Inteligência coletiva

Obrigado por botar o dedo na ferida

Dar reconhecimento para aqueles que falam o que precisa ser dito reduz a necessidade de ativar a coragem
É sócio da RIA, empresa especializada em construir segurança psicológica em equipes. Criador do PlayGrounded, a Ginástica do Humor, é jornalista (Folha de S.Paulo, Veja, Superinteressante e Vida Simples), foi sócio da consultoria Origami e consultor em branding. Ator e improvisador, integra o grupo Jogo da Cena.

Compartilhar:

Aconteceu em um evento de que participei recentemente, marcado pelo espírito da colaboração. Tudo ali havia sido cocriado. Se quisesse mudar algo, não havia a quem reclamar, responsável a quem culpar: vai lá e faz.

No segundo dia, a programação cocriada previa rodadas de conversas. Havia cinco rodas, o que limitava o número de temas. Na plenária, sugerimos assuntos, elegemos cinco por votação, e voluntários assumiram o papel de conduzir cada conversa.

Na roda em que eu estava, a conversa logo esquentou e muitos quiseram a palavra. Decidimos que levantaríamos dedos, representando nosso lugar na fila para falar. Eu, com meus quatro dedos erguidos, senti um desconforto quando uma pessoa fora da fila aproveitou que o dono da palavra tomou um fôlego para adiantar um comentário. “Só um aparte”, disse, justificando-se.

Depois dela, o próximo da fila expôs sua opinião, que contrastava com o que disse a pessoa que furou a fila. Ela então avançou e respondeu. Eu, cujos três dedos levantados indicavam já ter o que dizer desde o começo, senti o incômodo crescer, enquanto assistia aos dois indo e vindo em suas falas.

O seguinte na fila acrescentou algo que dizia respeito ao que os dois haviam conversado antes. Faz sentido, afinal estamos aqui para discutir o mesmo
tema! Novos apartes brotaram. Agora segundo da fila, eu já não conseguia mais acompanhar o conteúdo da conversa. Meus pensamentos estavam tomados pelo julgamento e pela irritação.

Nem sei o que foi discutido em seguida, embora estivesse presente e de olhos postos na conversa. Quando afinal a palavra me foi dada, meu comentário, que se referia a algo dito lá atrás, já nem tinha mais sentido.

Mas eu tinha o que dizer. Usei meu lugar na fila para narrar o que eu tinha acabado de observar, falar sobre meu desconforto e perguntar que regra iríamos usar para conversar, porque aquela tinha caducado.

Não houve tempo para desconforto: a pessoa que conduzia a conversa se adiantou e, olhando nos meus olhos, me agradeceu por trazer a questão, que era importante para o grupo.

Amy Edmondson, pesquisadora de Harvard que entrevistei para esta edição, diz que são mais competitivas as equipes cujos membros sentem que não há risco em falar sobre o que está pegando. Que ninguém irá julgá-los, excluí-los ou preteri-los por trazer à tona os problemas.

Para alcançar esse clima, diz ela, não basta convidar as pessoas a falar. É preciso responder bem, quando alguém se arrisca a botar o dedo na ferida que afeta todos nós. Ao reconhecer quem assume riscos pessoais em prol de nossos objetivos compartilhados, incentivamos essa atitude.

Sei que o efeito é mágico, porque senti na pele. Quando o risco que assumi foi valorizado, me senti transformado. De alguém impertinente, tornei-me protagonista de um ato de coragem. Coroando sua ação, depois de agradecer, a facilitadora me pediu para dizer, finalmente, por que eu tinha levantado o dedo lá no início. Ninguém fez aparte.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Quando o corpo pede pausa e o negócio pede pressa

Entre liderança e gestação, uma lição essencial: não existe performance sustentável sem energia. Pausar não é fraqueza, é gestão – e admitir limites pode ser o gesto mais poderoso para cuidar de pessoas e negócios.

