> **Saiba mais sobre Luiz Biagiotti e a Outbrain**
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> **• Quem é:** Country manager da Outbrain no Brasil e professor-pesquisador licenciado da ESPM-SP.
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> **• A Outbrain:** Criada em 2006, a empresa norte-americana fornece um software adaptado a esse tipo de estratégia. A ferramenta é utilizada por publicações nacionais e internacionais, como Folha de S.Paulo e The Guardian, e canais de mídia como Editora Globo, ESPN, CNN, Fox News.
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> **• O mercado:** Segundo a projeção do eMarketer, os gastos com mídia programática display nos Estados Unidos devem ser de US$ 57,35 bilhões em 2019, 84,5% de todo o investimento em mídia digital.
Sabe quando você lê uma notícia na internet e, ao chegar ao fim da matéria, encontra um conteúdo com a sua cara? Pois essa curadoria, que também pode aparecer em formato de vídeo, geralmente é feita por inteligência artificial (IA): a partir dos dados dos usuários, os algoritmos são treinados para comprar mídias levando em conta a afinidade entre seus leitores e o conteúdo a ser veiculado– seja ele um conteúdo de marca, seja um anúncio publicitário.
Como consumidores, já estamos nos acostumando com a chamada publicidade programática, ou marketing programático, que vem crescendo aceleradamente nos últimos anos. Mas, como gestores, em que medida entendemos todas as suas características e implicações?
Essa compra programática de mídia – que pode chegar ao consumidor como mensagem direta ou aparecer dentro de marketplaces – divide-se em categorias. Há o marketing programático do tipo display – em que a publicidade é claramente separada do conteúdo a sua volta. Nos EUA, esse modelo já movimenta quase US$ 47,4 bilhões ao ano, correspondendo a 82,5% de todos os investimentos em publicidade digital. Anunciantes como a Amazon são grandes players de programática display e grandes DSPs (sigla em inglês para as plataformas de demanda) dominam o mercado, como OpenX e MediaMath. A alternativa ao tipo display é a publicidade nativa, que se mistura com o conteúdo de um marketplace e cresce muito no universo mobile. Destacam-se players como Outbrain e Taboola.
No Brasil, a compra programática de mídia ainda tem muito o que crescer. Atualmente, o segmento responde por 22,5% do mercado de publicidade digital, segundo os últimos dados disponíveis do IAB Brasil – Interactive Advertising Bureau.
De modo geral, marketing programático tem sido visto como o futuro do marketing, tanto que os investidores vêm fazendo muitas apostas em DSPs como a MediaMath, que recebeu um aporte recente de US$ 225 milhões da empresa Searchlight Capital Partners.
Porém, esse tipo de marketing ainda está longe do consenso. Muitos creem, por exemplo, que viola a privacidade. Nesta entrevista, Luiz Biagiotti, country manager no Brasil da Outbrain, adtech especializada em publicidade nativa, fala das tendências no setor, de desafios como a privacidade e a transparência no uso de dados pessoais, e do papel das agências publicitárias nesse contexto. “Como em todo negócio que cresce rápido, é preciso fazer ajustes, sobretudo em relação a normas e regras de uso”, diz ele.
> **Programático é o futuro**
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> _Por Fernando Juarez e Cris Silva, da Media Math_
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> O uso de dados e de inteligência artificial no marketing, o que se convencionou chamar de marketing programático, está ganhando cada vez mais proeminência no Brasil e no mundo. Um número crescente de anunciantes coloca o consumidor no centro de suas iniciativas de marketing, fazendo com que todo o ecossistema se baseie nas decisões e nas preferências desse consumidor para conectá-lo com as marcas e criar experiências positivas para ele.
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> A nosso ver, o marketing programático se torna, dia após dia, o caminho ideal para o mercado publicitário fazer um tipo de marketing que atenda às demandas tanto do consumidor como do anunciante. Com ele, acabam as campanhas digitais genéricas e intrusivas, e o sistema ganha eficiência. Os anúncios passam a ser menos intrusivos, o que agrada o consumidor, e mais assertivos, o que é bom para o anunciante.
