Melhores para o Brasil 2022

Aprendendo com a piada à brasileira

Há outra forma em que nosso povo é capaz de expressar melhor sua criatividade do que por meio dos memes?
Jornalista e doutoranda em comunicação social e balbúrdia pela Universidade Metodista de São Paulo.

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Pense na Nazaré confusa, na Luíza do Canadá, no Chico Buarque feliz e triste, no “ata” da Mônica. Como nós, você talvez conclua que o El País Brasil estava certo em maio de 2017, quando publicou: “A fábrica de memes é a única instituição funcionando plenamente no Brasil”. O texto fazia referência ao bom humor e à criatividade dos brasileiros diante de mais um escândalo político que movimentava as engrenagens dos memes: a gravação de Aécio Neves pedindo
R$ 2 milhões à JBS. “Quando o Brasil foi dormir… reinava a incerteza com exceção de uma clareza: poucos povos fazem memes tão bem como o brasileiro”, dizia o texto da jornalista María Martín.

A clareza sobre o jeitinho brasileiro de fazer piada diante de situações de crise não é nova – inúmeros são os programas humorísticos bem-sucedidos desse segmento na história da TV brasileira. Mas o humor tem se mostrado mais distribuído do que nunca na internet, por memes – e, há algum tempo, contamina publicidade e jornalismo também.

Uma busca no Google Notícias pelo termo nos dá cerca de 189 milhões de resultados no mundo. As notícias narradas por memes são as mais diversas, da cultura pop à política e negócios.

## O que são memes mesmo?
Os memes da internet são comportamentos, diálogos, peças textuais, imagéticas ou audiovisuais (ou todas essas formas combinadas) que circulam nas redes sociais, produzidas por usuários anônimos ou não, com longo alcance e potencial para adaptações personalizadas no compartilhamento. Ou seja, tudo rende meme na era digital: frases fora de contexto, performances exóticas, até foto antiga. Basta cair na graça dos internautas.

Memes não envolvem necessariamente celebridades, mas, muitas vezes, é esse o caso, como o apresentador de TV Luciano Huck. Ele tem fotos suas com personagens da política resgatadas toda vez que há algum cancelamento. Tentando ressignificar a zoeira com outro meme, Huck postou no Instagram uma selfie com balões de 2020 e a legenda “ninguém mais aguenta 2020”.

Porém, o termo “meme” foi cunhado em 1976 pelo biólogo britânico Richard Dawkins, a partir do grego “mimeme” (imitação). Já certo do processo evolutivo das espécies por meio dos genes transmitidos de pais para filhos, Dawkins voltou sua atenção aos processos culturais transmitidos. Ele observou que práticas comuns do dia a dia atravessavam gerações por meio da repetição pura e simples, como a forma de acender o fogo, de preparar alimentos, de confeccionar roupas etc.
Hoje, a ampliação dos efeitos sociais influenciados por tecnologias digitais é acompanhada por estudiosos globais. Em tempos de distanciamento social e tensões políticas, os memes, além de repassar informação e entretenimento, servem para reforçar o sentimento de pertencimento de grupo.

## Memes podem, sim, ser institucionais
Sabe aquela máxima “é na brincadeira que se dizem as verdades”? Pois há muitas discussões sérias no picadeiro memético. E os memes também são uma ferramenta séria para o marketing institucional das organizações. Ana Lu Oliveira, social media e especialista em marketing digital, explica que não há restrições de perfis corporativos que possam adotar memes como narrativa. Do Vaticano às quitandas, a estratégia serve a todos, uma vez que o humor sempre gera muito engajamento. “Mas a estratégia deve estar alinhada aos valores e ao posicionamento da marca para a empresa não ‘entrar errado’ e iniciar o jogo com gol contra. Precisa fazer sentido e não desrespeitar ninguém!”

