Estratégia e Execução

O coreógrafo & o executivo

O renomado coreógrafo Wayne McGregor conversa com Nikesh Arora, um dos principais executivos do Google, sobre a alquimia das forças antagônicas dos processos criativos

Compartilhar:

> **Saiba mais sobre Wayne McGregor**
>
> **Quem é:** britânico, coreógrafo residente do The Royal Ballet, um dos mais inovadores de nossos tempos, que prega a mistura das artes. 
>
> **Sua companhia:** diretor da Wayne McGregor | Random Dance. 
>
> **Quem encenou suas peças:** Paris Opera Ballet, San Francisco Ballet, Stuttgart Ballet, New York City Ballet, English National Ballet, National Ballet of Canada etc. 
>
> **Fora da dança:** dirigiu o movimento de filmes (como Harry Potter e o Cálice de Fogo), óperas (como no Scala de Milão) e videoclipes (como Lotus Flower, do Radiohead).

**Nikesh Arora:** O Google encoraja a criatividade empregando pessoas realmente inteligentes e procurando não inibi-las. E buscando ter opiniões diferentes ao redor da mesa. Isso não é uma questão apenas de diversificar raça, cor ou gênero; é diversidade de opiniões. A última coisa que quero são pessoas esperando que alguém lhes dê a resposta. No processo criativo tem de existir conflito. Por isso dizemos: “Não contrate pessoas iguais a você”. 

**Wayne McGregor:** Noto que trabalho melhor onde há um pouco de tensão, onde não há empatias imediatas, onde as ideias demoram para emergir. Diversidade é importante também para meu trabalho. O processo coreográfico é um fantástico exemplo de cognição distribuída: alguém compartilha uma ideia, outro pega um aspecto dela e leva em uma direção diferente. Isso, entre bailarinos, compositores, geógrafos, cientistas, antropólogos… 

**Arora:** Às vezes, estamos trabalhando em uma ideia para atingir um objetivo que, no fim, não alcançamos, mas geramos três ideias importantes no meio. 

**McGregor:** O truque é ter algum caminho inicial para facilitar o surgimento de uma ideia, mas, quando esta surge, temos de começar de novo. 

**Arora:** É o sutil equilíbrio entre estrutura e criatividade. É preciso estimular o debate, porém não debate demais, porque temos de fazer acontecer. 

**McGregor:** Para mim, isso tem a ver com jogar em equipe. Em um espaço seguro onde a experimentação é o esperado, você assume riscos, falha algumas vezes, mas vai construindo a igualdade intelectual necessária. 

**Arora:** Penso na gestão da criatividade como uma espécie de gestão do caos. Por nossa experiência, o ingrediente-chave para gerenciar o caos é ter pessoas muito inteligentes e criativas e mantê-las excitadas e apaixonadas pelo que fazem. 

**McGregor:** As pessoas têm de ser criativas e curiosas. A curiosidade é chave também. Você não tem de encontrar essas pessoas; elas é que devem encontrá-lo. Não é para convencer um bailarino; é para aproveitar o curioso que procura você. 

**Arora:** Sim, porque o curioso sempre tenta uma abordagem diferente. Também procuramos pessoas que escolheram um caminho específico na vida e o perseguiram, apesar de quaisquer pesares. Contratamos um patinador artístico olímpico por isso. Ele teve de abrir mão de beber, teve de acordar todos os dias às 4 da manhã e praticar por três horas antes de ir para a escola, e tudo isso nos indicou que ele era um realizador. 

**McGregor:** Coreografia é também 80% psicologia, porque é sobre obter o melhor das pessoas. Sou sensível às energias que estão em uma sala e bom em mudar sua dinâmica, redirecionando o trabalho para onde há mais energia, para capitalizá-la. 

**Arora:** As ideias evoluem no Google de modo darwiniano. Uma boa ideia atrai mais pessoas que querem trabalhar com ela. Mais pessoas se entusiasmam e, então, mais massa crítica se desenvolve. À medida que crescem, as ideias obtêm recursos e apoio. 

