Panorama Mulheres 2023

Panorama Mulheres 2023 : o avanço delas na liderança é silencioso, mas contínuo

O estudo Panorama Mulheres 2023, realizado pelo Talenses Group em conjunto com o Insper e divulgado em primeira mão por HSM Management, ajuda a enxergar abaixo da superfície e responde a perguntas essenciais sobre a liderança feminina

Maria Clara Lopes

Maria Clara Lopes é colaboradora da revista HSM Management....

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Quem acompanha o movimento pró-equidade entre homens e mulheres nas organizações por posts de redes sociais pode achar que esse tema entrou na agenda nos últimos dez anos. De fato, o debate ficou mais barulhento, e a pressão por ações afirmativas ganhou voz e corpo junto à opinião pública nessa última década, mas ele não é recente. Pode-se dizer que ele tem 30 anos, isto sim, se considerarmos o ano de 1993 como um divisor de águas, quando a declaração e o programa de ação da 2ª Conferência Internacional de Direitos Humanos da ONU, realizada em Viena, reafirmando os direitos humanos de mulheres e meninas como inalienáveis, colocou como objetivos prioritários da comunidade internacional a “erradicação de todas as formas de discriminação” com base no sexo.

Essa noção histórica é importante porque nos leva a ver o filme mais do que a fotografia e a entender melhor os dados apresentados no *Panorama Mulheres 2023*, estudo realizado por Insper e Talenses Group, e publicado em primeira mão por __HSM Management__. Apesar de, conforme a amostra analisada, 83% dos cargos de presidência das empresas ainda serem ocupados por homens, o surgimento contínuo de leis e políticas públicas, somado ao crescimento do número de consultorias especializadas e manifestações pró-equidade na mídia e nas redes sociais, contam uma história diferente: o avanço é praticamente contínuo. Assim, é para o filme, mais do que para a foto, que devemos olhar – para um filme povoado de dados que sinalizam a mudança maior.

Como pontua Ana Diniz, professora do Insper e uma das coordenadoras do Panorama Mulheres 2023, “a gente sabe que existem problemas; faz parte de um processo decisório mais robusto trazer dados para a discussão”. Neste especial, HSM Management apresenta os dados do Panorama Mulheres 2023, numa resenha do filme, aprofundando causas, consequências e caminhos futuros com especialistas e também trazendo a perspectiva de organizações e de mulheres líderes.

## Parte I – O tamanho do problema
Como dissemos, o gap continua a ser bem grande: apenas 17% dos cargos de presidência das empresas são ocupados por mulheres, numa projeção da amostra no *Panorama Mulheres 2023* para o mercado brasileiro. E esse número, por incrível que pareça, representa uma conquista, principalmente em um período pós-pandemia. Em 2019, apenas 13% das posições de presidência eram ocupadas por mulheres e em 2017, primeiro ano da pesquisa, elas eram apenas 8% das pessoas presidentes nas empresas.

Na avaliação do professor do Insper e coordenador técnico do *Panorama Mulheres 2023* Fernando Ribeiro Leite Neto, essa elevação pode ser vista como uma expansão quase contínua da presença de mulheres nas lideranças das empresas avaliadas, em todos os níveis hierárquicos. “{Os dados} parecem indicar que o desenho, no médio prazo, é de aumento da presença de mulheres nas presidências e nos cargos de alta liderança”, explica ele.

Das quatro posições no foco da pesquisa – diretoras, vice-presidentes, presidentes e conselheiras –, o último grupo foi o que teve evolução mais significativa. A presença de mulheres nos conselhos de administração (CAs) em 2017 era de meros 10%; saltou para 21% no estudo de 2023.

A segunda tendência de crescimento de maior destaque se deu na vice-presidência. Em 2017, eram só 18% de VPs mulheres, e agora a proporção está em mais que um terço do total (34%).

O mesmo não ocorreu com as mulheres diretoras, no entanto. Essa evolução é mais lenta. Em 2017, elas ocupavam 21% das posições das empresas do estudo que declaram ter a posição de diretoria na sua estrutura; em 2023, o percentual subiu para 26%.

