Artigo – Planejamento tático-operacional

Otimize o impacto dos seus investimentos sociais

Com a forte demanda dos stakeholders para que as empresas ocupem seu espaço como agentes de transformação social, adotar uma postura data-driven para definir o uso dos recursos de filantropia se mostra uma opção na hora de distribuir esses recursos

Compartilhar:

Gerar evidências do impacto social positivo se tornou peça-chave para que as empresas possam atender às novas demandas da sociedade. No Brasil, um debate consistente sobre a qualidade do investimento social privado vem crescendo. Questiona-se, inclusive, o resultado dos aportes feitos. Afinal, como o montante investido – R$ 5,3 bilhões (2021), superior em 63% ao investido em 2019, de acordo com o Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (GIFE) – dialoga com a resolução de problemas como a desigualdade social? É aqui que entra a tecnologia: com o uso da inteligência de dados é possível produzir informações balizadoras sobre o impacto socioambiental do investimento. Esse é um conhecimento que tem sido utilizado pelos executivos que estão liderando uma verdadeira revolução na temática, com apoio de socialtechs.

Os líderes que estão na fronteira de um novo pensar sobre o investimento social privado leem claramente os sinais enviados pela própria sociedade. Os dados da Edelman Trust Barometer 2022, pesquisa conduzida em 28 países, com mais de 36 mil respondentes globais e mais de 1.100 no Brasil, mostram que empresas e organizações não governamentais são as únicas instituições consideradas confiáveis, competentes e éticas no Brasil. Entre os entrevistados no País, 63% afirmam que compram ou defendem marcas com base nos seus valores e nas suas crenças, 58% escolhem um lugar para trabalhar com a mesma lógica e 60% investem baseados nos próprios valores e crenças.

O levantamento aponta que as empresas estão sendo solicitadas a liderar questões sociais altamente diversas, mas ainda há um descompasso na resposta. Para 61% dos entrevistados, as companhias não estão fazendo o suficiente em relação à desigualdade econômica; 60% apontam a falta de ação efetiva das empresas nas mudanças climáticas; e 50%, a ausência de posicionamento em injustiças sistêmicas.

Esses dados indicam uma demanda permanente dos stakeholders – baseados na crença de que a sociedade é capaz de criar um futuro melhor — para que as empresas ocupem seu papel social, tendo maior protagonismo e produzindo avanços tangíveis. A liderança deve, então, focar essa construção de longo prazo. O ponto é como fazer isso da maneira mais assertiva. Ou seja, como tornar visíveis as demandas sociais urgentes, a regionalidade dessas demandas e a capacidade de potencializar o impacto do investimento social privado.

O incômodo de enxergar os imensos desafios da filantropia no Brasil, acompanhar a falta de evidências do impacto positivo do investimento social privado no País e a urgência em acelerar as efetividades dos compromissos pactuados na Agenda 2030 se tornaram uma força-motriz para que a Simbiose Social criasse uma ferramenta tecnológica que orientasse os líderes das empresas a usarem a ciência de dados em prol da eficiência para a aplicação dos recursos. O investimento estratégico, com foco em maximizar o impacto social, é um dos ganhos consistentes desse novo pensar mediado pela tecnologia. Baseada nessa ferramenta tecnológica proprietária, uma pesquisa inédita traz evidências do diálogo possível entre o investimento social privado e a efetividade de ações.

Por estar no território das evidências, a Simbiose Social firmou uma aliança estratégica com os pesquisadores Edgard Barki (professor doutor da Fundação Getúlio Vargas), Haroldo Torres (doutor em ciências sociais e demografia) e Octávio Barros (doutorando em economia) para conduzir a pesquisa *[Brasil ODS: Desafios para Democratizar a Transformação por Meio do Investimento Social](https://conteudo.simbiose.social/lancamento-pesquisa-simbiose).* Com base em um estudo da Cambridge University e apoio do FGVcenn, a pesquisa utiliza a inteligência de dados para medir e conhecer as demandas sociais das regiões brasileiras. Para tal, os pesquisadores desenvolveram um algoritmo voltado à análise de dados para dar suporte à criação de indicadores sintetizados de demandas sociais.

Entre os dados produzidos, destaque para indicadores públicos relacionados a cada um dos 17 objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS) e 169 sub-ODS, que oferecem um panorama completo da demanda social de cada região do País. Um dos recortes da pesquisa – que tem como foco o olhar para a educação e a ODS 4 – conta com o aprofundamento de 36 dos 344 indicadores contemplados na pesquisa integral.

