Estratégia e Execução

Faça seu benchmarking

HSM Management selecionou diferentes cases de carreira global em que podemos nos espelhar: por que eles decidiram por esse caminho? Como o viabilizaram? Arrependeram-se?

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Eles chegaram a posições importantes nos Estados Unidos, América Latina, Europa, Ásia e Oceania. Dependendo de como os olhamos, têm mais diferenças do que semelhanças: desempenham atividades diversas em múltiplas indústrias, têm idades variadas, suas origens e trajetórias são distintas. 

Porém esses expatriados bem-sucedidos entrevistados por HSM Management possuem ao menos quatro características em comum: todos foram curiosos o suficiente para construir novas vidas longe de casa, correram riscos ao sair da zona de conforto, dispuseram-se a aprender formas diferentes de trabalhar e, é claro, sentem muitas saudades dos familiares e dos amigos que deixaram na terra natal. 

**MARIANA CAMPOS: DOMÍNIO DE CINCO IDIOMAS**

Há 16 anos, Mariana Campos resolveu fazer um curso de alemão em Zurique, na Suíça. Sem ter ascendência alemã. “Nem fazia ideia do que me esperava.” Depois de terminar sua imersão, descobriu que poderia ir além. “Comecei a buscar oportunidades e fui entendendo que, para morar na Europa, precisaria me estruturar. Com passos seguros, fui participando de seleções de trabalho e conseguindo ocupar posições.” Até que em 2012 surgiu a proposta de ir para a FIFA (Federação Internacional de Futebol). “Nunca passou pela minha cabeça que poderia chefiar uma equipe global que gerenciasse o transporte de seleções e dirigentes do futebol”, afirma Campos, hoje à frente do Departamento de Logística de Viagens da FIFA.

Aos 37 anos, ela já viajou por mais de 50 países e lidera uma equipe de 23 pessoas localizadas em 12 países diferentes. “Aprendi que o segredo é sempre buscar se colocar no lugar do outro. Meu grande desafio foi aprender a lidar com culturas diferentes sem querer impor um único modo de resolver conflitos. Para evitar reclamações infrutíferas, costumo dizer que cada pessoa deve trazer duas propostas de solução para cada problema apontado.” Apesar da grande responsabilidade, confessa que a sua maior dificuldade hoje é a distância da família. “Procuro ver meus pais uma vez por ano, principalmente agora com um filho de 18 meses de idade que tem tripla nacionalidade – brasileira, suíça e francesa.

O fato de falar cinco línguas foi essencial no trabalho de Campos, porém o mais importante em sua opinião foi sua capacidade de ser flexível e mais – resiliente. “O bom jeito brasileiro ajuda para encontrar saídas criativas que a rigidez europeia tem mais dificuldades de resolver, mas é vital que se tenha rigor com os processos. A cada nova etapa sou mais cobrada para superar resultados com melhor qualidade.”

Mariana Campos lembra que recebeu muitos “nãos” ao longo de sua carreira. “Até eu aprender a usar com propriedade a inteligência emocional, levei um certo tempo. Acho que a capacidade de tomar decisões acertadas envolvendo aspectos culturais é um ganho que só vem com a experiência de aprender muito com os erros. Hoje sinto que consigo interagir com pessoas que pensam muito diferente de mim na direção de atingir um mesmo objetivo. Essa construção é bem trabalhosa.”

**LUIS CARLOS CAETANO: FLEXIBILIDADE E PRECISÃO**

Depois de 26 anos trabalhando em São Paulo para a Element Six, do grupo sul-africano De Beers, Luis Carlos Caetano foi transferido para o Texas, nos Estados Unidos. Inicialmente passaria dois anos lá como gerente de vendas, mas por conta de mudanças estruturais na própria empresa, recebeu um convite para assumir a gerência de contas globais em 2016, além da gerência de distribuição para as Américas. “Já conhecia a cultura da companhia, mas trabalhar fora do Brasil é totalmente diferente. Para mim valeu muito a pena, apesar de todos os desafios.”

