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Assédio moral no trabalho: pesquisa revela que metade dos profissionais brasileiros pratica ou tolera

Provocação, ridicularização, gozação, desqualificação... Essas são apenas algumas das várias formas em que o assédio se manifesta. Ele não ocorre de maneira clara e evidente, e o assediador, que se julga dotado de poder superior ao assediado, se esconde covardemente em atitudes sutis e sorrateiras.

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De acordo com um levantamento realizado pelo IPRC (Instituto de Pesquisa do Risco Comportamental), metade dos profissionais brasileiros pratica ou tolera assédio em seu ambiente de trabalho. 

Foram analisadas as respostas de 2.435 funcionários e candidatos, de 24 empresas privadas situadas no Brasil, que ocupam posições sensíveis em suas organizações, sensibilidade essa que pode estar atrelada à vulnerabilidade das atividades que seu cargo propicia ao lidar com informações confidenciais, bens, dinheiro, negociações, entre outras.

O objetivo era compreender a visão do indivíduo frente a hipóteses de conflitos éticos e seu nível de resiliência a estes dilemas que poderão estar expostos no ambiente organizacional.

A Revista HSM Management conversou com exclusividade com Renato Santos, especialista em compliance e diretor do IPRC, sobre os resultados da pesquisa.

Confira na íntegra como foi essa conversa:

1- A Pesquisa Índice PIR Assédio aponta que 18% dos profissionais tendem a praticar o assédio moral. Qual a principal motivação para este comportamento?
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O assédio se origina no uso de poder por parte do assediador. Ele pode se configurar em um modo “positivo”, com promessas de promoções e aumentos salariais, ou seja, com indicadores de “vantagens”. Esse modo de exercício de poder se faz presente na realidade de muitas organizações, considerando que vivemos numa sociedade na qual predomina a competição em forma de meritocracia.

O assediador exerce sobre o assediado a manipulação de sua percepção de performance, atacando assim sutilmente a sua dignidade, fragilizando o assediado a tal ponto que se sentirá culpado por estar sofrendo assédio.

Porém o modo mais clássico de exercício do poder se dá pela negatividade, com ameaças (estas mais pontuais), com sugestões de que o assediado perderá o emprego se não fizer sua vontade, além da pressão contínua.

2- Por que 41% dos profissionais se calam ao observar um assédio moral ocorrendo ao seu lado?
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Por medo. Medo de retaliação, caso o assediador descubra quem o denunciou. Medo de ser o próximo alvo, pois o assediador é retroalimentado pelo próprio ato de assediar. Medo de ser tachado como “dedo duro”, algo que é rechaçado na nossa sociedade brasileira desde a infância. Medo de errar ao interpretar que aquela cena que presenciou realmente é um assédio. Medo de não receber apoio da organização, pois geralmente o assediador é aquele profissional “trator” que entrega resultado e, consequentemente, intocável.

3- Quais são as formas de assédio?
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• Deterioração proposital das condições de trabalho: o assediador busca humilhar o assediado por meio do ambiente a sua volta, inviabilizando condições básicas de trabalho, enfraquecendo assim a resistência do seu “alvo”.

• Isolamento e recusa de comunicação: é a famosa “geladeira” quando o assediador humilha silenciosamente o profissional, afetando diretamente a sua autoestima ao se ver isolado e sem qualquer suporte de seu superior ou colegas de trabalho;

• Atentado contra a dignidade: são olhares, sinais ou mesmo comentários “soltos” onde o assediador ataca diretamente a dignidade do assediado, tentando assim enfraquecer psicologicamente o assediado até uma despersonalização;

• Violência verbal, física ou sexual: nada sutil, ocorre geralmente entre quatro paredes, até mesmo por saber que outros podem identificar facilmente seu comportamento como assédio, o assediador se refugia no ato da investida.

4- A pesquisa aponta que 37% dos profissionais se omitem ao presenciar um assédio sexual no ambiente de trabalho. Essa omissão pode ter correlação com o machismo?
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Sim. Infelizmente a ideia de que a ‘culpa é da vítima’ se encaixa em muitas visões machistas, inclusive por parte de algumas mulheres. A percepção de que se a pessoa sofreu assédio sexual é porque provavelmente teve algum comportamento impróprio que levou o assediador a esta investida, ou mesmo, de que as roupas eram provocantes demais e, ainda, não ‘cortou’ porque não quis, aumenta este comportamento omisso por parte de colegas que presenciam o assédio sexual.

Todas estas visões se resumem a um único comportamento: o machismo. E, este machismo afeta inclusive o homem, quando ele é uma vítima. Imagine que um homem sofreu assédio sexual de sua chefe, caso um colega homem presencie essa situação, provavelmente não vai dar apoio para denunciar, mas vai questionar sua masculinidade por não aceitar a investida. E, caso o chefe seja outro homem, o preconceito e homofobia irá sobrepor qualquer outra reação. Daí, temos uma estrita correlação entre assédio sexual e machismo.

5- Existe assédio entre pares? O que é assédio invertido?
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O assédio é um fenômeno multidimensional. O assédio moral impõe a existência de hierarquia entre o assediador e assediado, mas essa violência pode ser praticada entre colegas, ou ainda, por subordinados quando estes utilizam a estrutura organizacional para obrigar o superior a fazer algo de seu interesse, esse fenômeno é denominado “Corporativismo” ou “Assédio Invertido”.

6- Porque o assédio moral é mais frequente do que o corporativismo?
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O assédio moral geralmente traz um ganho financeiro, mesmo que indireto, pois ele aumenta a produtividade da equipe a curto prazo e, com isso, impacta nos resultados da área e consequentemente no bônus do assediador. Em momentos de crise, pode garantir a empregabilidade do assediador, uma vez que ele apresentará um resultado direto, mesmo em detrimento das consequências psicológicas nocivas.

Já o corporativismo está muito mais associado ao comportamento de sabotagem contra colegas e superiores. O ganho é mais indireto. Apesar que cabe ressaltar que a pesquisa foi desenvolvida antes da pandemia, ou seja, em uma situação “normal” de pressão.

Percebemos a necessidade de desenvolver uma pesquisa durante e pós pandemia, para comparar e identificar possíveis alterações nos riscos comportamentais.

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