“A gente ainda tem o efeito do degrau quebrado”, pontua Margareth Goldenberg, CEO da Goldenberg Diversidade e gestora executiva do Movimento Mulher 360. “Nós temos em torno de 56% de mulheres concentradas em cargos até coordenação, cargos de entrada, assistentes, analistas, e esse total se transforma em menos de 20% quando falo em mulheres gerentes e diretoras.” Um dos focos do Movimento Mulher 360, conta ela, é justamente entender o que leva a quebrar esse degrau e o que fazer para superá-lo.

A lista de causas para isso é extensa: “Temos muitas questões culturais, de ambiente machista, masculinizado, a expectativa do líder das atitudes, muito mais masculina do que feminina, a forma como se dá feedback, como se promove é diferente, a maternidade – as mulheres estão engravidando mais tarde, geralmente porque estão nessa fase de coordenação”, elenca, destacando vários vieses e mitos. É um alerta quanto à média gerência, que representa a grande massa da empresa e onde se encontram as principais resistências. Ainda assim, ela reconhece avanços na maturidade das empresas do Brasil, que hoje buscam mais forma para implementar ações do que para conscientizar suas lideranças. Avanço que também é visto por Luiz Valente, CEO do Talenses Group.

“Desde 2011, quando começamos a nos envolver mais, vejo claramente uma maior conscientização das empresas – seja familiar ou de capital aberto e com uma governança mais complexa –, sobre a necessidade de ter lideranças femininas e mulheres em posição de comando nos vários níveis.” Um dos principais indicadores, para ele, é a mudança de comportamento dos clientes do grupo. “O maior termômetro são nossos clientes nos pedindo que a lista de candidatos que indicamos tenha 50% de mulheres. Isso é um fato, e é um demonstrativo do calor do mercado”, acredita Valente, que estima que possivelmente 50% das empresas já façam esse pedido.

## O efeito “presidenta”
Uma constatação importante do *Panorama Mulheres 2023* é que uma mulher no exercício da função de presidente gera efeitos em toda a composição de gênero nos cargos de liderança da empresa. Os dados indicam que a proporção de mulheres nos cargos de vice-presidência, diretoria e conselhos é 2x maior, na média, quando a presidência é ocupada por uma mulher do que com um homem no mesmo cargo.

No caso de vice-presidentes, por exemplo, empresas da amostra que são lideradas por homens têm 19% de mulheres na vice-presidência e 28% quando a liderança é feminina, o que indica uma probabilidade 50% maior de mulheres nessa posição quando há uma CEO mulher.

Essa influência também é notada na composição dos CAs. Quando a empresa é presidida por uma mulher, a participação de mulheres nos conselhos é de 43% enquanto nas presidências masculinas a proporção é de 16%. Isso leva a uma probabilidade 2,7 vezes maior de haver mulheres conselheiras nas empresas lideradas por mulheres. Tais números indicam um possível compromisso das lideranças femininas com a composição equalitária de gênero na liderança empresarial.

Tão importante quanto o que causa a presença de mais mulheres na alta gestão é compreender que esse contexto colabora para a equidade, ainda que, como lembra Ana Diniz, nem todas as mulheres estejam alinhadas com a questão de igualdade de gênero. Isso porque a simples presença da diversidade abre questões e contribui para essa maior participação das mulheres na gestão.

“Na teoria, podemos pressupor que existe, nesses casos {onde há mulheres na alta gestão}, um ambiente organizacional mais propício para as mulheres ocuparem essas posições de destaque”, comenta a pesquisadora. Ela explica que, apesar de a pesquisa não ter feito a análise demográfica de outros níveis hierárquicos, pode-se inferir que a formação de massa crítica em prol da equidade nessas empresas gera condições mais propícias para a entrada de mulheres na organização. “Mais do que o que veio primeiro, o ovo ou a galinha, esse ambiente pode inclusive resultar em diferentes práticas e políticas {para a equidade}”.