O estudo usa a inteligência de dados também para classificar a oferta de organizações sociais correlacionadas aos ODS. Para tal, utilizou algoritmos de machine learning que lançam mão de uma combinação de técnicas para classificar, por meio da síntese dos projetos, qual ODS ele atende. Milhares de sínteses foram classificadas, e, para melhor visualização, os autores construíram um mapa com os principais ODS utilizados para o investimento social via lei de incentivo. Com essa cartografia em mãos, surge uma pesquisa inédita no Brasil. Entre outras evidências, ela permite observar ineficiências que a falta de dados causa na tomada de decisão do investimento social.

## Resultados
Investigar o impacto da Lei Rouanet, em números, na Agenda 2030 foi o ponto de partida na condução da pesquisa. A escolha está associada à maior transparência de dados e à qualidade das informações disponibilizadas por essa lei. O objetivo é que, a partir desse conhecimento, se possa adicionar uma camada a mais de inteligência e garantir maior impacto social à tomada de decisão de empresas qualificadas a fazer uso da lei. A mesma lógica pode ser aplicada para outras leis de incentivo ou para investimento social direto.

Detalhando os resultados, o mapeamento mostrou que a Lei Rouanet – principal instrumento de fomento e incentivo à cultura nacional – tem registrado um crescimento nos últimos quatro anos, sendo que o acumulado de investimento é de aproximadamente R$ 6,4 bilhões no período – em 2021 esse volume atingiu o valor recorde de mais de R$ 2 bilhões. Um dos aprendizados foi que há impacto direto da lei em alguns dos ODS, sendo o ODS 4 (focado em educação) o que mais recebe investimentos no Brasil, seguido, na sequência, pelo ODS 8 (referente a trabalho decente e crescimento econômico) e o ODS 16 (paz, justiça e instituições eficazes).

A pesquisa concluiu que, nos últimos quatro anos, a maior parte do investimento via Lei Rouanet foi direcionado para projetos culturais que possuem a temática educacional. Vale esclarecer que a análise recaiu para projetos culturais que atuam com temáticas educacionais, já que não há um ODS que aborda o acesso à cultura. Essa decisão, aliás, está ancorada no fato de a lei trabalhar com projetos com bastante sinergia com a educação (iniciativas de criação de bibliotecas, aulas de música em escolas etc.). Na prática há uma grande ligação entre a cultura e a educação.

Com base nessa primeira camada de análise, o segundo passo da pesquisa foi analisar o mapa de demandas sociais, especificamente no ODS de educação, para que se pudesse entender se os investimentos que estão sendo conduzidos são destinados aos territórios que mais precisam de verba. Nessa lógica, a proposta foi investigar qual é a maior demanda e em quais regiões elas estão. Para mensurar o impacto social – na qualidade da educação das regiões investidas, por exemplo –, foram cruzadas informações como dados dos anos iniciais do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) e da Pnad Contínua 2020, separando as localidades em quatro grupos que demonstram a qualidade educacional local, classificando-as como: altíssima prioridade de educação, alta prioridade de educação, média prioridade de educação e baixa prioridade de educação. É válido salientar que a nomenclatura “qualidade na educação” diz respeito à média geral do município.

O ranking de municípios apresentado compara a qualidade educacional entre eles, ou seja, quando se fala em “alta qualidade em educação”, isso significa que se trata de uma referência para o País. Ao evidenciar esses dados, não há a intenção de suprimir a destinação de recursos para, por exemplo, o grupo de baixa prioridade educacional. Essa separação em grupos, categorias e as respectivas nomenclaturas são somente uma maneira comparativa de dizer quem, no momento, apresenta maior urgência para o recebimento de investimentos sociais privados e recursos por meio de leis de incentivo – dado que os indicadores locais comprovam que tais regiões estão mais desassistidas que outras no que tange à educação.

Dos municípios que receberam recursos via Lei Rouanet, os que apresentam os piores índices educacionais e menor investimento per capita em projetos associados à educação (aprovados pela lei), são Guapimirim, Campos dos Goytacazes e Itaboraí (RJ), Simões Filho (BA) e Parnaíba (PI). Já entre os que receberam maiores volumes de investimento per capita no País, destaque para Brumadinho, Tiradentes e Ouro Preto (MG), Barracão e São João do Polêsine (RS). Entre as empresas no topo do ranking de maiores investidoras em regiões de baixa qualidade educacional per capita estão nomes como Vale, Salobo Metais, Crown Embalagens Metálicas da Amazônia, Gerdau, Companhia Zaffari e CMPC Celulose {veja as listas de municípios e empresas, e os investimentos recebidos e feitos nos quadros abaixo}.

