Uncategorized

Muito além das batalhas meritocráticas

Para vencer as dificuldades de formar líderes, as empresas devem relembrar o papel e a força dos ritos tribais e incorporá-los, em vez de promover uma guerra de todos contra todos
Sócia-fundadora da Symballéin, especializada em gestão de ativos intangíveis, e coordenadora do núcleo de estudos de sustentabilidade em gestão da FGV.

Compartilhar:

Já reparou que as dificuldades de formação de líderes sempre reaparecem nas empresas? Tanto o bom técnico promovido à gestão continua com dificuldades para assumir seu papel na relação com as pessoas como o gestor com experiência tem dificuldades de desenvolver, em seu novo time, uma coalizão orientada para a missão da organização. Ambas as dificuldades podem ser ainda maiores nos casos de fusões e aquisições, quando a empresa perde a identidade conforme perde o contato com a saga corporativa –suas histórias de lutas, superações e vitórias. Em companhias resultantes de fusões e aquisições, os registros históricos são de fluxos de capital que dão origem a alianças desprovidas de rostos e de lutas. Vínculos se constroem em batalha, pressupõem uma história comum, o compartilhamento de dores e alegrias, levam tempo, condições de que poucas corporações dispõem atualmente. O conceito de “cultura organizacional” pretende substituir essa cola, mas um excesso de racionalidade rouba-lhe a força. O fato é que, na formação de lideranças, esquecemo-nos dos ritos e de sua importância. Nas organizações humanas, ritos de passagem têm papel-chave na dissolução de identidades anteriores e na consolidação de novas; proveem o suporte para que o indivíduo descubra como construir seu lugar nas relações sociais que se estabelecem. Em outras palavras, eles apoiam a construção do novo status e papel de um indivíduo e o ajudam a achar um novo lugar naquele mundo, além de atualizar a história do grupo. Pense no que acontece quando um indivíduo assume um novo papel na sociedade, como quando 

deixa de ser solteiro para casar-se. O rito do casamento se consolida após seis estágios prévios: 

1. o cortejamento, em que a pessoa seduz outra; 

2. o período de namorar, no qual se estuda se a escolha foi a mais adequada; 

3. o período de afastar-se do estágio anterior –o noivado, quando não se é mais solteiro, nem se é casado, e há tempo para se preparar para as responsabilidades futuras; 

4. a despedida de solteiro, na qual a ruptura com o estágio anterior se confirma; 

5. o rito público em si –o “sim” e a festa, em que se aceita o novo status publicamente; e 6. a reintegração, em que se é recebido no grupo dos casados.  

Na empresa, um rito de passagem para ser um novo líder requer seis estágios similares: 

1. a luta para ser reconhecido como um talento; 

2. a participação em processos de preparação para a sucessão, em que se avaliam o compartilhamento dos valores e a qualidade da relação; 

3. a definição como sucessor de um líder; 

4. a ruptura com a atividade e o grupo dos técnicos ou gestores anteriores; 

5. o momento em que a responsabilidade por outras pessoas vira o foco de sua agenda; e 

6. a aceitação de novas responsabilidades e a capacidade de sentar-se com outras pessoas (como antes sentavam-se em torno da fogueira) para deliberar sobre as formas de enfrentar os desafios. 

Sem ritos, os indivíduos que poderiam ser os novos líderes de uma organização ficam solitários, em uma guerra de todos contra todos, em batalhas “meritocráticas” desprovidas de sentido. Quem seria líder acaba por virar mercenário em busca de lucros rápidos e fáceis.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Calendário

Não, o ano ainda não acabou!

Em meio à letargia de fim de ano, um chamado à consciência: os últimos dias de 2024 são uma oportunidade valiosa de ressignificar trajetórias e construir propósito.

Empreendedorismo
Um guia para a liderança se antecipar às consequências não intencionais de suas decisões

Lilian Cruz e Andréa Dietrich

4 min de leitura
ESG
Entre nós e o futuro desejado, está a habilidade de tecer cada nó de um intricado tapete que une regeneração, adaptação e compromisso climático — uma jornada que vai de Baku a Belém, com a Amazônia como palco central de um novo sistema econômico sustentável.

Bruna Rezende

5 min de leitura
ESG
Crescimento de reclamações à ANS reflete crise na saúde suplementar, impulsionada por reajustes abusivos e falta de transparência nos planos de saúde. Empresas enfrentam desafios para equilibrar custos e atender colaboradores. Soluções como auditorias, BI e humanização do atendimento surgem como alternativas para melhorar a experiência dos beneficiários e promover sustentabilidade no setor.
4 min de leitura
Finanças
Brasil enfrenta aumento de fraudes telefônicas, levando Anatel a adotar medidas rigorosas para proteger consumidores e empresas, enquanto organizações investem em tecnologia para garantir segurança, transparência e uma comunicação mais eficiente e personalizada.

Fábio Toledo

4 min de leitura
Finanças
A recente vitória de Donald Trump nos EUA reaviva o debate sobre o protecionismo, colocando em risco o acesso do Brasil ao segundo maior destino de suas exportações. Porém, o país ainda não está preparado para enfrentar esse cenário. Sua grande vulnerabilidade está na dependência de um número restrito de mercados e produtos primários, com pouca diversificação e investimentos em inovação.

Rui Rocha

0 min de leitura
Finanças
O Revenue Operations (RevOps) está em franca expansão global, com estimativa de que 75% das empresas o adotarão até 2025. No Brasil, empresas líderes, como a 8D Hubify, já ultrapassaram as expectativas, mais que dobrando o faturamento e triplicando o lucro ao integrar marketing, vendas e sucesso do cliente. A Inteligência Artificial é peça-chave nessa transformação, automatizando interações para maior personalização e eficiência.

Fábio Duran

3 min de leitura
Empreendedorismo
Trazer os homens para a discussão, investir em ações mais intencionais e implementar a licença-paternidade estendida obrigatória são boas possibilidades.

Renata Baccarat

4 min de leitura
Uncategorized
Apesar de ser uma ferramenta essencial para o desenvolvimento de colaboradores, o Plano de Desenvolvimento Individual (PDI) vem sendo negligenciado por empresas no Brasil. Pesquisa da Mereo mostra que apenas 60% das companhias avaliadas possuem PDIs cadastrados, com queda no engajamento de 2022 para 2023.

Ivan Cruz

4 min de leitura
Tecnologias exponenciais
A inteligência artificial (IA) está revolucionando o mundo dos negócios, mas seu avanço rápido exige uma discussão sobre regulamentação. Enquanto a Europa avança com regras para garantir benefícios éticos, os EUA priorizam a liberdade econômica. No Brasil, startups e empresas se mobilizam para aproveitar as vantagens competitivas da IA, mas aguardam um marco legal claro.

Edmee Moreira

4 min de leitura
ESG
A gestão de riscos psicossociais ganha espaço nos conselhos, impulsionada por perdas estimadas em US$ 3 trilhões ao ano. No Brasil, a atualização da NR1 exige que empresas avaliem e gerenciem sistematicamente esses riscos. Essa mudança reflete o reconhecimento de que funcionários saudáveis são mais produtivos, com estudos mostrando retornos de até R$ 4 para cada R$ 1 investido

Ana Carolina Peuker

4 min de leitura