Carreira

Entre “sou uma fraude” e “sou o melhor!”

Dentro das organizações, a síndrome do impostor e o efeito Dunning-Kruger são comuns entre milhares de profissionais; para fugir desses dois polos ao longo da sua carreira, recomendo: não seja o seu próprio juiz
Luciano possui +20 anos de experiência no mercado digital tendo iniciado sua carreira no portal UOL, trabalhou 10 anos no Google Brasil em diversas áreas e foi diretor no Facebook Brasil a frente de uma equipe de vendas em São Paulo. É escritor e autor do livro "Seja Egoísta com sua Carreira", embaixador da Escola Conquer e faz parte do conselho consultivo da Agile.Inc.

Compartilhar:

Existem dois comportamentos muito comuns de encontrar no mundo corporativo, não importa em qual local ou indústria você esteja: a síndrome do impostor e o efeito Dunning-Kruger. Antes de falarmos um pouco mais sobre essas duas “coisas”, vamos dar uma olhada no que a definição do Wikipédia nos traz:

__Síndrome do impostor:__ “é um padrão psicológico no qual um indivíduo duvida de suas habilidades, talentos ou realizações e tem um medo persistente internalizado de ser exposto como uma ‘fraude’. Apesar das evidências externas de sua competência, as pessoas que vivenciam esse fenômeno continuam convencidos de que são fraudes e não merecem tudo o que conquistaram”

__Efeito Dunning-Kruger:__ é um fenômeno que leva indivíduos que possuem pouco conhecimento sobre um assunto a acreditarem saber mais que outros mais bem preparados, fazendo com que tomem decisões erradas e cheguem a resultados indevidos; é a sua incompetência que restringe sua capacidade de reconhecer os próprios erros. Essas pessoas sofrem de superioridade ilusória.

## “Eu sou uma fraude…”

Eu já vivi a síndrome do impostor na pele por muitas vezes, principalmente no começo da minha carreira. Acho que o ponto alto foi quando entrei no Google em 2005 e me deparei com um time absolutamente fera de pessoas com todo o tipo de experiência e formação que se possa imaginar.

Nos primeiros meses, eu tinha certeza de que eles haviam cometido um erro enorme ao me contratar e que em breve eu seria descoberto ou desmascarado. Pensei até mesmo em deixar a empresa por esse motivo, e nada do que eu fazia parecia ser bom o suficiente. Por sorte tive muita resiliência e bons líderes ao meu redor para mostrar que eu merecia, sim, estar ali e que era tão bom – e em algumas coisas até melhor – do que os meus colegas de trabalho.

Se reconheceu na minha história? Há grandes chances de que você passou ou passa por algo muito parecido. Se a resposta é sim, agora você já pode dar um nome a esse sentimento tão comum e que vai pegar a maioria dos profissionais, não importa o quão maduro e sênior eles sejam. Há diversos estudos e pesquisas sobre a síndrome, e algumas apontam que ela pode atingir até 80% das pessoas em determinados grupos.

## “Eu sou o melhor!”

Do outro lado, temos o sabe-tudo. Não saberia dizer se já sofri (ou sofro) de Dunning-Kruger ou não, já que os indivíduos acometidos por esse fenômeno não percebem ou não reconhecem sua própria ignorância em determinados assuntos. Contudo, já vi esse comportamento várias vezes na minha trajetória profissional.

Lembro claramente de um caso que testemunhei bem no começo da minha carreira quando trabalhei como auxiliar administrativo. O meu chefe na época tinha redigido um comunicado com um erro claro de português. Um colega de trabalho, redator, apontou o erro e mesmo assim o chefe não admitia. Disse que não estava errado, era um modo “alternativo” e que ele já escrevia quando o redator ainda usava fraldas. Mesmo o meu colega tendo a formação e experiência bem superiores ao chefe quando o assunto era escrever, ele insistia que sabia mais do que ele.

Tenho certeza de que você já deve ter topado com algum colega de trabalho, chefe, cliente ou qualquer outro personagem do mundo corporativo parecido com o meu ex-chefe. Eles estão na vida e, como não poderia deixar de ser, no trabalho.

## Como escapar dessas armadilhas?

Nas minhas sessões de mentoria, nunca encontrei uma pessoa que claramente estivesse sofrendo de Dunning-Kruger. Provavelmente, os que são acometidos pelo fenômeno se acham muito superiores para encarar e, mais ainda, para pagar por uma sessão de mentoria. Contudo, já vi muita, mas muita gente com síndrome do impostor.

São relatos de um profundo sentimento de fraude, de que nada do que fazem parece ficar bom e que não se sentem à altura dos lugares que ocupam. Trabalhei com uma mentorada que vivia isso ao extremo, mesmo com diversas evidências que apontavam o contrário. Ela se sentia inferior a todos os seus colegas de time e tinha certeza de que não entregava o que era esperado, mesmo com a sua avaliação formal acima das expectativas por todo o ano corrido e uma promoção no meio. Qual foi então o meu conselho para ela e todos os outros? Não seja o seu próprio juiz.

Acha que não está entregando o suficiente? Pergunte para a sua líder, que é a responsável por lhe avaliar, se isso é verdade. Sente que não deveria estar ali? Reflita se isso está em linha com suas avaliações e, novamente, converse com sua líder a respeito. Não se sente confortável em falar isso com sua líder? Tente achar algum colega – de preferência mais sênior – e peça uma avaliação do que tem feito e da percepção que tem de você.

