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O jogo dos 7 erros da transformação digital

Especialistas destacam as iniciativas que podem colocar sua empresa no futuro e ensinam a evitar os desvios existentes no caminho.
Adriana Salles Gomes é diretora-editorial de HSM Management.

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Seres do futuro entram em uma máquina do tempo e vêm nos dar pistas sobre seu mundo. Talvez não seja assim que acontece, mas o futuro realmente parece estar deixando sinais no presente: os carros autônomos testados em cidades da Finlândia, Suécia, Alemanha, Reino Unido, França, Suíça, Itália, Espanha, Grécia, Singapura, Japão, China e Estados Unidos; as lojas sem funcionários dos EUA, Grécia eFinlândia, só com sensores; as derrotas de Lee Sedol para o programa de inteligência artificial AlphaGo no complexo jogo Go etc. Qual é o recado? Os seres humanos serão substituídos pelas máquinas e os povos do futuro pedem socorro?

 Na visão de Silvio Meira, cofundador do Cesar Instituto de Inovação e presidente do conselho do Porto Digital, o futuro está nos dizendo que a internet atingiu sua maturidade e que, de agora em diante, como ocorre com toda plataforma madura (a eletricidade, os carros), provocará uma destruição criativa em rede, modificando vários aspectos da vida humana. Em janeiro, Meira se juntou, em Recife (PE), com Teco Sodré, investidor da Ikewai e especialista em marketing digital, e com Marcelo Tas, influenciador digital e estudioso da internet, para ministrar uma imersão de três dias sobre como fazer a transformação digital, o curso SeLiga Digital. Seu pressuposto é de que as empresas brasileiras, que deveriam ser protagonistas da mudança, estão atrasadas e com concepções erradas sobre o digital. **HSM Management** cobriu o evento e lista os mitos e a realidade.

**EVITE OS DESVIOS**

**MENTIRA 1.** SE SUA EMPRESA NÃO FOR SEXY, O DIGITAL IMPORTA MENOS. 

Se o leitor comparar fotos das duas últimas cerimônias de nomeação de papa no Vaticano, em 2005 e 2013, como fez Teco Sodré, ficará chocado: na primeira, vê-se um mar de gente; na segunda, um mar de celulares. Se o salto foi grande nesse intervalo de oito anos, de 2013 para 2017, o número mais que triplicou: de 1,5 bilhão para 5 bilhões de aparelhos. Mesmo com essa penetração do digital, ainda há muitas empresas no Brasil que não acreditam no impacto dessa plataforma em seus negócios –  seja porque não são tech ou “da moda”, seja por estarem em um país periférico e relativamente pouco globalizado.

Essas empresas erram ao ignorar que há um ponto de inflexão digital em todos os setores econômicos no mundo inteiro. Segundo uma pesquisa feita pela Microsoft, para 4% dos negócios, incluindo a indústria de mídia, essa inflexão já ocorreu – antes de 2010 até. Em 24% dos setores, ela teve vez entre 2010 e 2016. Para 56%, vem ocorrendo neste exato instante – entre 2017 e 2020. E só em 16% dos setores isso virá depois de 2020 (embora venha de qualquer modo).

As boas práticas de negócios ensinam que quem não se antecipa ao ponto de inflexão de seu setor é engolido por ele. Como fazê-lo? Segundo Meira, o caminho é montar um modelo de negócio de fácil percepção, baixo custo e alto retorno potencial, uma rede de valor com escalabilidade e riscos mensuráveis, e usar tecnologias sofisticadas que simplifiquem a experiência de uso pelos clientes.

Há diferentes formas de o digital adicionar valor. Você pode ser:

• Apenas apoiado pelo digital, mantendo produtos e serviços físicos e cadeia de valor tradicional. Exemplo: agronegócio.

• Enquadrado pelo digital, tendo produtos e serviços digitais e cadeia de valor tradicional. Exemplo: telecoms.

• Empoderado pelo digital, com produtos e serviços físicos e cadeia de valor digital. Exemplo: varejo.

• Naturalmente digital, com produtos e serviços digitais e cadeia de valor digital. Exemplos: empresas de tudo como serviço (software, serviços de streaming de áudio e vídeo etc.).

Caso a empresa opte por se tornar uma plataforma digital, os fatores de sucesso são cinco:

1. Propor soluções para uma gama de usuários.

2.Personalizar a solução para os usuários.

3.Engajar usuários com preços dinâmicos.

4.Proteger os participantes, mantendo a credibilidade entre eles.

5.Ter parceiros e fortalecer o ecossistema.

