Cultura organizacional

Como a cultura corporativa é criada?

As palavras movem, mas os exemplos arrastam
Luciano possui +20 anos de experiência no mercado digital tendo iniciado sua carreira no portal UOL, trabalhou 10 anos no Google Brasil em diversas áreas e foi diretor no Facebook Brasil a frente de uma equipe de vendas em São Paulo. É escritor e autor do livro "Seja Egoísta com sua Carreira", embaixador da Escola Conquer e faz parte do conselho consultivo da Agile.Inc.

Compartilhar:

Muito se fala sobre cultura corporativa. Ela acontece quando a maioria das pessoas de uma determinada empresa segue um conjunto de regras e comportamentos de forma quase que intuitiva e automática.

Para ilustrar, vou usar um exemplo de uma empresa que trabalhei por muito tempo e posso falar bem: o Google. Lá existe uma cultura da informação aberta e comunicação fluída, onde quase tudo é discutido e a hierarquia é interpretada de maneira diferente. Para garantir que isso aconteça, há uma série de estruturas montadas e dinâmicas que acontecem de forma natural.

Há, por exemplo, uma reunião semanal chamada “All hands” (algo como “Para todos”) onde os próprios fundadores ou os líderes seniores apresentam os principais acontecimentos da empresa e respondem perguntas dos funcionários. Todo o tipo de pergunta que você pode imaginar é feita por ali, desde detalhes sobre a estratégia da empresa até coisas mais mundanas como o motivo de um dos fundadores sempre vestir uma mesma cor de camiseta. Eu já vi até estagiário questionar o VP sobre os planos de diversidade da empresa e sugerir caminhos melhores. Essa reunião é global, mas ela é emulada localmente onde a mesma dinâmica acontece com questões específicas da região. 

Além disso, os executivos são acessíveis a qualquer um. Você não precisa de autorização do seu gerente para mandar um e-mail para o diretor ou fazer uma pergunta em uma reunião. Existe a crença, que é amplamente praticada, de que acesso faz as coisas circularem melhor, mais rapidamente e sem que um intermediário precise fazer a interpretação. Quando o assunto é seu gerente direto, é regra ter reuniões semanais não só para checar o andamento do trabalho, mas também aspectos pessoais e garantir que haja uma boa conexão entre os dois.

Ampla comunicação e acesso em todos os níveis para que ela aconteça faz com que todo o sistema trabalhe de maneira muito mais eficiente. Esses são apenas alguns exemplos de características da cultura de lá que, para muitos que estão lendo e muitas empresas que conheço, podem parecer inacreditáveis, alienígenas ou até utópicas. 

E eu já vi de tudo nesse mundão – regulamento interno que proibia enviar e-mail ou comunicações escritas para cargos dois níveis acima do seu, vi gerentes que só tinham reuniões individuais com seus times a cada três meses (sempre me pergunto como é possível não ter contato com seu líder por tanto tempo) e “liderança” que só falava com a massa uma vez por ano e sem qualquer possibilidade de permitir que as pessoas perguntem ou questionem o que está sendo apresentado. O que chega até elas é apenas a palavra final.

## Mas afinal, quem cria a cultura da empresa?
Eu gosto de pensar que ter uma boa cultura dentro da empresa é responsabilidade de todos, mas o peso maior recai sobre a liderança. Eu lembro de uma história que o Max Gehringer contou que mostra bem isso: uma empresa queria implementar o uso de crachá por todos os seus funcionários. Criaram crachás lindos e campanhas internas criativas para conscientizar sobre o uso, mas não funcionou. Ninguém usava o tal do crachá. Um dia, alguém teve a ideia de reunir a alta liderança e combinar que eles, a partir daquele dia, iriam usar o crachá diariamente. O resto da empresa, vendo todos os líderes usando o crachá, começaram também a utilizar. O uso passou a ser visto como um símbolo de status.

Uma história simples para mostrar algo muito importante: o líder é exemplo para seu time, a liderança para toda a empresa. Quando o assunto é cultura corporativa, é por lá que tudo tem que começar.

O caso que usamos no Google segue essa mesma linha. Para atingirem tanta maturidade na maneira como se comunicam e se relacionam, foi preciso muito exemplo, esforço e experimentos dos fundadores e seu time de liderança. Levou anos para chegarem onde chegaram e é preciso sempre estar vigilante para manter o que foi conquistado.

Pegando um dos exemplos que usamos acima, imagine uma empresa onde a comunicação é deficiente ou inexistente. Para mudar isso, é preciso um grande comprometimento da liderança sênior. Não só comprometimento, mas dar o exemplo constantemente.

Como colocou de maneira brilhante o Max, tem que usar o crachá.