Diferenciais de Vania Neves, CTO da Vale

A família está no centro da conversa sobre o sucesso profissional de Vania Neves, executiva C-level e conselheira, o que inclui suas netas, seu filho e o marido, Mauro. E valores também, aprendidos com seus pais, dona Nilza e seu Oscar, ambos funcionários públicos: estudar e a estar sempre sempre arrumada “para não ser confundida com bandidos na rua”.

Neves se interessou por tecnologia ainda na adolescência, ao notar a ampliação de oportunidades proporcionada às pessoas. “Digo que sou uma ‘tech people person’, porque eu olho a tecnologia, mas primeiro eu olho as pessoas.” Conseguiu cursar matemática em universidade pública, depois análise de sistemas, e trabalhou enquanto estudava. Formada, foi trainee na White Martins, e lá ficou 12 anos, mas, quando foi impedida por um chefe de aceitar um convite para trabalhar nos EUA num episódio de racismo, saiu. Migrou para a telecom Intelig (5 anos), a farma Glaxo – atual GSK (15 anos e sua primeira posição sênior/regional) e hoje é uma líder na Vale, fruto de sua conexão com a transformação cultural da empresa.

Neves atribui suas conquistas ao lifelong learning e ao foco no desenvolvimento de pessoas. Também fez trade-offs. Exemplo: por um tempo, alisou seu cabelo, mas hoje o assume como é.

O segredo de Jurema de Araújo, CMO da Hypera

Pouco antes de completar 40 anos, Jurema Aguiar de Araújo ocupou a cadeira de diretora-geral no Brasil da Castrol, multinacional de lubrificantes, que comandou por três anos com resultados consistentes de crescimento. Porém quando alguém pergunta à atual diretora de marketing da farma Hypera, empresa nacional de capital aberto, se gostaria de se sentar novamente na cadeira de presidente, ouve um “não, não quero”. Ela diz que a qualidade de vida e a família foram ajustando sua ambição. Hoje, aos 51 anos, Araújo conta que sua carreira foi planejada, incluindo o momento da gravidez, dez anos depois de casada, aos 31 anos. Houve ocasiões em que, por ser uma liderança mulher e jovem, sentiu que outros duvidavam de sua capacidade? Sim. Mas ela também sentiu que, quando o desconforto inicial é mitigado e se constroem relações de confiança, “as ideias vencem os preconceitos”. É preciso ter paciência, aprendeu Araújo.

O futuro se constrói hoje

Como se toma a decisão de lançar um instituto para ampliar as ações afirmativas em DEI no mercado de recrutamento de profissionais.Por Carla Fava

Não há dúvida. Olhando pelo retrovisor, temos orgulho da trajetória que construímos até aqui no Talenses Group como uma empresa que conecta profissionais a outras empresas, todos os dias. Mas, ao mesmo tempo, sabemos que reflexões são necessárias, incontornáveis até eu diria. E nós as temos feito nos últimos anos. Como empresa, qual é o legado que queremos deixar? Qual nosso papel de agentes de mudança na construção de um ambiente de trabalho mais justo?

Em 2023, quando nossa empresa completa uma década de vida, somamos ação a essa reflexão: o Talenses Group decidiu lançar um instituto homônimo para ampliar nossa visão de mundo. Como é dentro das organizações que milhões brasileiros têm a oportunidade de construir suas carreiras – e, consequentemente, gerar renda para si mesmos e suas famílias –, todos os brasileiros devem poder se beneficiar dessas oportunidades, e nós podemos ajudar.

Assim, nosso instituto social se propõe a trabalhar em dois pilares fundamentais para acelerar este movimento: equidade de gênero e conexão de jovens em vulnerabilidade social com o mercado de trabalho.