Se falar com alguém do trabalho não é uma opção, podemos sempre recorrer a um psicólogo ou algum outro profissional capacitado. Dependendo do contexto, é um exercício que pode ser até feito com amigos e familiares. O mesmo vale para o contrário: acha que está arrasando e é bom em tudo que faz? Veja se essa é a percepção do seu líder, dos colegas de trabalho e das pessoas ao seu redor.

Principalmente quando falamos de síndrome do impostor, já vi pessoas passarem anos com esse sentimento sem nunca compartilhá-lo com ninguém. Se esse é o seu caso, dê o primeiro passo e converse sobre isso. Como vimos no começo deste artigo, esse é um sentimento comum que a maioria de nós vai passar. E vai passar, literalmente, ele vem e volta e, com o tempo, acontece com menos frequência.

Tudo bem sentir-se assim de vez em quando, mas se o sentimento é sempre presente e parece que nunca vai embora, converse com alguém ou procure ajuda. Não deixe que esse sentimento defina como vai ser toda a sua vida.

Você não é uma fraude.

*Gostou do texto do Luciano Santos? Saiba mais sobre gestão de carreira assinando gratuitamente [nossas newsletters](https://mitsloanreview.com.br/newsletter) e escutando [nossos podcasts](https://mitsloanreview.com.br/podcasts) em sua plataforma de streaming favorita.*

Compartilhar:

Luciano possui +20 anos de experiência no mercado digital tendo iniciado sua carreira no portal UOL, trabalhou 10 anos no Google Brasil em diversas áreas e foi diretor no Facebook Brasil a frente de uma equipe de vendas em São Paulo. É escritor e autor do livro "Seja Egoísta com sua Carreira", embaixador da Escola Conquer e faz parte do conselho consultivo da Agile.Inc.

Artigos relacionados

Passa conhecimento

Incluir intencionalmente ou excluir consequentemente?

A estreia da coluna “Papo Diverso”, este espaço que a Talento Incluir terá a partir de hoje na HSM Management, começa com um texto de sua CEO, Carolina Ignarra, neste dia 3/12, em que se trata do “Dia da Pessoa com Deficiência”, um marco necessário para continuarmos o enfrentamento das barreiras do capacitismo, que ainda existe cotidianamente em nossa sociedade.

Empreendedorismo
A importância de uma cultura organizacional forte para atingir uma transformação de visão e valores reais dentro de uma empresa

Renata Baccarat

4 min de leitura
Tecnologias exponenciais
Em meio aos mitos sobre IA no RH, empresas que proíbem seu uso enfrentam um paradoxo: funcionários já utilizam ferramentas como ChatGPT por conta própria. Casos práticos mostram que, quando bem implementada, a tecnologia revoluciona desde o onboarding até a gestão de performance.

Harold Schultz

3 min de leitura
Gestão de Pessoas
Diferente da avaliação anual tradicional, o modelo de feedback contínuo permite um fluxo constante de comunicação entre líderes e colaboradores, fortalecendo o aprendizado, o alinhamento de metas e a resposta rápida a mudanças.

Maria Augusta Orofino

3 min de leitura
Tecnologias exponenciais
A Inteligência Artificial, impulsionada pelo uso massivo e acessível, avança exponencialmente, destacando-se como uma ferramenta inclusiva e transformadora para o futuro da gestão de pessoas e dos negócios

Marcelo Nóbrega

4 min de leitura
Liderança
Ao promover autonomia e resultados, líderes se fortalecem, reduzindo estresse e superando o paternalismo para desenvolver equipes mais alinhadas, realizadas e eficazes.

Rubens Pimentel

3 min de leitura
Empreendedorismo, Diversidade, Uncategorized
A entrega do Communiqué pelo W20 destaca o compromisso global com a igualdade de gênero, enfatizando a valorização e o fortalecimento da Economia do Cuidado para promover uma sociedade mais justa e produtiva para as mulheres em todo o mundo

Ana Fontes

3 min de leitura
Diversidade
No ambiente corporativo atual, integrar diferentes gerações dentro de uma organização pode ser o diferencial estratégico que define o sucesso. A diversidade de experiências, perspectivas e habilidades entre gerações não apenas enriquece a cultura organizacional, mas também impulsiona inovação e crescimento sustentável.

Marcelo Murilo

21 min de leitura
Finanças
Casos de fraude contábil na Enron e Americanas S.A. revelam falhas em governança corporativa e controles internos, destacando a importância de transparência e auditorias eficazes para a integridade empresarial

Marco Milani

3 min de leitura
Liderança
Valorizar o bem-estar e a saúde emocional dos colaboradores é essencial para um ambiente de trabalho saudável e para impulsionar resultados sólidos, com lideranças empáticas e conectadas sendo fundamentais para o crescimento sustentável das empresas.

Ana Letícia Caressato

6 min de leitura
Empreendedorismo
A agência dos agentes em sistemas complexos atua como força motriz na transformação organizacional, conectando indivíduos, tecnologias e ambientes em arranjos dinâmicos que moldam as interações sociais e catalisam mudanças de forma inovadora e colaborativa.

Manoel Pimentel

3 min de leitura