Não faltam exemplos de empresas periféricas e nada sexy que aproveitaram a transformação digital. Uma das empresas aéreas mais bem administradas do mundo é a Ethiopian Airlines, primeira operadora global do Airbus A350, que gera 250 gigabytes de dados por voo e, com isso, consegue fazer uma gestão mais eficiente e eficaz do que as concorrentes de outros países. Já um caso não sexy é o comércio de aparelhos de barbear, feito pela startup DollarShaveClub, que, em quatro anos, conseguiu um market share de 15% no mercado de lâminas de barbear dos EUA. Seu cliente faz uma assinatura e recebe todo mês um pacote com lâmina, creme de barbear e loção pós-barba por US$ 18, que custaria US$ 23 nas farmácias.

A hesitação em relação ao digital talvez tenha a ver com nossa cultura ibérica, que busca qualidade.

**MENTIRA 2.** Não há mais oportunidades –  nem em e-commerce.

A cada dia que passa, fica mais difícil criar uma grande empresa digital, porque as coisas que estão aparecendo agora ficaram de 10 a 30 anos sendo desenvolvidas em laboratório. No entanto, mesmo que haja líderes em determinado segmento, uma empresa pode desafiá-los ao desenhar uma experiência de usuário diferente – se a experiência for igual, o líder é que ganhará o consumidor.

Além disso, sobram mercados no Brasil nos quais é possível redesenhar a experiência com a ajuda do digital. Por exemplo, o comércio eletrônico não chega a 4% do varejo físico no País, com vendas de R$ 49,7 bilhões em 2017, ante R$ 780 bilhões do varejo físico. Dos 50 países considerados digitais no planeta (aqueles com 50% de penetração de internet), o Brasil é o que movimenta menor volume financeiro em e-commerce. Se considerarmos que, só em 2017, mais 8 milhões de pessoas passaram a comprar pela internet no Brasil e que, em muitos casos, o mercado já se digitalizou informalmente – como prova o fato de 90% das encomendas de marmitas serem feitas por WhatsApp –, fica claro que o potencial não é bem aproveitado.

Como redesenhar a experiência em relação ao e-commerce existente? Teco Sodré cita o prazo médio de entrega praticado pelo e-commerce brasileiro, que ainda é longo demais, de 9,1 dias. Imagine se isso for reduzido para dois dias? O atraso na entrega também é elevado, de 8,5%, e o índice de satisfação NPS é diretamente impactado por atrasos. Não só as empresas de varejistas mas toda a sua cadeia de valor, como a área de logística, podem aproveitar a transformação digital para crescer. O varejo por assinatura e os agregadores também são promissores.

Você pode montar um e-commerce do zero, correndo risco (essa é a lógica do mundo digital), mas minimizando o custo de aquisição do cliente. Ou pode ser um varejista estabelecido que adquira uma operação digital. Movimentos como o que fez a rede de livrarias Cultura quando comprou a startup Estante Virtual são um caminho válido de transformação digital, para Silvio Meira – embora o sucesso nesse caso dependa da competência da equipe (diferente da que fundou a startup) de tocar o negócio incorporado.

Construção civil e agricultura são dois setores que vão se digitalizar nos próximos três a cinco anos, segundo previsão da consultoria PwC. No último caso, o Brasil tem um desafio particular, porque países como Israel, Austrália e Holanda estão 10 a 20 anos na frente na “internet dos rebanhos”. Educação é um setor complexo, mas também é uma oportunidade. Não só porque a empresa vai se transformar, cada vez mais, em uma escola, como também porque deve-se fazer com que as pessoas cheguem à formação universitária, de terceiro grau – quem estuda só até o nível secundário contabiliza 70% de chance de ter seu emprego ameaçado pelas máquinas no futuro – o Brasil pode ter 200 milhões de pessoas até o nível secundário em 2050 e, o mundo, 6 bilhões.

O desafio da educação é complexo, contudo, porque, como diz Barbara Oakley, da Oakland University, as duas organizações mais difíceis de mudar são os cemitérios e as universidades, “porque os habitantes  de ambas se recusam a colaborar”. Piadas à parte, isso é muito sério – colaboração é essencial no digital.

E onde não competir? Olhe para a margem de lucro alucinante de um Facebook, que é de 36%, e veja que é difícil competir em anúncios digitais – sua margem vem da mídia, assim como a do Google. A Match, dona do Par Perfeito e de outros sites de relacionamento, também tem margem de 36% e é uma área a ser evitada.