O primeiro desafio foi levar a família. “Seria uma grande oportunidade para vivenciar a cultura de outro país, principalmente para a minha filha mais nova, de 11 anos. O importante para quem quer ser expatriado é fazer um bom planejamento – para não ter surpresas. É preciso estar bem convicto desse passo na vida.” A escola é muito diferente, por exemplo; então é preciso se adaptar bem, aos estudos e ao modo de fazer novos amigos. “Para nossa felicidade, encontramos muitos brasileiros por aqui.”

No escritório, o mais importante para Caetano foi se adequar aos novos valores e ter uma grande capacidade de ouvir, o que evita muitos problemas de comunicação. “Os americanos são muito bons de processos, mas nós somos mais flexíveis. Daí que procurei ser um facilitador para minha equipe. Agora, estou numa função em que a área comercial precisa dialogar muito de perto com o conhecimento técnico – vendemos diamantes sintéticos para equipamentos que fazem o acabamento de asas de avião, por exemplo. Então, o trabalho tem de ser bem preciso”, conta Caetano.

Por contas das plantas industriais estarem espalhadas pelo mundo, Caetano sempre viaja para África do Sul, China, Irlanda (onde fica a matriz), além da América Latina e até mesmo pelos Estados Unidos. “Tenho uma agenda intensa, mas sempre procuro ir ao Brasil no Natal ou nas férias de julho. Isso é sagrado para manter o vínculo familiar.”

Apesar de querer ficar uns bons anos nos Estados Unidos, a meta de Caetano é se aposentar no Brasil. “Aqui tudo é mais complicado com o seguro-saúde. Pretendo parar aos 70 anos e voltar ao meu País. Imagino que esse prazo vá coincidir com a formatura da minha filha mais nova na universidade aqui.” 

**TUSHAR PARIKH: UM INDIANO EM SÃO PAULO**

“Ao chegar ao México em 2005, deparei com um país onde quase tudo acontece em espanhol e, embora eu falasse três idiomas, esse não era um deles. Então, para comprar o pão do café da manhã eu fazia mímica. Mas o México me mudou: cheguei 100% vegetariano e aprendi a gostar de frango, peixe e frutos do mar! Ao vir para o Brasil eu me adaptei facilmente depois de ter vivido no México e na Argentina por vários anos”, afirma Tushar Parikh, country head da Tata Consultancy Services (TCS). “Aqui tem coisas muito parecidas com a Índia, onde as famílias são unidas e cuidam umas das outras. O povo brasileiro sabe fazer com que os expatriados se sintam confortáveis e estão sempre dispostos a ajudar na adaptação.”

Na visão de Parikh, conhecer diferentes povos e culturas a trabalho é muito diferente de ler sobre o mundo ou viajar como turista; a pessoa passa a ver o mundo de uma maneira verdadeiramente global. “Isso abre nossa mente para aceitar melhor a diversidade que existe e, principalmente, oferece uma oportunidade única para nossas crianças. A experiência de trabalhar como expatriado é equivalente a viver na residência universitária durante a graduação.” 

Parikh confessa que gostaria de ter vindo antes ao Brasil por ser uma das maiores economias da região e um país não apenas muito grande como dono de muita diversidade. Ele também queria ter aprendido português antes. “Meu conselho a aqueles que estão se preparando para viver em um novo país é tentar fazer uma visita prévia ao local em que fará seu novo lar, pesquisar bastante sobre a cultura e os costumes do país de destino e estudar o básico do novo idioma”, diz. 

Ele recomenda também estar preparado para um período de adaptação desafiador. Diz que sua esposa se adaptou muito bem à América Latina, e as crianças “talvez já sejam mais brasileiras do que indianas”.

Parikh ainda não tem previsão de retorno à Índia, mas sentirá saudades quando for a hora. “Acredito bastante no potencial dos talentos locais e, como crescemos sempre dois dígitos ao longo dos últimos anos, estamos muito otimistas com o País.”

**JOANNA CAROLA: A CIENTISTA E O PRÊMIO NOBEL**

Formada em biologia pela Universidade Federal do Piauí (UFPI), Joanna Carola resolveu fazer seu doutorado na Universidade de São Paulo (USP) sobre a hipóxia, que é a baixa oxigenação celular. O processo ocorre naturalmente quando uma pessoa pratica exercícios físicos ou em grandes altitudes, mas também é uma característica de células cancerígenas. A partir do seu interesse, recebeu o convite do dr. Peter Ratcliffe, prêmio Nobel de Medicina em 2019, para passar um ano fazendo parte de sua equipe de estudos na Oxford University, Inglaterra. “Foi o momento mais incrível da minha vida de cientista! O professor sir Peter Ratcliffe é uma mente incansável, uma máquina de pensar. Cada minuto de conversa é um aprendizado eterno. Sempre comento que foi a oportunidade mais enriquecedora da minha vida profissional.”