PROGRAMA EQUALIZA. Desde o ano de fundação do Talenses Group estamos envolvidos em debates que visam contribuir para a correta participação das mulheres no mercado de trabalho. Sabemos que iniciativas isoladas têm o seu valor, mas sentimos a necessidade de aprofundar ainda mais e buscar modos de amplificar nossa voz, nossas ações e nossa vontade. Por isso, sempre amparados nos princípios do empoderamento das mulheres promovidos pela ONU Mulheres, vamos dar a isso unidade e maior força: a partir de agora, todas as ações realizadas estarão vinculadas ao Instituto Talenses Group. Com esse movimento, nosso intuito é trazer ainda mais luz aos impactos gerados por nossos projetos, para que mais ações sejam criadas nesse sentido.

PROGRAMA LINKA. Enquanto os jovens forem a força motriz para a construção do futuro, é neles que precisamos mirar. Acreditamos que a porta de entrada para um mercado de trabalho mais plural reside na preparação dos jovens – mulheres incluídas, naturalmente – para o início da carreira corporativa. O programa é baseado em uma jornada de capacitação para os primeiros passos de quem quer entrar no mundo corporativo, mas não sabe por onde começar. Nossa expertise em processos seletivos e entrevistas de emprego será aplicada a uma plataforma de capacitação online, na qual jovens vinculados a projetos parceiros poderão absorver conhecimentos sobre o mercado de trabalho. Também trabalharemos para que eles sejam apresentados às organizações que se interessem em oferecer uma oportunidade de trabalho digna.

Estamos convencidos de que empresas existem não só para desenvolver a economia. Nossa responsabilidade inclui, sim, e cada vez mais, o desenvolvimento social. Que tal sua empresa também abraçar a causa?

Carla Fava é diretora administrativa do Instituto Talenses Group e diretora de RH, marketing e comunicação do Talenses Group

## Onde estão as mulheres?
Pelo *Panorama Mulheres 2023*, a resposta para essa pergunta, que virou bordão da colunista de __HSM Management__ Neivia Justa, pode ser: em empresas familiares, de capital fechado, de serviços e com sede no Brasil. Os dados dos questionários da pesquisa de 2023 mostram que, nas empresas familiares, 25% dos presidentes são mulheres, enquanto nas empresas de administração profissional o índice cai para 14%.

Essa tendência já aparecia na edição de 2019 do estudo, quando os dados indicavam maior probabilidade de encontrar mulheres na presidência de empresas com sede no Brasil, de capital fechado, do setor de serviços, de administração familiar e de pequeno porte (ou seja, até nove funcionários).

Empresas de capital fechado também são mais equitativas do que aquelas com capital aberto, um padrão que se intensificou na pandemia. Entre 2019 e 2023, as empresas de capital fechado ampliaram a presença de mulheres em todos os cargos de liderança, exceto vice-presidência. E mesmo nas empresas de capital aberto da amostra houve crescimento de uma pesquisa para a outra. Em 2019, 1% dessas empresas tinha presidentes mulheres. Em 2023, a proporção subiu para 7%, enquanto nas empresas de capital fechado o avanço foi de 18% para 20%.

As fortalezas de Adriana Carvalho, CEO da Generation

Nos cerca de 25 anos de vida profissional, Adriana Carvalho tem passagem por áreas tão diferentes como cadeia de fornecimento, gestão e diversidade e inclusão (D&I), bem como por organizações que vão de Dow Brasil a consultorias – foi a líder em D&I e responsabilidade corporativa da EY para Latam –, passando por organismos internacionais como a ONU Mulheres (onde comandou, de 2016 a 2020, a plataforma de Princípios do Empoderamento Feminino). Hoje lidera uma organização não governamental, a Generation Brasil, um programa global fundado por McKinsey, BlackRock, Microsoft e Verizon que fomenta a empregabilidade de jovens por meio de programas de educação orientados para as necessidades das empresas. Com esse histórico, Carvalho se tornou uma livre pensadora contundente, ou surpreendente, sobre práticas das organizações. “Há uma mistura de pautas muito grande”, diz ela, referindo-se à associação que alguns fazem entre agenda DEI
e movimentos de esquerda, por exemplo. Ou “ muitas mulheres acabam reproduzindo mais machismo do que
os próprios homens”,
o que ela atribui em
parte a uma busa de segurança psicológica.

