**Vale a leitura porque…**
… no mercado global atual, as empresas estão sendo chamadas a criar produtos e serviços inovadores para usuários, culturas e ambientes cada vez mais diversificados.
… esses desafios de design podem ser tão sistêmicos e complexos que a tarefa de alinhar todos os stakeholders em um projeto às vezes parece impossível.
… com a empatia, ela não é. Se mais pessoas nas empresas se abrirem a uma compreensão emocional profunda das necessidades do usuário, a capacidade criativa para a inovação será destravada.
Nos anos 1970, um jovem desenhista industrial chamado John Stoddard foi contratado pela Moggridge Associates em Londres. Sua primeira tarefa era redesenhar rádios de barcos. No primeiro dia, ele foi mandado a uma cidade pesqueira na costa inglesa para sair com os pescadores em seus barcos e assim entender como eles usavam os rádios. Após a experiência empática, Stoddard voltou para o estúdio acreditando no valor de observar pessoas e seu contexto como parte do processo de design.
Essa abordagem – que Bill Moggridge, cofundador da empresa, depois levou para a Ideo – ofereceu a base inicial de nossa prática de design empático, centrado no ser humano. A partir daí, o escopo de nosso trabalho expandiu-se do design de produtos para inovação digital, estratégia organizacional e desafios de negócios globais. Aprendemos que enfrentar todas essas questões como se fossem problemas de design leva a resultados não apenas funcionais, mas também emocionalmente significativos para as pessoas afetadas. Esse é o design thinking, e a empatia tem papel-chave nele.
Agora, as relações entre consumidores e produtores estão mudando. Empresas de todo o mundo são cada vez mais responsabilizadas pelo impacto social e ambiental de longo prazo que causam, e conversar com pescadores não é mais suficiente para lidar com os desafios.
A influência do trabalho do design vai muito além do mercado, e é hora de a empatia do design se expandir para fornecedores, clientes e o ecossistema inteiro de pessoas e negócios envolvidos. A empatia precisa começar por escalar em toda a empresa, tornando-se uma força mobilizadora que se propague pela sociedade.
**COMO DAR ESCALA À EMPATIA**
Em desafios sistêmicos e complexos, há uma multiplicidade de atores, cujos papéis, necessidades, atitudes, habilidades e expectativas influenciam as exigências de design. Aqui dividimos algumas de nossas abordagens para envolver esses atores e assim fazer a empatia escalar.
**Descoberta progressiva.** Pode ser difícil sentir empatia por pessoas cuja cultura e valores são fundamentalmente diferentes dos seus. Nessas situações, é preciso criar um caminho progressivo de empatia e aprendizado. Foi o que nós, da Ideo, fizemos quando uma empresa norte-americana nos pediu pesquisas sobre a atitude de mulheres chinesas urbanas em relação à contracepção.
Nossos designers perceberam que seria necessário mais do que uma apresentação de slides para que a empresa cliente compreendesse seu mercado-alvo. A solução foi fazer com seus gestores uma viagem de quatro dias de descoberta progressiva, para a construção de empatia.
No primeiro dia, eles acompanharam nossas entrevistas com quatro mulheres chinesas e, com a ajuda de um intérprete, ouviram suas reações surpreendentes quanto a produtos e conceitos.
Os executivos tiveram de fazer um esforço enorme para compreender que sexo é um tabu muito grande na China e entender como a cultura afeta as mulheres e suas escolhas de controle de natalidade.
No segundo e no terceiro dias, nós os levamos para conversar com médicos que praticam aborto em hospitais e com farmacêuticos e até mesmo para visitar um hotel de alta rotatividade em Xangai.
No quarto dia, os clientes estavam prontos a aceitar uma realidade em que há inúmeras normas culturais contra pílulas contraceptivas. Podiam repensar seu produto a partir daí.
