Desenvolvimento pessoal

Boeing: dados como combustível

Em entrevista, o CIO da Boeing, Ted Colbert, conta que os investimentos em analytics, embora causem desconforto, estão ajudando a Boeing a voar mais alto.

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A negociação para a venda da terceira maior fabricante de aviões do mundo, a brasileira Embraer, à líder mundial do setor, a norte-americana Boeing, tem ocupados os noticiários. Embora o capital da empresa esteja sob controle privado, o governo federal possui a chamada “golden share”, a ação de classe especial que lhe permite vetar alterações como a transferência do controle acionário – uma vez que a Embraer é uma fornecedora do Ministério da Defesa do Brasil.

Enquanto a situação não se define, uma das questões que chama a atenção das duas companhias é a área de data analytics. O CIO da Boeing Ted Colbert é um evangelista da análise de dados e a Embraer criou uma unidade de negócios dedicada ao pós-venda que trabalha intensamente com analytics _[veja quadro na próxima página]_. Em entrevista, Colbert conta como tem pregado a palavra do analytics na Boeing, fazendo-a mudar sua cultura.

**SAIBA MAIS SOBRE TED COLBERT E A BOEING**

**QUEM É:** chief information officer da Boeing Company e vice-presidente sênior de tecnologia da informação e analytics, à frente de mais de 6,5 mil funcionários nas áreas de estratégia, operações e processos de TI. Vem da área de sistemas e segurança, e está na empresa desde 200.

**TRAJETÓRIA:** atuou na Ford por 11 anos e no Citigroup, onde chegou a vice-presidente sênior de arquitetura de négocios.

**SOBRE A BOEING:** fundada em 1916 por William Boeing em Seattle, fundiu-se com a McDonell Douglas em 1997 e hoje está sediada em Chicago. Seu CEO atual é Dennis Muilenburg.

**A Boeing sempre foi reconhecida por seu poder de fogo na engenharia. Agora ela vai se destacar mais por seu poder de analytics?**

De certa forma, sim. Temos muitos engenheiros, matemáticos, cientistas e estatísticos incríveis. Analytics certamente não é uma área nova para a empresa. Quando comecei a prestar atenção a sua importância cada vez maior, tínhamos cerca de 800 pessoas que podíamos classificar como cientistas de dados, o que era um ótimo começo [hoje são 6,5 mil].

Mas, quando começamos a perguntar [por volta de 2009], quão orientadas por dados eram nossas decisões, se realmente usávamos os dados que tínhamos para melhorar produtividade e habilidades da empresa, descobrimos que havia muito a ser feito. Por exemplo, usávamos ciência dos dados para melhorar decisões de manutenção, mas não para entender como o sistema da Boeing podia funcionar melhor. 

Todos os processos estavam documentados: sabíamos que os mecânicos gastavam um quarto do tempo identificando peças, projetos e ferramentas para começar seu trabalho, por exemplo. Mas não propúnhamos revoluções na fábrica.

**É difícil mudar a mentalidade?**

De início, muitos me disseram que não havia nada de novo no que eu dizia sobre analytics. Só quando você consegue ter pontos de prova em áreas importantes é que as pessoas veem a luz – se estão sob pressão para aumentar margens e notam que seu jeito de fazer isso não resolve mais, aí a mentalidade muda.

Entender que é preciso mudar nem sempre é confortável. Por exemplo, tivemos de integrar 13 sistemas para demonstrar a quantidade de estoque parada em nossa organização. Em uma empresa do nosso tamanho, era de esperar que isso valesse dezenas de milhões de dólares, mas descobrimos que eram centenas de milhões. Algumas pessoas ficaram muito desconfortáveis, e questionaram os dados como primeira reação. 

**A cultura digital de alta performance, própria da empresa movida a dados, é uma cultura ágil. A Boeing consegue ser ágil?**

É fato: o DNA da Boeing gira em torno de um longo ciclo de negócio que põe a segurança em primeiro lugar, enquanto desenvolvimentos digitais são engrenagens minúsculas, movendo-se 100 vezes mais rápido. Meu trabalho é garantir que as menores não quebrem a grande.

Na prática, a área de serviços da Boeing é essencialmente digital, e costuma ser um lugar melhor para aprender do que as áreas comercial e de defesa. Damos a nossos engenheiros a oportunidade de trabalhar em serviços, por exemplo, e isso leva a nova cultura digital adiante.

**A Boeing costuma ter funcionários com 20 ou 30 anos de casa. A cultura de contratação da Boeing mudou em função do analytics?**

O que me faz perder o sono é saber se teremos os talentos corretos. Em um de nossos projetos, eu simplesmente não consegui achar alguém da área de negócios que compreendesse todos os processos do início ao fim bem o suficiente para entregar o resultado e fiquei insone. O importante, portanto, é proporcionar às pessoas que conhecem bem a Boeing que construam novas habilidades. E se eu quiser que trabalhem de outra forma, também tenho de construir credibilidade com elas, provando que há valor em fazer as coisas de outra forma. Eu é que vim de fora, do setor automobilístico e de banco. 

**EMBRAER: PÓS-VENDA COM ANALYTICS**

A fabricante brasileira de aeronaves Embraer também está investindo pesado em big data analytics, o que fica particularmente nítido em sua área de pós-venda. Em entrevista a **HSM Management**, Johann Bordais, presidente e CEO da unidade de serviços e suporte da Embraer [na foto ao lado], contou sobre a adoção do sistema de analytics da Salesforce, que permite à empresa prever, cada vez mais, os esforços de manutenção necessários às aeronaves, reduzindo ao máximo os tempos de manutenção e, principalmente, os possíveis defeitos.

“Hoje estamos ao vivo na operação do cliente e nossa meta é conseguir antecipar em até 30 dias eventuais problemas. Antes tínhamos 80 bancos de dados diferentes e, quando os dados eram extraídos, era preciso compilar e traduzir para o vocabulário executivo para que tivessem alguma utilidade. Agora foi tudo unificado, essa tradução é automática e tudo ficou não só mais eficaz, mas em tempo real, e no celular”, explica Bordais.

Assim, o pós-venda é hoje o grande diferencial das empresas, segundo o executivo, uma vez que os aviões se tornaram praticamente commodities. Os planos para a área de serviços não se limitam aos aviões da empresa; o objetivo é, um dia, atender aviões de outros fabricantes. “Chegar a isso também é uma meta”, diz Bordais.

**MAIS UM PONTO EM COMUM**

Atualmente, apenas três fabricantes do setor dominam essa tecnologia de analytics, segundo o CEO: além da Embraer,  a Airbus e a Boeing. Esse é mais um ponto de contato da brasileira com a Boeing, que desde 2016 vem demonstrando interesse em incorporar a Embraer e aumentar a verticalização de seu negócio, com a produção interna de partes adquiridas de terceiros.  **(Lizandra Magon de Almeida)**

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