O efeito, porém, não se repetiu em outros cargos. O estudo mostra que há maior proporção de conselheiras em empresas de administração profissional do que nas familiares. E, entre 2019 e 2023, houve redução na participação de mulheres na vice-presidência nos dois tipos de empresa. A participação de mulheres na diretoria é similar nas duas categorias de empresas.

Quando se observa o tamanho da organização, a presença da mulher na alta gestão cai à medida que o tamanho da organização aumenta. Essa tendência já era vista na edição de 2019 e foi confirmada com os dados de 2023, que mostraram, inclusive, crescimento do número de mulheres diretoras, vice-presidentes e conselheiras nas empresas até nove funcionários de um estudo para outro. O número de presidentes ficou estável, em 67%.

__Leia também: [Plataforma de mulheres para mulheres](https://www.revistahsm.com.br/post/plataforma-de-mulheres-para-mulheres)__

Esse efeito não se repetiu nos outros perfis de empresa. Naquelas entre nove e 49 funcionários, houve aumento do número de mulheres presidentes no período, passando de 14% para 38% (índice ainda abaixo do de presidentes de pequenas empresas), com pouca variação no total de diretoras e conselheiras. A redução de VPs, no entanto, foi grande, mesmo com a diferença no tamanho da amostra. De 100% em 2019, caiu para 43% em 2023.

Com relação aos setores de atividade das empresas da amostra, o setor que apresenta um percentual mais homogêneo de mulheres nos quatro blocos da alta gestão é o de serviços, com presença igual ou superior a 20% em todos os cargos, o que representou uma evolução (exceto no caso de vice-presidentes, cujo percentual caiu de 30% em 2019 para 24% em 2023). É preciso destacar ainda um salto positivo no volume de mulheres na presidência de empresas do setor de comércio: de 4% em 2019, elas passaram a representar 50% das posições em 2023. Também houve evolução – mais discreta – no total de diretoras, que passou de 28% para 36% em 2023.

A receita de Alini dal Magro, CEO do Instituto Proa

O primeiro ponto que chama a atenção na executiva Alini Dal Magro é sua juventude – ela tem 34 anos. Mas seu foco e clareza logo nos fazem esquecer isso. Nasceu numa cidade de 200 habitantes no interior de Santa Catarina, mas filha de uma família de “mulheres poderosas” – “somos sete netas” –, e com um pai que sempre a incentivou a perseguir seus objetivos. Em vez de casar cedo, entrou na Universidade Federal de Santa Catarina aos 16 anos e, desde o começo, “queria ser CEO”. Fez intercâmbio no exterior, formou-se e mudou-se para São Paulo, onde sabia que podia crescer. Virou trainee de novos negócios na editora Saraiva e, quando esta foi comprada pela Somos Educação, foi convidada a ser a PMO da integração. Aos 27 anos era head de uma unidade de negócios de ensino técnico; aos 28, diretora do Instituto Singularidades; aos 31, CEO do Instituto Proa. Chegou a ficar um ano sem ver os pais por trabalhar 15 horas diárias. Dal Magro não se vê como uma ativista do feminismo, embora esteja atenta a fenômenos “reais” como o da síndrome de impostora. Hoje tem uma rede de apoio feminina, mas com bem mais VPs que CEOs, como ela diz. E a maternidade? Bem, ela congelou os óvulos.

A pesquisa indica que é preciso um esforço maior das organizações para ampliação de mulheres no setor de indústria. De 2019 para 2023, houve um ligeiro avanço (de 6% para 7%) de mulheres apenas na posição de presidência; em todos os outros blocos, houve queda, principalmente nos conselhos de administração (de 17% para 11%). A redução na vice-presidência foi de 1% no período (de 19% para 18%) e na diretoria passou de 23% para 20%.

