ESG

Evitando o escoamento de dinheiro público: a revolução das Cidades-Esponja

A crescente frequência de desastres naturais destaca a importância crucial de uma gestão hídrica urbana eficaz, com as "cidades-esponja" emergindo como soluções inovadoras para enfrentar os desafios climáticos globais e promover a resiliência urbana.

Guilherme Hoppe

Guilherme Hoppe é um profissional com mais de 15 anos de experiência no desenvolvimento de...

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Se havia qualquer dúvida sobre a importância do planejamento eficiente do manejo das guas das comunidades pelo mundo, maio de 2024 pode ter sido um marco claro neste sentido.

Na Europa, a Itália foi duramente atingida por enchentes devastadoras na região da Emilia-Romagna. Na Ásia, o Afeganistão sofreu da mesma forma com enchentes, apenas umas poucas semanas depois de um tornado causar danos significativos na China, enquanto no sul dos Estados Unidos, o Texas foi particularmente afetado por tempestades severas que causaram danos à propriedades e interrupções no fornecimento de energia e o Rio Grande do Sul, no sul do Brasil, teve mais de 300 municípios que decretaram situação de emergência.

Nos últimos tempos, a frequência e intensidade dos eventos climáticos extremos têm imposto desafios significativos às áreas urbanas, causado destruição e perdas substanciais.

As recentes calamidades destacaram a necessidade premente de abordagens inovadoras para a gestão hídrica urbana. Nesse cenário, as “cidades-esponja” emergem como uma solução promissora e crucial para o futuro sustentável das cidades.

O conceito de cidades-esponja foi concebido pelo arquiteto chinês Kongjian Yu. Baseia-se na premissa de que o planejamento urbano deve harmonizar-se com os processos naturais, especialmente no manejo das águas pluviais. As cidades-esponja são desenhadas para absorver, reter e purificar a água da chuva através de uma combinação de superfícies permeáveis, vegetação abundante, lagos e estruturas projetadas para inundar temporariamente. Esse design visa diminuir o volume de água que escoa rapidamente para os sistemas de drenagem e cursos d’água, mitigando o risco de enchentes e promovendo uma resiliência urbana mais robusta.

Um exemplo marcante dessa iniciativa é a cidade de Wuhan, na China. A cidade
implementou diversas estratégias para se transformar em uma cidade-esponja. Entre as intervenções estão a criação de parques alagáveis, telhados verdes e pavimentos permeáveis. Os parques alagáveis funcionam como grandes reservatórios naturais, absorvendo a água da chuva e aliviando os sistemas de drenagem.

Telhados verdes contribuem para a retenção e evaporação da água, enquanto pavimentos permeáveis permitem que a água infiltre no solo. Em 2016, durante um período de chuvas intensas que causaram inundações generalizadas na China, Wuhan conseguiu evitar os piores impactos, evidenciando a eficácia dessas medidas.

Na China como um todo, o governo lançou a iniciativa de cidades-esponja em 2015, com o objetivo de equipar 80% das áreas urbanas com características de cidades-esponja até 2030 e reciclar pelo menos 70% das chuvas. Entre 2016 e 2020, mais de 33.000 projetos foram realizados em 90 cidades de 13 províncias, totalizando um investimento de aproximadamente 1,06 trilhão de yuan (cerca de 148 bilhões de dólares) Copenhague, na Dinamarca, também se tornou um exemplo de cidade-esponja,
especialmente após uma enchente devastadora em 2011. A cidade investiu em
infraestruturas verdes, como parques projetados para serem alagados, calçadas
permeáveis e bacias de retenção de água. Essas infraestruturas são projetadas para armazenar temporariamente grandes volumes de água da chuva, liberando-a gradualmente nos sistemas de drenagem ou permitindo sua infiltração no solo. Essas intervenções têm se mostrado eficazes em eventos subsequentes de chuvas intensas, protegendo a cidade de inundações severas e melhorando a qualidade da água ao filtrar poluentes.

