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o Executive Branding e a nova economia

Em alta, o personal branding dá origem a uma nova geração de gestores que personificam marcas corporativas

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To be or not to be in the social networks? Se o bardo William Shakespeare escrevesse Hamlet nos dias atuais, seria bem possível que sua famosa frase ganhasse o complemento acima. Provavelmente seria dita por um executivo. E a caveira em sua mão talvez tivesse uma logomarca. A razão é simples: cada vez mais, empreendedores e executivos estão personificando as marcas de suas empresas. Por quê? De um lado, tem havido uma queda insistente no nível de confiança nas instituições, segundo os relatórios de confiabilidade da Nielsen. De outro, cada vez mais, “pessoas confiam em pessoas”, como destaca Ilana Berenholc, sócia da Ilana Berenholc Presença Executiva. Não é à toa que o personal branding está vivendo uma explosão nos últimos dois anos.

O resultado é que algumas empresas começaram a investir em programas de executive branding para reforçar seu lado humano no mercado e fazer, segundo Berenholc, com que mais consumidores se identifiquem com elas. Empreendedores e profissionais liberais também vêm praticando o personal branding. 

O desenvolvimento de marcas pessoais associadas a empresas é um movimento global, e bem claro: a espanhola Saffron Brand Consultants projeta aumento na demanda de empresas com planos de desenvolver as marcas pessoais de seus principais executivos, como presidentes, CEOs e membros do conselho de administração. A agência considera a tendência inevitável, e crucial para o sucesso nos dias atuais, por conta da exposição cada vez maior das companhias. No Brasil, Arthur Bender, CEO e estrategista de marcas da Key Jump e da Selling, também vê nas corporações uma preocupação com as marcas pessoais de seus gestores, mas as iniciativas nesse front ainda são incipientes – ao menos, são mais preventivas do que estratégicas. 

O grande apelo do personal branding é os executivos tirarem as conversas do terreno exclusivo dos negócios e “falarem de coisas de que a sociedade quer falar, como problemas a resolver”, pontua Bender, autor do livro Personal Branding: Construindo sua marca pessoal. Sofia Esteves, fundadora da Cia de Talentos, exemplifica o executive branding com Theo van der Loo, ex-presidente da Bayer. O modo como Van der Loo lutou por diversidade e igualdade de oportunidades dentro de sua empresa fortaleceu muito a marca corporativa. Alguns exemplos nacionais da nova geração de fundadores, que representam sua marca e também uma filosofia de vida para os clientes são Rony Meisler, do Grupo Reserva, Rogério Salume, da Wine.com.br, e Henrique Bredda, gestor do fundo Alaska Black. São pessoas que usam sua reputação como forma de projetar conexão e proximidade, impregnando o business de significado. “Isso é muito importante numa sociedade de produtos cada vez mais comoditizados numa competição ruidosa em que é vital que se consiga entregar algo maior e com mais significado que somente os produtos e serviços que produzem”, avalia Bender. 

Porém o risco de fazer isso é grande. Se a marca depender tanto de seu líder a ponto de não conseguir transcendê-lo, ficará em apuros. “A Votorantim,  por exemplo, conseguiu transcender a ausência do Antônio Ermírio e continuar crescendo, graças a um processo muito cuidadoso de sucessão”, analisa Jaime Troiano, da Troiano Branding. Mas nem todas as empresas sobreviverem a seus líderes porta-vozes. Para Troiano, é preciso atentar para a volatilidade dos executivos – um CEO fica, em média, dois a três anos na posição de liderança. “E nessas mudanças, não é somente uma pessoa que sai; vai embora uma forma de gerir a empresa.” Ele também recomenda tomar cuidado para “não criar uma personalização narcisista da empresa. Até porque existe também o employee branding: em geral, as pessoas gostam de trabalhar num ambiente em que todos representam algo diante do mercado, em uma empresa que dependa menos de um grande herói solitário e muito mais de um conjunto de colaboradores”. Bender completa: “Em uma sociedade envidraçada onde todos somos vigiados, a exposição pessoal em demasia gera um permanente grau de risco aos negócios”. Ou seja, se a pessoa derrapar em alguma atitude, a empresa derrapa junto.

