Uncategorized

O Oriente Médio pode inspirar sua liderança

A região traz lições valiosas para gestores e para a dinâmica das equipes

Compartilhar:

Um olhar mais apurado sobre o Oriente Médio – 17 países com população aproximada de 371 milhões de pessoas e mais de 60 línguas – revela uma cultura de negócios riquíssima. Randall S. Peterson, professor de comportamento organizacional da London Business School, vem estudando a região em busca de lições de liderança diferentes das ocidentais. 

Na Arábia Saudita, por exemplo, é impossível alguém ir longe na carreira sem olhar nos olhos das pessoas e gastar um bom tempo construindo relacionamentos. No Kuwait, os negócios são essencialmente feitos em família, porque só se negocia com gente conhecida, de confiança. No Barein, assuntos importantes que surgem são imediatamente a prioridade dos líderes – o resto espera. 

Em comum, todos esses países têm a cultura árabe, baseada na confiança. Os executivos ali costumam se guiar pelos princípios do Alcorão: respeitam sua cultura, defendem suas tradições e valorizam os relacionamentos. 

**É COMO A CHINA?**

Cultura e trabalho em equipe estão intrinsecamente ligados. O psicólogo Geert Hofstede resumiu a cultura – a maneira com que fazemos as coisas – como um software para a mente. “Software” refere-se à rede de instruções que nos permite executar tarefas, e “mente”, à parte que nos faz pensar, sentir e viver. O que diz o estudo de Hofstede sobre os países árabes do Oriente Médio? 

Vale a pena analisar pelo menos duas das cinco dimensões culturais de Hofstede: distância de poder e individualismo versus coletivismo. A distância de poder é significativa entre os líderes e os membros da equipe no Oriente Médio. Trata-se de um desequilíbrio de forças, o que faz com que, uma vez que o líder tome uma decisão, os membros da equipe a implementem fielmente. 

Os líderes empresariais do Oriente Médio, portanto, têm mais poder de implementação, diz Peterson, que os de outras regiões em que o grupo normalmente decide em conjunto os objetivos, como Estados Unidos e Reino Unido, e possuem influência direta sobre o resultado final. 

Então, o Oriente Médio é como a China, onde a distância entre o líder e seus subordinados também é imensa? Não. E, citando Hofstede, Peterson traz a dimensão cultural do individualismo versus coletivismo para explicar a diferença. Se um membro da equipe desafiar seu líder na China, isso pode ser um grande problema. Uma opinião que leva alguém a se destacar na mentalidade coletiva chinesa não necessariamente trabalhará a seu favor. Já no Oriente Médio, o destaque na multidão não é malvisto; há mais apreço ao individualismo. 

**ATRIBUTOS-CHAVE NAS EQUIPES**

Confiança pode ser uma necessidade universal para construir bons relacionamentos em toda parte, mas em nenhum outro lugar ela é tão essencial às equipes quanto nos países árabes do Oriente Médio. O mesmo se pode dizer de honra e de discrição – o desejo de evitar a exposição pública. Peterson ainda aponta mais dois atributos – sinceridade e excelência –, ambos pregados pelo Islã, como características da liderança, o que provê uma motivação que vem do berço para as equipes trabalharem bem. 

A mentalidade vigente naqueles países árabes é resumida por um gestor local: “Uma equipe é como uma colmeia de abelhas. Todo mundo na colmeia sabe qual é seu papel, quando deve entrar e sair, onde produzir o mel, quando proteger o ninho e quando alertar o líder; aqui também é assim”, comparou ele em conversa com Peterson. 

A metáfora da colmeia resume bem a influência de confiança, honra, discrição, sinceridade e excelência nas dinâmicas de equipe no Oriente Médio. A confiança, construída sobre objetivos explicitados, é o que prepara os membros da equipe para avisar seus superiores sobre problemas na hora certa. Não é só a menor distância de poder que faz isso. 

A maioria dos líderes da região, aliás, rejeita a ideia de que os funcionários precisam “segui-los cegamente”. Ao contrário: por causa da honra e de outros valores do Islã, é esperado dos líderes que sempre consultem seus comandados. No Oriente Médio, consultar o povo antes de tomar uma decisão é uma obrigação tanto moral como religiosa. “Isso está em nossa tradição islâmica”, lembra um líder empresarial enfaticamente. “O profeta Maomé consultava seus companheiros e levava em consideração suas opiniões.” 