O Skybrudsplan, o plano para transformar Copenhague em uma “cidade-esponja” inclui 350 projetos individuais e se espera que continue até pelo menos 2035. A maior parte do financiamento não vem dos impostos, mas de uma taxa sobre o consumo de água paga por famílias e empresas, que gera aproximadamente 120 euros adicionais por ano para uma família de quatro pessoas Nova Iorque, após o furacão Sandy em 2012, adotou várias estratégias de cidades-esponja para aumentar sua resiliência contra eventos climáticos extremos. A cidade construiu zonas
úmidas e parques alagáveis em áreas como Brooklyn e Staten Island, projetados para absorver grandes volumes de água durante tempestades e marés altas. Além disso, investiu em barreiras contra tempestades e sistemas de drenagem aprimorados. Essas medidas têm protegido comunidades vulneráveis e reduzido os danos causados por futuras tempestades e inundações.

O plano conhecido como “PlaNYC” e seu sucessor, “OneNYC”, incluem investimentos
significativos em tecnologias de contenção de água e resiliência climática. Desde 2012, foram destinados cerca de 20 bilhões de dólares para melhorias na infraestrutura No Brasil, várias cidades começaram a incorporar conceitos semelhantes ao das cidades-esponja para melhorar a gestão das águas pluviais. São Paulo, por exemplo, implementou a construção de piscinões, que são reservatórios subterrâneos projetados para coletar e armazenar grandes volumes de água da chuva, evitando inundações nas ruas e sistemas de drenagem.

Exemplos notáveis incluem os piscinões do Córrego do Ipiranga e o Piscinão do Pacaembu. Além disso, a cidade tem investido em parques lineares, como o Parque Linear do Córrego Verde, que ajudam a absorver a água da chuva e reduzir o escoamento superficial, contribuindo significativamente para o controle das
enchentes em áreas críticas e melhorando a qualidade de vida dos moradores.

Em São Paulo, os investimentos em infraestrutura para conter enchentes têm sido
substanciais. A construção dos piscinões no Córrego Ipiranga, por exemplo, recebeu um total de R$138,1 milhões, sendo R$115,5 milhões provenientes de recursos federais e R$22,6 milhões da Prefeitura de São Paulo. Estes piscinões, incluindo o Deputado Jooji Hato e o Lagoa Aliperti, têm capacidade combinada para armazenar até 310 mil m³ de água.

Além disso, o governo de São Paulo também está investindo R$117 milhões na construção de um novo piscinão e na canalização do Córrego Antonico, na região do Morumbi. Esse novo reservatório terá a capacidade de armazenar mais de 44 milhões de litros de água e beneficiará mais de 1 milhão de moradores, ajudando a mitigar os efeitos das enchentes (São Paulo SP).

Recife também tem avançado na implementação de soluções de cidades-esponja,
especialmente através do Projeto Capibaribe Melhor, que foca na revitalização das margens do Rio Capibaribe. O projeto inclui a criação de parques e áreas verdes que ajudam na absorção da água da chuva. Além disso, a cidade tem investido na implementação de jardins de chuva e pavimentos permeáveis em diversas áreas, aumentando sua resiliência frente a chuvas intensas e melhorando a qualidade ambiental e urbanística.

Curitiba, conhecida por suas inovações em planejamento urbano, também tem adotado
estratégias de cidades-esponja. A cidade utiliza seus parques municipais, como o Parque Barigui e o Parque Tingui, como grandes esponjas naturais que ajudam a gerenciar as águas pluviais. Além disso, Curitiba tem implementado jardins de chuva em espaços públicos e privados, facilitando a infiltração da água da chuva no solo. Essas medidas têm sido eficazes na redução das enchentes, protegendo áreas urbanas densamente povoadas e contribuindo para a biodiversidade e a qualidade do ar.

A implementação de estratégias de cidades-esponja representa um avanço significativo na adaptação das cidades aos desafios impostos pelas mudanças climáticas. Os exemplos de Wuhan, Copenhague e Nova Iorque demonstram que é possível integrar soluções baseadas na natureza ao planejamento urbano, criando um ambiente urbano mais seguro, resiliente e sustentável.

No Brasil, as iniciativas (e valores aplicados) em São Paulo, Recife e Curitiba mostram que essas estratégias podem ser adaptadas ao contexto local, promovendo a resiliência urbana e melhorando a qualidade de vida dos habitantes. Adotar essas soluções é um passo essencial para construir cidades preparadas para enfrentar os desafios climáticos futuros.

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