Nos últimos cinco anos, quatro ferramentas de gestão têm despertado interesse crescente nos gestores brasileiros: design thinking, lean startup, canvas do modelo de negócio e storytelling. Tanto a mídia como os programas de educação executiva retratam isso.
São meros modismos ou há uma razão concreta para a tendência, a ponto de se manter na crise? “Essas quatro ferramentas estão tendo espaço cada vez maior em nossas empresas porque vêm cobrir deficiências muito comuns em nossa gestão – em comportamento humano, comunicação, trabalho em equipe e criatividade”, explica Maribel Suarez, professora de pós-graduação em administração do Instituto Coppead, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Historicamente, a formação e a contratação de gestores privilegiam os aspectos técnicos e cartesianos, segundo Suarez. O resultado é seu menor foco em comportamento humano, comunicação, trabalho em equipe e criatividade, áreas hoje consideradas essenciais para o sucesso dos negócios. “É natural que as quatro ferramentas estejam sendo mais valorizadas como forma de compensar tais lacunas”, completa a professora do Coppead.
Porém, como ferramentas, as quatro são pacotes pré-prontos de procedimentos e técnicas, o que sempre gera dúvida: proporcionam a melhor relação custo-benefício para resolver o problema de uma empresa ou seria melhor uma solução sob medida? Fabricantes de bens de consumo, telecoms e varejistas são algumas das empresas que parecem preferir as ferramentas de gestão, uma vez que estão entre as que mais as usam.
Julian Birkinshaw, professor e pesquisador de inovação em gestão da London Business School, também acha que não é preciso reinventar a roda a cada desafio. Contudo, segundo ele, devem ser cumpridas duas condições para uma ferramenta funcionar:
(1) a organização tem de ser criteriosa em sua escolha e implementação e (2) os gestores não podem esperar “vitórias rápidas”. “As pessoas sempre esperam resultados imediatos das novas metodologias, mas raramente estas conseguem entregá-los na velocidade desejada.
Isso acaba criando desânimo e desconfiança, o que dificulta o êxito”, explica Birkinshaw. Alfredo Pinto, diretor da consultoria Bain & Company em São Paulo, que faz a principal pesquisa mundial sobre ferramentas de gestão, alerta que, em um momento como o atual, os executivos tendem a recorrer às ferramentas ansiosos para entregar resultados imediatos e, portanto, deixam de fazer análises criteriosas. “Tempos de crise nunca combinam com medidas desesperadas”, diz.
Para Pinto, ferramentas de gestão podem funcionar se forem incorporadas adequadamente – e de modo complementar. “Nenhuma ferramenta é mais importante que um planejamento estratégico robusto e apropriado para o contexto da empresa”, afirma.
Segundo ele, os gestores têm melhores resultados quando focam estratégias realistas e veem as ferramentas como um dos meios de alcançá-las. José Roberto Ferro, presidente do Lean Institute Brasil, diz que os gestores não podem sair em busca de soluções sem saber exatamente qual problema têm. “O sistema de gestão lean, por exemplo, vai contra a busca incessante de ferramentas; incentivamos que se tenha uma visão ampla da empresa e de seus problemas para só depois, se for o caso, buscar a ferramenta mais simples, eficaz e coerente com isso.”
O estudo Management Tools & Trends, realizado anualmente pela Bain & Co., corrobora que ferramentas de gestão são muito mais eficazes quando fazem parte de um esforço maior da organização. Em sua versão 2015, ele indica que a satisfação geral com as ferramentas é positiva, mas a efetividade, as forças e as fraquezas delas variam imensamente.
> **O que os executivos dizem**
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> Respondida por mais de 13 mil executivos em 70 países de todos os continentes, a pesquisa Management Tools & Trends 2015, da Bain & Co., traz insights valiosos:
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> • A ferramenta mais usada no mundo é o CRM (gestão de relacionamento com os clientes), mas na América Latina é só a quarta.
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> • Na América Latina, a ferramenta de maior uso é o planejamento estratégico, seguida de benchmarking, balanced scorecard, CRM e declarações de missão e visão.
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> • A AL é mais conservadora – e lenta – na adoção de ferramentas.
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> • Também é a região com o menor índice do mundo no uso de SCM – gestão de cadeia de fornecimento (24%), big data analytics (17%), competências essenciais (15%), gestão baseada em tempo (14%), ferramentas de tomada de decisão (4%) e laboratórios de inovação disruptiva (3%).