Vai além de mera formalidade: ainda que as estruturas de gestão e a hierarquia sejam mais rígidas no Oriente Médio do que no Ocidente, decisões tomadas sem consulta prévia às partes interessadas são vistas como ilegítimas. Essa consulta também tem a ver com discrição; o líder não quer brilhar sozinho. 

Depois de consultar a equipe e ouvir o que seus membros têm a dizer, os líderes exercem seu poder tomando decisões ancorados no mérito, ou seja, na busca da excelência. “Não é incomum na região, por exemplo, ouvir um gestor dizer que rejeita a ideia de que o funcionário seja fiel a ele. O trabalho e as escolhas devem ser sempre pelo bem da organização; é em prol dela que a lealdade deve funcionar”, observa Peterson. 

“Se os colaboradores não têm abertura para expressar suas opiniões mais verdadeiras a favor da organização, isso mata o trabalho”, conta um líder em um depoimento. Outro afirma que encoraja o debate amplo: “Minha porta está sempre aberta. Não vejo mal algum em opiniões sinceras divergentes. Ao contrário, boas coisas costumam surgir daí, especialmente se quem discorda é especialista no assunto”, argumenta ele. No entanto, é bom saber: no Oriente Médio, quem tem a última palavra é o líder.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Quando a IA desafia o ESG: o dilema das lideranças na era algorítmica

A inteligência artificial está reconfigurando decisões empresariais e estruturas de poder. Sem governança estratégica, essa tecnologia pode colidir com os compromissos ambientais, sociais e éticos das organizações. Liderar com consciência é a nova fronteira da sustentabilidade corporativa.

Liderança
Transições de liderança tem muito mais relação com a cultura e cultura organizacional do que apenas a referência da pessoa naquela função. Como estão estas questões na sua empresa?

Roberto Nascimento

6 min de leitura
Inovação
Estamos entrando na era da Inteligência Viva: sistemas que aprendem, evoluem e tomam decisões como um organismo autônomo. Eles já estão reescrevendo as regras da logística, da medicina e até da criatividade. A pergunta que nenhuma empresa pode ignorar: como liderar equipes quando metade delas não é feita de pessoas?

Átila Persici

6 min de leitura
Gestão de Pessoas
Mais da metade dos jovens trabalhadores já não acredita no valor de um diploma universitário — e esse é só o começo da revolução que está transformando o mercado de trabalho. Com uma relação pragmática com o emprego, a Geração Z encara o trabalho como negócio, não como projeto de vida, desafiando estruturas hierárquicas e modelos de carreira tradicionais. A pergunta que fica: as empresas estão prontas para se adaptar, ou insistirão em um sistema que não conversa mais com a principal força de trabalho do futuro?

Rubens Pimentel

4 min de leitura
Tecnologias exponenciais
US$ 4,4 trilhões anuais. Esse é o prêmio para empresas que souberem integrar agentes de IA autônomos até 2030 (McKinsey). Mas o verdadeiro desafio não é a tecnologia – é reconstruir processos, culturas e lideranças para uma era onde máquinas tomam decisões.

Vitor Maciel

6 min de leitura
ESG
Um ano depois e a chuva escancara desigualdades e nossa relação com o futuro

Anna Luísa Beserra

6 min de leitura
Empreendedorismo
Liderar na era digital: como a ousadia, a IA e a visão além do status quo estão redefinindo o sucesso empresarial

Bruno Padredi

5 min de leitura
Liderança
Conheça os 4 pilares de uma gestão eficaz propostos pelo Vice-Presidente da BossaBox

João Zanocelo

6 min de leitura
Inovação
Eventos não morreram, mas 78% dos participantes já rejeitam formatos ultrapassados. O OASIS Connection chega como antídoto: um laboratório vivo onde IA, wellness e conexões reais recriam o futuro dos negócios

Vanessa Chiarelli Schabbel

5 min de leitura
Marketing
Entenda por que 90% dos lançamentos fracassam quando ignoram a economia comportamental. O Nobel Daniel Kahneman revela como produtos são criados pela lógica, mas comprados pela emoção.

Priscila Alcântara

8 min de leitura
Liderança
Relatórios do ATD 2025 revelam: empresas skills-based se adaptam 40% mais rápido. O segredo? Trilhas de aprendizagem que falam a língua do negócio.

Caroline Verre

4 min de leitura