Estávamos chegando ao final de um dia cheio de vivências e discussões. O grupo era formado por 20 lideranças de uma mesma organização, reunidas com a intenção de aprender a construir relações de confiança em suas diferentes equipes. No papel de facilitador, abri espaço para quem quisesse falar.
Depois de alguns depoimentos, uma participante (vou chamá-la de Carmen) pediu a palavra e, em um tom emocionado, se disse comovida pelo que fizemos juntos. Disse que, a certa altura, sentiu-se completamente à vontade para se expressar.
“Naquele momento, senti que eu podia fazer o que quisesse, foi uma libertação. Acho que nunca me senti tão livre junto a outras pessoas da empresa.” Algumas pessoas sorriam, ouvindo seu depoimento.
Agradeci e disse que esse era mesmo o propósito do dia: propiciar a experiência concreta de habitar um ambiente seguro. E afirmei que, para mim, relações de confiança significam exatamente aquilo que ela tinha relatado: sentir-se à vontade para contribuir e não se omitir por medo do julgamento dos outros.
Seguiram-se mais alguns depoimentos, e uma outra pessoa (vou chamá-lo de Luiz) pediu a palavra. Começou dizendo que não entendeu para que serviam aquelas atividades que havíamos feito e concluiu afirmando que, para ele, tudo aquilo foi um desperdício de tempo. Vi algumas cabeças se movendo, em concordância. Pelo jeito, outros compartilhavam sua opinião.
Vejo essa dinâmica acontecer com muita frequência em grupos. E enxergo nela mais do que uma simples divergência de opinião. Ao chamar a experiência de “desperdício de tempo”, Luiz simplesmente negou o relato de Carmen, cujo conteúdo não era nada banal: ela havia acabado de se dizer tocada profundamente, como nunca antes, junto àquelas pessoas com quem convive todos os dias.
Centrado em sua própria percepção, Luiz perdeu Carmen de vista. E ignorou o possível valor que aquele espírito de abertura, relatado por ela, poderia trazer para o grupo e para os resultados. Afinal, nosso propósito ali era aprender a construir relações de confiança.
Luiz tomou sua experiência como a única verdade. E com isso desligou sua curiosidade para a experiência alheia, traço fundamental para aprender e construir valor em um ambiente de negócios em permanente transformação.
Os problemas e desafios que o presente e o futuro nos reservam raramente terão soluções cabais, daquelas que eliminam todas as outras hipóteses. A zona cinzenta, cheia de incertezas e ambiguidades, só faz aumentar.
A cada encruzilhada, será bom desviar nossos olhos e ouvidos do próprio umbigo, da própria mente, da própria opinião, para direcioná-los ao outro, a fim de capturar o valor que eu não enxergo. E os perigos que eu não vejo. Em relação a muitos de seus pares naquela sala, Luiz tinha uma desvantagem competitiva.
Coluna publicada na HSM Management nº 154