Nos últimos dois anos, temos vivenciado um cenário de pandemia que nos obrigou a rever todos os nossos conceitos sobre comunicação, cultura organizacional, liderança e gestão de pessoas. Estamos sendo desafiados a mudar processos enraizados, a forma como gerimos e valorizamos a contribuição individual, e principalmente a relação vida pessoal e trabalho.
Como ficarão as interações humanas, o conceito de produtividade e os processos organizacionais pós pandemia no [modelo de trabalho híbrido](https://www.revistahsm.com.br/post/aqui-estao-algumas-ideias-para-gerenciar-um-time-hibrido)?
O termo soft skills nunca esteve tão presente nos fóruns de discussões de executivos de RH e de líderes de negócio sobre gestão de pessoas. O desenvolvimento das competências interpessoais (que não são nada soft) sempre foram um grande desafio na gestão de pessoas, e agora e mais do que nunca, no trabalho remoto.
Historicamente, as organizações tradicionais se constituíram tendo como base o modelo “comando e controle”, estruturas hierárquicas e processos formais de comunicação. Mesmo com todo o investimento feito na capacitação dos líderes, na adoção de novos processos e metodologias de trabalho, ainda encontramos estruturas organizacionais definidas por funções, processos, cargos, papéis e responsabilidades. Este modelo aparentemente “sempre funcionou”, principalmente em um formato de trabalho presencial, quando a medida da produtividade e a entrega de resultados podiam ser vistas: o que foi feito e por quem.
Rompemos com este paradigma ao nos depararmos com o fato de que, para as atividades em que o modelo de trabalho remoto é possível, ele tem se mostrado mais produtivo que o presencial. Esta é a percepção de executivos em várias empresas e também o que demonstram estudos que estão sendo realizados, como o [Work Trend Index](https://www.microsoft.com/en-us/worklab/work-trend-index#:~:text=The%202021%20Work%20Trend%20Index%20provides%20data-driven%20insights,powerful%20insights%20about%20how%20people%20work%20and%20collaborate.), produzido pela Microsoft.
Estes estudos também demonstram um aumento no número de reuniões, e-mails, entregas e crescimento nos resultados, mesmo em empresas que tiveram seus quadros de funcionários impactados pela pandemia, ao mesmo tempo em que a construção da conexão entre pessoas de diferentes áreas, o sentimento de pertencimento de fazer parte de algo maior, aparentemente tem se enfraquecido, conforme ilustra a imagem a seguir.
![imagemartigoONA](//images.ctfassets.net/ucp6tw9r5u7d/47C5BDkTpDHre3Ds7wbdLP/5110cbe9ba22550b345fcaa2976b2fc3/imagemartigoONA.jpg)
Uma de nossas maiores inquietações neste contexto foi encontrar novas abordagens e ferramentas que auxiliassem a entender melhor estes efeitos do modelo de trabalho remoto e que nos trouxessem insights para atuar neste novo contexto, respondendo algumas questões: como manter o nível de engajamento e entrega, sem perder as conexões (empatia), a colaboração e a identidade da [cultura organizacional](https://www.revistahsm.com.br/post/como-preservar-a-cultura-organizacional-trabalhando-com-times-hibridos)? Como construir novos modelos de comunicação, que promovam maior interação? Como medir produtividade? Como cuidar do equilíbrio entre vida e trabalho? Com essas inquietações, decidimos testar algo novo.
## Explorando as redes de relacionamentos informais de uma organização
A análise das redes sociais não é um tema exatamente novo… As primeiras teorias e conceitos surgiram em 1736 com a Teoria dos Grafos, evoluindo ao longo do tempo em um vasto campo de estudo: teoria dos laços, teoria dos seis graus de separação, estudo do 1–9–90, número de Dunbar, tipologia das redes sociais e famílias, e outros estudos.
A grande novidade neste tema está relacionada ao uso de novas plataformas e tecnologias, principalmente ao uso das mídias sociais virtuais e algoritmos, que possibilitam visualizar, coletar, medir e analisar uma quantidade muito maior de informações sobre o comportamento nas redes em diversas dimensões, inclusive no ambiente organizacional.
As organizações que conhecemos estão definidas e descritas em estruturas e organogramas, porém mesmo estruturas matriciais e mais horizontais, não conseguem muitas vezes garantir uma maior colaboração entre áreas e funções. Existe uma dimensão que, em geral, não conhecemos e não gerimos, e que também afetam as interações e o desempenho de uma organização: as redes informais.
![imagemartigoONA2 colaboração](//images.ctfassets.net/ucp6tw9r5u7d/2fjaPNZvZ0O1qo5S1OChtO/037b56d2402c5056995f79ba5e318663/imagemartigoONA2.jpg)
Na figura, temos um exemplo de rede de colaboração em comparação ao organograma.
Os líderes informais têm enorme importância nos processos de transformação de uma organização. Pesquisas indicam que 3% dos líderes informais podem influenciar 85% dos colaboradores (e podem tanto facilitar quanto dificultar processos organizacionais e de mudança). Agora imagine esse poder a favor das transformações positivas de uma empresa?
Para entendermos como acontece esta colaboração em rede, no novo formato híbrido, utilizamos uma metodologia de people analytics conhecida como ONA — Organizational Network Analysis (análise da rede organizacional, em tradução literal), que permite mapear a rede de relacionamentos e interações na organização.