Por todas essas razões, o branding de executivos deveria, na opinião de Bender, ser tratado nos conselhos com mais responsabilidade. “O caráter das empresas, que as vezes é o reflexo do caráter do líder, acaba atraindo gente semelhante num círculo que pode ser virtuoso, saudável e inspirador ou tóxico, arrogante e belicoso. E isso se torna a cultura da organização.”

> **Gestores ou influenciadores, eis (outr)a questão**
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> Pessoas são marcas e marcas tentam ser pessoas – ou se aproximar de suas características humanas. Essa é a opinião do comunicador Marc Tawil, que não tem dúvida de que o personal branding veio para ficar e este ano lança o livro Seja sua própria marca, para tratar disso do que ele chama de “mindset de marca”. “É uma mentalidade que nos convida a pensar e agir de acordo com nossos atributos e, com isso, deixar nossa marca no mundo. Todos nós temos uma marca. Nascemos com ela. Mas apenas alguns ‘criam’ uma nova marca, isto é, desenham o mundo de possibilidades que desejam vivenciar. Ao ter isso lapidado e vivido em plenitude, conseguem transcender e inspirar outros ao seu redor. São pessoas que se notabilizam não pelo que têm, e sim por quem são”, observa ele, que é head da Tawil Comunicação, número 1 entre os LinkedIn Top Voices.
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> A questão a decidir é como o personal branding se estende a uma empresa, se por meio de seu presidente e/ou por influenciadores. O mercado de business influencers está amadurecendo e, agora, entende melhor os pré-requisitos para que um terceiro possa ajudar. Por exemplo, compreende-se que ter milhares de seguidores não adianta nada se a pessoa, na vida real, não lida com negócios, como avisa Tawil. Entende-se que deve haver um alinhamento entre a marca do influenciador e a marca que o contrata – em termos de cultura, valores, posicionamento, reputação e propósito. Entende-se que o alinhamento vale para a alegria e para tristeza, ou seja, no caso de uma crise da marca corporativa, o business influencer tem de ser corresponsável pelo que acontece.
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> Qual é o trabalho do business influencer em nome de uma marca corporativa? Produzir textos, vídeos e áudios que divulguem produtos, serviços, novidades e a cultura organizacional da empresa parceira. E divulgar esse material em suas redes sociais. Pelo menos é assim que Tawil atua para empresas como Nespresso, Credita e SAP. “O mais importante é que a parceria seja ganha-ganha-ganha-ganha: precisam sair ganhando as empresas, a audiência, o mercado e eu. Se não for assim, não vale a pena.”

> **Uma Perspectiva histórica**
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> Década de 1990, Estados Unidos. Duas companhias aéreas começam a brigar por um slogan. Kurt Herwald, CEO da Stevens Aviation, desafia o icônico Herb Kelleher, fundador da Southwest Airlines, a uma queda de braço pelos direitos de uso. Diante de um ginásio lotado em Dallas, com cobertura da mídia, mantos à la UFC e comissárias de bordo como cheerleaders,  “Smokin’ Herb” e “Killer Kurt” lutam. Herwald vence, mas deixa a Southwest usar o slogan. Os US$ 15 mil de bilheteria são doados para a caridade, pois a publicidade obtida já fez tudo valer a pena.
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> Kurt Herwald e Herb Kelleher são exemplos perfeitos de executive branding, segundo o especialista no tema, Arthur Bender. Outros nomes históricos são citados por ele, como Howard Schultz, da Starbucks, e Richard Branson, Virgin Group. No Brasil, ele aponta Assis Chateaubriand, criador de um dos maiores impérios midiáticos do século passado, Jorge Gerdau, Antônio Ermírio de Moraes, Abilio Diniz, Samuel Klein e Ricardo Semler. 

**COMO CRIAR E GERIR A MARCA PESSOAL**

O primeiro passo para o personal branding, de executivos representando a marca corporativa ou a si mesmos, é o profundo autoconhecimento, como ensina o professor da ESPM-SP Higor Gonçalves. Veja um possível roteiro:

1. Busque o entendimento claro e profundo em relação a quem você é, onde está e aonde pretende chegar. Identifique os pontos fortes e seus diferenciais, defina o valor a ser gerado para os outros e o modo como todos esses elementos serão comunicados. Identifique também os pontos fracos.
2. Procure a visão do observador –amigos, colegas, familiares, clientes etc. –, para saber como você é percebido. Compare sua visão com a do observador para descobrir a verdade.
3. Defina seu conjunto de propósitos, construa o planejamento estratégico pessoal e coloque em prática um plano de ações alinhado a seus objetivos de carreira. Ao vincular sua marca pessoal à marca corporativa, tenha a certeza da sinergia de valores entre ambos.