Desde a ansiedade pré-viagem até o luto de despedida, Joanna Carola viveu a dor de ficar longe da família, a ansiedade sobre a conquista de novos amigos e teve momentos de solidão, porém passou momentos incríveis de vivências mundo afora. “A expatriação é uma oportunidade para desenvolvermos muitas habilidades de negociação e sobrevivência. E aprendemos a valorizar mais o tempo com a família quando estamos perto.”

Como um brasileiro se distingue em Oxford? “Cresci ouvindo falar na nossa capacidade de improviso e eu pude constatar que isso é verdade. Nós, brasileiros, temos uma capacidade intrínseca de pensar e de resolver os problemas de imediato e com criatividade.” 

Agora, o fato de estudar em Oxford – “na melhor universidade do mundo” – está trazendo muitos pontos positivos para a carreira de 

Joanna. O que ela mais celebra é a aplicação do conhecimento adquirido. “Poder aplicar tudo que venho aprendendo é essencial e estou conseguindo fazer isso na Inglaterra”, diz Joanna, que pretende ficar mais quatro anos na Europa. “Vivi o mesmo processo quando saí do Piauí e migrei para São Paulo, mas, agora, o Brasil como um todo tem deixado bastante a desejar em educação e em ciência.” Ela diz que ter a capacidade de comparar os mais diversos aspectos socioculturais entre os países foi algo extremamente importante para moldar sua visão de mundo.

Joanna Carola sonhava ser biomédica, não bióloga. Porém o curso pretendido não existia em sua cidade em sua época de vestibular, e a mãe não a deixou migrar para outro lugar a fim de fazer a graduação. Durante alguns anos, sentiu-se fracassada por isso. Depois, ao iniciar a carreira acadêmica, ela pôde ter mobilidade e tudo mudou. Joanna Carola é a prova do valor profissional da mobilidade.

