Uncategorized

Liderança compartilhada, o modelo de MANDELA

É hora de o líder empresarial descer do pedestal e compartilhar a liderança com sua equipe, como fez o ex-presidente da África do Sul Nelson Mandela | por Joseph A. Raelin
Joseph A. Raelin é professor de gestão e desenvolvimento organizacional da D’Amore-McKim School of Business, da Northeastern University, de Boston, Massachusetts, EUA.

Compartilhar:

Temos despendido tempo demais procurando a liderança no lugar errado. Ela não tem a ver com os líderes em si, com pessoas carismáticas. Refere-se à prática de pessoas que trabalham juntas para materializar as escolhas que fizeram juntas. Diz respeito ao compartilhamento da liderança.

O mundo dos líderes carismáticos não é suficientemente bem–sucedido? Bem, muitos dizem que a raça humana está mais perto da extinção do que em qualquer outro momento da história – e foram nossos líderes que nos fizeram chegar a esse ponto. Dentro das corporações, sobretudo, existe a preocupação de que a visão de cima para baixo dos líderes se tornou muito limitada.

Isso fica evidente quando um executivo como Simon Lloyd, diretor de recursos humanos do Banco Santander no Reino Unido, diz em uma entrevista que, por causa das tecnologias de comunicação, “tentar impor uma estrutura de controle e comando não funciona mais”.

É nítido quando uma executiva como Betsy Sutter, vice-presidente corporativa sênior e responsável pela gestão de pessoas da VMware, afirma que, devido ao rápido ritmo das mudanças, “não se pode esperar conseguir escalar, transformar e vencer se você não estiver criando modelos ágeis. Se as coisas acontecem de cima para baixo, o movimento é lento demais”.

Podemos obter alguns insights para esse novo modelo de liderança com Nelson Mandela (1918-2013), que foi presidente da África do Sul e uma das maiores figuras de nosso tempo.

Ele costumava enfatizar a natureza compartilhada da liderança e ficou conhecido por dar crédito aos outros – quando homenageado por seu papel no fim do apartheid, observou que essa mudança foi um empreendimento coletivo.

Ao contrário do que se pensa, uma das lições mais importantes de liderança que podemos tirar de Mandela foi não sua conquista da liderança, mas a maneira como a compartilhava.

**POR QUE A ABORDAGEM DE MANDELA É DISTINTA**

A abordagem de Mandela sugere uma nova forma de pensar em liderança. Deixa de ser um conjunto de características próprias de indivíduos especialmente dotados e torna-se um conjunto de práticas de pessoas engajadas na materialização de suas escolhas.

Que atividades esse tipo de liderança envolve? As principais são esquadrinhar o ambiente, mobilizar recursos e convidar os outros a participar – tecendo interações entre redes existentes e novas, oferecendo feedback, facilitando a reflexão.

E como desenvolver esse tipo de liderança? Isso exige um treinamento diferente do padrão adotado pelas empresas, que tira os gestores de seu local de trabalho para assistir a sessões que supostamente ensinariam competências de liderança. Se a liderança é uma atividade colaborativa, faz pouco sentido educar indivíduos para exercê-la em um ambiente afastado de onde a liderança precisa acontecer.

Gestores podem aprender competências ou habilidades específicas em sala de aula, mas talvez não as considerem aplicáveis aos problemas reais em seu ambiente de origem. Até a transmissão das melhores práticas pode não dar em nada em sala de aula, uma vez que a pessoa se concentra para valer no ambiente real com a prática real.

O que fazer, então? Descartar o treinamento de liderança? Não, este deve continuar a ser feito, porém combinado com experiências de desenvolvimento formais e informais no ambiente de trabalho, como mentoria de pares, coaching, processo de reflexão em grupo e aprendizado ativo.

**O desenvolvimento**

Se você quer desenvolver liderança em um grupo, precisa encontrar meios de trazer mais do que há de inconsciente para o domínio da consciência e do intencional. Tem de estudar exemplos de fracasso, dissonância, crise e obstrução no local de trabalho ou mesmo surpresas que estimulem a criatividade.

Um dos métodos disponíveis para instigar esse tipo de diálogo reflexivo é o aprendizado ativo, no qual os participantes param e refletem em tempo real sobre problemas que acontecem em seu ambiente de trabalho.