Cultura organizacional, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
17 de setembro de 2025
Ignorar o talento sênior não é só um erro cultural - é uma falha estratégica que pode custar caro em inovação, reputação e resultados.

João Roncati - Diretor da People + Strategy

3 minutos min de leitura
Inovação
16 de setembro de 2025
Enquanto concorrentes correm para lançar coleções sazonais inspiradas em tendências efêmeras, o Boticário demonstra que compreende um princípio fundamental: o verdadeiro valor do design não está na estética superficial, mas em sua capacidade de gerar impacto social e econômico simultaneamente. A linha Make B., vencedora do iF Design Award 2025, não é um produto de beleza – é um manifesto estratégico.

Magnago

4 minutos min de leitura
Cultura organizacional, Bem-estar & saúde, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho
15 de setembro de 2025
O luto não pede licença - e também acontece dentro das empresas. Falar sobre dor é parte de construir uma cultura organizacional verdadeiramente humana e segura.

Virginia Planet - Sócia e consultora da House of Feelings

2 minutos min de leitura
Marketing & growth, Inovação & estratégia, Tecnologia & inteligencia artificial
12 de setembro de 2025
O futuro do varejo já está digitando na sua tela. O WhatsApp virou canal de vendas, atendimento e fidelização - e está redefinindo a experiência do consumidor brasileiro.

Leonardo Bruno Melo - Global head of sales da Connectly

4 minutos min de leitura
Liderança, Cultura organizacional, Inovação & estratégia, Tecnologia & inteligencia artificial
11 de setembro de 2025
Agilidade não é sobre seguir frameworks - é sobre gerar valor. Veja como OKRs e Team Topologies podem impulsionar times de produto sem virar mais uma camada de burocracia.

João Zanocelo - VP de Produto e Marketing e cofundador da BossaBox

3 minutos min de leitura
Cultura organizacional, compliance, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho, Liderança
10 de setembro de 2025
Ambientes tóxicos nem sempre vêm da cultura - às vezes, vêm de uma única pessoa. Entenda como identificar e conter comportamentos silenciosos que desestabilizam equipes e ameaçam a saúde organizacional.

Tatiana Pimenta - CEO da Vittude

5 minutos min de leitura
Cultura organizacional, Gestão de pessoas & arquitetura de trabalho, Inovação & estratégia
9 de setembro de 2025
Experiência também é capital. O ROEx propõe uma nova métrica para valorizar o repertório acumulado de profissionais em times multigeracionais - e transforma diversidade etária em vantagem estratégica.

Fran Winandy e Martin Henkel

10 minutos min de leitura
Inovação
8 de setembro de 2025
No segundo episódio da série de entrevistas sobre o iF Awards, Clarissa Biolchini, Head de Design & Consumer Insights da Electrolux nos conta a estratégia por trás de produtos que vendem, encantam e reinventam o cuidado doméstico.

Rodrigo Magnago

2 minutos min de leitura
Tecnologia & inteligencia artificial
2025

José Blatazar S. Osório de Andrade Guerra, professor e coordenador na Unisul, fundador e líder do Centro de Desenvolvimento Sustentável (Greens, Unisul)

0 min de leitura
Tecnologia & inteligencia artificial
2025

Felipe Knijnik, diretor da BioPulse

0 min de leitura

Baixe agora mesmo a nossa nova edição!

Dossiê #170

O que ficou e o que está mudando na gangorra da gestão

Esta edição especial, que foi inspirada no HSM+2025, ajuda você a entender o sobe-e-desce de conhecimentos e habilidades gerenciais no século 21 para alcançar a sabedoria da liderança

Baixe agora mesmo a nossa nova edição!

Dossiê #170

O que ficou e o que está mudando na gangorra da gestão

Esta edição especial, que foi inspirada no HSM+2025, ajuda você a entender o sobe-e-desce de conhecimentos e habilidades gerenciais no século 21 para alcançar a sabedoria da liderança