Outro ponto que é notado com frequência nas pesquisas e que o *Panorama Mulheres 2023* (e que já tinha sido notado na edição de 2019) confirma é a baixa incidência de mulheres com origem em áreas mais “hard” do negócio, como tecnologia e operações. As áreas de atuação e origem das mulheres na liderança costumam ser predominantemente áreas de suporte à gestão, como marketing, jurídico, finanças e recursos humanos. Fato que também foi verificado no estudo Women in the Workplace, feito pela McKinsey em 2023. Os dados apurados pelo *Panorama Mulheres 2023* é que há sobreposição na distribuição de frequência das áreas. O estudo cita como exemplo, que 38% das vice-presidentes atuam em RH, mas também podem ser responsáveis por vendas ou marketing. Depois de RH, as áreas com maior prevalência de mulheres na vice-presidência foram finanças (25%) e jurídico (18%). Sem surpresas, tecnologia é a área com menor frequência de vice-presidentes mulheres.

Interseccionalidade em foco
Mulheres PcD são o segundo grupo mais contemplado nos planos de açÃO

O estudo “Panorama Mulheres” começou, na edição 2023, a medir também como essas intersecções são tratadas pelas organizações em seus planos de ação. Na amostra, foi percebido que o foco principal das ações para diversidade estão em dois grupos de marcadores, o de mulheres negras (cerca de 80%) e o de mulheres com deficiências, ou PcD (com cerca de 60%). Outros grupos próximos desse índice são mulheres jovens, mulheres com filhos e mulheres acima de 50 anos. Pouco mais de 20% disseram ainda ter programas para mulheres indígenas. Há obstáculos culturais que se manifestam das formas sutis (muitas vezes, nem tão sutis assim). Dilma Santos, CEO da Outra Praia e conselheira em várias organizações, já escreveu que, mesmo com o ambiente mais favorável, as jovens que começam em programas de trainees afirmativos para a população negra continuam a sofrer discriminação.

Uma das descobertas do estudo Panorama Mulheres 2023 com relação às intersecções é que o segundo grupo que está mais contemplado nos planos de ação das empresas da amostra é o de mulheres PcD. Para Carolina Ignarra, fundadora do grupo Talento Incluir, a deficiência em si conta muito. “Uma mulher cadeirante lésbica passa de forma mais blindada pela homofobia”, avalia, completando: “A deficiência nos resume”. Ela mesma, cadeirante aos 23 anos após um acidente de carro, disse sentir um incômodo por ter demorado para se entender como mulher.

Ignarra sugere como avançar na inclusão. Primeiro, medir. Depois, apoiar a evolução na carreira. Para isso, ela vê duas frentes: mentorias/aconselhamentos e “colar em outras mulheres”. (MCL)

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![Thumbs HSM 157-13](//images.ctfassets.net/ucp6tw9r5u7d/3dFCuMYmiIu8rdG86oiHtn/652b3ade6a8559ad602a58eb5eb7bc86/Thumbs_HSM_157-13.png)

O quadro é similar quando se olha para as diretorias. Recursos humanos é a área com maior predominância de diretoras mulheres (cerca de 45%), seguido por marketing (30%). Em seguida, vê-se uma distribuição maior em três áreas – finanças, operações e vendas – com cerca de 25% de participação.

No caso das conselheiras, no entanto, a área predominante dessas lideranças é a financeira (27%), com RH na sequência (20%), seguido por operações (19%). Nos dois casos, tecnologia é a área com menor participação de mulheres – diretoras ficam abaixo de 15% e conselheiras com menos de 10%.

Para Margareth Goldenberg, junto com o degrau quebrado, essa concentração de mulheres nas áreas de apoio é outro problema e um desafio grande a ser resolvido. “Não adianta falar que tem 40% de mulheres em um total – isso até engana – e depois vamos ver quais as áreas, quais os cargos, qual a velocidade da jornada, e quando vejo, mais de 60% estão em comunicação, jurídico, financeiro, RH. E quando elas ascendem à liderança, vão ser diretoras de RH, de marketing, jurídico”, algo que fica claro nos dados do *Panorama Mulheres 2023*. “Agora, alguém consegue ser CEO de uma empresa ficando 20 anos no RH? É preciso ter mobilidade interna em áreas core do negócio, passando por vendas, desenvolvimento, operação, para conhecer o negócio e poder ser uma CEO. Não é só no cargo que elas estão estagnadas, mas também nas áreas”, reforça a executiva do Movimento Mulher 360.

