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As marcas e as empreendedoras de si mesmas

Garotas equilibristas, novo livro da pesquisadora e especialista em estudos de marketing Cecília Russo, mostra que a comunicação com as mulheres mais jovens no Brasil não pode ser baseada só na atitude lean in

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Em 2014, Sheryl Sandberg lançou uma versão de seu best-seller _Lean in_ para mulheres recém- -formadas – _Lean in for graduates_ –, trazendo uma perspectiva mais globalizada e o ponto de vista de negras, já que o livro inicial refletia sobretudo o universo de mulheres brancas de classe média e alta. A mensagem era a mesma: o caminho para o sucesso profissional feminino passa pela atitude lean in, de se comprometer mais integralmente com o trabalho e demonstrar mais autoconfiança. A ideia toda teve grande repercussão [_veja quadro no final do artigo_] e muitas marcas começaram a se comunicar com as mulheres jovens como se todas tivessem esse perfil lean in. Será que isso é verdade, seja nos Estados Unidos, seja no Brasil? 

Podemos buscar respostas no livro _Garotas equilibristas_, que a especialista brasileira Cecília Russo acaba de lançar, com base em um estudo em profundidade com universitárias brasileiras. 

Nele conhecemos as estudantes Maria, 21 anos, heterossexual, branca, que frequenta o curso de direito na Universidade Mackenzie; Bárbara, 22 anos, heterossexual, negra, estudante de administração na Universidade de São Paulo (USP); Verônica, 21 anos, heterossexual, branca, que faz administração na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e cosmetologia no Senac; Andréa, 21 anos, heterossexual, branca, aluna de engenharia na USP; Isabel, 22 anos, heterossexual, branca, do curso de direito do Mackenzie; Carla, 21 anos, homossexual, branca, estudante de comunicação na Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP); Rachel, 22 anos, heterossexual, branca, aluna de arquitetura no Mackenzie; Lúcia, 21 anos, homossexual, branca, que cursa comunicação na Universidade Anhembi Morumbi; e Nádia, 20 anos, heterossexual, negra, estudante de comunicação da PUC-SP. 

O que descobrimos com as jovens entrevistadas por Russo é que nem as universitárias paulistanas são exatamente lean in, como se poderia imaginar. Elas não querem apostar todas as fichas na carreira; querem ter tudo. O trabalho é trampolim para outras coisas. Desejam, sim, relacionamentos amorosos, apenas não necessariamente seguindo o script tradicional de casar e formar uma família. Há para elas uma pluralidade de possibilidades: ter filhos ou não, morar sob o mesmo teto com a pessoa amada ou não, ser mãe sem ser casada com o pai da criança, ter uma relação hétero ou homoafetiva, entre muitos outros modelos. 

Também desejam estar em paz com seu corpo, em dia com o que consideram bonito, e fazer o bem, agregando a seu “eu individual” uma responsabilidade social, expressa no olhar de querer ser útil para o futuro da sociedade e do planeta. Ter um propósito e trabalhar com algo que alimente esse propósito ganha força para essas jovens, muito mais do que fazer carreira em si. Assim, elas se veem como empreendedoras de si mesmas. 

Como mostra Russo, até nos Estados Unidos o lean in não é tão dominante. A American Association of University Women, por exemplo, publicou em seu site o artigo de uma mulher de 30 anos, Jennifer Perdomo, que também quer “ter tudo” e que, para conseguir isso, cobra uma revisão de decisões da sociedade como um todo, mulheres e homens. Um estudo de Anne Machung entre as estudantes da University of California em Berkeley, sobre suas expectativas de futuro em termos de trabalho e família, revelou que as mulheres esperavam desenvolver uma carreira, mas também consideravam a possibilidade de largá-la quando tivessem fi lhos. 

O que isso significa no mundo do branding, incluindo o branding do empregador? Segundo Russo, essas jovens rejeitam mensagens rígidas de que devem ser apenas profissionais de sucesso, sacrificando todo o resto, bem como a idade de serem somente cuidadoras perfeitas da casa e da família, como se não tivessem outras ambições. 

Se já estava difícil para as marcas e empresas falarem com a geração X, ficou mais complicado agora. Segundo Russo, terão êxito na comunicação com essa nova geração de mulheres as marcas que escolherem um de três modos de se posicionar: 

**• Marcas colaborativas.** Apostam no desenvolvimento dessas jovens e se veem crescendo com elas. Não se trata de iniciativas como Uber ou Airbnb, voltadas a tornar coletivo o que é individual. São colaborativas ao apoiar os projetos de futuro das mulheres e lhes facilitar a vida. Russo ilustra essa postura colaborativa com a IBM, onde as cegonhas são bem-vindas. As gestantes podem agregar o período de férias à licença-maternidade, trabalhar em home office e, durante a amamentação, ter o táxi pago pela empresa duas vezes ao dia para ir até em casa; há, também, reembolso para despesas com creche durante 18 meses.
**• Marcas com propósito.** “Revelam propósitos com os quais as jovens se identificam”, explica Russo. “Não são causas, pois estas são passageiras, muitas vezes fruto de oportunidades inoculadas nas empresas de fora para dentro, que servem para as empresas reduzirem o sentimento de débito social delas com a natureza, a comunidade, o mundo a seu redor.” Segundo a autora, esse propósito é a razão de existir da empresa, algo de dentro para fora. O Google, aos olhos dessa geração, é uma marca com propósito de qualidade de vida, por seus espaços abertos, horários flexíveis, arquitetura contemporânea e estímulo para que seus colaboradores tenham qualidade de vida.
**• Marcas que abrem possibilidades.** Fornecem a liberdade de que as jovens precisam, porque, em sua comunicação, ampliam caminhos para um novo equilibrismo feminino que faça caber família e carreira. Um exemplo é a marca Coors Light, lançada em 2016 nos Estados Unidos. Com o tema _Whatever your mountain_, tem sentido que vai bem além do literal; promove a equidade de gêneros. 

Cecília Russo dá um recado claro em seu livro: “Se uma marca foca de modo exagerado o caminho do lean in, há poucas chances de ela gerar algum tipo de envolvimento com as jovens mulheres. Se trouxer modelos idealizados de mãe, esposa e afins, incompatíveis com uma vida de quem quer equilibrar pratinhos de maneira mais leve e saudável, também será malvista”. 

**DESAFIANDO SHERYL SANDBERG**

Lançado em 2013, o livro _Lean in_, da COO do Facebook, Sheryl Sandberg, teve mais de 2 milhões de exemplares vendidos no mundo inteiro e grande repercussão, inclusive no Brasil, onde recebeu o título Faça acontecer. A pesquisadora Cecília Russo, autora de _Garotas equilibristas_, diz entender a obra como literatura de “autoajuda”, baseada em um roteiro de como ter sucesso e inspirada em sua própria história. Russo cita em seu livro, por exemplo, a jornalista Ana Paula Padrão, que desenvolve vários projetos focados em questões femininas. Para Padrão, Sandberg peca ao colocar a culpa exclusivamente no ombro das mulheres, como se a falta de ambição fosse o principal motivo por trás da ausência das mulheres nos cargos mais altos. A jornalista defende a mudança dos ambientes corporativos, o que exige uma participação mais assertiva dos homens na direção da equidade de gêneros. Lola Aranovich, professora do departamento de letras estrangeiras da Universidade Federal do Ceará e autora do blog Escreva Lola Escreva, é outra referência de Russo. Para Aranovich, não falta confiança às mulheres executivas, como Sandberg diz, e sim apoio da sociedade em geral para conciliar carreira e vida pessoal, especialmente após a maternidade.

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