Assunto pessoal

Estão levando a sério a semana de trabalho de 4 dias

O novo modelo, bem como a alternativa do dia útil de seis horas (em vez de oito), é objeto de um número crescente de estudos em vários lugares do mundo

Compartilhar:

A semana de trabalho mais curta está se tornando um estilo de vida… acelera-se a tendência em direção aos quatro dias úteis.” Essa notícia foi publicada numa edição de 1971 do *New York Times*. Foi alarme falso. Mas agora há indícios de que o bebê está mais próximo de nascer.

Um indício é que já temos tecnologia para dar suporte à semana curta – apps que aumentam a produtividade e automatização –, o que não existia 50 anos atrás. E a maior disseminação dessa tecnologia é do interesse de corporações poderosas.

O segundo indicador é que grandes estudos e experimentos sobre a semana 4×3, tanto em nível país (Reino Unido, Suécia, Espanha, Japão e Islândia) quanto em empresas (a exemplo de Microsoft Japão e Unilever Nova Zelândia), têm recebido financiamento. No mínimo, quer dizer que há lideranças levando a sério o tema e cogitando mudar o modelo.

## Os estudos
A Islândia foi pioneira em experimentos com a semana de trabalho de quatro dias; ela o fez entre 2015 e 2019, com 2.500 funcionários públicos – profissionais de creches, funcionários administrativos do governo, assistentes sociais, trabalhadores de hospitais. Esse número representa 1% da população do país. O resultado foi que não houve queda na produtividade. E, em julho de 2021, a BBC informava que 86% do país havia migrado para a semana mais curta ou, ao menos, ganhado o direito de fazê-lo.

A Suécia também fez um experimento em 2015, mas em escala menor, e nesse caso o resultado foi negativo. Algumas organizações de saúde governamentais, como a ala cirúrgica de um hospital universitário de Gotemburgo, adotaram a jornada de seis horas por dia (em vez de oito) nos cinco dias da semana. Mas, após 23 meses, a decisão do governo foi voltar às 40 horas semanais, sob a alegação de que sairia muito caro escalar o novo modelo. Os funcionários ficaram mais engajados, porém as organizações fizeram o teste contratando mais funcionários – e o custo subiu.

O Reino Unido começou em 6 de junho o maior dos experimentos até agora. Um total de 3,3 mil trabalhadores em 70 empresas reduzirão sua jornada para quatro dias por semana durante seis meses. Os participantes representam setores variados, como serviços financeiros, cervejaria e fabricação de automóveis. O estudo está sendo executado pela organização sem fins lucrativos 4 Day Week Global, em conjunto com think tanks e as universidades de Oxford e Cambridge e o Boston College.

As empresas do estudo britânico adotarão o trabalho “80-100-100”: precisa haver uma redução de 80% nas horas trabalhadas, mantendo 100% da remuneração usual e também 100% da produtividade. Como farão isso depende delas. Há uma forte hipótese de que isso pode ser alcançado só reduzindo as reuniões e usando mais tecnologias.

A Espanha também anunciou planos de testar a redução dos expedientes, e o Japão fez diferente: lançou em 2021 um plano para o maior equilíbrio entre vida e trabalho – a fim de reduzir as taxas de suicídio e outros problemas de saúde. E isso levou as grandes empresas a agir, fazendo experimentos.

## Os fatores porte e confiança
Em abril, um projeto de lei na Califórnia propôs exigir que a semana de trabalho de quatro dias úteis fosse implementada, o que beneficiaria 3,6 milhões de trabalhadores. Foi rejeitado. Em maio, veio uma nova proposta: empresas com mais de 500 funcionários pagariam horas extras aos trabalhadores acima de 32 horas. O Comitê de Trabalho e Emprego do parlamento estadual recusou-se a avançar para uma audiência de política. Isso mostra que grandes empresas estão resistindo à mudança – com exceções, é claro.

As pequenas e médias parecem mais abertas à novidade. Por exemplo, a firma de advocacia britânica Arken, com 22 funcionários, implementou em definitivo a semana de quatro dias após um teste de nove meses. Os funcionários foram entrevistados, e 85% disseram que a decisão melhorou sua visão da empresa. Não houve queda na produtividade, embora a mudança de rotina tenha dado alguma dor de cabeça no início. A confiança é o fator de sucesso.

A agência de comunicação brasileira Shoot, parte do rating *Melhores para o Brasil* publicado na __HSM Management__ nº 151, também testou em 2021 e adotou a prática em 2022. Ao *CNN Brasil Business*, o sócio Luciano Braga afirmou que a empresa está mais organizada em tempo e tarefas. Os funcionários foram divididos em duas equipes que se alternam: a primeira folga segunda-feira e a outra não trabalha na sexta-feira. “Todos sempre chegavam exaustos na segunda-feira, agora não mais”, disse Braga, e, segundo ele, a busca por vagas na empresa subiu mais de 300%.