![-057-062- quadro 1](//images.ctfassets.net/ucp6tw9r5u7d/56yJ8nXyuSKlceUcXD3fsV/495663103af42ab6a2efb42ecc067a26/-057-062-_quadro_1.png)

![-057-062- quadro 2](//images.ctfassets.net/ucp6tw9r5u7d/2jUMBZD8IoI4oJoSonkf0f/23e21c15fb246816628a4930036b254b/-057-062-_quadro_2.png)

## Para onde o dinheiro vai
Ao cruzar os dados para identificar a destinação dos investimentos, a pesquisa aponta um desequilíbrio entre a verba alocada pelas empresas e a prioridade de investimento da educação. Cabe ressaltar que a análise contempla os investimentos locais versus população local para evitar distorções. Na leitura de resultados, o mapeamento aponta que, nos últimos quatro anos, os locais com altíssima prioridade educacional receberam em torno de R$ 1,49 (investimento per capita), enquanto os locais com média e baixa prioridade educacional registraram R$ 7,34 e R$ 2,21, respectivamente.

Ao comparar os investimentos per capita nos últimos quatro anos, via Lei Rouanet, as regiões com altíssima prioridade educacional receberam 75% a menos de recursos per capita do que a média das outras regiões. O professor Edgard Barki, um dos coordenadores da análise, ressaltou que, apesar de vermos um grande crescimento de interesse das empresas em investir em projetos culturais que possuam a temática educacional na Lei Rouanet, percebemos que a decisão não leva em conta o perfil de demandas regionais. Isso se observa por meio de uma estabilidade na distribuição de investimento em cada grupo educacional no decorrer dos últimos quatro anos.

Sobre a evolução do investimento por grupo educacional nesse mesmo período – cruzando dados da Simbiose Social e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) –, nota-se um significativo crescimento no protagonismo do ODS 4 por meio de investimentos via Lei Rouanet, sobrepondo a taxa de crescimento da lei em si. Contudo, esse movimento não é observado quando se olha o recorte de representatividade de investimento em localidades de altíssima prioridade educacional [veja mapa no quadro “Investimentos da Lei Rouanet”]. A pesquisa aponta que as regiões com altíssimas demandas sociais são as que menos recebem verba per capita.

Um ponto importante a ser ressaltado – que se tornou visível a partir de dados qualificados da pesquisa – é que se, por um lado, há um crescente interesse das companhias em usar as leis de incentivo fiscal para potencializar a transformação social, por outro vemos que essas corporações não estão investindo nos lugares certos.

## Uma nova profissão surge: o assessor dos investimentos sociais privados
Com os insumos produzidos pela plataforma, as empresas que fazem uso tanto da Lei Rouanet quanto de outras leis de incentivo podem tornar os investimentos sociais privados mais assertivos, direcionando os aportes para projetos e regiões que dialoguem com o cumprimento das metas da Agenda 2030. Para esse ganho de efetividade na decisão, as empresas podem optar por um aconselhamento direcionado, por meio de um assessor de investimento social privado, geralmente um profissional ou empresa que conhece a temática em profundidade.

Da mesma forma como um especialista em investimentos convencionais de capitais, esse profissional dá suporte às empresas para que tomem as melhores decisões de investimento social com base nos objetivos estratégicos da companhia. Essa ação maximiza o impacto social gerado pela companhia ao alinhar os objetivos da empresa às demandas sociais – criando uma carteira inteligente e de maior impacto. Ao mesmo tempo, impulsiona instituições com projetos sérios de uma maneira integrada, holística e harmônica.

É FUNDAMENTAL QUE, EM SEUS PLANEJAMENTOS DE INVESTIMENTO SOCIAL, os líderes empresariais atuem efetivamente na redução das desigualdades sistêmicas. Investimentos sociais mais assertivos – que cruzam demanda com soluções – resultam de um olhar mais acurado para projetos e iniciativas que não seriam vistos sem essa camada de inteligência à alocação dos recursos disponíveis. Quando monitorados, permitem mensurar o impacto gerado e que se estabeleça um fluxo contínuo de transformação social de maneira a alcançarmos, como sociedade, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU. O processo de decisão é claro:

1. Conhecer as demandas sociais de cada região do Brasil.
2. Saber quais os projetos sociais que realmente solucionam os problemas dessas regiões.
3. Submeter os projetos escolhidos a uma auditoria criteriosa.
4. Mensurar os resultados dos investimentos sociais realizados.

