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Marshall Goldsmith: #segueolíder

Confira as lições do mais aclamado coach mundial, que inicia um novo ciclo de expansão dos negócios às vésperas de completar 70 anos

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O astro do basquete Pau Gasol, espanhol que joga na NBA, está sendo adotado por Marshall Goldsmith. O CEO mundial da WD-40, Garry O. Ridge, também. Os dois fazem parte do programa “100 Coaches” em que o coach número 1 do mundo vem treinando 100 pessoas – selecionadas entre as 12 mil que se candidataram – na arte do coaching. E faz isso gratuitamente, com a condição de que passem adiante o conhecimento adquirido. Não é seu único ato de generosidade; autor de 36 livros que venderam mais de 2,5 milhões de cópias em 32 idiomas, Goldsmith está prestes a lançar, pela primeira vez, um livro gratuito na internet, intitulado _Stakeholder Centered Leadership_. “Eu vou colocar o livro online de graça e, se alguém quiser a versão impressa, pagará só US$ 2 por ela”, contou o coach em entrevista exclusiva a **HSM Management**.

As duas iniciativas têm tudo a ver com o momento atual da consultoria Stakeholder Centered Coaching (SCCoaching) e todo o grupo de Goldsmith, de expansão dos negócios. Com uma metodologia bem própria – em que os stakeholders de um líder são os verdadeiros coaches –, internacionalização e mais tecnologia, a empresa aumentou cinco vezes de tamanho nos últimos cinco anos e quer seguir nesse ritmo. Já formou 3 mil coaches e busca chegar aos 10 mil. Uma escalada com um propósito declarado: reverter a baixa qualidade da liderança. 

O programa de adoção e o livro gratuito também são retribuições, diz Goldsmith, pelo que conquistou. Ele é líder do segmento; está há oito anos entre os dez primeiros do ranking Thinkers 50, de pensadores do management; e é um dos coaches favoritos dos CEOs globais – nada menos que 27 CEOs endossaram seu livro Triggers (O efeito gatilho, no Brasil). Recentemente, o prêmio de coaching e mentoring da Thinkers 50 recebeu seu nome. A seguir, Goldsmith e o holandês Will Linssen, seu associado, abordam a relação com coachees e coaches – e o business.

**COACHING COM GARANTIA**

**A definição de coaching da SCCoaching tem dois traços marcantes:** de um lado, é focada em líderes, e só em como impactam os liderados; de outro, o coach atua como um facilitador do processo, não um fornecedor de conhecimento. As pessoas com quem o líder interage (stakeholders) é que são os verdadeiros coaches, porque elas é que dão as ideias de melhoria. Além disso, o coach do grupo costuma atuar B2B e oferecer resultados garantidos (a remuneração só vem após 18 meses, se o sucesso for comprovado) – e, importante, faz uma “peneira” de coachees. Primeiro, ele orienta a empresa a dar coaching apenas aos talentos nos quais acredita; depois, avalia se são de fato treináveis.

**Como tudo começou? Goldsmith recorda:** “Há 24 anos, eu era professor de uma escola de negócios e conheci um consultor famoso que tinha dois compromissos no mesmo horário e perguntou se eu poderia substituí-lo em um. Ele disse que eu ganharia US$ 1 mil em um dia, em uma época em que eu ganhava US$ 15 mil por ano, e respondi: ‘Posso tentar’. O que fiz foi um programa de treinamento para uma empresa de seguros de vida em Nova York. Trabalhando com treinamentos, fui abordado por um CEO com um pedido: ‘Tem um menino que trabalha para mim e é jovem, esperto, dedicado, mas um imbecil. Seria maravilhoso se mudasse de comportamento. Falei: ‘Talvez eu consiga ajudá-lo. Posso trabalhar com ele por um ano e, se ele melhorar, você me paga. Se não, é de graça’”. (Segundo Linssen, o jovem Marshall viu um empreiteiro negociar assim com seu pai e se inspirou.) Ao longo dos anos, o coach foi “inventando” seu processo.

