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A Startup “Secreta” de Obama

Sigilosamente, o presidente Obama recrutou talentos do primeiro time de empresas do Vale do Silício. Seu objetivo: dar um banho de tecnologia na gestão pública do governo dos EUA

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> **Vale a leitura porque…**
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> … muitas organizações, públicas ou privadas, enfrentam o mesmo problema do governo dos EUA: burocracia e lentidão. … a inovação, nesse caso, não foi obtida apenas com inovadores. … a iniciativa de misturar inovação e tradição pode ser o mais indicado para seu caso também – Obama pôs os geeks para trabalhar em conjunto com a “prata da casa”. 

Eric Maland foi o 13º engenheiro contratado pela amazon e o primeiro diretor de operações do twitter e hoje perambula, ao lado de outros geeks parecidos, pelos arredores da casa Branca, com MacBooks em bolsas a tiracolo. Mas seu pedigree do Vale do Silício lhes dá uma reputação de deuses e deusas. como todos os outros integrantes da equipe secreta que o presidente Barack Obama vem montando, ele nunca imaginou que moraria e trabalharia no Distrito Federal (D.c., na sigla em inglês). “eu só gosto de consertar coisas quebradas”, diz, dando de ombros. 

No caso de Lisa Gelobter, tudo começou com o telefonema que ela recebeu em Nova York, convidando-a para uma reunião de líderes da área de tecnologia. Gelobter tinha acabado de passar pela diretoria de empresas como Hulu e Bet. ela decidiu, com relutância, que iria à reunião, que incluía um tal de Mikey, além de um certo todd. Quando viu, estava no Salão roosevelt, na West Wing da casa Branca. e então o presidente Obama abriu a porta e por 45 minutos fez o discurso mais vendedor que ela já havia ouvido. eles tinham de ir trabalhar para ele, para consertar a infraestrutura digital do governo. 

Quanto a Matthew Weaver, foi recrutado na califórnia em 2014 para trabalhar no site Healthcare.gov e decidiu ficar em D.c. e deixar para trás o conforto do Google e suas opções de ações. “trabalhar nisso mudou minha vida e me fez ver que eu jamais poderia fazer outro trabalho sem impacto social.” Weaver agora passa seus dias na Veterans administration, a agência que dá suporte aos veteranos de guerra. todo esse movimento de Obama é resultado do colapso do site Healthcare.gov, o braço digital do Obamacare, em 2013. O site não conseguiu atender à demanda, como se sabe. era uma das promessas-chave de Obama (permite à população acessar planos de saúde e atendimento médico e hospitalar) e seu projeto teve um custo final de cerca de uS$ 800 milhões e envolveu 55 empresas terceirizadas, mas não funcionou. 

Foram então recrutados os tais todd park, para ser executivo-chefe de tecnologia (ctO) do governo dos estados unidos, e Mikey Dickerson, para liderar o time de 60 engenheiros do Google que corrigiu o Healthcare.gov no ano passado. 

A partir daí, os dois foram recrutando a elite do exército digital – vinda de startups e de quadros de empresas privadas – e inserindo-a no governo dos estados unidos. O objetivo é refazer os sistemas digitais operados pelo governo, implementando a eficiência, a agilidade e a eficácia que definem os maiores sucessos do Vale do Silício, em todos os serviços. “temos hoje em torno de 140 pessoas na rede”, diz park sobre a equipe digital. “a meta é chegar a cerca de 500 no final de 2016.” 

Uma das preocupações é se park e Dickerson conseguirão encontrar profissionais suficientes. E há dúvidas maiores: será que um pequeno número de pessoas é capaz de implantar mudanças tão profundas no governo mais parrudo da terra?

> **À procura do meio-termo**
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> Em entrevista à Fast Company, o presidente dos EUA, Barack Obama, disse que cometeu um erro significativo ao pensar que o governo poderia usar métodos tradicionais para construir algo que nunca tinha sido construído. “Quando se lida com TI, software e design de programa, lida-se com um processo criativo, e este não pode ser tratado da mesma forma que uma compra de lápis no atacado.” Isso significa que substituir a cultura de Washington pela do Vale do Silício deve ser uma meta? Não. Pessoas de tecnologia que tenham paciência em vez de agressividade podem ser mais eficazes. 
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> Mikey Dickerson, um dos  geeks-chefes do grupo de Obama, observa que os terceirizados tecnológicos do governo, mesmo os mais habilidosos, enfrentam o árduo desafio de tentar reparar um sistema digital envelhecido sem comprometer os serviços essenciais. O problema é grande. O método para emitir cheques de seguridade social hoje, por exemplo, se baseia em velhos servidores que rodam com a linguagem de computador Cobol. “Tudo bem, durou um tempão para eles”, diz Dickerson. 
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> Mas as pessoas que podem manter e operar essa geração de tecnologia não vão viver para sempre; na verdade, muitas delas já passaram muito da idade de se aposentar. Nesse caso, a mentalidade da Costa Oeste talvez seja contraproducente. “No setor empreendedor privado, costumamos não dar a mínima para o que veio antes: queremos abalar as estruturas. Mas não podemos abalar a previdência. É o que deixa tudo mais difícil.”

