Entre os dias 27 e 28 de novembro de 2023, ocorreu o HSM+, o principal evento de gestão e inovação da América Latina. Como curadora desse evento há oito anos, posso apontar muitos momentos memoráveis. (Para citar apenas dois, a conversa entre Michael Phelps e seu técnico Bob Bowman, e a primeira vez de Yuval Harari no Brasil.) Em geral, são os nomes internacionais que ficam na memória dos participantes. No entanto, este ano, foi o painel sobre ESG e brasilidade como direcionadores de negócios com quatro CEOs brasileiros (Ana Paula Bogus, da Havaianas, Estevan Sartoreli, da Dengo; Fábio Barbosa, da Natura; Miguel Setas, da CCR) o que mais repercutiu.
O tom das mensagens que recebi me chamou atenção: a maioria se referia à minha coragem de colocar um painel potencialmente explosivo no palco diante de 3,5 mil líderes. Isso porque era uma conversa necessariamente difícil sobre um tema necessariamente complexo. Fiquei muito feliz com a montanha de feedbacks, mas reflexiva: por que um debate sobre ESG e brasilidade ainda requer coragem em pleno 2023? Há algo de errado não no reino da Dinamarca, mas no reino corporativo.
Sou capaz de entender que evitar conversas difíceis e debates complexos é uma escolha mais confortável. Mas a maioria dos gestores deveria ser capaz de entender o cruel tradeoff envolvido: perspectivas e oportunidades valiosas são perdidas com essa postura.
Sabe uma perspectiva valiosa que o nosso painel de CEOs sobre ESG e brasilidade ainda deu a quem estava presente? O alerta sobre o reducionismo da sigla ESG (de fatores ambientais, sociais e de governança) e seus efeitos perversos. O alerta foi lançado por Miguel Setas, CEO da CCR, e debatido intensamente por todos.
Por exemplo, compararam os conceitos de ESG e sustentabilidade, dizendo que o último é mais abrangente ao englobar as dimensões de pessoas, planeta e lucro no “triple bottom line”, enquanto ESG sofre de simplificação excessiva. A letra G de ESG, que remete a governança, de certa forma, retirou da equação a economia/o lucro. Isso limita a visão holística que havia em sustentabilidade. O desempenho financeiro de uma organização é vital não apenas para sua sobrevivência; ele é vital também para avaliar se sua contribuição para o mundo ao seu redor é positiva ou negativa.
Outro exemplo: a lacuna ética que as três letrinhas reducionistas podem gerar ao pregarem o foco em indicadores mensuráveis. Isso porque, perseguindo métricas específicas, uma empresa perde de vista a complexidade e a interconexão entre fatores ambientais, sociais e de governança. Isso obscurece nuances importantes e pode criar uma visão distorcida da verdadeira contribuição de uma empresa para a sociedade.
O ESG é resultado da nossa busca pelo pragmatismo? Sim. Só que, nessa busca, corremos o risco de ser reducionistas, tropeçar na ética e ignorar desafios amplos a serem enfrentados. Contra isso, é preciso coragem. Como abri parafraseando Shakespeare, com ele fecho: a coragem cresce com a ocasião.