Em São Luís (MA), a Prefeitura Municipal foi bem-sucedida na produção de conteúdo em linguagem memética entre os anos de 2017 e 2020. Foi observado um envolvimento muito maior nas publicações que continham memes em comparação às mais informativas nos perfis oficiais da Prefeitura. “O engajamento disparava e era sempre positivo. Alguns deixavam um emoji de risada, outros já entravam na brincadeira e faziam comentários supercriativos envolvendo o meme da publicação”, lembra o publicitário Arthur Araújo, que atuou como social media na equipe de comunicação da capital maranhense. “Alguns chegavam a declarar que amavam a comunicação da Prefeitura.” Outros órgãos públicos vêm tentando fazer isso, porém ainda é mais exceção do que regra.

Muitas empresas que ainda não recorriam a memes se viram empurradas a fazê-lo com a crise pandêmica. Não só para aliviarem a carga negativa das informações, mas também para promoverem o senso de pertencimento e tornar as marcas mais humanas. O coronavírus não acelerou só a transformação digital das empresas, como diz um meme; acelerou a memetização corporativa.

## Produtores e distribuidores
Apesar de muitos memes serem anônimos, há perfis de produção e compartilhamento desse tipo de humor nas redes; alguns são profissionais e vendem seus serviços a empresas, como South America Memes e Capinaremos.

Um diferencial é que os profissionais cuidam dos direitos autorais de filmes e músicas memetizados, mantendo o diálogo com estúdios e artistas. É o que faz o South America Memes, que surgiu como um canal de “zoeira entre amigos” e hoje tem mais de 3 milhões de seguidores no Instagram.

Outros diferenciais são segmentação e posicionamento. O South America Memes possui hoje três perfis – ele mesmo, Lixeira Memes e Máquina de memes. Já o grupo Campina Meme Factory conta com mais de 24 mil membros produzindo dezenas de peças por dia em um grupo no Facebook. As melhores são filtradas e lançadas nas páginas oficiais do Campinaremos.

A manutenção das páginas e grupos, realizadas por dois administradores e cinco moderadores, apesar de render esporádico retorno financeiro em publicidade, se mantém mais como entretenimento. “Em relação à monetização, infelizmente, nada decolou de forma significativa, pelo menos para nós. Continuamos fazendo como um hobby. Cada moderador toca sua vida com outras profissões, e controla o grupo no tempo livre”, conta Sandro Sanfelice, administrador do Campinaremos.

## “Think tanks” meméticos
O Brasil possui um Museu de Memes. Coordenado pelo professor Viktor Chagas, da Universidade Federal Fluminense (UFF), o site preserva a memória dos memes e estimular, em eventos, a reflexão sobre o lugar que essa forma de comunicação ocupa. Ali estão memes históricos, como Michel Temer Poeta e a I Guerra dos Memes entre Brasil e Portugal, vencida por nós, claro. Acesse www.museudememes.com.br.
Outro “think tank” é o podcast “Além do Meme”, do jornalista Chico Felitti, que entrevista personalidades brasileiras marcadas por memes. Eis alguns episódios de destaque: Beth do trote; Grávida de Taubaté; Cariúxa, que não venceu o concurso da Garota da Laje; atrasados do Enem.
Resumo da ópera: fica, vai ter meme!

Meme criativo da hora: EAD na quarentena

Com as salas de aula fechadas e a consequente adaptação ao ensino a distância (EAD), a nova rotina causou impacto na vida de estudantes, professores e famílias de um modo geral – e, claro, dos internautas, que buscaram nos memes uma forma de lidar com o estresse causado por esse novo modelo de ensino. Como de costume, o brasileiro não decepcionou.

Meme criativo da hora: Partiu, tomar
vacina em SP

Quando o governador de São Paulo, João Dória (PSDB), anunciou um plano de vacinação para o início de 2021, afirmando que todo e qualquer brasileiro que estivesse em São Paulo poderia receber a vacina gratuitamente sem precisar comprovar residência no estado, a fábrica de memes colapsou mais uma vez. Na abertura da matéria e acima, alguns resultados.

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