> **O HÁBITO DE MUDAR** _por Paulo Amaral_
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> Sempre mudei muito em minha vida. Foram mais de dez cidades no Brasil. Meu pai, juiz de direito, decidiu fazer carreira passando das comarcas pequenas no interior de São Paulo até chegar à capital do estado. Quando chegou ao ápice, a família estava cansada e ficou no interior. Estudei em muitas escolas, a maioria delas pública. Quando me perguntavam de onde eu era, não sabia o que responder. Não lembro de existir a expressão “cidadão do mundo” naquela época… Sorte que tive irmãos. 
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> Tudo isso me ajudou a perceber anos mais tarde que viver é mudar. 
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> Aos 17 anos decidi sair de casa, fazer faculdade em São Paulo e ditar minha própria vida. De preferência uma vida estável, sem tantas mudanças, pensei. Entrei na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, mas não durou um ano. Prestei vestibular novamente. Entrei na Escola de Comunicações e Artes (ECA-USP) e finalmente parecia ter encontrado meu lugar no mundo. 
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> Terminando a faculdade decidi trabalhar em redacão de jornal diário. Sentir a adrenalina das 24 horas. Todo dia o jornal tem de chegar à casa das pessoas. Queria escrever reportagens da vida cotidiana. Acabei em economia e negócios. Um dia, a chefe olhou para mim e perguntou se eu tinha alguma experiência com tecnologia. Bem, eu sabia o que era um computador. Teclado, tela verde, DOS… Acabei por estruturar o projeto do caderno de informática do jornal. 
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> Era o momento da abertura do mercado de tecnologia no Brasil e as multinacionais estavam investindo pesado no País. Executivos chegavam de várias partes do mundo. Mas eu não estava preparado. Meu inglês macarrônico não estava me ajudando… Precisava estudar, mas não tinha tempo. Decidi ir para uma assessoria de imprensa na área de tecnologia para poder me preparar com um ou dois idiomas. O inglês era padrão. Decidi também estudar espanhol, pois o Mercosul estava saindo do papel e prometia.
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> Nessa época fui “aprovado”para ter internet em casa. Lembro até hoje daquela noite em que “visitei”o museu do Louvre em frente ao computador. Ali tive a certeza de que a internet mudaria o mundo. Na época eu tinha um cargo bacana de editor-assistente na maior editora de revistas da América Latina. Mas queria algo que não podia fazer naquele lugar. Queria trabalhar com internet e a empresa parecia estar relutante sobre acelerar a transformação digital. 
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> Recebi convite para ajudar a criar um site de notícias sobre tecnologia, espécie de startup dentro da subsidiária brasileira de uma editora norte-americana. O projeto vingou e se tornou líder do segmento no Brasil: IDG Now! Aí percebi que precisava entender mais de estratégia digital. Chegava a hora de cruzar a fronteira. Destino? Califórnia. 
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> Fui com minha namorada na época. Pude estudar em Berkeley e trabalhar a partir do escritório da editora em San Francisco. Tinha acesso às conferências de tecnologia do Vale do Silício. Entrevistei de Linus Torvalds a Bill Gates. Mas não fomos para ficar. Só que, quando estávamos prestes a regressarmos ao Brasil, recebi um convite para trabalhar em uma ponto.com. A RealNetworks havia criado uma tecnologia chamada streaming media para transmitir áudio e vídeo online… Em modems de 28K! Mudei para Seattle para ajudar a planejar a entrada da companhia na América Latina e voltei ao Brasil para educar o mercado sobre o streaming – publicitários, provedores de internet, empresas de mídia. Fiz de Big Brother a Casa dos Artistas, de Rock in Rio a Carnaval…
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> Anos depois do estouro da bolha da internet, oportunidades reais para a transformação digital em indústrias estabelecidas começaram a surgir. Era hora de reorientar minha carreira. Conversei com headhunters. Participei de processos de seleção para vagas nos Estados Unidos e na América Latina. Era distante de tudo o que eu havia feito, o maior desafio. Uma das cinco maiores empresas de saúde do mundo precisava de alguém para estruturar a área de e-business na região e buscava profissionais no Google, no Yahoo. Fui com ambição de aprender por alguns anos como funciona essa área fascinante. Estou nela há quase 14 anos…
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> Foi muito bacana ajudar a fazer a mudança do modelo comercial e a estruturar a operacão de marketing digital regional da companhia. Fizemos algumas das operacões líderes em digital nos principais mercados da América Latina. Mas comecei a entrar em uma zona de conforto. E entendi que tinha de expandir meu horizonte. Então, fui chamado por outra companhia que precisava implementar uma mudança importante no modelo de engajamento com os clientes usando digital. E onde eu teria oportunidade de perseguir uma carreira global. Isso foi o que mais pesou na decisão.
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> Combinei com o chefe. Implemento a operação digital na América Latina. Se tudo der certo, vou concorrer a vagas internacionais em dois ou três anos. Combinei também com minha família. Depois de tentar algumas posições, acertei os Estados Unidos. A companhia estava para lançar um novo produto e a equipe global ficaria baseada na região metropolitana de Washington, DC. Eu mal conhecia a cidade. Estava na metade do ano. Os filhos ficaram relutantes. Ninguém estava preparado. Fui primeiro. Passei quase seis meses sozinho. 
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> Trouxe a familia, e a gata, no meio do inverno, logo após o réveillon no Brasil. Foi provavelmente um erro aterrissar com os termômetros marcando 14º C negativos. Neve caindo é lindo em “snow globes”, mas dificulta as coisas na vida real. Validar o currículo escolar, fazer testes de proficiência em inglês, tomar vacinas obrigatórias, aprender a ir para a escola no ônibus. E sempre há a sensação de estarmos voltando no tempo: fazer registro de seguro social, abrir conta no banco, tirar carteira de motorista, comprar carro, encontrar cabeleireiro, médico, dentista, veterinário etc. É quase como passar uma borracha na vida e recomeçar do zero. 
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> Trabalhei com empresas e chefes norte-americanos em boa parte da minha vida, mas ainda assim tive vários momentos de adaptação em Washington. Você olha o calendário anual e vê só sete dias de feriado. Não tem cafezinho ou almoço de uma hora com a equipe. Sim, às cinco da tarde muita gente fecha o computador e vai para casa. Mas que tem aquela olhada nos e-mails à noite, isso tem. E o dia começa às 7 horas, com o escritório a pleno vapor. (Ou antes, se houver conference calls de madrugada com a Ásia.)
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> Não demora para a família toda perceber que viver fora do Brasil tende a envolver montar móveis com as próprias mãos, limpar a casa, fazer a comida, colocar o lixo para fora. Um amigo carioca lembrou que tinha cinco “funcionários” no Rio, de babá a piscineiro. Aqui não tem nenhum. Se a pia da cozinha entupir em pleno domingo ou esquilos invadirem o sótão, a gente pergunta “Hey Google, como faço para…”. E faz.
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> Leva algum tempo, mas você começa a desenhar um novo círculo social. Você faz novos amigos, você começa a criar algumas raízes. É bem mais fácil ter gente à sua volta com uma cultura parecida com a sua – franceses, italianos, espanhóis e, claro, outros brasileiros. Só que boa parte dessas pessoas está de passagem. E você começa a ver seus novos amigos dizendo adeus. Aqui há, inclusive, quem evite fazer amigos para não ter de perdê-los.
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> Seja como for, adoro poder trabalhar com gente brilhante, com esses cidadãos do mundo que cursaram as melhores universidades e cruzaram diversas fronteiras (não só geográficas). Há que reconhecer que os EUA prezam a diversidade e atraem alguns dos melhores cérebros.
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> Realmente acredito que não existe melhor maneira para se desenvolver, profissionalmente e como ser humano, do que ir além de territórios conhecidos. Cada obstáculo te prepara para o próximo desafio. É assim com as pessoas, é assim com as empresas.
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> _Paulo Amaral é líder global de marketing digital para vacinas na GSK e mora com sua família na região metropolitana de Washington, DC._