Com isso feito à risca, esse desbalanceamento vai deixar de ocorrer.

Artigo publicado na HSM Management nº 155

Compartilhar:

Artigos relacionados

Uso de PDI tem sido negligenciado nas companhias

Apesar de ser uma ferramenta essencial para o desenvolvimento de colaboradores, o Plano de Desenvolvimento Individual (PDI) vem sendo negligenciado por empresas no Brasil. Pesquisa da Mereo mostra que apenas 60% das companhias avaliadas possuem PDIs cadastrados, com queda no engajamento de 2022 para 2023.

Regulamentação da IA: Como empresas podem conciliar responsabilidades éticas e inovação? 

A inteligência artificial (IA) está revolucionando o mundo dos negócios, mas seu avanço rápido exige uma discussão sobre regulamentação. Enquanto a Europa avança com regras para garantir benefícios éticos, os EUA priorizam a liberdade econômica. No Brasil, startups e empresas se mobilizam para aproveitar as vantagens competitivas da IA, mas aguardam um marco legal claro.

Governança estratégica: a gestão de riscos psicossociais integrada à performance corporativa

A gestão de riscos psicossociais ganha espaço nos conselhos, impulsionada por perdas estimadas em US$ 3 trilhões ao ano. No Brasil, a atualização da NR1 exige que empresas avaliem e gerenciem sistematicamente esses riscos. Essa mudança reflete o reconhecimento de que funcionários saudáveis são mais produtivos, com estudos mostrando retornos de até R$ 4 para cada R$ 1 investido

ESG, Inteligência artificial e gestão, Diversidade, Diversidade
Racismo algorítimico deve ser sempre lembrado na medida em que estamos depositando nossa confiança na inteligência artificial. Você já pensou sobre esta necessidade neste futuro próximo?

Dilma Campos

Inovação
A transformação da cultura empresarial para abraçar a inovação pode ser um desafio gigante. Por isso, usar uma estratégia diferente, como conectar a empresa a um hub de inovação, pode ser a chave para desbloquear o potencial criativo e inovador de uma organização.

Juliana Burza

ESG, Diversidade, Diversidade, Liderança, times e cultura, Liderança
Conheça os seis passos necessários para a inserção saudável de indivíduos neuroatípicos em suas empresas, a fim de torná-las também mais sustentáveis.

Marcelo Franco

Lifelong learning
Quais tendências estão sendo vistas e bem recebidas nos novos formatos de aprendizagem nas organizações?

Vanessa Pacheco Amaral

ESG
Investimentos significativos em tecnologia, infraestrutura e políticas governamentais favoráveis podem tornar o país líder global do setor de combustíveis sustentáveis

Deloitte

Estratégia, Liderança, times e cultura, Cultura organizacional
À medida que o mercado de benefícios corporativos cresce as empresas que investem em benefícios personalizados e flexíveis não apenas aumentam a satisfação e a produtividade dos colaboradores, mas também se destacam no mercado ao reduzir a rotatividade e atrair talentos.

Rodrigo Caiado

Empreendedorismo, Liderança
Entendimento e valorização das características existentes no sistema, ou affordances, podem acelerar a inovação e otimizar processos, demonstrando a importância de respeitar e utilizar os recursos e capacidades já presentes no ambiente para promover mudanças eficazes.

Manoel Pimentel

ESG, Liderança, times e cultura, Liderança
Conheça e entenda como transformar o etarismo em uma oportunidade de negócio com Marcelo Murilo, VP de inovação e tecnologia da Benner e conselheiro do Instituto Capitalismo Consciente.

Marcelo Murilo

ESG
Com as eleições municipais se aproximando, é crucial identificar candidatas comprometidas com a defesa dos direitos das mulheres, garantindo maior representatividade e equidade nos espaços de poder.

Ana Fontes

ESG, Empreendedorismo
Estar na linha de frente da luta por formações e pelo desenvolvimento de oportunidades de emprego e educação é uma das frentes que Rachel Maia lida em seu dia-dia e neste texto a Presidente do Pacto Global da ONU Brasil traz um panorama sobre estes aspectos atuais.

Rachel Maia