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> • Design thinking, lean startup, canvas do modelo de negócio e storytelling não são contabilizadas separadamente pela Bain & Co.; aparecem como parte de outras ferramentas.
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> • Na AL, 68% dos executivos creem que os consumidores estão menos fiéis às marcas – é o percentual mais alto de todas as regiões do planeta.
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> • Só 31% dos executivos na AL dizem que as condições econômicas atuais são favoráveis para seu negócio, ante 80% na China e Índia, 61% na América do Norte e 44% na Europa.
**ADOÇÃO CRITERIOSA**
“Muitas vezes, as empresas adotam ferramentas gerenciais só porque estas se tornaram uma convenção do mercado – se os competidores usam, elas usam”, afirma Suarez. Esse é o modo errado de escolher uma ferramenta de gestão. O certo é entender, em profundidade, os gargalos e desafios que a empresa enfrenta para, então, incorporar a solução que os ataque, como diz Ferro. A ausência desse primeiro passo costuma conduzir a quatro erros, que devem ser evitados: (1) esperar que uma mesma metodologia seja a solução para todos os problemas, (2) não entender as limitações e potencialidades da ferramenta, (3) ficar migrando de uma para outra e (4) ir adicionando ferramentas sem um direcionamento. Segundo Suarez, erros assim é que “fazem muitas empresas parecerem Frankensteins na maneira de gerenciar”.
> **Prós e contras, segundo Birkinshaw**
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> O pesquisador e professor Julian Birkinshaw, da London Business School, é um dos maiores especialistas atuais em inovação em gestão. Novas ferramentas gerenciais entram em seu radar antes de se disseminarem, e ele acompanha seu uso pelas empresas com regularidade. A reportagem o questionou sobre as quatro ferramentas que estão mais “em moda” hoje no Brasil:
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> **Design thinking:** “É bem útil para gerar ideias criativas de como melhorar produtos e serviços, mas o risco de ser interpretado muito abertamente é alto: os gestores tendem a usar ‘pensamento do design’ como sinônimo de tudo o que diz respeito a inovação; assim, fazem uma grande confusão”.
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> **Lean startup:** “É relevante ao fazer as empresas olharem para o mercado que querem desenvolver e/ou expandir. No entanto, é guarda-chuva de muitas técnicas, e é preciso ter muito clara a técnica específica que se vai operar”.
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> **Canvas do modelo de negócio:** “Consegue oferecer insights únicos sobre um negócio, mas sua utilidade se dilui em um mercado conforme é empregado em massa (se as concorrentes também usam, os insights são menos originais), e é necessário ter essa limitação em mente”.
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> **Storytelling:** “Contando histórias, as pessoas podem ser mais eficazes em influenciar as outras, nos negócios e na vida, porque mensagens transmitidas em histórias interessantes são de fato memorizadas (e, assim, mais engajadoras)”.
Eles também minam a credibilidade das ferramentas ante os colaboradores e, conforme o relatório da Bain & Co., levam a expectativas irreais quanto a elas e, em consequência, a resultados desapontadores. Um segundo passo obrigatório é adaptar a ferramenta à empresa que vai usá-la.
Embora Pinto observe que muitas multinacionais e companhias de médio e grande portes do Brasil já se preocupam em “tropicalizar” as metodologias de gestão e adaptá-las a sua realidade organizacional específica, isso às vezes é esquecido. E, no caso das organizações de menor porte, a adaptação depende mais da intuição dos principais executivos. Birkinshaw destaca mais dois passos cruciais para uma implementação eficaz:
• O apoio dos níveis mais altos da empresa, com o CEO ficando tempo suficiente para coordenar as mudanças que ela requer e acompanhar os resultados de sua execução.
• A realização de um processo adequado de criação de conhecimento e habilidades necessárias para a adoção da ferramenta, fase que “costuma ser atropelada pelas empresas ”.
Pinto acrescenta que toda ferramenta de gestão tem de parecer suficientemente simples para que um número razoável de colaboradores possa executá-la e interpretá-la. E diz que seu uso exige uma base de dados atualizada e confiável.
**O PAPEL DOS GESTORES**
Ferramentas de gestão podem ser úteis e, ao atacarem um problema real para boa parte das empresas brasileiras, design thinking, lean startup, canvas do modelo de negócio e storytelling passam no primeiro filtro da utilidade. No entanto, como lembra Pinto, nenhuma delas substitui a competência e o discernimento dos executivos.
Birkinshaw concorda e vai além: “Os gestores precisam ter mais confiança em sua capacidade de resolver os problemas”.