> **Princípios do personal branding**
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> Quando o especialista em gestão Tom Peters falou a primeira vez sobre cada um “ser seu próprio CEO” e “ter sua própria marca”, o ano era 1990 e não existiam redes sociais.  Em 1997, ele “criou” o termo personal branding, que define como “pessoas que comercializam a si mesmas e suas carreiras como marcas”. Mas foi só mais recentemente, com mídias como Facebook, Instagram, Twitter e LinkedIn, que houve a “explosão de personal branding”, catalisado pelas redes sociais. “Vivemos num mundo com menos hierarquia, mais colaborativo e humano, então queremos nos relacionar com alguém. Só que esse alguém administra a relação com seu público por meio da gestão de sua marca”, diz Ilana Berenholc, que investiga esse assunto há quase 20 anos.
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> Segundo o jornalista e consultor Higor Gonçalves, professor da ESPM, as pessoas usam as mesmas técnicas de comunicação e marketing utilizadas na divulgação de marcas de produtos. Ele compartilha alguns princípios, que também servem ao executive branding:
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> * Entregue valor para as outras pessoas: resolva problemas e deixe claro como poderá ser útil e relevante em suas vidas. 
> * Encontre seu espaço e seu público.
> * Seja coerente; é o que gera confiança.
> * Seja autêntico; garanta que a marca esteja baseada em sua essência.
> * Entenda que a gestão de marca pessoal não é algo temporário. Ela exige um trabalho constante, com metas de curto, médio e longo prazos.
> * Evite armadilhas, como tentar agradar a todos, copiar os outros, mentir ou omitir sobre características e competências que não possui, a incoerência de comportamentos no mundo on e offline.
> * Lembre que postar nas mídias sociais é o fim do processo, nunca o início. 

**O CASO CRIS ARCANGELI**

“A vida inteira estive à frente das minhas marcas e das empresas em que trabalhei, desde 1990.” Essa é Cristiana (Cris) Arcangeli, empresária serial, que criou a Phytoervas, a Phyta, a PH – Arcangeli, a Eh e a Beauty’In, sendo hoje CEO desta última e sócia do fundo de venture capital Phoenix, com participações em diversas startups. Antes mesmo de as redes sociais existirem, ela já era a cara das marcas e quem falava por elas. “Sempre fiz esse papel. Eu represento aquilo em que eu acredito, o que eu faço e as marcas que coloco no mercado. Minha credibilidade assina tudo isso”, completa.

A criação de sua marca pessoal, conta ela, não foi planejada; foi acontecendo organicamente, em conjunto com seus negócios. “Todas as minhas marcas foram muito inovadoras. Sempre expliquei o que era, porque estava criando aquilo, o que eu queria dizer com elas. Uma coisa foi puxando a outra.”

Nem mesmo hoje Arcangeli recorre a alguma técnica formal de branding; só segue seu feeling. E garante não ter qualquer receio de fazer algo que vá afetar a marca corporativa. “Pelo contrário, acho que o que eu faço só ajuda as marcas”, diz ela, que também é mentora da Endeavor, diretora da Fiesp – CJE/Pequenas e Médias Empresas e professora do curso de MBA da PUCRS, além de ser um dos tubarões do programa de TV Shark Tank Brasil. 

Para Arcangeli, estar presente nas mídias sociais é fácil, basta fazer e falar só aquilo em que acredita. “Eu me posiciono bastante diante das coisas, o que deixa transparente quem eu sou. A verdade é boa porque a gente nunca esquece e nem se confunde”, explica. 

A empresária faz um post por dia em cada uma das mídias em que está presente, com exceção do Twitter, que usa pouco. Entre os temas abordados estão comportamento, moda, fitness, mas também fala de economia, últimas notícias, lançamento de livros. Conta com seguidores no Instagram (cerca de 812 mil, no fechamento deste texto) e no Twitter (175 mil), além de 344 mil curtidas no Facebook e 37 mil conexões no LinkedIn.