**VIVIANI FAGUNDES: A OPÇÃO PELO CRESCIMENTO HORIZONTAL**

A decisão de sair do Brasil foi muito rápida para Viviani Fagundes. Entre receber a proposta de expatriação e embarcar para Bruxelas, na Bélgica, passaram-se apenas três meses. Na época, ela tinha 28 anos e um cargo de especialista na subsidiária brasileira de uma grande empresa de eletrodomésticos – e iria ocupar um posto na tesouraria global do grupo. 

Fagundes resolveu abdicar de um crescimento profissional vertical mais acelerado, em troca de ampliar seu conhecimento e habilidades em diversas áreas do negócio. “Isso foi uma escolha. Algumas coisas não aconteceram da forma como eu esperava, mas não considero que tenha dado ‘errado’”, analisa. É claro que ver colegas que permaneceram na mesma função no Brasil serem promovidos mais rapidamente a fez questionar um pouco sua decisão, mas hoje ela enxerga esse tempo no pipeline de liderança como um investimento. “Hoje tenho consciência de que abri muitas portas e que estou desenvolvendo expertises que me permitirão ter sucesso em grande parte das posições de alta liderança”, afirma Fagundes.

A expatriação é uma experiência única, tanto pessoal como profissionalmente. Ela proporciona aprendizados e quebras de paradigmas únicos, coisas que não se aprende em livros, cursos ou viagens. “A imersão cultural dentro e fora do trabalho definitivamente mudam a visão de uma pessoa nos mais diversos aspectos, desde a maneira como nos relacionamos com os colegas de trabalho até o modo de enxergarmos nosso próprio país.” 

 Fagundes conta que sempre foi muito próxima à família e lidar com a distância ainda é complicado, mesmo passado tanto tempo. “Se a expatriação envolver grandes distâncias, o expatriado precisa ter consciência de que abdicará de momentos familiares únicos, incluindo as grandes celebrações”, avisa. 

Para a executiva, cada um precisa entender se a expatriação é o que ele, ou ela, realmente deseja, inclusive conversando com a família e com outros expatriados antes de decidir. “Se, depois de colocar todos os fatores na balança, a pessoa acreditar que realmente é o que quer, então é só começar a planejar o caminho e ir atrás. É uma realidade muito mais próxima de nós do que se imagina.” 