**Experiências análogas.** Quando não é viável colocar clientes cara a cara com os usuários no contexto, a Ideo tenta criar experiências análogas para promover a empatia. Elas facilitam envolver grandes grupos no processo de empatia do design e, ao mesmo tempo, não tiram o impacto emocional que observações convencionais forneceriam.
De certo ponto de vista, como esse processo tende a exigir algum esforço dos clientes, as experiências análogas podem ter um poder ainda mais transformador do que a observação passiva das atividades de usuários reais.
Por exemplo, a Ideo trabalhou com um hospital para melhorar a experiência do paciente. Em um primeiro momento, os gestores foram imersos nas atividades cotidianas dos pacientes, mas acharam difícil refletir sobre como estes realmente se sentiam.
Então, desenhamos uma experiência análoga, em que o hospital passou a ser um restaurante onde os fregueses comiam na cozinha em meio aos chefs. (Tínhamos notado que não havia limite entre “acesso público” e “bastidores” no hospital.) Atores fizeram os papéis de garçons, que trataram os gestores-fregueses de maneira incompreensivelmente rápida. Os “fregueses” também foram obrigados a usar babadores pouco lisonjeiros e submetidos a longas esperas sem explicação alguma.
Esse cenário análogo foi extremo e arriscado – nem todos os participantes apreciaram a experiência inicialmente. No entanto, em seguida, veio uma conversa questionadora e, então, a experiência revelou-se extremamente bem-sucedida: os colaboradores do hospital agora procuram ativamente maneiras de melhorar a experiência do paciente de forma mensurável. Seu primeiro sucesso foi acelerar o processo de alta dos pacientes, a ponto de quase 50% poderem sair antes do meio-dia, superando a meta inicial do hospital, que era de 30%.
**Imersão de longo prazo.** Em outro projeto, precisamos garantir que uma companhia farmacêutica fosse verdadeiramente empática quanto ao efeito cumulativo de pequenas inconveniências de sua terapia injetável. Quando os produtos são pensados para resolver grandes problemas, fica fácil ignorar pequenos desconfortos.
Para isso, nossos designers planejaram uma experiência imersiva de um mês para que 35 colaboradores da empresa cliente entendessem as dificuldades causadas por uma droga injetável semanal.
Cada participante levou para casa quatro protótipos com as instruções, bem como o perfil de um paciente cujo papel ele ou ela deveria assumir durante o experimento. Todos teriam de armazenar seus protótipos na geladeira, aplicar-se injeções simuladas uma vez por semana e documentar a experiência.
Semanalmente, nós lhes dávamos vários desafios do cotidiano, como um suco derramado, uma viagem de avião de última hora e assim por diante, e eles tinham de encontrar uma forma de lidar com os imprevistos.
No fim do mês, os clientes foram surpreendidos com quanto haviam aprendido com o exercício. Isso rendeu ideias para melhorar dezenas de aspectos da experiência do paciente, desde a embalagem do produto até instruções para o serviço de atendimento ao cliente. Convencer um grupo tão grande a passar por tal inconveniência nem sempre é fácil, mas a experiência deu à organização um senso de empatia que motivou todos a trabalhar nos detalhes.
**COMO MANTER A EMPATIA**
Quando uma empresa inteira está tentando alterar seu curso para se tornar mais empática e centrada no ser humano, não basta que uma equipe pequena tenha uma experiência transformadora em campo, e simplesmente apresentar ideias para um grupo maior raramente cumpre a promessa. Todos os stakeholders envolvidos precisam ser motivados.
A seguir apresentamos algumas abordagens para manter a empatia em uma organização.
**Contar histórias em estilo de documentário.** Em um esforço para desenvolver a empatia pelos clientes em uma organização global de 30 mil pessoas, a Ideo transformou seus resultados de uma pesquisa em “minidocumentários” a que todos pudessem assistir.
Também desenvolvemos versões dos vídeos para a internet e para apps de smartphone ou tablet, com informações complementares. Logo depois do lançamento, colaboradores do mundo inteiro estavam assistindo aos vídeos e acompanhando os dados.
