“O empreendedorismo virou a sustentabilidade da vez.” A frase, quase irônica, parece decretar a banalização do movimento empreendedor no Brasil e anunciar um possível retrocesso no futuro próximo. Mas será que é isso mesmo que está acontecendo? Há diversos motivos para comemorar a revolução empreendedora no País, a começar pelos culturais: nos últimos 15 anos, nunca tanta gente se declarou disposta a empreender no Brasil. Apenas para ilustrar o momento, a última edição da Campus Party, maior evento de cultura digital do País, deu enorme destaque para seu espaço dedicado a empreendedores e startups. E a onda parece não refluir: pesquisa recente da Endeavor mostra que quase 60% dos universitários brasileiros têm interesse em se aventurar a ter um negócio nos próximos cinco anos.
Mais do que isso, estamos presenciando no Brasil um fluxo cada vez mais consistente de pessoas querendo ter um negócio pelos motivos certos –paixão pessoal, desejo de autonomia, identificação de oportunidades de negócio reais.
Segundo o Global Entrepreneurship Monitor (GEM) 2014, a taxa de empreendedores por oportunidade é de 70%, um recorde histórico. Em 12 anos, a motivação do brasileiro para empreender deixou de ser a necessidade –55% dos brasileiros que tentavam a sorte com um negócio em 2002 o faziam por falta completa de oportunidades de trabalho, em comparação a 29% em 2014. A proporção entre empreendedores por oportunidade e por necessidade é hoje de 2,5 para 1. Se os indicadores são tão positivos, onde está o risco de nosso empreendedorismo perder fôlego? A resposta pode estar na performance dos empreendedores.
Apenas 11% dos empreendedores brasileiros pretendem criar mais do que cinco empregos em cinco anos, diante de quase 40% dos norte-americanos, conforme o GEM 2014. Se o assunto for inovação, apenas 22% dos brasileiros focam colocar um produto novo no mercado, em comparação a 60% dos chineses. E, se a conversa for sobre pensar globalmente, aí levamos goleada: somente 0,6% de nossos empreendedores pensa em se internacionalizar, número seis vezes menor do que na China e 23 vezes menor do que nos EUA. Ainda estamos surfando a onda, mas aqui e ali já é possível ouvir perguntas sobre a dificuldade do Brasil de criar as próximas grandes empresas globais.
Os jovens da Campus Party precisam de um pouco mais que um empurrãozinho: precisam de outros empreendedores, já de sucesso, que sejam seus mentores e investidores, criando um ciclo virtuoso de novos negócios. E precisam também de um ambiente de negócios menos hostil do que sugere nossa 120a posição no Doing Business, do Banco Mundial. Empreender no Brasil não tem de ser coisa de super-herói.