**MENTIRA 3.** Velocidade  é tudo.

Sim, a Amazon viu que um décimo de segundo a mais que a pessoa tinha de demorar para fazer uma compra em seu site impactava 1% das vendas; o Google calculou meio segundo de queda de velocidade afetava 20% da lucratividade. Porém essa aceleração digital está nos trazendo angústia (pelo que não foi feito e deveria ter sido) e ansiedade (pelo que virá), como observa Marcelo Tas – o que prejudica a velocidade.

É preciso dar alguns passos atrás. Em primeiro lugar, vale a pena entender que houve várias acelerações tecnológicas na história, a começar pela prensa de Gutenberg em 1454 – em 1495 já havia gráficas por toda a Europa –; as ideias de Lutero contra as indulgências católicas “viralizaram” pouco depois. Em segundo, “na hora de acelerar, todos precisam desacelerar”, como diz Tas. Respirar fundo, ter postura ereta e até meditar são modos de sair do frenesi da aceleração digital e conseguir concentrar-se no aqui e agora. Essa presença é o que pode nos capacitar a enxergar as oportunidades criadas pela aceleração digital. 

Não é tão fácil assim enxergar tais oportunidades; o crescimento dos negócios passou a seguir uma curva exponencial, em vez de linear. Isso significa que a curva desse gráfico começa a ascender mais devagar e, de repente, faz uma subida abrupta – e os observadores são iludidos pela lentidão inicial. Por exemplo, o Spotify surgiu em 2008, mas sua curva exponencial só começou a aparecer em 2012. “Por fim, há uma prova clara de que a aceleração não vai desacelerar: o mundo tem 9 milhões de quilômetros de cabos submarinos e número equivalente de satélites”, comenta Marcelo Tas. Com essa infraestrutura instalada, um recuo é, de fato, improvável.

Em paralelo, deve-se evitar o desperdício de tempo verificado hoje nas empresas. Entre um evento ocorrer e seus dados serem capturados, existe a latência da captura. Entre os dados a serem capturados e a próxima etapa, há a latência de armazenamento e processamento. Entre essa fase e a entrega da informação, há nova latência – a de entrega. Depois, entre a entrega e a ação em curso, há a latência da tomada de decisão. Cada latência vai diminuindo o valor a ser gerado para a empresa por determinados dados, como explica Meira. Além de reduzir a latência, outro modo de ganhar velocidade, afirma Sodré, é não inventar nada do zero, porque é caro; deve-se fazer parcerias.

A transformação digital exige planejamentos estruturantes por prazos de 30 anos – públicos e privados –, além de muito esforço repetitivo, coisas que não combinam com velocidade. Para atender melhor o usuário, o botão do like do Facebook teve 46 versões; o app do Angry Birds, 42; o Waze mudou mais de 100 vezes em dois anos e o Google Maps, 300 vezes. O leitor precisa de outras provas?

 **MENTIRA 4.** É preciso focar as disciplinas STEM.

“Antropólogos serão profissionais muito importantes para a empresas”, prevê Tas. Esses profissionais conseguem observar os comportamentos com a mente aberta, sem preconceitos, desenvolvendo empatia. Meira concorda que humanidades e artes serão mais valiosas, e cita como exemplo os psicólogos sociais que integram a equipe do jogo LoL (League of Legends), responsáveis por habilitar e desabilitar comportamentos. Enquanto todo mundo só fala em contratar cientistas, tecnólogos, engenheiros e matemáticos (os profissionais conhecidos pela sigla em inglês STEM), Tas diz que a aceleração digital exige doses maciças de humanidades, porque a aceleração sem consciência é perigosa, uma vez que tira a sensibilidade das pessoas, e porque transformação exige empatia. “Humanidades e artes são o domínio da reflexão, do entendimento amplo e da beleza; evoluem muito mais lentamente do que ciência e tecnologia, mas são fundamentais para entender os problemas a serem resolvidos pelo digital.”

Tas cita uma experiência que ele viveu ao lançar na TV brasileira o programa CQC, em que humoristas e jornalistas trabalharam juntos. “Foi preciso empatia para aprendermos uns com os outros”, conta. Empatia é o que permite impactar a experiência de uso.

Tas e Sodré recomendam a ferramenta conhecida como “mapa de empatia” para quem quer aprender a colocar-se no lugar do outro. Ela ajuda entender o que o outro precisa fazer, o que ele vê, o que ele fala e faz, o que ele escuta, como pensa e sente – tanto em termos de dores como de amores.

