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Cinco razões pelas quais colaboradores autistas podem ter dificuldade para falar temporariamente

É psicólogo, especialista em terapia comportamental cognitiva em saúde mental, mestre em psicologia da saúde. Faz parte do grupo de trabalho sobre Direitos Humanos nas Empresas da rede brasileira do Pacto Global da ONU e é diretor geral da Specialisterne no Brasil.

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Imagine um colaborador que normalmente é articulado, prolixo e capaz de se expressar com clareza, de repente lutando para formar uma frase simples. Essa situação pode parecer intrigante ou até alarmante para colegas e gestores, mas, para muitas pessoas autistas, é uma experiência comum e profundamente desafiadora chamada mutismo situacional.

Esse fenômeno não é fruto de desinteresse, grosseria ou desobediência, como muitos podem interpretar equivocadamente. Ele está enraizado na neurodiversidade e nas formas únicas como o cérebro autista processa o mundo ao seu redor. Aqui estão cinco razões que ajudam a compreender por que isso acontece:

Surpresa ou interrupção repentina

Para muitas pessoas autistas, mudanças abruptas no ambiente podem ser percebidas como alarmes internos. Um exemplo típico é ser abordado de surpresa com uma pergunta casual, como “Como foi seu fim de semana?”. Apesar de parecer simples, essa interação pode desencadear uma sobrecarga de processamento.

O cérebro autista apresenta padrões únicos de conectividade que pode influenciar a integração de informações — contexto, tom, linguagem corporal e formulação da resposta. Quando surpreendido, esse sistema pode falhar temporariamente, causando dificuldade em articular palavras.

Hiperfoco interrompido

O estado de hiperfoco, comum em muitas pessoas autistas, é como estar imerso em uma bolha de produtividade e concentração. Uma interrupção nesse estado pode ser extremamente desorientadora, como se fios de pensamento cuidadosamente alinhados fossem cortados de repente.

Quando isso acontece, o colaborador pode parecer inexpressivo ou incapaz de responder verbalmente. Essa reação não é insubordinação, mas uma resposta natural ao impacto cognitivo da mudança abrupta.

Sobrecarga emocional e confusão social

Pessoas autistas muitas vezes lutam para compreender nuances sociais e reações emocionais inesperadas. Uma resposta agressiva ou sarcástica a algo que disseram ou fizeram pode ser um gatilho potente para o mutismo situacional.

A confusão entre intenção e reação — especialmente quando há uma discrepância entre o que o colaborador pretendia e como foi interpretado — pode criar um estado de “congelamento”, dificultando a fala.

Esgotamento sensorial e mental

O cérebro autista processa significativamente mais informações em repouso do que o cérebro neurotípico, o que aumenta a suscetibilidade ao esgotamento. Dias particularmente intensos ou ambientes sensorialmente desafiadores podem levar a uma redução temporária na capacidade de falar.

O mutismo situacional, nesse caso, é um sinal claro de sobrecarga. Assim como um músculo exausto, o sistema cognitivo precisa de tempo para se recuperar.

Ansiedade diante de demandas sociais

Situações de pressão, como reuniões inesperadas ou perguntas reiteradas, podem amplificar a ansiedade e agravar o mutismo situacional. Quanto mais o colaborador sente que está sendo julgado ou pressionado, maior a probabilidade de a fala travar completamente.

Essa ansiedade pode ser exacerbada pelo medo de ser mal compreendido ou pela percepção de que seu silêncio está sendo visto como desrespeito ou descaso.

Mais do que uma questão de acolhimento, adaptar o ambiente para atender às necessidades de colaboradores autistas é um investimento estratégico. Empresas que promovem inclusão e empatia não só retêm talentos valiosos, mas também fortalecem a cultura organizacional como um todo.

Afinal, compreender o silêncio é tão importante quanto valorizar a fala.

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