Você sabe como funciona um algoritmo? De forma bem simplista: um algoritmo, na matemática, é um conjunto de regras e raciocínios para se chegar em um determinado resultado. Para a tecnologia, eles são a base do trabalho em machine learning e inteligência artificial.
O algoritmo nos traz o resultado com base nas variáveis que um ser humano insere, logo, existe um grande debate sobre a ética nessas novas tecnologias, visto que podem carregar um forte viés de quem o programa. Como nos [casos icônicos, de fatores raciais, de gênero ou localização geográfica](https://www.revistahsm.com.br/post/como-nao-criar-uma-inteligencia-artificial-racista) terem desdobramento para aprovação de crédito, sistemas de saúde ou ações prisionais.
Se formos olhar em grosso modo, um processo seletivo é como um algoritmo. Temos em mente um resultado esperado, inserimos uma sequência de regras, raciocínios e parâmetros (pré-requisitos, testes, perguntas etc.), inserimos uma variável (o candidato) para o algoritmo processar e *voilà*: temos a nossa nova pessoa da empresa!
Mas, quem “programou” esse algoritmo? O que tomou como base para as premissas e regras de contratação para o processo? Vamos fazer, então, a engenharia reversa…
## O espelho do líder
Quando olhamos as principais lideranças de uma companhia hipotética, o que todas elas têm em comum? Vemos que elas têm uma alta capacidade de pensar estrategicamente, olhando de forma holística os problemas e trazendo soluções. Elas estudaram nas “melhores faculdades” do país, as grandes privadas, federais ou estaduais.
Agem de forma autônoma, persistindo e tendo uma visão de dono sobre o negócio. Fizeram intercâmbio, o que ajudou a serem mais independentes. Conseguiram assim seu primeiro emprego, com menos de 20 anos, como estagiários em grandes organizações. Falam inglês fluente e tem familiaridade com as novas tecnologias.
Quando um algoritmo roda, ele traz a seguinte estrutura:
Se
Senão
Então, vamos programar um processo de trainee:
Se , então
Para captar essas informações, o [processo da companhia](https://www.revistahsm.com.br/post/qual-e-o-segredo-de-uma-boa-estrategia-de-employer-branding) coloca requisitos como a faculdade e experiência em multinacionais, insere um teste de inglês fluente e o entrevistador fica maravilhado em saber que a Marina fez seu ensino médio no Canadá. Que incrível, parece com a trajetória dele! Afinal, é a realidade que ele conhece e como classifica “talento”.
## A exclusão na pele
A outra candidata era a Deise, ela é uma mulher negra, da periferia e vem de uma família na qual sua mãe concentrou todas as responsabilidades de criar e sustentar seus filhos. Deise ralou muito para terminar o ensino médio público, depois disso, teve que trabalhar fazendo de um todo: do caixa do mercado ao telemarketing. Ali teve que ter contato direto com os clientes, solucionando problemas sob pressão.
Conseguiu juntar uma grana e se matriculou na faculdade mais acessível da cidade, já perto dos seus 30 anos de idade. Trabalhava como assistente em uma empresa familiar de dia e à noite, depois de três conduções, ia para a faculdade. Ouviu diversos nãos, teve que alisar seu cabelo porque seu chefe pediu e, constantemente, ajuda financeiramente sua família. Deise pega um trem e dois ônibus para fazer a entrevista, nem sabendo direito como vai pagar as passagens de volta e chega lá no prédio imponente e espelhado na Faria Lima, onde todos a sua volta parecem tão diferentes.
Então, rodamos o algoritmo na Deise: E se, então… reprovada.
## Uma reflexão urgente
É claro que não quero falar que um processo seletivo é tão simples assim, sabemos o grande desafio em selecionar as melhores pessoas. Porém, quais as réguas que estamos aplicando para abrir as portas das nossas empresas a um arquétipo de talento que não temos na liderança da companhia e, ainda mais, que não temos no nosso convívio social?
Será que o nosso processo permite que a Deise possa contar a sua história de vida? De todos os momentos que ela lidou com a pressão e resolveu problemas com maestria? Do seu nível de resiliência e persistência em buscar o que quer?
E como avaliamos o “gabarito” da Deise? Quem entrevista imagina qual arquétipo de candidato? Está na busca de um “control c + control v” de si próprio? Talvez a Deise não tenha todo o traquejo corporativo e seu inglês ainda é básico, mas essas são competências que acredito que a empresa pode desenvolver.
Não sei se, na mesma medida, é tão prático ensinar a Marina sobre ser resiliente quando recebe nãos, a ser persistente em querer mudar os costumes da companhia e ter a empatia de saber o que o consumidor final, o verdadeiro brasileiro, precisa.
Semana passada, a Nasdaq, uma das maiores bolsas de valores do mundo, trouxe [novas regras para que suas empresas listadas sejam mais diversas](https://amp-cnn-com.cdn.ampproject.org/c/s/amp.cnn.com/cnn/2020/12/01/investing/nasdaq-rule-board-of-directors-diversity/index.html). Elas deverão publicar seus números de diversidade e ter, no mínimo, uma posição de direção assumida por um grupo minorizado. Países como Noruega, Espanha, França e Islândia possuem a exigência que mulheres representem pelo menos 40% dos conselhos de empresas de capital aberto. Esse movimento só tem um caminho: seguir em frente!
Essa é uma conversa que pode soar desconfortável, cheia de “mas, é que aqui…” e de mudar o que sempre foi assim. Porém, esse é o [momento que você, RH](https://www.revistahsm.com.br/post/qual-e-o-papel-do-rh-nas-organizacoes), precisa levar ao board do negócio. Você tem em mãos a força de mudar esses “algoritmos”, de salvar o futuro da sua empresa e mais do que isso: deixar a Deise contar a sua história e alterá-la para sempre.
Nos próximos meses, quero te ajudar a iniciar essa conversa, vamos juntos e seguindo em frente!