Foi por causa de sua empatia que a Amazon conseguiu aumentar a velocidade de suas operações, evoluindo para a compra em um clique, e isso aumentou as vendas em 45%. Foi a empatia que a levou a adotar drones de entrega e ofertas com dash button, os ímãs que, instalados na lavadora e ligados à internet, facilitam encomendar mais sabão. É a empatia que está levando a Uber a desenvolver o helicóptero elétrico, em parceria com Nasa e Embraer, com o qual uma viagem de Campinas e São Paulo deve demorar 20 minutos, em vez das duas horas de carro, e custar R$ 153. Em 2020, haverá um piloto; em 2023, seis cidades serão atendidas e, em 2030, 300. A boa notícia é que, de muitos modos, há empatia no Brasil – a cultura da gambiarra e do improviso deriva disso. “Somos o país onde barraca de praia oferece wi-fi”, diz Meira.

Como enfatiza Teco Sodré, é um erro achar que é preciso pensar criativamente para fazer a transformação digital. O necessário é ter empatia e fazer observações criativas, especialmente daquilo que não é dito, das necessidades latentes. “Entenda o consumidor primeiro”, repete Sodré.

**MENTIRA 5.** A experiência supera a estratégia.

Tecnologia não direciona a transformação digital  – o que muito gestores já entenderam racionalmente, embora não no nível das emoções. Experiência do usuário direciona a transformação digital? Sim, mas não 100% dela. A experiência de uso é duas vezes mais importante do que o produto, chegam a calcular alguns especialistas, mas ela precisa vir acompanhada de estratégia e execução. A experiência precisa de estratégia, ou de algoritmo, no vocabulário de Meira. “Não se engane: algoritmos são a essência da transformação digital”, diz o presidente do Porto Digital.

A explicação? É a experiência diferente que conta, e diferença depende de estratégia. O leitor se lembra do exemplo do DollarShaveClub? Ele mudou completamente o modo de os homens consumirem lâminas de barbear e, entre 2012 e 2016, passou a ter US$ 160 milhões de receita anual e 3,2 milhões de assinantes. Resultado: a Unilever adquiriu a empresa por US$ 1 bilhão. O DollarShaveClub entendeu que um dos principais modelos de negócio do mundo digital é a confiança entre estranhos – no caso, sua empresa e o consumidor que recebia seu pacote todo mês.

Na execução da estratégia há outros aspectos bastante importantes. Por exemplo, ao montar uma rede de parceiros, é preciso sempre ter substitutos em mente. E nunca se deve trabalhar com parceiros muito maiores e independentes do que você, porque eles podem abandoná-lo com facilidade. Outro aspecto importante é distinguir o que é uma funcionalidade nova e o que é um negócio. Quem inova em funcionalidade morre cedo, como aconteceu com o app Twitpic quando o Twitter incorporou a parte das imagens.

**A ILUSÃO DE PULAR ETAPAS**
Para muitos especialistas, a era digital permite que economias em desenvolvimento deem saltos. Isso nem sempre é bom: passamos  às estradas, pulando as ferrovias, e agora trens nos fazem falta.

**MENTIRA 6.** Basta fazer uma inovação.

Crença improcedente. Há dez tipos de inovação, segundo uma classificação de Larry Keeley, e as pesquisas mostram que as empresas que se mantêm no mercado digital inovam em 3,6 tipos, enquanto as dominantes inovam em cinco tipos ao mesmo tempo.

Há quatro inovações de configuração (modelo de lucratividade, rede, estrutura, em processo), duas inovações de oferta (performance do produto, sistema do produto) e quatro inovações de experiência (serviço, canais, marca, engajamento do cliente). Muitos gestores acreditam erroneamente que inovar na performance do produto (entregando novas características e funcionalidades) e no serviço (com mais apoio) é suficiente.

**MENTIRA 7.** As tecnologias ainda têm de amadurecer.

Muita gente se esconde atrás desse argumento, mas  é fácil derrubá-lo. Em 2001, as cinco empresas de maior valor de mercado do mundo eram General Electric, Microsoft, Exxon, Citi e Walmart – só uma de tecnologia. Em 2017, Apple, Alphabet (Google), Microsoft, Amazon, Tencent (e Facebook vem logo depois) – todas são de tecnologia. A maior alta da bolsa de valores de Nova York em 52 semanas, 141,7%, foi de uma empresa de tecnologia também, a Nvidia, fabricante de placas de vídeos, chips e inteligência artificial. A maturidade já está aí.

O que vai acontecer de novo é que, com o digital, a produtividade do trabalho vai aumentar entre 0,8% e 1,4% ao ano entre 2015 e 2065, cinco vezes mais do que o aumento causado pela terceira revolução industrial, da Inglaterra, segundo Meira. Mas não cabe o argumento no extremo oposto do espectro de que rejeitemos a tecnologia para proteger o trabalho humano. Não dá para proteger o trabalho, só o trabalhador. Então, abrace a era digital antes que seja tarde.