**O processo de Goldsmith tem quatro etapas:** avaliação de coachability, foco, feed forward e follow-up. Na primeira, o coach precisa entender quão treinável é o líder. Em geral, isso resulta de uma combinação de coragem (entende que não há conforto na mudança?), humildade (leva sugestões alheias a sério ou não?) e disciplina (vive reclamando e arrumando desculpas ou age?). O próprio coachee deve avaliar em que medida está disposto a mudar, em uma escala de 1 a 10. “Como o coachee será cobrado por seu comprometimento em um ano, ele acaba sendo realista”, diz Linssen. Também deve-se investigar se o coachee tem objetivo, foco e resiliência – “eu escolho ser bem-sucedido, eu quero ser bem-sucedido, e serei bem-sucedido”.

A etapa do foco de mudança é definida pelos stakeholders, em uma avaliação 360 graus. Cinco perguntas são feitas a um grupo de 5 a 20 pessoas, entre liderados, gestores e pares: (1) quais as forças do coachee em seu comportamento como líder? (2) em que áreas precisa melhorar? (3) em que ambiente ele se mostra melhor? (4) em que ambiente ele piora? (5) se você fosse seu coach ou mentor, que mudanças sugeriria?

Isso feito, o coach monta um business case sobre as mudanças potenciais do coachee, estimando custos (tempo, paciência, confiança e dinheiro) e benefícios. O hiperfoco é recomendado – ou seja, a escolha de uma única mudança comportamental a implementar. Assim, a taxa de sucesso é de 95%. 

A terceira etapa é o feed forward, que funciona muito melhor do que o feedback com pessoas de sucesso, voltadas ao futuro. O líder deve pedir às pessoas sugestões do que fazer nos 30 dias seguintes, como por exemplo ouvi-las e agradecer sem julgar. E, por fim, o coach faz o follow-up com os oito mais importantes stakeholders para saber se houve melhora, com o cuidado de fazer as pessoas realmente pensarem nisso.

**Quais são os problemas comportamentais dos  líderes atendidos?** Em geral, giram em torno de querer acertar e vencer o tempo todo – problemas de ego. E os CEOs são os coachees mais difíceis nesse aspecto. “É muito difícil parar de fazer isso; é um comportamento enraizado. Só que, quando se torna CEO, você precisa parar de fazê-lo; nessa etapa, as pessoas que você gerencia sabem mais do que você em suas áreas”, diz Goldsmith, que atende CEOs do mundo inteiro, mas nunca treinou um brasileiro. Outra situação dolorosa é o coaching da transição de fim de carreira. Goldsmith já fez seis programas para aposentar CEOs e lembra um depoimento: “Trabalhei tanto, para meus filhos não precisarem trabalhar. Foi um erro – tirei a ambição deles”. 

Linssen acrescenta que as novas competências do líder do século 21 também são pontos de atenção. “Quão bom o líder é em colaboração e parcerias, por exemplo? Mandar era fácil, mas gerir parcerias é complexo”, comenta. “Há cinco diferenças do líder atual: duas delas são ter de gerir parcerias e ser um facilitador mais que um chefe. Outras são ter pensamento global, lidar com diversidade intercultural e entender o impacto da tecnologia sobre o negócio”, diz Goldsmith. 

Linssen acrescenta que os coaches da empresa também têm trabalhado com os líderes o desafio de lidar com o “fenômeno da porta de vidro”, a transparência, em que os subordinados expõem os bastidores da empresa e das relações a todos e não têm mais a mesma lealdade ante a oferta de emprego de um rival. 

**A remuneração ocorre só depois do follow-up final, passados 18 meses.** O preço é premium pelo baixo risco em relação aos resultados. Mas há a possibilidade de um processo mais curto, em que o coachee pague menos. “O processo leva tempo, porque assim dá para garantir a mudança sustentável; ninguém no mercado acompanha o coachee tanto tempo quanto nós”, afirma Goldsmith. Tempo é importante para ele, aliás – uma de suas promessas costuma ser a de que o cliente não perderá tempo.

**ESCALANDO COACHES**

**A certificação de coaches do grupo tem 32 horas de duração, divididas em duas etapas.** A primeira é o e-learning, em que as pessoas aprendem em vídeos sobre como funciona o processo e têm de responder a perguntas. Depois, há um workshop de quatro dias de treinamento. “O treinamento online é a compreensão intelectual, como a prova teórica do exame para carteira de motorista, enquanto o workshop é a prova prática”, compara Linssen. 