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> O que é fazer marketing programático? Significa que você utiliza uma plataforma de tecnologia para realizar a compra de mídia em diversos veículos. A tecnologia programática, usada para targeting e segmentação de audiência, não é uma estratégia, mas pode ser uma parte-chave de um plano de publicidade digital. Ela surgiu em 2007 para facilitar a compra e a venda de espaços publicitários, com mais praticidade e com a negociação do melhor preço – quase como se fosse uma negociação de bolsa de valores, mas feita entre máquinas.
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> Como se confere eficiência de uma campanha de marketing programático? Uma equipe de profissionais acompanha o interesse que determinada peça desperta nos consumidores em tempo real. E aí vem a melhor parte: como a tecnologia permite negociar a compra de um anúncio em milissegundos, no acompanhamento ela pode fazer ajustes que aumentem as chances de alcançar o cliente certo, no momento certo, com as táticas corretas – além de evitar que a marca apareça em páginas não ligadas ao interesse da empresa, como sites de violência, fake news etc.
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> E como fica a privacidade no programático? Desde o escândalo Facebook-Cambridge Analytica, o uso de dados no meio publicitário tem recebido muita atenção. A forma que os governos europeus encontraram para lidar com isso foi o já famoso GDPR, sigla em inglês que designa um conjunto de leis sobre privacidade e proteção de dados pessoais, aplicável a todos os indivíduos da União Europeia, onde quer que estejam. Mas a regulamentação não deve ser vista, de maneira alguma, como um obstáculo para o programático, e sim como um desafio – vai ajudar os players a se desenvolverem e tornarem o marketing ainda menos intrusivo e mais amigável ao consumidor.
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> O programático é o futuro do marketing.
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> **Fernando Juarez** é managing director da região Latam da Media Math, DSP líder mundial em mídia programática. **Cris Silva** é director account lead no Brasil.
**A publicidade digital é quase um terço do mercado e cresce 25% ao ano. Ela se consolidou?**
Sem dúvida. O digital se transformou em uma enorme plataforma de mídia, com inúmeros players e agentes . E a tendência é continuar crescendo, tanto no Brasil quanto no exterior. Na América Latina, de acordo com a consultoria eMarketer, o avanço anual será de pelo menos dois dígitos nos próximos três ou quatro anos – muito acima da inflação e do próprio investimento no mercado publicitário. Na Inglaterra, mais da metade do mercado publicitário já está no digital.
**De onde vem o investimento em marketing digital?**
Há duas grandes vertentes. A primeira é uma realocação de verbas: olhando para o share dos diferentes meios, é notória a perda de investimento da mídia tradicional, como jornais, rádio e TV, e o crescimento substancial da publicidade na internet.
A outra vertente é representada pelos novos anunciantes. Antes, era difícil para uma pequena padaria comprar espaço publicitário – na TV ou no rádio. Hoje, o empreendedor dessa padaria ou de qualquer outro ramo pode fazer uma ação de comunicação nas plataformas digitais que quiser, de onde quiser e por quanto tempo quiser. Comparada com a das grandes marcas, a verba desses entrantes é menor, claro. Mas ajuda a aumentar o tamanho do bolo.
**O marketing programático, ao que parece, é ainda mais alvissareiro do que o marketing digital…**
Não tenha dúvida. Em 2016, a participação da publicidade programática dentro da publicidade digital no Brasil era de 16,5%. No ano seguinte, isso já tinha subido para 22,5%. Como estamos no começo do ano [a entrevista foi concedida no fim de janeiro de 2019], ainda não temos os resultados de 2018. Mas a percepção geral é a de que continuou crescendo. Tem empresa que já investe 100% dos recursos em compra programática.
Isso prova que o uso massivo de dados pessoais já é crucial para a economia.