O desafio de uma mudança dessas é grande: há o “pesadelo logístico” de organizar os horários das pessoas, é preciso não atrapalhar clientes e fornecedores nos dias off, e receitas e lucros têm de ser mantidos. Os testes – externos e internos – são cruciais.

__Leia mais: [Lifequakes: como lidar com as transições de vida](https://www.revistahsm.com.br/post/lifequakes-como-lidar-com-as-transicoes-de-vida)__

Na varredura

Uma regra da varredura de sinais de mudança é focar fenômenos “estranhos” que se repetem com padrões similares. A “great resignation” (grande renúncia) preenche os três requisitos. Mostra repetição e padrão, porque são muitas as pessoas deixando seus empregadores por livre e espontânea vontade, em muitos países (4,5 milhões só nos EUA) e com motivos iguais (exaustão e busca de realização pessoal). E a estranheza é observada em dois aspectos:

1. Os demissionários se importam pouco com o contexto econômico adverso. As renúncias ocorrem na esteira de uma pandemia que desestabilizou a economia global e atinge mesmo as economias mais fragilizadas – no Brasil, 600 mil pessoas pediram as contas em março de 2022 (dados do Cadastro Nacional de Empregados e Desempregados – Caged).

2. Eles desafiam as autoridades – e o autoritarismo. Há mobilização até na China, onde vigora o sistema de trabalho 9:9:6 – de trabalhar das 9h da manhã às 9h da noite seis dias por semana. Demandando mais pausas, os chineses jovens defendem o “tang ping” (“fique deitadão”).

Será que isso é uma pista de que o modelo da semana de trabalho de cinco dias (ou seis) está com a validade vencida? Alguns especialistas acham que sim. Nesse caso, a semana de quatro dias tem chances reais.

Paragrafo 2

Compartilhar:

Artigos relacionados

Calendário

Não, o ano ainda não acabou!

Em meio à letargia de fim de ano, um chamado à consciência: os últimos dias de 2024 são uma oportunidade valiosa de ressignificar trajetórias e construir propósito.

ESG
Investimentos significativos em tecnologia, infraestrutura e políticas governamentais favoráveis podem tornar o país líder global do setor de combustíveis sustentáveis

Deloitte

Estratégia, Liderança, times e cultura, Cultura organizacional
À medida que o mercado de benefícios corporativos cresce as empresas que investem em benefícios personalizados e flexíveis não apenas aumentam a satisfação e a produtividade dos colaboradores, mas também se destacam no mercado ao reduzir a rotatividade e atrair talentos.

Rodrigo Caiado

Empreendedorismo, Liderança
Entendimento e valorização das características existentes no sistema, ou affordances, podem acelerar a inovação e otimizar processos, demonstrando a importância de respeitar e utilizar os recursos e capacidades já presentes no ambiente para promover mudanças eficazes.

Manoel Pimentel

ESG, Liderança, times e cultura, Liderança
Conheça e entenda como transformar o etarismo em uma oportunidade de negócio com Marcelo Murilo, VP de inovação e tecnologia da Benner e conselheiro do Instituto Capitalismo Consciente.

Marcelo Murilo

ESG
Com as eleições municipais se aproximando, é crucial identificar candidatas comprometidas com a defesa dos direitos das mulheres, garantindo maior representatividade e equidade nos espaços de poder.

Ana Fontes

ESG, Empreendedorismo
Estar na linha de frente da luta por formações e pelo desenvolvimento de oportunidades de emprego e educação é uma das frentes que Rachel Maia lida em seu dia-dia e neste texto a Presidente do Pacto Global da ONU Brasil traz um panorama sobre estes aspectos atuais.

Rachel Maia

Conteúdo de marca, Marketing e vendas, Marketing Business Driven, Liderança, times e cultura, Liderança
Excluído o fator remuneração, o que faz pessoas de diferentes gerações saírem dos seus empregos?

Bruna Gomes Mascarenhas

Blockchain
07 de agosto
Em sua estreia como colunista da HSM Management, Carolina Ferrés, fundadora da Blue City e partner na POK, traz atenção para a necessidade crescente de validar a autenticidade de informações e certificações, pois tecnologias como blockchain e NFTs, estão revolucionando a educação e diversos setores.
6 min de leitura
Transformação Digital, ESG
A gestão algorítmica está transformando o mundo do trabalho com o uso de algoritmos para monitorar e tomar decisões, mas levanta preocupações sobre desumanização e equidade, especialmente para as mulheres. A implementação ética e supervisão humana são essenciais para garantir justiça e dignidade no ambiente de trabalho.

Carine Roos

Gestão de Pessoas
Explorando a comunicação como uma habilidade crucial para líderes e gestores de produtos, destacando sua importância em processos e resultados.

Italo Nogueira De Moro