**O QUE FAZER**

A consultoria A.T. Kearney estima que a internet das coisas gere um movimento adicional anual de US$ 14,4 trilhões em todos os setores de atividade já a partir de 2020. A economia inteira da União Europeia é de US$ 14 trilhões e a dos EUA, US$ 17 trilhões. Em 2018, 16% da população do mundo já é de nativos digitais – preste atenção aos seus filhos –, o que vai acelerar a adoção de IoT, segundo o IDC, e em 2020 estima-se que 50 bilhões de coisas estejam conectadas. Não se iluda porque isso ainda não está na televisão. Quando aparece na TV, como o bitcoin, é porque já está acontecendo há muito tempo. 

Não há mais oportunidade fácil, mas os gestores e empreendedores brasileiros precisam libertar-se do sebastianismo herdado de Portugal, e parar de esperar quem os salve, como diz Tas. Eles é que têm de fazer a mudança. Meira sugere começar por transformar produtos em produtos intensivos em serviços e redefinir serviços como serviços intensivos em serviços. “A DaimlerBenz fez isso: adquiriu a MyTaxi, que é um Uber que conecta taxistas e passageiros, e depois a fundiu com a Hailo do Reino Unido, além de comprar a rival grega, Taxibeat”, conta. Bancos como o Itaú estão digitalizando as empresas no Brasil, porque 96% de suas transações são digitais hoje. Políticas governamentais poderiam ajudar, mas não conte com elas.

**QUAIS AS TECNOLOGIAS ALIADAS**

Hoje, quando se pensa em transformação digital no Brasil – ou, de modo mais amplo, na quarta revolução industrial –, pensa-se em três tecnologias-chave, segundo Teco Sodré: internet das coisas (para coletar dados), inteligência artificial (para analisar esses dados e agir rapidamente sobre eles) e blockchain (para que tudo possa funcionar de maneira mais veloz, descentralizada e confiável). Silvio Meira concorda com isso, mas prefere chamar a atenção para as APIs, que são a única forma de conectar tantas coisas de modo econômico–a sigla APIs é uma maneira de dizer que as empresas deixarão seu sistemas com interfaces abertas e programáveis por terceiros.

Marcelo Tas concorda com Sodré e Meira, porém convida as empresas a abordar essas ferramentas com prioridades distintas: as tecnologias para coletar, armazenar e cruzar dados, gerando valor com eles, devem fi car em quinto lugar, em sua opinião; o quarto lugar cabe ao algoritmo – “é importante que as empresas desenvolvam seus próprios algoritmos”; em terceiro lugar, o machine learning, que é o algoritmo que vai aprendendo com a experiência dos dados; a segunda posição pode ser ocupada pelo blockchain, para que os dados sejam gerenciados com transparência, credibilidade e privacidade, como só um sistema descentralizado permite. 

E o que fi ca no topo do ranking de Tas? Não é uma tecnologia, e sim a conexão com o consumidor (e seu problema). As empresas devem se apaixonar pelo problema a solucionar, não pela solução – e a tecnologia nunca pode ser o item número 1.

**LÍDERES SÃO AINDA MAIS RELEVANTES**

A relevância dos líderes para a transformação digital é um consenso entre os especialistas acompanhados por HSM Management em Recife. “A ausência de líderes é o maior inibidor da transformação”, garante Silvio Meira. Várias decisões cabem ao líder: (1) engavetar o que se sabe e estimular o reaprendizado; (2) fazer as pessoas colaborarem; (3) afastar os sabotadores e advogados-do-diabo da mudança; (4) dividir um desafi o que seja muito grande em partes menores; (5) garantir o alinhamento de tudo e todos com o propósito; (6) relembrar constantemente que não se pode começar pela tecnologia, mas com a visão empática de um problema do consumidor; (6) não deixar que a equipe se apaixone por uma determinada solução; ela deve se apaixonar pelo problema e (7) manter na tropa o espírito de que “vai dar errado”, porque, se estiverem preparados para erros, defeitos e falhas, a ocorrência desses será só mais uma parte do processo. (Já quando algo não pode dar errado no ponto de partida fi ca impossível de consertar.)

O fato é que ninguém faz transformação digital sozinho – os investidores ensinam isso ao abordarem inovação com as startups, mas vale para qualquer empresa e qualquer mudança: como se sabe, se um empreendedor vem falar com um investidor sozinho, ele pode nem ser recebido. Tem de haver equipe e, onde há equipe, tem de haver líder.

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