A necessidade de inovar nas empresas nunca foi tão discutida. No entanto, é curioso notar que muitos que falam sobre inovação em redes sociais, eventos e reuniões continuam travados, sem apresentar resultados concretos. Neste artigo, apresento quatro razões que explicam essa apatia, acompanhadas de dicas práticas para despertar o lado “i” das pessoas inquietas, inovadoras e intraempreendedoras.
Antes, compartilho minha definição de inovação para fazermos uma avaliação intelectualmente honesta e sem apegos emocionais:
Inovação é a combinação da coragem para fazer o que precisa ser feito, com a tolerância ao desconforto, que essas ações vão gerar nas pessoas e na empresa.
Destaco três palavras-chave: coragem, tolerância e, principalmente, desconforto — pois inovar é, antes de tudo, lidar com a impermanência e com o incômodo que mudanças inevitavelmente causam.
Um teste simples para saber se uma ideia é inovadora: apresente-a a cinco pessoas. Se todas concordarem ou a considerarem incrível, provavelmente não é inovadora. Talvez criativa, mas mais do mesmo. A inovação gera desconforto por envolver o desconhecido, exigindo coragem e tolerância às consequências, boas ou ruins.
A coragem está diretamente ligada à liderança, que divido em três dimensões: criatividade, persuasão e antifragilidade. Tenho usado com frequência uma frase que traduz bem os desafios contemporâneos de uma liderança de impacto:
“Liderar é, essencialmente, a arte de fazer a gestão da impermanência.”
Note, que em um mundo marcado por transformações constantes, os cenários futuros, que ainda teimamos prever, já se tornaram irrelevantes e imateriais.
Você conhece alguém que, além de postar no LinkedIn, leu e aplicou, na prática, as tão badaladas tendências divulgadas, anualmente, num relatório de 400 páginas pela Amy Webb? Ou nos longos estudos que inundam os grupos de whatsapp no início de cada ano? Quantos você recebeu, não leu, mas repassou? Ou quantos você leu 1 vez e não retornou para conferir se aquele cenário previsto havia se realizado?
Temos um apego a previsões e planejamentos estratégicos de longo prazo, esquecendo que o contexto, que já foi estável, agora desapareceu.
Sou adepto da “presentologia”, que significa ativar um olhar de amplitude e profundidade para o presente, como forma de manter-se viável para um futuro ainda desconhecido.
Logo, inovação não deveria mais ser um departamento isolado, mas o motor dos negócios. Nas startups, não existem cargos ou áreas dedicadas à inovação. Tenho recebido, cada vez mais convites para apoiar grandes empresas que buscam ativar culturas pró-inovação, mas em suas áreas de operações (fábricas), o que celebro como um indicador de expansão e adoção.
Agora, minha definição de inovação esbarra em estruturas rígidas da era industrial, vigentes até hoje, num paradoxo de apresentar o impacto real da IA para Henry Ford: existe a busca, mas ainda prevalece a rejeição pelo desconforto gerado.
Abaixo, aponto quatro bloqueadores humanos da inovação, sem relação com tecnologia:
- Na dúvida se vai dar certo ou vai me expor, melhor nem fazer ou sabotar:
Na época que liderava a transformação digital na Nestlé, o CEO com a melhor intenção de acelerar o processo contratou uma grande consultoria, que trouxe novos estímulos e provocações. Como liderança, meu apoio ou não indicaria o sucesso ou não daquela iniciativa. Numa posição de alta exposição, me senti julgado e fiz o que pude para inviabilizar o projeto, que por sorte (para mim naquela época) naufragou.
Hoje vejo a oportunidade que deixei escapar de ter um apoio importante e externo para acelerar a agenda que precisava liderar. Na época foi um alívio, porque temia pelo meu emprego ao ter pessoas com mais conhecimento ou experiência do que eu.
Essa mesma dúvida e aflição, que me fizeram agir em modo defesa e sabotagem, sigo vendo aos montes. Reflita quantas vezes você viu ou mesmo fez algo parecido.
Nosso cérebro reptiliano e primitivo, ao ver algo desconhecido e que não podemos controlar, ativa o modo sobrevivência.
Se liderar é sobre a arte de gerir a impermanência, convido você nessas ocasiões a ativar um grande “e se?” – e se der certo? e se eu aprender mais? e se isso que acho que é uma ameaça pode me ajudar a acelerar?
Ao evocar o “e se?” substituímos o medo pela curiosidade. Bora tentar? E se?
- Falhar é ruim. Posso comprometer meu bônus ou até a minha carreira
O medo de errar paralisa, enquanto o desejo de fazer mobiliza. Mas como fazer, se tenho receio de ser julgado ao cometer alguma falha? O CEO de uma grande multinacional de tecnologia, no segmento B2B, aqui no Brasil, ao reparar que o negócio estava estagnado nos últimos 3 meses, decidiu tomar uma atitude diferente em sua reunião mensal com o board de diretores.