Fagundes mudou sua própria visão do profissional brasileiro; crê que sua principal qualidade não é a flexibilidade, como tantos dizem, mas seu comprometimento com o trabalho. “Muitos estrangeiros são impecáveis em seu trabalho, mas não se engajam no time com o mesmo vigor”, analisa.

**TIEGO DINIZ: O GAP É DE VALORIZAÇÃO**

Como parte do seu doutorado na Universidade de São Paulo (USP), Tiego Diniz foi para a Austrália em agosto de 2019, para passar um ano no St Vincent’s Institute of Medical Research, na cidade de Victoria, perto de Melbourne. Foi uma situação quase emergencial. Seu orientador atrasou na entrega de documentos e colaborar com pesquisadores transfronteiras tornou-se necessário para que pudesse começar a trabalhar o mais rápido possível. “Hoje estou envolvido em um projeto de pesquisa muito maior, que deve me render bons frutos no futuro”, conta. 

Se suas expectativas profissionais eram altas, as pessoais não ficavam para trás. “Do ponto de vista profissional, hoje estou agregando muito conhecimento trabalhando com os melhores cientistas na minha área. E, do pessoal, acredito que as conexões e amizades que fazemos no exterior ficam para o resto da vida. É isso que vou levar daqui.”

Alguma coisa poderia ter sido diferente? Sim. Ele faz um balanço: “Eu me dedicaria mais no aprendizado do inglês antes de vir. E teria definido meu projeto de pesquisa de outro modo, analisando muito bem o local e as pessoas com quem que ia trabalhar”. 

A quem quiser ser um expatriado, Diniz recomenda perguntar tudo antes de partir. Por experiência própria diz que, muitas vezes, na ansiedade de sair do país, as pessoas acabam deixando detalhes importantes de lado. “A experiência no exterior é, sim, fantástica, mas também pode ser desastrosa.”

Para Diniz, a flexibilidade e a resiliência são as principais características dos pesquisadores brasileiros. Isso porque constantemente as hipóteses científicas são refutadas e precisam de alteração, com os experimentos tendo de ser refeitos diversas vezes .“Como no Brasil falta investimento, desenvolvemos a criatividade. Aliás, falando em qualidade da ciência, posso garantir que o único fator que nos separa de outros países é a capacidade de investimento! Somos tão bons quanto eles, só não somos valorizados.”