Formados, os coaches podem usar aplicativos de celular e portal na internet para se manter atualizados. “Uma vez certificados, os coaches têm acesso à biblioteca do Marshall Group, com vídeos, podcasts e ferramentas que podem ser baixadas”, acrescenta o head de operações internacionais. A assinatura é barata e o português é um dos nove idiomas disponíveis. 

**Quatro anos atrás, o grupo lançou também a certificação de coaches 100% online, mais barata que a outra.** Nela, a segunda etapa é uma versão online do workshop presencial, em tempo real. Reúne 15 ou 20 pessoas no workshop de dez países diferentes – umas aprendem com as outras. “Então, os alunos vão para um grupo separado, no qual fazem uma sessão de prática de coaching e nós monitoramos isso com tecnologia.” Esse programa já corresponde a 50% da demanda do Marshall Group. 

**Os programas de certificação também ensinam aos coaches como administrar seus negócios, em termos de marketing e vendas.** E o coach aprende a montar um portfólio de clientes com prazo mais longo e mais curto, combinando o pagamento baseado em resultados com o pagamento à vista, para garantir seu fluxo de caixa. 

A certificação em liderança global, também oferecida pelo Marshall Group, acaba sendo outra ferramenta de venda para os coaches por seguir uma abordagem do tipo Netflix. Antes, o grupo cobrava entre US$ 500 por certificado. Agora, o processo é online, com versão em português também, e o certificado, gratuito. Quem faz pode ficar usando a ferramenta de assessment, pagando uma assinatura que dá direito a um determinado número de acessos. “O coach pode ir a um cliente potencial e dizer: ‘Posso fazer isso de graça’”, diz Linssen. 

**Como os coaches lidam com o pagamento baseado em resultados?** Alguns ficam ansiosos, e a orientação do executivo do Marshall Group a eles é direta: “Digo: não transforme o que é um problema seu em problema do cliente. Se acredita em seus serviços, você pode garantir os resultados”. 

**A pergunta mais cabeluda nesses tempos de boom, porém, é Goldsmith quem responde: é possível uma pessoa inexperiente ser um coach efetivo?** “Sim. Um de nossos melhores coaches não tem background na área; ele só segue o processo. Se você seguir o processo, as pessoas melhoram.” Outra lição enfatizada por Goldsmith diz respeito à escolha do cliente: “O que aprendi foi que, no meu método, a variável-chave para meu sucesso não sou eu, são meus clientes. Se eu escolher os clientes certos, eu ganho. Se escolho o cliente errado, nunca vou ganhar”, atesta, do alto de seus cabelos brancos. 

**O NEGÓCIO E A MISSÃO**

**O Marshall Group é liderado por uma rede de quatro pessoas:** o próprio Goldsmith, Linssen, Chris Coffey e Frank Wagner (os dois, na América do Norte). Linssen gerencia Europa, Ásia, Austrália e América Latina a partir de Hong Kong. No Brasil, atuam desde meados de 2017 com o business partner Márcio Silva, que já era coach. “Somos bem empreendedores e o Márcio viu isso”, diz Linssen. Mas os parceiros não são a tônica no mundo. A expansão se faz sobretudo com tecnologia. 

**A internacionalização foi iniciada em 2012**, com a visão de Goldsmith de ter 10 mil coaches espalhados pelo mundo para alavancar a eficácia da liderança em toda parte. Hoje, os 3.000 certificados estão em cerca de 200 cidades de 54 países.

**A expansão é encarada como uma missão humanitária.** “Afinal, quanto mais nós e nossos coaches fazem coaching, mais as pessoas ganham dinheiro e mais todo mundo tem uma vida melhor”, explica Linssen, que sempre enfatiza o fato de as pessoas amarem a sexta-feira e odiarem a segunda. 

