O mais novo livro de Raj Sisodia, cofundador do capitalismo consciente no mundo, chamado The Healing Organization, nos lembra – já no resumo editorial do próprio autor – que estamos vivendo um ponto de inflexão, no qual negócios precisam assumir a responsabilidade de curar as crises do nosso tempo. Todos os negócios precisam se transformar em negócios de impacto socioambiental positivo. Somente as políticas públicas e/ou a sociedade civil organizada não conseguirão sozinhas acelerar as boas transformações de que o mundo precisa.
Saímos dos tempos de missão, visão e valores em quadrinhos na parede para a era do propósito ou, como nos apresentou Salim Ismail em 2014 com Organizações exponenciais, do propósito transformador massivo (PTM), no caso de negócios escaláveis por suas tecnologias. Missões vêm dando lugar a propósitos absolutamente claros e simples carregados de intenção de transformação para o mundo. Para a Tesla, por exemplo, acelerar a transição para o transporte sustentável é a cura que ela quer para o mundo; o Sicoob, por sua vez, declarou por um tempo ser seu propósito a promoção da justiça financeira no Brasil.
Tirar a extensa e confusa missão da parede fria e dar vida a ela por meio de um propósito simples e claro de curar algum desafio do mundo já tem sido um importante passo de muitas empresas brasileiras. O despertar do propósito e a sustentação dele por meio de uma cultura repleta de artefatos é chave para gerar engajamento de colaboradores e consumidores, mas talvez o novo desafio que se apresenta seja o da coerência. É absolutamente desmotivador testemunhar um propósito nascer e não vê-lo traduzido na prática na cultura ou até mesmo nos produtos e nos serviços que deveriam entregar essa cura prometida ao mundo.
Uma organização precisa ser fractal do mundo que ela quer empreender e sua entrega de valor precisa ser a tangibilização de seu propósito. Healing leaders guiam o processo de despertar do propósito, bem como a sua sustentação por meio da cultura, dos produtos e dos serviços de uma organização. É muito mais do que moda ou tendência, já que a lista de razões e impactos para empresas guiadas por propósito é bastante extensa:
**Atração e retenção de talentos.** São dezenas de pesquisas de diversos institutos e organismos globais assegurando o crescimento da sensibilidade da geração Z à ética, ao impacto socioambiental e ao propósito quando se fala de consumo e emprego. Pagar bem é importante (e diminui desigualdades), mas não está no topo da lista para as novas gerações de talentos. O relatório da EY, The Millennial Economy, mostra que 77% da geração millennial, que representa metade da força de trabalho do planeta, é movida por um propósito maior do que o retorno financeiro. Isto é, incorporar o propósito no ambiente de trabalho e no modelo de negócio passa a ser vital para a liderança.
**Engajamento e performance.** Sustentar o propósito pela cultura e desenvolver produtos e serviços como manifestação prática disso permitem aos colaboradores conectar o “o quê” com o “por quê”, alinhando os propósitos individuais com os organizacionais. A relação de engajamento e performance nas organizações é objeto de diversos estudos. Um relatório da Harvard Business Review, The Impact of Employee Engagement on Performance, aponta que elevar engajamento significa dar os instrumentos adequados aos colaboradores para construírem carreiras de sucesso e, por consequência, aumentarem a performance das organizações.
**Retorno financeiro e crescimento.** O recente estudo Empresas Humanizadas do Brasil, liderado pelo doutorando da USP Pedro Paro, que reedita o clássico Firms of Endearment de Raj Sisodia, confirmou os resultados conhecidos: em períodos longos – 4 a 16 anos de análise – as empresas humanizadas chegam a ter rentabilidade duas ou mais vezes superior à média das 500 maiores empresas brasileiras.
**Atração de capital alinhado.** É crescente o volume de capital que combina retorno financeiro com impacto positivo. O segmento Ambiental, Social e Governança (ASG) no mercado de capitais já atinge o montante de US$ 24 trilhões, de acordo com o JP Morgan. Para isso, as lideranças precisam atuar no DNA dos negócios e, assim, combinar o discurso com práticas e implementar métricas, medindo e reportando seu impacto positivo.
É importante que a liderança engaje seus stakeholders em torno de um propósito claro e definido, criando um senso de urgência em torno de uma oportunidade única de transformação a partir do impacto positivo gerado pelo negócio. Ao combinar o propósito em um modelo de negócio de impacto com consistência, coerência e integridade, a liderança tende a colher resultados objetivos em curto e longo prazo, ampliando performance e impacto positivo de seu empreendimento.