É muito cedo para dizer qual o impacto desse projeto em longo prazo, mas já foi valioso como experimento no aprofundamento do foco e da empatia com o cliente.
Nós nos vimos apagando as fronteiras entre a realização de uma pesquisa de design e a busca prévia de personagens para um documentário. Há alguns anos, quando trabalhamos na campanha nacional para a prevenção da gravidez na adolescência, criamos o bedsider.org, para ajudar os jovens a encontrar um método de controle de natalidade que funcione para eles. Entre outros recursos, o site compartilha relatos de jovens mulheres em primeira pessoa sobre suas decisões quanto a contraceptivos.
Nossa pesquisa mostrou que as mulheres poderiam ter mais empatia com outras do que com, digamos, uma figura de autoridade. Um tom um pouco atrevido foi o mais eficaz. Então, gravamos vídeos delas falando sobre suas experiências, como fariam com uma amiga, e projetamos o site para que também fosse leve e sincero.
**Incorporar histórias aos dados.** Embora a Ideo coloque a empatia e as histórias reais em primeiro lugar, cada vez mais usamos dados quantitativos para contextualizar nossos insights. O comportamento observado em uma pequena amostra pode ser descartado como uma anomalia ou uma peculiaridade ou, ao contrário, estimular a imaginação da equipe e ter grande peso.
Por exemplo, em um projeto sobre o uso de ferramentas de mídias digitais, uma jovem que dava conta de suas múltiplas responsabilidades usando uma gama de equipamentos diferentes parecia, de início, ser única. Contudo, o lado quantitativo do estudo mostrou que ela realmente exemplificava um segmento inteiro de early adopters.
Adotar essa “abordagem híbrida” combina os melhores aspectos das pesquisas qualitativa e quantitativa: a qualitativa revela as verdadeiras histórias humanas e experiências, e a quantitativa considera o contexto de mercado e o impacto potencial.
Nós, então, incorporamos histórias aos dados e cruzamos percepções emocionais com números para chegar a um ponto de vista mais forte, centrado no ser humano.
**Conduzir clientes a “jornadas viscerais”.** As empresas que não partem de um ambiente empático podem descobrir maneiras de começar a promover a empatia. Por exemplo, uma telecom europeia nos pediu que a ajudássemos a desenvolver uma estratégia centrada no cliente para suas tarifas e, quando começamos a explorar a experiência do cliente, logo nos vimos soterrados por informações.
Chegamos a uma forma física de transmitir a tensão da experiência do cliente que foi poderosa: a equipe construiu uma “exposição da experiência” na Ideo. Levamos os gestores a uma jornada multissensorial, que incluía um “túnel de papelada” literal, dramatizando a experiência do cliente deles.
A compreensão se tornou visceral e, inspirados pelo exercício, eles prosseguiram e construíram um ambiente semelhante em seu local de trabalho. Até agora, já fizeram mais de 3 mil colaboradores passarem por esse angustiante túnel, para ajudar a desenvolver a empatia por seus clientes.
**VIVENDO NO LIMITE**
Devido à crescente complexidade do mundo atual, a empatia precisa envolver um espectro mais amplo de stakeholders e ir além do tempo de um projeto ou das entregas tradicionais.
Cultivar uma cultura de empatia e estendê-la para chegar a mais stakeholders exige mais do que o esforço usual de todos os envolvidos. É difícil dar escala à empatia e mantê-la em grupos grandes e diversificados, mas o esforço compensa, tanto para os indivíduos como para a organização.
**Você aplica quando…**
… assume, entre seus desafios de líder, escalar a empatia e mantê-la.
… utiliza um dos três métodos para escalar a empatia: descoberta progressiva, experiência análoga e imersão de longo prazo.
… adota uma das três abordagens para manter a empatia: contar histórias em estilo de documentário, incorporar histórias aos dados e fazer jornadas viscerais.