No piloto que realizamos no segundo semestre de 2021 na Travelex Confidence, abordamos colaboradores da organização incluindo todas as áreas de suporte e uma amostra das áreas comerciais. O mapeamento foi feito utilizando duas abordagens de análise de redes — ONA Passivo e Ativo. E aqui, é importante pontuar que, no Brasil, a Travelex, empresa especialista em câmbio, conta com aproximadamente 800 funcionários, em sua maioria estabelecidos na Região Sudeste, mas como estamos presentes em todo o País, nossa equipe é bastante diversa e espalhada pelo território nacional.
Na abordagem ONA Passivo, utilizamos uma plataforma integrada às ferramentas do Office 365, que identificou o conjunto de metadados sobre as interações e a comunicação dos colaboradores nos canais e sistemas formais de colaboração da empresa: o Teams e o Outlook. Isso permitiu identificar de forma objetiva volume de e-mails e reuniões, fornecendo hipóteses sobre dimensionamento e produtividade das equipes e possíveis alertas de sobrecarga de trabalho e risco de [burnout](https://mitsloanreview.com.br/post/revisitando-o-burnout-a-luz-da-covid-19).
A análise das redes organizacionais possibilita elevar o trabalho das equipes e entre diferentes times e áreas de organização a novos patamares de inovação e performance. Conhecer as redes de colaboração significa identificar possíveis silos, gargalos e pessoas que estão isoladas na organização, bem como identificar influenciadores naturais e líderes informais que criam pontes e conectam as áreas.
Para a análise ativa da rede — ONA Ativo —, realizamos uma pesquisa com 400 colaboradores voluntários, em que buscamos entender como as pessoas percebem as interações com seus colegas através de quatro perguntas, sendo que quanto mais um colaborador é mencionado nas quatro dimensões, maior é o seu nível de influência — centralidade na rede. As quatro perguntas são:
1. Quem compartilha regularmente com você as informações de que você precisa para fazer seu trabalho?
2. Quem você procura quando precisa de suporte técnico / especializado relacionado ao trabalho que requer conhecimento especializado?
3. A quem você recorre quando precisa de suporte pessoal em uma situação difícil relacionada ao trabalho?
4. Quem você considera um modelo e te inspira dentro da organização?
O resultado obtido foi um mapa claro da colaboração, com clareza do grau de influência de cada participante na rede e a conexão entre as áreas, cuja representação gráfica segue abaixo.
![imagemartigoONA3 colaboração](//images.ctfassets.net/ucp6tw9r5u7d/7d1bjAQDG259roW406ZyjO/82285d939450b16741d3aa8a338dd109/imagemartigoONA3.jpg)
*Mapeamento de rede de colaboração – fonte Mapa de Talentos / Cognitive Talent Solutions*
## Colaboração e influência como balizadores na gestão de pessoas
Descobrimos que, apesar do distanciamento físico, não tínhamos muitas pessoas isoladas e que nossa rede de colaboração era bastante coesa.
A pesquisa nos auxiliou a identificar: quais áreas trabalham de forma mais próxima; pessoas que atuam como elos entre vários departamentos e áreas; pessoas que são referências técnicas; e também pessoas que exercem um papel importante na organização — gestores, especialistas e talentos — e que estão isolados (periféricos na rede).
Este conhecimento nos fez refletir sobre algumas questões como: estas pessoas são novas ou antigas na organização? Qual o nível de engajamento dessas pessoas? Qual o risco de perdemos estes talentos? E, por fim, como podemos aprofundar nosso conhecimento sobre o contexto de cada indivíduo, para auxiliar em seu processo de inserção, para que possam se sentir parte e contribuir com o todo?
O (bom) uso destas informações tem como objetivo melhorar a colaboração, dar mais reconhecimento às pessoas na rede, reduzir a sobrecarga de trabalho, e nos ajudar a tomar decisões em algumas iniciativas como:
– Identificar e indicar líderes informais que antes não estavam em nosso radar para programas de liderança.
– Identificar e reconhecer “treinadores” e “engajadores” internos.
– Revisar a formação de equipes multidisciplinares em projetos de transformação ou mudança.
– Apoiar a escolha de mentores em programas de mentoria.
– Contribuir com a estratégia do negócio na tomada de decisões e modelagem de processos, estruturas, automatizações ou ampliação de headcount.
Acreditamos que a análise das redes organizacionais é mais uma ferramenta que contribuirá com o avanço do people analytics, atendendo as mais diversas demandas organizacionais, desde revisão de processos objetivos até questões mais subjetivas da cultura organizacional como o entendimento mais profundo de ‘role models’ de comportamentos e valores.
Projetos como este permitem utilizar a tecnologia de dados para potencializar a construção de [relações de confiança](https://mitsloanreview.com.br/ebooks/o-impacto-da-confianca-na-lideranca) e a colaboração entre as pessoas e as áreas, multiplicando a capacidade de inovação e entrega do capital humano existente na organização.
*Gostou do artigo da Paula Gianetti e do Miguel Nisembaum? Saiba mais sobre gestão de times híbridos no e-dossiê __[Gestão de Times Híbridos](https://www.revistahsm.com.br/dossie/gestao-de-times-hibridos)__ e na comunidade __[HR for Tomorrow](https://www.revistahsm.com.br/comunidade/hr4t-hr-for-tomorrow)__.*