Como acelerar os avanços
Sete passos ajudam a tomar as decisões. Por Margareth Goldenberg

Nos últimos dez anos, a pauta de equidade de gênero no segmento corporativo teve muitos avanços, mas ainda sobram desafios. Vivenciando o tema em mais de 150 empresas, como consultora ou líder do Movimento Mulher 360, percebo que o porquê já está resolvido. Já se compreende que a equidade de gênero é um imperativo moral, legal e econômico, e é o caminho a seguir. A questão é o “como”.
São inúmeras as dúvidas: é responsabilidade do RH? Das lideranças ou dos grupos de afinidade (GAs)? Ampliar representatividade ou fazer a inclusão em primeiro lugar? Sugiro os seguintes passos:

1. Posicionar-se. Comece pelo engajamento da alta liderança. O tema deve estar vinculado aos valores e à estratégia de negócio, não um tema do RH apenas, e ter o CEO como aliado e patrocinador da causa na organização.
2. Diagnosticar. Onde estamos? Não basta pesquisar quantas mulheres existem no headcount total; deve-se saber onde elas estão, em quais áreas e cargos, quais os marcadores sociais dessas mulheres (somente brancas, hetero e sem deficiência), qual a velocidade da jornada de desenvolvimento; qual é o índice de turnover, em especial pós-licença maternidade. E ainda: a ambiência é justa, sem discriminação, assédio e microagressões? Há oportunidades de desenvolvimento equitativas?
3. Definir para onde ir. Identifique os desafios e as oportunidades de avanços. Para tanto, defina um posicionamento, conectado com os valores e cultura da organização, com diretrizes claras.
4. Definir como chegar lá. Para responder a isso, é preciso desdobrar esse posicionamento e as diretrizes estratégicas em um plano tático com a definição das ações afirmativas a serem realizadas em todo o ciclo de vida da colaboradora: atração, seleção, desenvolvimento, promoção e retenção. E incluir iniciativas de educação e comunicação para fortalecimento da cultura inclusiva e transformação de mindset em toda a organização.
5. Estabelecer metas claras a perseguir, bem como indicadores de processos e de resultados. Importante: sempre com um olhar interseccional. As barreiras estruturais e culturais das mulheres se interseccionam com outros marcadores identitários; mulheres negras, por exemplo, somar as barreiras do machismo e do racismo. Caso contrário, não há avanço real.
6. Estruturar a governança. Defina atribuições e responsabilidades para as instâncias envolvidas: RH, comitê técnico, comitê de lideranças, grupos de afinidade e sponsors. Essa fase costuma ser esquecida ou adiada.
7. Conectar-se com movimentos empresariais promotores da equidade e diversidade.

Margareth Goldenberg é CEO da Goldenberg Diversidade e gestora executiva do Movimento Mulher 360.

Elevar o total de mulheres na área de tecnologia passa, para Vania Neves, CTO da Vale, por trabalhar intensamente o gosto pelas disciplinas de exatas e lógica desde a infância. Ela, que é conselheira de algumas organizações e membro do conselho editorial desta revista, lembra como o estímulo começa na infância. Por exemplo, estimulando as meninas desde pequenas com brinquedos que desenvolvam a capacidade cognitiva, “junto com as bonecas”. E na escola, as meninas precisam ser estimuladas a ver a matemática “e coisas que envolvem o raciocínio lógico e ver que as exatas são legais”, defende.

Para Neves, se não trabalhar a base, a conta não fecha. “É preciso mais mulheres em cursos técnicos, e em graduações da área de exatas. E em uma idade mais adulta, precisamos de trabalhar fortemente no desenvolvimento de hard e soft skills para que tenhamos bem mais mulheres preparadas dentro e fora das empresas.”