**COSTAS QUENTES**

O fato de os geeks terem uma “cobertura aérea” significativa, como descreveu Obama, ajuda bastante. O presidente colaborou pessoalmente com park e sua equipe para recrutar os talentos e implantar suas ideias nas agências governamentais. a ideia de construir um “pipeline” de talentos tecnológicos em Washington começou com um apelo prático, como lembra Obama: melhores ferramentas podem aperfeiçoar os sites de agências que prestam serviços cruciais, trazendo economia de tempo, dinheiro e vidas. “O que percebemos, porém, é que isso poderia ser o caminho para algo maior – um governo mais amigável e responsivo, que pode trabalhar com indivíduos de uma forma mais customizada, como já tem feito com empresas”, diz. em outras palavras, se o time tecnológico de Obama for capaz de reconstruir com sucesso a infraestrutura digital de Washington, o governo não apenas ficará mais funcional. As atitudes dos norte-americanos em relação ao governo também podem se transformar. e será que o governo ainda vai reter um grupo dedicado de gênios da tecnologia que abraçam o serviço público como parte essencial de suas carreiras? O presidente aposta que sim. esse hub de insurgência tecnológica de Washington, conhecido como uS Digital Service (USDS), fica em uma casa de tijolos aparentes a meia quadra da casa Branca. apesar da aparência de seus frequentadores, a administração Obama se sente à vontade com eles. O presidente – cuja campanha de 2008 foi a demonstração mais convincente do potencial das mídias sociais – foi o primeiro chief executive officer público a nomear um chief technology officer e, mais recentemente, um chief data officer. “O governo foi péssimo em termos de tecnologia nos últimos 30 anos e ficou muito atrás do setor privado”, diz Obama. criar posições de alto nível, como a de ctO, era um degrau para uma política tecnológica governamental melhor, mas não necessariamente para melhores operações. além disso, a prioridade imediata era enfrentar a crise econômica e resolver pepinos militares.

**NÃO BASTA SER GEEK**

Quem olha de fora muitas vezes comete o erro de avaliar os problemas técnicos de Washington como consequência da falta de talentos. parece tentador classificar essa onda de contratações como a formação de uma equipe tática de guerra que veio salvar o governo dos bárbaros da cidade. 

Mas não é bem assim. De um lado, os profissionais que park e Dickerson estão atraindo não são só engenheiros de software; são cientistas de dados, “gurus” da experiência do usuário, gestores de produto e especialistas em design. 

De outro, eles se associam a pessoas de dentro do governo que podem aconselhá-los sobre como implantar ferramentas do setor privado, proibidas por muito tempo, ou sobre como a contratação de terceiros pode ser melhorada. em geral, isso envolve abrir uma picada na selva das regulamentações. 

Como afirma park, “precisamos das duas coisas: pessoas que dominam a tecnologia e pessoas que dominam a burocracia”. a complexidade em jogo é formidável. Se você colocar o chapéu de engenheiro, segundo Dickerson, pode olhar para a abordagem de tecnologia do governo e concluir que é insana. No entanto, se analisá-la como um antropólogo, alguém que estuda uma cultura estrangeira com interesse, vai ver que as disfunções surgiram por motivos profundos e estruturais. Segundo Dickerson, Washington tem muitas pessoas inteligentes, mas elas ficaram distantes do crescimento extraordinário das empresas da costa Oeste que agora gerenciam “sites em escala planetária”, ocorrido na década passada. 

E não se contaminaram. acima de tudo, há na capital do país uma inércia do passado. uma das primeiras lições que Dickerson aprendeu sobre o D.c. quando chegou foi que a cidade tradicionalmente associa a importância de uma tarefa a seu custo. referindo-se ao Healthcare.gov,  ele diz: “Foram alocadas centenas de milhões de dólares 

para construir um site porque era um site importante. Mas o twitter precisou de três rodadas de financiamento antes de conseguir o mesmo número de usuários do Healthcare.gov – de 8 a 10 milhões. Somando as três rodadas, o valor não ultrapassou uS$ 60 milhões”. Dickerson acredita que o projeto do Healthcare.gov poderia ter sido feito com um orçamento de igual tamanho. No entanto, não havia ninguém para insistir que a hoje bem estabelecida prática do Vale do Silício de construir software “ágil” seria muito melhor e bem mais barata que uma colcha de retalhos de terceirizados construindo um site monolítico. 

**MEDINDO RESULTADOS**

É cedo para dizer se esse ecossistema vai se desenvolver, mas também é verdade que a insurreição tecnológica foi além de seus estágios conceituais. Várias equipes agora estão envolvidas em projetos em diversas agências. todos os programas usam código aberto e, assim, podem ser adaptados por outras áreas do governo sem qualquer trabalho extra, o que já está acontecendo. 

É claro que uma startup tecnológica de cem ou mais pessoas, apoiada pelo presidente e trabalhando dentro do governo, difere de uma startup de três caras em uma garagem de palo alto. para park, a missão do governo é mais parecida com a de uma grande corporação que decidiu se reinventar. Mas como medir uma iniciativa como essa? Sem dúvida, existe demanda para o trabalho dessas equipes. 

E também há profissionais disponíveis – conforme as empresas de tecnologia crescem, as contribuições de engenheiros individuais ficam mais diluídas e isso os motiva a buscar um propósito maior, como aconteceu com Weaver. A seleção de profissionais do uSDS é feita não só pelo QI, mas pela inteligência emocional. “pessoas interessadas em refeições gourmet e opções de ações não vêm para cá”, diz Dickerson. apesar dos riscos políticos e dos cortes orçamentários, o fato de o uSDS estar abrigado sob o escritório de gestão e orçamento dá musculatura aos  techies dentro de várias agências. 

O risco maior a pairar sobre toda a empreitada é o de acabar o tempo. É necessário atingir a velocidade e o momentum necessários antes do fim do segundo mandato de Obama. Ou não será possível aproveitar essa inteligência e capacidade de inovação instaladas.

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