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Para entender PIKETTY E KLEIN

A influência desses agentes da mudança é crescente, mas será que você entende por que o economista francês Thomas Piketty e a jornalista canadense Naomi Klein fazem tanto sucesso? Deveria, pois desafiam o mundo empresarial como o conhecemos

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“Criticar é fácil; Thomas Piketty e Naomi Klein só sabem criticar” ou “Piketty e Klein são populistas, demagogos”. Esses tipos de comentários podem ser corriqueiros em rodas de executivos, mas são mal informados. A razão pela qual esse economista francês e essa jornalista canadense inspiram milhões de pessoas não é o fato de “serem percebidos como críticos e independentes” ou o de “falarem o que a multidão quer ouvir”.

É preciso distanciar-se e observar o fenômeno para conseguir compreendê-lo: Piketty e Klein escolheram pôr o dedo nas duas feridas fundamentais identificadas por toda a humanidade atualmente – desigualdade social e mudança climática. Podem ser descritos, no próprio jargão da gestão, como “agentes da mudança” necessários.

O que os dois querem mudar, no entanto, não é a cultura ou a gestão de empresas, mas toda a ordem econômica mundial. E eles não apenas mostram ambição; trabalham duro para mobilizar pessoas em torno de uma solução e propõem alternativas concretas.

Piketty, que dá aulas na PSE–École d’Économie de Paris, provou, com o livro O Capital no Século 21, que a desigualdade na distribuição de riqueza vem aumentando desde os anos 1980, tanto na Europa como nos Estados Unidos, o que fica claro em uma classe média enfraquecida. Ao apoiar o que era uma hipótese em dados sólidos, ele criou a ruptura requerida para que os líderes comecem a agir.

A denúncia de Naomi Klein é igualmente disruptiva. Em seu livro This Changes Everything: Capitalism versus the Climate, ela enfatiza que a mudança climática em curso, já grave, é ainda mais agravada pelo capitalismo como é hoje e que a transformação do sistema se faz urgente por essa razão.

Vale a pena conhecer os highlights do pensamento desses dois agentes da mudança.

**A MUDANÇA DE THOMAS PIKETTY**

O Capital no Século 21 conta a história da riqueza e de sua distribuição nos últimos 250 anos. “O que fiz foi reunir uma série de evidências para mostrar que a desigualdade está aumentando e que isso resulta em um sistema financeiro mais frágil para enfrentar crises”, explica Piketty.

Ainda é cedo para saber se essa nova ideia está influenciando quem toma decisões, nos governos e nas empresas, e, em consequência, se influirá no futuro. Contudo, segundo o economista, há ao menos uma boa notícia: “Fica claro que tudo dependerá das instituições e das políticas que escolhermos. A democratização, especialmente a do conhecimento, pode fazer toda a diferença”.

Piketty chega a propor, por exemplo, uma visão diferente de democracia. “É mais do que escolher representantes”, afirma. Em essência, baseia-se sobretudo no acesso à informação e também nas mínimas coisas que fazemos em nossa vida, que são formas de ação política.

Não é novidade que a distribuição de riqueza seja desigual; na história da humanidade, sempre foi assim. A surpresa é que, há um século, a classe média era mais robusta do que hoje, ao menos na Europa e nos Estados Unidos.

Houve uma quebra de expectativas. Espera-se sempre que os vários estratos da sociedade – pobres, ricos e classe média – cresçam de maneira equiparada, e isso não está ocorrendo. Os ricos têm crescido a taxas muito maiores que os demais nas últimas décadas.

“É uma situação delicada, porque os ricos têm mais possibilidade de evadir impostos, levando seu dinheiro a paraísos fiscais; e, quando a classe média sente que paga mais impostos do que os ricos, imediatamente o modelo econômico entra em crise”, alerta o francês.

Piketty, porém, aposta que essa crise provocada pela classe média que se sente injustiçada embutirá uma real oportunidade de mudança da ordem econômica mundial. Ele mesmo propõe uma solução para o problema: um sistema de pagamento de impostos progressivos em escala global, garantidor de que os ricos não consigam evadir divisas legalmente.

É importante acrescentar que o economista não quer que todos concordem com suas ideias; ele convida, isto sim, ao debate, de maneira tal que cada um tire as próprias conclusões. Mostra, desse modo, o que acredita ser mais um elemento de uma definição correta de democracia: os temas que forem importantes para todos devem poder ser debatidos por todos.