Mudanças na seleção também fazem diferença. “Uma das coisas que fazemos aqui na Talenses, em todos os processos que conduzimos, especialmente nos de liderança, é que temos uma meta de 50% de mulheres na lista final de candidatos”, explica Valente. “Obviamente que a gente sempre procura ter os melhores profissionais, os mais adequados para o perfil daquela posição, mas sempre tentamos compor as listas com uma equidade de gênero.”

Paridade de gênero no topo – até 2050
movimento promove ideia do meio a meio entre líderes. Por Sandra Regina da Silva

Atingir a paridade de gênero na alta liderança nas empresas é a ambição do movimento “Elas Lideram 2030″. No início de maio de 2023, 79 empresas já estavam oficialmente comprometidas com essa agenda, além de três empresas embaixadoras e dez parceiras estratégicas. Mas ainda está longe da meta de seus criadores – o Pacto Global da ONU Brasil e a ONU Mulheres –, que é atrair a adesão de 1,5 mil empresas.

Só assim o movimento deve atingir seu objetivo: promover nas empresas brasileiras 11 mil mulheres para cargos de alta liderança até 2030 e ter pelo menos 150 lideranças de alto nível engajadas com essa ambição.

Uma das que aderiram recentemente ao movimento é a Leadcomm, empresa de soluções de cibersegurança, que se comprometeu a chegar em 2030 com 50% do board de gestão ocupado por mulheres. Hoje, elas representam 32% da alta liderança da empresa. Não se vai substituir homens por mulheres mas aumentar o número de funcionárias, diz a head de pessoas Ingrid Chiarini.

![Thumbs HSM 157-14](//images.ctfassets.net/ucp6tw9r5u7d/1g3xWHsxTuOyiUrXKrAuW4/1f602fd3db32bd1bd62b3dde8a68986a/Thumbs_HSM_157-14.png)

## O retrato da liderança delas
É comum ouvirmos, quando o tema é diversidade, equidade e inclusão, a consciência de ver a foto da organização. Pois a foto que o *Panorama Mulheres 2023* apresenta ainda é de lideranças predominantemente brancas, principalmente em empresas presididas por homens. Já as empresas com mulheres na presidência tendem a ter um quadro com mais diversidade, a começar pela própria cadeira de presidente. Nas empresas com presidência masculina, 91% são homens brancos, e há os pardos (5,5%) e os de ascendência oriental (2,5%). Dois presidentes da amostra são homens negros (0,8%) e há um indígena (0,4%).

Quando o foco está nas empresas com liderança feminina, a foto muda. Das mulheres presidentes, 75% são brancas, 14% são pardas (uma proporção três vezes maior do que de homens pardos). O estudo também verificou maior presença de pretas (4%) e orientais (4%) entre as presidentes de gênero feminino.

Amanda Andreone é diretora-geral da Genesys Brasil

Os 30 anos de carreira de Amanda Andreone se passaram em organizações de tecnologia e, hoje, além de liderar uma empresa tech, ela atua como investidora-anjo de startups, buscando levar mais governança a elas – inclusive no campo da diversidade. Do outro lado, ela prega muita capacitação feminina. “Só se pode ter número quase igual de profissionais mulheres se tiverem competência.” Apesar do ambiente predominantemente masculino, Andreone não se queixa de sofrer preconceito – nem na maternidade (ela tem dois filhos), mas viu colegas sofrerem. E aprendeu a lidar com machistas, pondo-se em outro patamar. “Não dou palco.”

Será que essa pluralidade, dependendo do gênero que está ocupando a cadeira da presidência, se repete nos outros níveis hierárquicos avaliados? “O que vimos é que a composição racial nesses quatro grandes blocos hierárquicos é mais diversa quando a presidência é ocupada por uma mulher”, ressalta o professor Ribeiro.

Por exemplo, tanto nas empresas presididas por homens quanto nas lideradas por mulheres,

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