> **WAGNER DAMIANI: EMPREENDER GLOBALIZA** _por Sandra Regina da Silva_
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> Desde criança, montar um negócio era o sonho de Wagner Damiani. O que ele não podia imaginar é que um dia teria seis, sendo dois fora do Brasil, nos Estados Unidos e na China. Quando enveredou também pela carreira acadêmica, como professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas 
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> (FGV-EAESP), ele tampouco sonhou que daria aulas em uma universidade norte-americana: é professor da David Eccles School of Business, ligada à University of Utah, nos EUA. 
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> As carreiras internacionais, como empreendedor e como acadêmico, aconteceram de maneira orgânica para Damiani. E ele atribui ambas aos investimentos que fez na própria educação.
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> Sua primeira empresa, a B2touch, nasceu quando cursava administração na PUC de São Paulo. “Eu era molecão, mas sabia aonde queria chegar.” Trabalhando na casa dos pais, sobre uma mesa de pingue-pongue e com computadores alugados por hora, já que não tinha capital para investir, começou a prestar serviços de informática para uma grande transportadora. Aos poucos, foi conquistando outras clientes do ramo, chegando a ter as cem maiores do Brasil na carteira. 
>
> Nessa trajetória, foi fazer mestrado na FGV e ganhou bolsa de estudos, com ajuda de custo da instituição, a partir do segundo semestre. “Para mim, a mensalidade era uma fortuna; o mestrado era três vezes o que eu pagava de aluguel”, relembra ele, que era recém-casado. No terceiro ano, a FGV fez uma proposta: que tal se transferir diretamente para o doutorado nos EUA, em vez de terminar o mestrado? E, assim foi: em 1995, ele se dedicou ao doutorado na University of Texas, de Austin. 
>
> De volta ao Brasil, vendeu sua tese, Executive Information Systems, para empresas. “Foi aí que eu parei de trabalhar com transportadoras e reorientei o negócio para grandes empresas, como bancos, administradoras de cartão de crédito, seguradoras, companhias telecomunicações etc.” 
>
> Damiani conheceu Utah em 2006, quando foi fazer pós-doutorado na Brigham Young University. Dez anos depois, procurando uma tecnologia nova para aplicar aos seus negócios, voltou para aquele lugar, para fazer um sabático e abrir os horizontes. “O plano era eu fazer um sabático de um ano, mas já estou aqui há quatro”, diz ele. 
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> Damiani concilia os negócios com a vida acadêmica graças a negociações feitas com ambas as instituições. Na FGV-EAESP, ensina a disciplina de inovação, empreendedorismo e tecnologia, durante uma semana por semestre. Já na University of Utah, dá aulas nas noites de segunda-feira, em que aborda inteligência artificial com a ajuda de carrinhos autônomos, munidos de computador e câmera. Os alunos, depois, têm de desenvolver planos de negócios. O recrutamento de talentos está feito. “Sempre quero contratar alguns alunos para trabalhar comigo”, conta ele.
>
> Esse curso de IA é um dos produtos no catálogo de outra de suas empresas, a Uglobal. Outro negócio que ele desenvolveu foi levar brasileiros para Utah, conseguindo bolsas doadas pelas duas famílias mais ricas locais, mescladas com financiamento vindo da Inglaterra. Na cidade, ele era o único brasileiro ao chegar; hoje já são 50.
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> “Nesse processo, descobri algo terrível. Muitos brasileiros queriam imigrar, mas não queriam estudar”, conta. Mas, em vez de ficar chocado com isso, ele montou mais um negócio – para atender a essa demanda. 
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> Hoje, Damiani tem seis empresas, incluindo uma startup na China, em sociedade com um ex-aluno, mas ainda não se deu por satisfeito. A meta é ter dez negócios. “Essa é a minha vida: adoro dar aula, tocar empresas e ajudar pessoas a estudar e a trabalhar”, conclui ele, que fez tudo isso em família. É casado, tem três filhos e, como diz, “uma linda neta”.

**THIAGO ELY: 5 LUGARES EM 7 ANOS**

Sua carreira foi meteórica. Entrou como trainee numa empresa panamenha em 2002 e, depois de 17 anos, tornou-se CEO do grupo. “Para mim foi importante ter feito essa caminhada passo a passo, para que pudesse consolidar meu papel como líder de equipes e conhecer profundamente a cultura da empresa tendo passado pelas principais áreas da corporação”, afirma Thiago Ely, que hoje tem 41 anos e resolveu voltar ao Brasil em seu sabático.

Aqui ele trabalhou por 11 anos, com posições em vários estados. Em 2013, foi para Nova York, onde passou um ano e oito meses. “Foi uma experiência incrível para mim e minha família. Pude vivenciar como funciona um mercado muito veloz e potente. Também tive dificuldades, claro, mas tudo foi sendo contornado.” Em 2015, assumiu a vice-presidente de trade marketing e negócios próprios na Cidade do México e, em 2017, virou VP regional de vendas e distribuição em Guadalajara. A adaptação foi mais difícil, porém o desafio de implantar uma nova cultura corporativa numa empresa adquirida havia dois anos fez valer a pena.

“Quando saímos do Brasil, vendemos tudo e partimos sem data para voltar. Uma coisa boa é que minha mulher se envolveu com vários projetos novos, porque não conseguia trabalhar como pedagoga, que era seu ofício no Brasil. Primeiro fez uma ação de empreendedorismo com os alunos da University of Boston, o que lhe fez muito bem. E mais recentemente escreveu dois livros, lançados no Brasil e no México.” Então, nasceu o primeiro filho, mexicano.

Em 2019, Ely assumiu a liderança da empresa no Panamá. “Lá é um lugar fascinante e eu pude colocar em prática todos os meus conhecimentos de gestão. Entendi, de uma vez por todas, que temos que abrir mão do Brasil como única referência de vida. Há vários modos de gerir um negócio, não só o jeitinho.” Ficou um ano no cargo.

A família de Ely morou em cinco lugares diferentes ao longo de sete anos e, com um novo bebê a caminho, ele achou que era hora de dar um tempo no Brasil, daí o sabático. “Mas sempre estou aberto ao novo.”

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