**Como a Outbrain mergulhou nessa onda digital?**
A Outbrain surgiu há mais de dez anos como uma plataforma de distribuição de conteúdo digital, não publicitário. Naquela época, era baixo o incentivo de um site de notícias para que os leitores continuassem navegando pelo portal. O usuário não experimentava o conteúdo chegando até ele na forma de recomendação customizada e personalizada. A Outbrain tornou isso possível.
Do ponto de vista do leitor, a experiência não chega a ser disruptiva, embora produza resultados interessantes. Já pelo lado dos publishers, nossa ferramenta permite a oferta de conteúdo significativo, aumentando o engajamento com os leitores, a permanência deles no site e o número de páginas acessadas – que são métricas relevantes na mídia digital.
**Mas hoje ela também faz publicidade programática…**
Exatamente. Também fazemos recomendação de conteúdo de marca por meio de algoritmos e dados; essa é outra forma de monetização que a Outbrain oferece. Nosso conjunto de algoritmos tenta a todo instante entender o perfil de consumo de conteúdo nos sites em que o software está instalado. Isso nos permite conhecer os temas mais relevantes para cada leitor.
O anunciante pode especificar um ou mais perfis de leads – submetendo-os à plataforma para rodar a campanha –, e a nossa ferramenta automaticamente otimiza a entrega conforme esses perfis. Além disso, nós só usamos o modelo de CPC [custo por clique], ou seja, a marca só paga quando o usuário clica no anúncio. Isso faz com que a eficiência da campanha seja maior para ele – o que é outro diferencial nosso em comparação com outras plataformas de recomendação programática, as DSPs.
**Como é que se faz para inovar em uma iniciativa que já é uma inovação?**
Quando a gente questiona a inovação, as respostas dependem da perspectiva de cada agente. O leitor necessita de novos formatos de conteúdo, de experiências mais agradáveis e intuitivas, ao passo que os anunciantes precisam desenvolver novas ferramentas de segmentação e serviços. Empresas como a
Outbrain têm a obrigação de criar cada vez mais soluções nesse sentido. Estamos focados em fazê-lo.
**Como tudo que envolve dados, há tensão em relação à preservação da privacidade das pessoas. Qual é sua posição a respeito?**
No universo publicitário, qual é a linha que separa o útil – que é de interesse do cidadão – daquilo que é invasão de privacidade, feito sem consentimento? Essa é uma questão quase filosófica. Quer a gente queira ou não, nossa vida está no digital. E o uso de dados se tornou básico em qualquer campanha publicitária. No entanto, é preciso distinguir sobre quais dados estamos falando. Publicidade baseada em dados não significa unicamente a extração do dado individual, da pessoa física. Existe outra camada com dados mais genéricos e ao mesmo tempo relevantes para as marcas, como hábitos de consumo do usuário na internet e de conteúdos de interesse. É importante essa distinção, porque o uso de dados é um assunto sensível.
Minha posição é que, quanto mais o tempo passa – e mais sofisticadas as ferramentas ficam –, mais relevante é a elaboração de políticas reguladoras para proteção, captação e tratamento dessas informações. Vimos isso acontecer com o GDPR (marco regulatório da União Europeia, aprovado em 2016) e o Brasil seguirá pelo mesmo caminho (sancionada no ano passado, a Lei de Proteção de Dados no Brasil será aplicada a partir de 2020).
**Quais são as lições já aprendidas com o GDPR?**
Pelo fato de a Outbrain ser uma empresa global, acompanhamos de perto o mercado europeu. As empresas, de modo geral, foram se adaptando gradativamente em relação à transparência – algumas mais rápidas e estruturadas do que outras. A mesma coisa tende a acontecer no Brasil até 2020. Nossa lei não é muito diferente da europeia. Só não acho que as normas vão se consolidar em apenas um ano. Esse processo terá uma característica bem dinâmica.