O aprendizado ativo exige que os gestores façam um esforço concentrado para observar e pensar juntos sobre as práticas que têm impacto no resultado final. A multinacional de tecnologia da informação Cisco, sediada na Califórnia, é uma das que já usaram o método, por exemplo.

**CONTRA O DESPERDÍCIO**

A ideia deste artigo não é acabar com os líderes. O que dizemos é que liderar não pode mais se resumir à transferência de instruções “daqueles que sabem” para “aqueles que não sabem”. Em ambientes de negócios que se movimentam rápido, desperdiçar a energia e a criatividade dos condenados ao papel de seguidores não é mais possível.

Precisamos, isso sim, de um modelo de liderança que se autocorrija, no qual os participantes consigam, por conta própria, engajar-se uns com os outros e refletir sobre suas ações para que possam aprender continuamente e melhorar as práticas ainda em andamento.

A liderança é devolvida ao grupo que põe mãos à obra, em vez de se solidificar em torno de um indivíduo que está tomando decisões pelos outros.

Compartilhar:

Artigos relacionados

DNA corporativo: impacto do sistema familiar nos negócios

A história familiar molda silenciosamente as decisões dos líderes, influenciando desde a comunicação até a gestão de conflitos. Reconhecer esses padrões é essencial para criar lideranças mais conscientes e organizações mais saudáveis.

Finanças
Com projeções de US$ 525 bilhões até 2030, a Creator Economy busca superar desafios como dependência de algoritmos e desigualdade na monetização, adotando ferramentas financeiras e estratégias inovadoras.

Paulo Robilloti

6 min de leitura
Tecnologias exponenciais
No SXSW 2025, a robótica ganhou destaque como tecnologia transformadora, com aplicações que vão da saúde e criatividade à exploração espacial, mas ainda enfrenta desafios de escalabilidade e adaptação ao mundo real.

Renate Fuchs

6 min de leitura
Inovação
No SXSW 2025, Flavio Pripas, General Partner da Staged Ventures, reflete sobre IA como ferramenta para conexões humanas, inovação responsável e um futuro de abundância tecnológica.

Flávio Pripas

5 min de leitura
Empreendedorismo
Em um mundo de incertezas, os conselhos de administração precisam ser estratégicos, transparentes e ágeis, atuando em parceria com CEOs para enfrentar desafios como ESG, governança de dados e dilemas éticos da IA

Sérgio Simões

6 min de leitura
Liderança
A Inteligência Artificial está transformando o mercado de trabalho, mas em vez de substituir humanos, deve ser vista como uma aliada que amplia competências e libera tempo para atividades criativas e estratégicas, valorizando a inteligência única do ser humano.

Jussara Dutra

4 min de leitura
Gestão de Pessoas
A história familiar molda silenciosamente as decisões dos líderes, influenciando desde a comunicação até a gestão de conflitos. Reconhecer esses padrões é essencial para criar lideranças mais conscientes e organizações mais saudáveis.

Vanda Lohn

5 min de leitura
Empreendedorismo
Afinal, o SXSW é um evento de quem vai, mas também de quem se permite aprender com ele de qualquer lugar do mundo – e, mais importante, transformar esses insights em ações que realmente façam sentido aqui no Brasil.

Dilma Campos

6 min de leitura
Gestão de Pessoas
O aprendizado está mudando, e a forma de reconhecer habilidades também! Micro-credenciais, certificados e badges digitais ajudam a validar competências de forma flexível e alinhada às demandas do mercado. Mas qual a diferença entre eles e como podem impulsionar carreiras e instituições de ensino?

Carolina Ferrés

9 min de leitura
Inovação
O papel do design nem sempre recebe o mérito necessário. Há ainda quem pense que se trata de uma área do conhecimento que é complexa em termos estéticos, mas esse pensamento acaba perdendo a riqueza de detalhes que é compreender as capacidades cognoscíveis que nós possuímos.

Rafael Ferrari

8 min de leitura
Inovação
Depois de quatro dias de evento, Rafael Ferrari, colunista e correspondente nos trouxe suas reflexões sobre o evento. O que esperar dos próximos dias?

Rafael Ferrari

12 min de leitura