma vez, um dos temas centrais. A falta de conexões humanas está se tornando um desafio urgente, não apenas para as pessoas, mas também para as empresas e para a sociedade como um todo.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera o isolamento social uma ameaça grave, associada a riscos aumentados de doenças cardiovasculares, metabólicas e mortalidade precoce. Uma pesquisa realizada pelo Instituto Gallup revelou que 24% da população mundial se declara muito ou razoavelmente sozinhos. Quando questionadas o quão conectadas as pessoas se sentem a outras pessoas, 77% do público global se sente muito ou razoavelmente conectado, enquanto, no Brasil, este índice ficou bem abaixo da média, em 55%.
Mas quando a solidão começa? Tenho um filho de 10 anos e percebo como as habilidades socioemocionais vão se desenvolvendo desde a infância. Sua capacidade de construir laços, de lidar com frustrações, de compreender o outro – tudo isso está se formando desde os primeiros anos da sua vida. Crianças aprendem a se comunicar, interagir, compartilhar, negociar e construir relações saudáveis. A escuta ativa é incentivada. A autoconsciência, ou seja, a capacidade de reconhecer emoções, compreender sentimentos e desenvolver a autoestima, vai sendo desenvolvida em casa e na escola.
A autorregulação emocional, controlar impulsos e adaptar comportamentos a diferentes situações é estimulada a partir de vários jogos cooperativos, técnicas de respiração e incentivo à resolução de
conflitos com diálogo. A tomada de decisão responsável é estruturada a partir de atividades de resolução de problemas. E ela: a famosa empatia, não deixa de existir nesta lista de habilidades essenciais para formar crianças mais resilientes e preparadas para seus desafios futuros.
No entanto, vivemos em um contexto que valoriza cada vez mais a produtividade e a hiperconectividade digital, e que parece nos afastar do essencial: o contato humano genuíno. Olhando para o mundo corporativo, encontramos um paradoxo bem parecido. Atuando consultivamente e como mentora, vejo uma crise geral de soft skills, onde competências como empatia, colaboração e comunicação estão cada vez mais escassas. Vejo empresas investindo em tecnologia, inovação e eficiência, mas muitas vezes negligenciando aquilo que torna o trabalho verdadeiramente produtivo: as relações saudáveis. Será que a raiz desse problema não está em um afastamento das nossas bases, daquilo que desenvolvemos ainda na primeira infância?
Se, no dia a dia, substituímos conversas por mensagens e, nas empresas, valorizamos mais a performance individual do que a colaboração, como esperar que adultos se sintam conectados e acolhidos? A solidão não vai ser resolvida com um novo aplicativo, um treinamento pontual ou uma política corporativa isolada. Ela é combatida com presença, com criação de espaços para interações reais e reconstruindo o tecido social em todos os níveis da vida. Talvez seja hora de lembrar o que nos torna humanos desde sempre: a nossa capacidade de estar junto, de sentir com o outro, e de criar vínculos que dão sentido à vida e nos fazem pertencer.