**A MUDANÇA DE NAOMI KLEIN**

A jornalista e pesquisadora canadense Naomi Klein ganhou os holofotes com o movimento antiglobalização observado no início deste século. No entanto, seu maior impacto como agente de mudança diz respeito à mudança climática, que, a seu ver, pode efetivamente conduzir à transformação da ordem econômica mundial.

Como o sistema econômico atual define sucesso em função do crescimento econômico, diz Klein, sempre que a economia não cresce, vem uma crise. A consequência disso é simples: “Qualquer política passa a ser válida quando temo objetivo de crescimento, mesmo que seja preciso sacrificar a estabilidade e a sobrevivência do planeta”. Para ela, isso explica o que está acontecendo à Grécia, por exemplo: “Querem impor aos gregos, como única saída para suas dificuldades, esforços para obtenção de gás e petróleo, o que constitui enorme risco para uma economia que se baseia no turismo e na pesca”.

Em seu livro This Changes Everything: Capitalism versus the Climate, Klein defende que a mudança climática pode ser agravada pelo capitalismo, mas que compreender isso nos dá a oportunidade de exigir e construir um mundo melhor. “Não acho que as pessoas sejam indiferentes sobre o mundo que deixarão a seus filhos e netos, como alguns dizem; elas apenas estão paralisadas com as perspectivas aterrorizantes e evitam pensar no assunto”, afirma. Entretanto, segundo ela, historicamente são esses momentos de crise que põem os seres humanos à prova e é quando eles se superam.

Klein planeja repensar o problema desafiando, em primeiro lugar, o modelo que separou a mudança climática das demais preocupações; as coisas precisam estar conectadas. Em segundo, ela prega mudanças no sistema capitalista, que piora a crise porque sempre persegue o crescimento de curto prazo. A terceira medida é reverter o fato de a sociedade ter deixado de acreditar na capacidade do sistema de resolver problemas, o que aconteceu por ter perdido a fé em seus líderes políticos.

Diante disso, Klein acredita que a ameaça ao clima, que atinge todo o mundo, possa ser o gatilho que impulsione uma coalizão com adesão maciça, capaz de criar o contexto para a próxima economia.

Para solucionar o problema da mudança climática, sua principal proposta é investir pesadamente em uma infraestrutura que nos livre da dependência do petróleo, gerando novas fontes de energia renovável e priorizando transportes públicos que acabem com acultura do automóvel.

A esse respeito, a pesquisadora aponta a Alemanha como exemplo: em poucos anos, a participação da energia renovável sobre a oferta total saltou de 6% para 25%, e a evolução deveu-se principalmente ao fato de os cidadãos terem assumido o controle. “As pessoas votaram a favor da mudança que as empresas privadas não tinham vontade de fazer”, lembra Klein.

Iniciativas localizadas como essa podem ter o efeito bola de neve, estimulando outros a empreender pequenas ações, como enviar cartas ao Congresso, assinar petições, participar de protestos pacíficos, e o movimento vai crescendo. A existência dessas iniciativas é, de certo modo, um indicador de que uma verdadeira mudança da ordem econômica mundial já começou. A “preguiça” dos políticos acaba onde se inicia o clamor popular.

“A mudança tem de vir de todos nós, maciçamente e com ações concretas”, ressalta Klein. “Enquanto os que acreditam que a mudança será gerada pela elite no poder ficarão decepcionados, os que apostam que ela acontecerá de baixo para cima começarão a sentir esperança.”

**A QUESTÃO É POLÍTICA**

A economia e os negócios têm papel extremamente importante na mudança de paradigma pregada por Piketty e Klein, mas ambos colocam o protagonismo dessa transformação na ação política.

Klein deixa claro que a perda de fé nos líderes políticos é o fator paralisante na hora de desenhar soluções para o clima e diz que as pessoas precisam exigir a mudança.

Piketty afirma que as forças que levam ao aumento da desigualdade, como sistemas de tributação equivocados e remuneração excessiva dos investimentos, não são detidas por qualquer processo natural ou espontâneo; requerem liderança política.

Nem vetores conhecidos e potentes de diminuição da desigualdade, como educação e difusão de conhecimento, têm vez ante tais forças desestabilizadoras, segundo o francês, não importa o que se diga a respeito. Para ele, a distribuição de renda está relacionada sobretudo com a noção de justiça social e, assim, é, definitivamente, uma questão política.

Piketty e Klein têm sido alvo de inúmeras críticas e questionamentos. No entanto, a pergunta que os dois fazem vale a pena por nos obrigar a olhar para o longo prazo: que planeta deixaremos para nossos descendentes? A resposta é relevante.

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