“Aprendi com um médico na Índia que é possível melhorar o mundo e ganhar dinheiro ao mesmo tempo; ele criou o maior e mais acessível sistema de saúde do mundo para erradicar a cegueira”, diz. Pela lógica do healthcare, 70% das pessoas recebem ajuda de graça, financiadas pelos 30% que pagam, porque podem. Isso gera alta qualidade a custo baixo. “E nós temos filosofia similar: quem pode paga e, para os outros, criamos formas gratuitas – ou quase – de adquirir conhecimento, como o e-book grátis que sairá, o programa ‘100 Coaches’, os conteúdos de mídias sociais (Goldsmith é influencer do LinkedIn) e até os livros vendidos”, observa Linssen. 

A prova de que isso é também uma missão ainda está em se conformarem que seu método seja usado ilegalmente na China, como vem ocorrendo. “Não precisamos ganhar dinheiro com tudo, precisamos de fluxo de caixa para sustentar nossa missão.” 

**Os livros de Goldsmith puxam mesmo o cordão.** Ele já emplacou três na lista de best- sellers do New York Times: What Got You Here Won’t Get You There, Triggers e Mojo – muito pouca gente pode dizer o mesmo. E está trabalhando em mais quatro atualmente. Seus livros, além disso, costumam ser bem-escritos. Goldsmith montou um processo de produção com padrão de qualidade, como, aliás, fez com a formação de coaches e com o processo de coaching. “Eu não escrevi nenhum deles. Meu amigo Mark Reiter é quem escreve os livros, na maioria. Eu falo, ele escreve. Tenho ótimas ideias”, diz, sem cerimônia. 

O que Goldsmith também tem é faro para o sucesso. Triggers aprofundava a ideia dos hábitos ruins e bons; Mojo abordou uma força interior positiva que todos podem cultivar. Leading Your Own Life deve ter o mesmo apelo. Este ano, ele lançou How Women Rise, escrito com Sally Helgesen. Não que o coaching de mulheres deva ser diferente (o processo não varia nem por gênero, nem por país, garante). Mas há o padrão de auto-sabotagem feminino precisa ser reconhecido. “A mulher muitas vezes sacrifica a carreira por seu emprego. Esforça-se o dobro para aumentar a qualidade da entrega de 95% para 99%, em vez de aceitar os 95% e dirigir esforços para cuidar da própria carreira”, diz. “Além disso, a mulher também tem mais chances de se apaixonar por sua equipe e, assim, não querer ser promovida.” As mulheres são um alvo precioso: 50% do público de coachees e 50% do de coaches. 

Os livros são uma alavanca para o grupo conseguir certificar dez mil coaches em 25 anos. Mas isso cumprirá a missão? Linssen diz que sim e explica: “As empresas [da Fortune 500] têm cerca de 27 milhões de funcionários. Se os coaches do Marshall Group ajudarem a melhorar o comportamento dos 10% principais, muita gente vai voltar a gostar da segunda-feira. 

A VIDA É BOA, MAS…

Talvez por ser um budista em San Diego, talvez por ter nascido no Kentucky, Marshall Goldsmith irradia “mojo”. Ele aceita, por exemplo, que em tudo há um lado bom e um ruim, e não tenta ficar consertando o ruim. “Já entendi que não me chamo Jesus Cristo e que não consigo ajudar quem não quer ajuda”, explica. Ele é bem resolvido em relação à concorrência – “um professor meu, Paul Hersey, me ensinou a usar definições. Eu tenho minha definição de coaching e não digo que é a única possível; você pode definir de outro jeito”. Ele tampouco pretende ser um especialista em gestão de empresas. “Ter um pouco de conhecimento de uma área é perigoso. Se você não for um especialista, é melhor admitir. Minha especialidade é ajudar líderes de sucesso a fazer mudanças positivas de comportamento – só isso.” E Goldsmith vira amigo para toda a vida de muitos coachees. 

Mas tem uma coisa de que esse guru não gosta: o “mas”. Como qualquer jornalista, usei a palavra umas dez vezes durante a entrevista, e ele me interrompeu em todas. “Fiz o mesmo com seu colega do New York Times. Sou um coach mau! [risos]” Entrevistas são feedbacks, a seu ver, e o feedback ao outros deve ser positivo. O “mas” desmereceria o que o interlocutor falou. Aliás, Goldsmith nem é fã de feedbacks, relativos ao passado; prefere olhar o futuro – feed forward.

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