Um garçom que trabalha para uma família milionária é atropelado enquanto anda de bicicleta e o responsável foge. Essa é a trama básica do filme italiano _Capital humano_, que parece, à primeira vista, um filme de suspense sobre quem atropelou o rapaz e como escapará da punição. No entanto, conforme o enredo evolui, diferentes perspectivas vão sendo apresentadas, e quem era inocente passa a ser culpado, e quem era vilão ganha alguns tons de vítima.
Mais ou menos a mesma linha é abordada no filme O _filho do outro_, em que duas crianças nascem sob um bombardeio e são trocadas na maternidade – a palestina é entregue à família israelense e vice-versa. Quando o jovem supostamente judeu precisa servir o Exército e descobre que seu sangue não é compatível com o dos pais, a confusão vem à tona, e, com ela, um drama sobre as diferenças e as perspectivas diferentes. O que fazer quando você descobre que pertence ao grupo a quem tanto criticava?
Exibo aqui meu lado cinéfilo, porque estou convencido de que multiplicar perspectivas nunca foi tão importante como agora, em todos os fronts, incluindo o empresarial. Não é possível trocar de família judia para uma muçulmana para ver o que o outro enxerga, como no segundo filme, mas há uma maneira de fazer isso: exercitando a empatia. Em especial no caso da liderança, não há como um líder liderar sem se colocar no lugar dos outros, sem entender que há pontos de vista diferentes do seu, sem aceitar que seu ponto de vista não é um retrato fiel da realidade.
Muitas vezes, na loucura do cotidiano, esquecemos esse “detalhe”. Mas o líder Jeff Bezos, por exemplo, não esqueceu. Não esqueceu em 2015, quando o _New York Times_ publicou uma matéria sobre como sua empresa colocava a inovação e o desempenho acima do bem-estar de seus funcionários, e ele a compartilhou com os funcionários abrindo seu e-mail para queixas. Recebeu todas, leu e, um ano depois, anunciou mudanças significativas. Agora, foi empático de novo: anunciou um aumento salarial que beneficiará 350 mil colaboradores, usando três palavras: “Ouvimos nossos críticos”. Entendeu as perspectivas alheias.
A escritora nigeriana Chimamanda Adichie, no famoso TED em que ela fala sobre o perigo da história única, explica que existem muitos pontos de vista possíveis em uma mesma realidade. E a inteligência artificial e o big data estão nos mostrando, cada vez mais, que cada pessoa é só um “pedaço” desse mosaico de individualidades que o mundo atual permite existir. Cada perspectiva é resultado da visão pessoal, moldada por experiências de vida, valores, estado de espírito e muito mais. E é de nossa natureza termos nossa perspectiva e negar as dos outros.
Só que negar os outros é uma rua sem saída para a evolução, para a eficiência e para a inovação. Multiplicar perspectivas é do seu melhor interesse. O consultor e coach Steffan Surdek sugeriu, na Forbes, como fazer isso. O primeiro passo seria observar o que você pode aprender com as visões alheias. Você pode tomar decisões melhores? Comunicar-se melhor? Identificar uma vantagem de saída é um drive. Outra ação é avaliar quão ampla (ou estreita) é sua perspectiva. Também vale a pena ter em mente que não é para julgar; nenhum ponto de vista é certo ou errado em si; ele apenas molda como respondemos a uma situação.
Inspire-se no cinema e em Jeff Bezos, e pergunte-se: se você fosse acolhesse diferentes perspectivas, quais seriam os resultados? E se o Brasil fosse generoso com a multiplicidade de perspectivas?