Ajuda para escrever só mesmo nos stories, que têm frequência de postagem maior. A própria Arcangeli define os conteúdos, com base no que aborda em dois boletins diários em rádio, de dois minutos cada, exibido há 15 anos na Alpha FM – e que, antes, ficou outros 15 anos na Rádio Eldorado. Uma equipe desenvolve e aprofunda a pauta e passa para ela postar.

O que Cris Arcangeli recomenda ao leitor de HSM Management? “Sua empresa tem que ser a continuidade da sua essência. A empresa tem que espelhar o que você acredita. Quanto mais verdadeiro você for, mais você se conecta com seu produto e seu consumidor. Não basta lançar um produto para um mercado que está bombando; se você não está conectado a ele é bem difícil que o sucesso aconteça, porque nem a verdade e nem a conexão estarão lá.”

**O CASO TIAGO ALVES**

O CEO da Regus & Spaces Brasil, Tiago Alves, tem seu perfil nas redes sociais totalmente vinculados às marcas da empresa de coworking e escritórios flexíveis. Quando assumiu o cargo, quase cinco anos atrás, a Regus, que fatura quase R$ 500 milhões e está no Brasil há 25 anos, era low-profile. Então, fez uma pesquisa de mercado e 1% dos entrevistados conhecia coworking e um número menor ainda conhecia a marca Regus, que tem mais 40 mil escritórios no País.

Contrariando as orientações globais, ele mesmo começou a produzir conteúdo para as mídias sociais, porque o material que vinha em inglês não fazia sentido localmente. “Comecei a colocar minha cara no mercado, não só como executivo da empresa, mas tentando mostrar as vantagens dos escritórios flexíveis, os espaços de coworking”, conta ele. No início, em 2016, eram 15 a 20 visualizações. Clientes começaram a se envolver e passaram a aparecer nas postagens de Alves, que também passou a mostrar seu dia a dia. “A coisa foi ganhando corpo, fui ganhando seguidores, criando uma base, fui incentivando meus funcionários a fazer o mesmo e foi tracionando.”

Na matriz, em Luxemburgo, não entendiam essa cultura de mídia social brasileira, a cultura de postar. Em 2018, globalmente, ela decide tirar a autonomia de todos os países de ter páginas locais, só haveria a global. “Apesar de entender os motivos da companhia, aquilo foi um iceberg no meio do caminho, e tivemos que nos reinventar.”

Foi quando Alves começou a postar conteúdo sobre escritórios compartilhados em seu perfil pessoal. Se, antes, menos de 1% da demanda para a empresa vinha de mídias sociais, isso saltou para 10% no início de 2019 e para 30% em 2020. 

No início de 2019, a empresa lançou um ranking global no LinkedIn para os 11 mil funcionários no mundo, que mostra o nível de engajamento com ferramentas,  posts e interações. Alves está em primeiro lugar – a soma dos pontos do segundo até o décimo colocados não bate a pontuação dele. “Hoje a visibilidade do meu perfil é três vezes maior do que a da marca global”, diz o CEO. 

O jogo se inverteu e o marketing da matriz da empresa, que é listada em bolsa e presente em 126 países, agora se inspira no que a filial brasileira faz, procurando Alves para que compartilhe notícias globais e tratando as mídias sociais de modo muito mais estratégico. Hoje, 40% do tráfego de mídias socias da Regus global é brasileiro, e metade disso (ou seja, 20%) das visitas ao site da companhia é creditado ao CEO do Brasil. Pessoalmente, Alves tem 18 mil seguidores no Instagram e 40 mil no LinkedIn. Recebe, em média, 100 inquiries por dia, 10% qualificados para o envio de proposta.

Em seus canais pessoais, as postagens vão dos filhos, do cachorro e dos hobbies até notícias sobre trabalho flexível, inovação, conteúdo que vem de fora, novas tecnologias e networking. Para reconhecer um funcionário, faz isso online, assim como qualquer ação social em nome da empresa. 

Detalhe: Alves também fala dos erros. “Não seria honesto não falar.”

Ainda em dúvida? Higor Gonçalves coloca números no branding pessoal, comparando-o ao corporativo tradicional: “Bill Gates possui 24,3 milhões de fãs; a Microsoft soma 9,8 milhões”.

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