Compartilhar:

Luciano possui +20 anos de experiência no mercado digital tendo iniciado sua carreira no portal UOL, trabalhou 10 anos no Google Brasil em diversas áreas e foi diretor no Facebook Brasil a frente de uma equipe de vendas em São Paulo. É escritor e autor do livro "Seja Egoísta com sua Carreira", embaixador da Escola Conquer e faz parte do conselho consultivo da Agile.Inc.

Artigos relacionados

Organização

A difícil arte de premiar sem capitular

Desde Alfred Nobel, o ato de reconhecer os feitos dos seres humanos não é uma tarefa trivial, mas quando bem-feita costuma resultar em ganho reputacional para que premia e para quem é premiado

ESG
No mundo corporativo, onde a transparência é imperativa, a Washingmania expõe a desconexão entre discurso e prática. Ser autêntico não é mais uma opção, mas uma necessidade estratégica para líderes que desejam prosperar e construir confiança real.

Marcelo Murilo

8 min de leitura
Empreendedorismo
Em um mundo onde as empresas têm mais ferramentas do que nunca para inovar, por que parecem tão frágeis diante da mudança? A resposta pode estar na desconexão entre estratégia, gestão, cultura e inovação — um erro que custa bilhões e mina a capacidade crítica das organizações

Átila Persici

0 min de leitura
Tecnologias exponenciais
A ascensão da DeepSeek desafia a supremacia dos modelos ocidentais de inteligência artificial, mas seu avanço não representa um triunfo da democratização tecnológica. Embora promova acessibilidade, a IA chinesa segue alinhada aos interesses estratégicos do governo de Pequim, ampliando o debate sobre viés e controle da informação. No cenário global, a disputa entre gigantes como OpenAI, Google e agora a DeepSeek não se trata de ética ou inclusão, mas sim de hegemonia tecnológica. Sem uma governança global eficaz, a IA continuará sendo um instrumento de poder nas mãos de poucos.

Carine Roos

5 min de leitura
Tecnologias exponenciais
A revolução da Inteligência Artificial está remodelando o mercado de trabalho, impulsionando a necessidade de upskilling e reskilling como estratégias essenciais para a competitividade profissional. Empresas como a SAP já investem pesadamente na requalificação de talentos, enquanto pesquisas indicam que a maioria dos trabalhadores enxerga a IA como uma aliada, não uma ameaça.

Daniel Campos Neto

6 min de leitura
Marketing
Empresas que compreendem essa transformação colhem benefícios significativos, pois os consumidores valorizam tanto a experiência quanto os produtos e serviços oferecidos. A Inteligência Artificial (IA) e a automação desempenham um papel fundamental nesse processo, permitindo a resolução ágil de demandas repetitivas por meio de chatbots e assistentes virtuais, enquanto profissionais se concentram em interações mais complexas e empáticas.

Gustavo Nascimento

4 min de leitura
Empreendedorismo
Pela primeira vez, o LinkedIn ultrapassa o Google e já é o segundo principal canal das empresas brasileiras. E o seu negócio, está pronto para essa nova era da comunicação?

Bruna Lopes de Barros

5 min de leitura
ESG
O etarismo continua sendo um desafio silencioso no ambiente corporativo, afetando tanto profissionais experientes quanto jovens talentos. Mais do que uma questão de idade, essa barreira limita a inovação e prejudica a cultura organizacional. Pesquisas indicam que equipes intergeracionais são mais criativas e produtivas, tornando essencial que empresas invistam na diversidade etária como um ativo estratégico.

Cleide Cavalcante

4 min de leitura
Empreendedorismo
A automação e a inteligência artificial aumentam a eficiência e reduzem a sobrecarga, permitindo que advogados se concentrem em estratégias e no atendimento personalizado. No entanto, competências humanas como julgamento crítico, empatia e ética seguem insubstituíveis.

Cesar Orlando

5 min de leitura
ESG
Em um mundo onde múltiplas gerações coexistem no mercado, a chave para a inovação está na troca entre experiência e renovação. O desafio não é apenas entender as diferenças, mas transformá-las em oportunidades. Ao acolher novas perspectivas e desaprender o que for necessário, criamos ambientes mais criativos, resilientes e preparados para o futuro. Afinal, o sucesso não pertence a uma única geração, mas à soma de todas elas.

Alain S. Levi

6 min de leitura
Carreira
O medo pode paralisar e limitar, mas também pode ser um convite para a ação. No mundo do trabalho, ele se manifesta na insegurança profissional, no receio do fracasso e na resistência à mudança. A liderança tem papel fundamental nesse cenário, influenciando diretamente a motivação e o bem-estar dos profissionais. Encarar os desafios com autoconhecimento, preparação e movimento é a chave para transformar o medo em crescimento. Afinal, viver de verdade é aceitar riscos, aprender com os erros e seguir em frente, com confiança e propósito.

Viviane Ribeiro Gago

4 min de leitura