Ao entrar na sala, cumprimentou a todos e ao começar suas considerações, fez a seguinte pergunta: “gostaria de aproveitar nosso encontro mensal para saber quem de vocês cometeu alguma falha nesse último mês e gostaria de compartilhar?”
O silencio foi total, com diretores se olhando, provavelmente ativando o modo sobrevivência ao refletir se havia acontecido algum erro grave, que se tornaria em uma bronca ou até em alguma punição.
Ao ver a tensão no ar, o CEO comentou que havia falhado ao não aprovar um projeto, por receio de não ter todas as respostas e ao ver seu concorrente realizando algo parecido e tendo sucesso, se arrependia de não ter tido a coragem necessária.
Num ambiente agora de surpresa, ele seguiu: “não termos falhado ou a coragem de declarar, demonstra que não fizemos ou mesmo tentamos fazer algo diferente e isso me preocupa”
A partir daquele mês, a empresa voltou a crescer. Note que o CEO ao se mostrar vulnerável, na prática, criou um espaço de conforto e segurança que uniu aquele grupo.
Proponho a seguinte reflexão: você conhece alguma inovação gerada na 1ª tentativa?
Logo, a falha é parte do processo. Empresas grandes tem ciclos de inovação de 18 ou 24 meses, para projetos que poderiam ser testados em poucos meses, com poucas pessoas, gerando aprendizados, para realimentar o processo. Gosto muito de substitui a palavra intraemprer por intraAprender.
- Pequenos e perigosos poderes
Já ouviu falar da síndrome do pequeno poder? Dou um exemplo simples: ao levar meu filho de 8 anos para um jogo de futebol, o fiscal do portão de entrada pediu o RG da criança. Disse que era pai dele e que havia esquecido. O fiscal me barrou alegando que sem o RG não poderia comprovar que aquela criança era meu filho.
Chocado, argumentei “será que encontrei essa criança que me abraça, chama de pai e tem a minha cara e trouxe com uma meia entrada?” Se ele fosse da polícia entenderia o argumento, mas era o fiscal da catraca do estádio, exercendo o pequeno poder de barrar alguém por motivo descabido.
Recentemente, fui convidado a fazer uma palestra. Fui contatado pelo contratante, dono da verba que me passou o briefing e indicou que alguém do setor de compras entraria em contato.
Fui convocado para uma reunião com essa pessoa de compras e acredite, havia mais duas pessoas assistindo a reunião para uma conversa de 5, que durou 30 minutos e não teve qualquer resultado.
Fiquei pensando na quantidade de reuniões inúteis e tempo perdido em controles desnecessários. Trabalhando em startups aprendi que e-mails se enviam para fora da empresa. Dentro não se usa Slack ou outra ferramenta de comunicação ágil e sem burocracia. Confesso ficar estarrecido com práticas que seguem intactas desde os anos 90, quando comecei a trabalhar.
Minha dica ou provocação aqui é: preciso estar? Não? Então não vou participar, pois confio. Seguimos agindo em manada, como forma instintiva de nos protegermos em grupo, como se fossemos animais irracionais. Desapegue, dê espaço e note as mudanças e empoderamento das pessoas. É pelo pequeno que se define o percurso.
- Rasgue o Organograma e monte um “Habilidograma”
Em plena era da abundância, tecnologia e conhecimento, seguimos reféns de organogramas criados no século passado. Enquanto as empresas ou você seguirem contratando por currículos iremos reforçar silos, ego, falta de colaboração e o individualismo.
O que minhas ou suas passagens por empresas 10 ou 20 anos atrás, dizem sobre minha ou sua contribuição hoje? Ah, mas fiz coisas incríveis Wacla. Beleza! Mas o contexto, o mercado, a cultura, a tecnologia, a sociedade, os costumes, a concorrência são iguais?
Não e por isso nossas experiências são camadas e não definem quem somos ou como podemos contribuir.
Em um mundo mais abundante e tecnológico o fator humano será cada vez um diferencial, logo precisamos aprender a nos autoconhecermos e a quem contratamos.
Uma empresa nacional estava com dificuldades para inovar, até buscar conhecer com mais profundidade seus colaboradores e descobrir que em sua maioria queriam gerar um impacto no mundo através da diversidade.
O CEO com essa informação, pediu que fosse feito um projeto para uma inovação que acolhesse esse desejo. Foi o projeto com o menor ciclo de tempo entre ideação e lançamento dessa empresa, até então.
Se eu perguntar o que motiva ou qual o impacto no mundo as pessoas da sua equipe querem gerar, você saberia me dizer?
Em resumo, inovar exige coragem para enfrentar o desconforto e tolerância para lidar com a impermanência. Romper com velhos paradigmas e valorizar o fator humano são passos essenciais para transformar a inovação no motor dos negócios. Que este artigo inspire possa te inspirar a substituir o medo pela curiosidade e a agir com coragem para fazer diferente hoje.