**McGregor:** As tecnologias digitais têm ocupado parte significativa da minha vida. Estou interessado em como aplicar a tecnologia no próprio processo criativo, não em seu uso no palco. Nos últimos dez anos, trabalhamos com neurocientistas para descobrir e mapear certos aspectos da inteligência sinestésica e fomos construindo um software que pensa corporalmente. Se eu colocar um problema para um bailarino –por exemplo, fazer o deslocamento físico para trás–, posso pôr o mesmo problema no software. A tecnologia resolve a questão do jeito dela e o bailarino do dele, a gente compara e surgem opções de movimentos que não teríamos descoberto de outra maneira. Outro exemplo é o trabalho que fazemos em San Diego na captura do processo coreográfico completo, ao vivo e em tempo real. Crio uma coreografia em condições de laboratório e a tenho capturada por dez câmeras. Os cientistas cognitivos analisam cada decisão no processo e oferecem insights sobre a evolução criativa da peça. Isso leva a novas direções. 

**Arora:** Tecnologia realmente é um facilitador fenomenal… 

**McGregor:** E, por meio da tecnologia internet, posso interagir com um bailarino jovem na África com um contexto cultural diferente do meu. Essa troca é muito rica. 

**Arora:** O mais difícil é tirar as pessoas da zona de conforto. 

**McGregor:** É o que tento fazer no Royal Ballet: construir um caos administrado.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Organização

A difícil arte de premiar sem capitular

Desde Alfred Nobel, o ato de reconhecer os feitos dos seres humanos não é uma tarefa trivial, mas quando bem-feita costuma resultar em ganho reputacional para que premia e para quem é premiado

ESG
Adotar o 'Best Before' no Brasil pode reduzir o desperdício de alimentos, mas demanda conscientização e mudanças na cadeia logística para funcionar

Lucas Infante

4 min de leitura
Tecnologias exponenciais
No SXSW 2025, a robótica ganhou destaque como tecnologia transformadora, com aplicações que vão da saúde e criatividade à exploração espacial, mas ainda enfrenta desafios de escalabilidade e adaptação ao mundo real.

Renate Fuchs

6 min de leitura
Inovação
No SXSW 2025, Flavio Pripas, General Partner da Staged Ventures, reflete sobre IA como ferramenta para conexões humanas, inovação responsável e um futuro de abundância tecnológica.

Flávio Pripas

5 min de leitura
ESG
Home office + algoritmos = epidemia de solidão? Pesquisa Hibou revela que 57% dos brasileiros produzem mais em times multidisciplinares - no SXSW, Harvard e Deloitte apontam o caminho: reconexão intencional (5-3-1) e curiosidade vulnerável como antídotos para a atrofia social pós-Covid

Ligia Mello

6 min de leitura
Empreendedorismo
Em um mundo de incertezas, os conselhos de administração precisam ser estratégicos, transparentes e ágeis, atuando em parceria com CEOs para enfrentar desafios como ESG, governança de dados e dilemas éticos da IA

Sérgio Simões

6 min de leitura
Tecnologias exponenciais
Os cuidados necessários para o uso de IA vão muito além de dados e cada vez mais iremos precisar entender o real uso destas ferramentas para nos ajudar, e não dificultar nossa vida.

Eduardo Freire

7 min de leitura
Liderança
A Inteligência Artificial está transformando o mercado de trabalho, mas em vez de substituir humanos, deve ser vista como uma aliada que amplia competências e libera tempo para atividades criativas e estratégicas, valorizando a inteligência única do ser humano.

Jussara Dutra

4 min de leitura
Gestão de Pessoas
A história familiar molda silenciosamente as decisões dos líderes, influenciando desde a comunicação até a gestão de conflitos. Reconhecer esses padrões é essencial para criar lideranças mais conscientes e organizações mais saudáveis.

Vanda Lohn

5 min de leitura
Empreendedorismo
Afinal, o SXSW é um evento de quem vai, mas também de quem se permite aprender com ele de qualquer lugar do mundo – e, mais importante, transformar esses insights em ações que realmente façam sentido aqui no Brasil.

Dilma Campos

6 min de leitura
Uncategorized
O futuro das experiências de marca está na fusão entre nostalgia e inovação: 78% dos brasileiros têm memórias afetivas com campanhas (Bombril, Parmalat, Coca-Cola), mas resistem à IA (62% desconfiam) - o desafio é equilibrar personalização tecnológica com emoções coletivas que criam laços duradouros

Dilma Campos

7 min de leitura