Entretanto, mesmo com o GDPR, a falta de transparência em relação ao uso de dados pessoais ainda é motivo de debate na Europa. Nos últimos anos, muitas empresas recolheram os dados pessoais de forma errada. E isso fez a questão da privacidade virar um nó conceitual difícil de desatar. Se o meu celular captar dados de localização para me informar a previsão do tempo ou quanto vou demorar no trânsito, tudo bem, acho esse serviço bem-vindo. O nocivo é o uso dos meus dados para coisas que não são do meu interesse – ou para manipular a minha opinião sobre determinado tema. Por isso é preciso uma ampla discussão.
**Quando fala em manipulação, o que você quer dizer?**
Toda comunicação, de certa forma, busca manipular o processo de decisão – seja para estimular a compra de um produto, seja para adotar um comportamento, seja para convencer de uma ideia etc. Isso aconteceu no passado, e acontece hoje. Ocorre que a quantidade de dados pessoais aumentou muito, permitindo que pessoas e empresas mal-intencionadas se apropriem de estratégias digitais para manipular e até mesmo interferir em grandes questões, como eleições e plebiscitos. Daí a importância de haver regulação. Não dá para tratar as plataformas digitais como seres autônomos, que não se sujeitam a normas e regras do mercado.
**Existe um código de ética para o programático?**
Há um código de boas práticas. Tem essa questão do uso de dados, que passa a ser melhor regulado e seguirá tendo novas leis e normas, mas também tem conceitos relativos à experiência. Se um usuário entrar num site para ver o preço de um sofá, os algoritmos vão captar esse lead e os anunciantes interessados vão tentar, via publicidade digital, oferecer sofás para ele. Mas por quanto tempo o produto aparecerá na tela do usuário? Se o sofá perseguir o leitor por seis meses, isso vai aborrecê-lo. Não dá para bater no mesmo ponto além do necessário.
Essa é uma preocupação da mídia tradicional que precisa ser resgatada na mídia digital. O desafio é entendermos como melhorar a cobertura, a frequência, o impacto e o material das campanhas.
**Como o usuário tem reagido do outro lado da tela?**
Gosto de conversar com pessoas que não são do mercado para entender a percepção delas. O consumidor que não pertence à área da comunicação geralmente não faz ideia do que seja mídia programática. Ele tende a reagir positivamente e acha interessante que uma ou mais ofertas de sofás apareçam enquanto navega na internet, sentindo que a mensagem lhe é sob medida. E isso o agrada.
**O marketing programático pode levar À concentração de mercado?**
Sem dúvida. Tem players muito fortes que já dominam o mercado global – uma fatia de 50% a 60% está com eles. No Brasil, há quem afirme que o monopólio na publicidade programática seja ainda maior, na casa de 80%. Então, existe uma tendência de concentração.
No entanto, todo mercado nasce superpulverizado e, com o tempo, vive essa seleção natural que caminha em direção à centralização. Mas, para mim, a concentração é mais um motivo para termos normas e regras bem definidas.
**Como você é professor licenciado da ESPM, pergunto: até que ponto o digital e o programático vão matar as agências?**
Eles constituem um desafio às agências e às funções que esses players mantêm no processo de comunicação. No digital, grande parte das plataformas permite intermediação direta. Ou seja, a padaria compra a mídia sem o intermédio de uma agência de propaganda. Essa já é uma realidade.
Outra ameaça é o conceito criativo da comunicação. Até o surgimento das mídias digitais, não dava para medir tudo. Você tinha uma ideia relativamente boa de que tal mídia dava tal resultado “x” ou melhorava a percepção de marca, mas não havia 100% de certeza. Com o arcabouço de tecnologia das mídias digitais, é possível medir quase toda a jornada do consumidor, desde o momento em que ele viu a publicidade até a compra no carrinho. E isso fez a comunicação ficar muito focada em métrica, oferta e produto. Perdeu-se um pouco a questão do conteúdo, do apelo publicitário.
**Então, uma agência ainda é vital? ou não?**
A meu ver, é. Vivemos um ponto de inflexão, mas entendo como crucial o papel da agência dentro da cadeia da comunicação. A comunicação não pode passar a ser tratada como commodity, ela merece o mesmo nível de atenção dos dados.