Quando compartilho minha experiência como diretora de gente e sustentabilidade da Lojas Renner ao longo dos últimos 29 anos, muitas pessoas se admiram, ainda hoje, do fato de uma profissional de recursos humanos ter incorporado também temas da pauta ESG em suas atribuições. Estou falando de 2008, época da criação do Instituto Lojas Renner, quando a importância dessa agenda não estava tão em evidência nas organizações, mas já se falava bastante sobre responsabilidade social.
Naquele momento, percebemos que as equipes de diversas lojas começaram a se mobilizar espontânea e regularmente para arrecadar doações de roupas para as comunidades e entidades de sua região. Em geral, recorriam à área de recursos humanos para saber sobre como proceder com aquelas doações e os gerentes, naturalmente, desejavam compartilhar aquele entusiasmo de seus times conosco.
Por conta dessas iniciativas, entendemos que havia um desejo genuíno e latente na empresa de ajudar, de colaborar, porém os esforços eram dispersos. Em paralelo às doações, atuávamos também como mantenedores do Projeto Pescar, um programa pioneiro de formação sócio-profissionalizante para jovens. Começamos, então, a pensar sobre como organizar todas as ações em andamento para que gerassem, de fato, o maior impacto social.
## Mapeamento de ações e demandas
O primeiro passo foi mapear o que as lojas já faziam isoladamente. Ficamos surpresos em descobrir tantas atividades interessantes que não eram documentadas de forma padronizada. Analisamos todas as iniciativas com as lentes da cultura de encantamento da empresa, e levamos em conta o público-alvo preferencial de Lojas Renner: as mulheres.
Com base em todo esse conjunto de informações, levantado a partir de um comportamento detectado nas lojas, a área de recursos humanos apresentou para a diretoria o projeto de criação do Instituto Lojas Renner. Ele nascia, nesse contexto, com o propósito claro de apoiar ações sociais empreendedoras, desenvolvidas por organizações da sociedade civil, que contribuíssem de forma eficaz para a qualificação e inclusão da mulher, bem como para o desenvolvimento das comunidades próximas à empresa. Vale dizer que, nessa época, a Lojas Renner atuava há três anos como uma organização de capital aberto e, portanto, o “G” da governança já estava ancorado.
O “S” do social surgia, dessa forma, como uma demanda interna, sem a pressão do mercado ou de investidores. A iniciativa de criar uma agenda social alinhada ao negócio e ao público da empresa poderia ter sido uma iniciativa da área de marketing, de operações ou ainda de relacionamento com investidores? Poderia. Nesse caso, no entanto, o RH quebrou o paradigma de ser apenas uma área de apoio a outros segmentos da organização, para estruturar, de fato, esta agenda, e ajudar a empresa a adotar uma nova postura, dar um passo importante e estratégico no mercado.
## Ímpeto ESG
Com a criação do Instituto Lojas Renner, novos projetos foram agregados e ajudaram a ampliar o impacto social da empresa, por meio de iniciativas que estimulam a geração de renda, o empreendedorismo e a formação profissional de mulheres. Importante frisar que, ao mesmo tempo em que definimos as prioridades de alcance externo por meio do instituto, contemplamos também nossos stakeholders internos, promovendo, por exemplo, o censo da empresa, para conhecer e atuar sobre a diversidade no time de colaboradores, assim como o desenvolvimento e a formalização de boas práticas com nossos fornecedores.
Implementamos ainda uma política de direitos humanos e mantivemos, com regularidade, a pesquisa de satisfação de colaboradores, para entender nossas vulnerabilidades e tomar as melhores decisões em relação à equipe no menor tempo possível. O “S”, semeado pela área de recursos humanos, rendeu vários frutos ao longo do tempo.
Em 2013, o “E” do ambiente (environment, em inglês) foi contemplado também. Nessa ocasião, começamos a fazer a logística reversa dos frascos de perfume e embalagens de maquiagem, um projeto bem amplo, que envolveu toda a cadeia e incluiu a educação e a adequação dos fornecedores ao processo.
## Mobilização e engajamento constantes
Em 2016, o Instituto Lojas Renner atualizou sua missão, que foi orientada para o empoderamento econômico e social de mulheres na cadeia têxtil, e desdobrada em quatro frentes alinhadas ao negócio: matéria-prima, produção, varejo e pós-consumo. Dada a dimensão e ramificação de todas essas iniciativas, fica claro que a área de recursos humanos não fez tudo sozinha e, tampouco, avançou sobre as atividades de outras áreas. Coube ao RH identificar um comportamento latente na empresa e mobilizá-lo em uma direção interessante para todos.
No decorrer de todo esse processo, contamos, conforme o projeto, com patrocinadores de diferentes áreas: compras, logística, operações etc. Da mesma forma, apoiamos os projetos de outros setores da empresa sempre que envolviam questões comportamentais, novos olhares e atitudes. Mais do que abordar as atribuições de cada área em projetos transformadores, o ponto central, aqui, é mostrar que a gestão de pessoas também pode ser uma área estratégica, inovadora, disruptiva e assumir o protagonismo e a mobilização de ações de maior impacto.
Um RH estratégico sabe ler a organização, as tendências, o mercado. Um RH estratégico se prepara para conversar com a alta gestão, para engajar seus pares, para defender projetos e iniciativas que, em última instância, irão contribuir para o desenvolvimento das pessoas e, consequentemente, do negócio e da sociedade.