Estratégia e Execução

Pesquisa explica por que elas empreendem menos

Humildade e pouco acesso a capital dificultam o empreendedorismo feminino e, assim como andorinhas sós não fazem verão, menos mulheres empreendedoras têm menor efeito multiplicador

Compartilhar:

Mesmo quando partem das mesmas condições, ainda há menos mulheres empreendedoras do que homens. Várias pesquisas comprovaram essa afirmação, assim como não deixaram dúvida de que as mulheres são tão inovadoras quanto os homens e igualmente bem-sucedidas à frente de empresas. 

Buscando explicar esses fatos, os pesquisadores Ethan Mollick e Venkat Kuppuswamy, respectivamente da Wharton School e da University of North Carolina, escreveram um paper sobre o assunto: “Humildade e húbris: diferenças de gênero nos indicadores de fundação serial de empresas”. 

**PERSONALIDADE**

O primeiro questionamento dos acadêmicos foi: “Por que alguém abre uma empresa?”. Eles presumiram que empreender equivale a comprar um bilhete de loteria, uma vez que mais da metade das empresas fracassa em cinco anos. Analisando uma série de pesquisas sobre personalidade e gênero, descobriram que o empreendedor se considera melhor do que aqueles que estão a sua volta. 

A extrema autoconfiança, ou o que os gregos chamam de “húbris”, é o maior indicador psicológico de um empreendedor. E onde entra o gênero? Muitos estudos já detectaram que os homens tendem mais a ter húbris, enquanto as mulheres costumam ser humildes. Isso faz com que elas tenham menor probabilidade do que eles de acreditar que, se tudo der certo, será por sua genialidade e, se der errado, será por influências externas e má sorte. 

O excesso de autoconfiança, embora possa ser prejudicial aos homens individualmente, por significar a não avaliação correta dos riscos, é um traço bom para o grupo: faz com que mais homens experimentem coisas novas, e dessa amostra ampliada podem surgir mais casos de inovação de sucesso. 

O segundo questionamento dos pesquisadores disse respeito ao desempenho das mulheres empreendedoras ao longo do tempo. Analisando projetos de homens e mulheres em sites de crowdfunding, viu-se que elas são mais bem-sucedidas em levantar fundos, mas têm menor probabilidade de seguir tentando propor projetos de financiamento coletivo mesmo quando obtêm um ótimo resultado. 

Na visão dos pesquisadores, por conta da humildade, as mulheres são menos encorajadas pelo sucesso e mais desencorajadas pelo fracasso. “Ser desencorajada pelo fracasso até é uma característica racional que beneficia as mulheres individualmente, porque elas não se envolvem em aventuras condenadas ao fracasso, mas as prejudica como grupo. 

Isso significa que não há mulheres suficientes comprando ‘bilhetes de loteria’ e, de uma amostra menor, saem menos vencedoras”, afirmou Mollick à Knowledge@ Whar ton. Menos vencedoras no crowd funding geram menos empreendedoras de sucesso, o que produz menos exemplos para outras mulheres. 

A pesquisa revelou ainda que, se fossem menos humildes e mais autoconfiantes, haveria cerca de 28% mais mulheres abrindo empresas. “Há um número enorme de empreendedoras sendo desencorajadas por essa característica pessoal. Isso explica muito sobre a diferença nos índices de fundação de empresas entre homens e mulheres”, disse Mollick.

**ACESSO A CAPITAL**

Além de abrirem menos ne gócios, as mulheres que os abrem também têm menos acesso a financiamento e capital de risco. Mollick e Kuppuswamy observaram vários motivos para isso – a misoginia, claro, é um deles –, mas alguns chamam particularmente a atenção, como o fato de que mulheres e homens tendem a abrir negócios diferentes. 

Elas têm maior probabilidade de investir em áreas como o varejo, em que o capital de risco e os empréstimos bancários não são tão comuns. Outra razão para o menor acesso ao dinheiro parece ser o que os pesquisadores chamam de “homofilia”, ou seja, o princípio de que “Narciso acha feio o que não é espelho”. “As pessoas gostam de quem é parecido com elas. 

Como a tendência é que os investidores sejam homens, é muito difícil para uma mulher ter acesso a eles”, explicou Mollick. Aumentar o número de mulheres capitalistas resolveria o problema? Os pesquisadores creem que não. Uma de suas experiências com os projetos de crowdfunding foi criar duas versões exatamente iguais de um projeto – uma assinada por Jessica Smith, e outra, por Michael Smith – e entender se a resposta variava conforme o gênero. 

A surpresa foi que os homens não se importam se um projeto é criado por um homem ou uma mulher, mas as mulheres, sim. Dois terços delas acharam que o projeto do homem era melhor do que o da mulher. O terço que privilegiou as mulheres era de “ativistas” – elas sabem que há discriminação e lutam para revertê-la. “O que percebemos é que muitos projetos femininos com melhor desempenho nos sites de crowdfunding eram apoiados por essas ativistas”, disse Mollick. 

Assim, um número de investidoras maior não aumentará o acesso das mulheres ao capital se essas capitalistas não forem ativistas. E por que as mulheres conseguem mais contribuições dos homens nos sites de crowdfunding? Os pesquisadores entrevistaram vários empreendedo

res com projetos propostos para saber sobre sua formação e experiência, e as mulheres se saíram melhor. Ou seja, o crowdfunding oferece a elas mais oportunidades de mostrarem seu real mérito, neutralizando o problema da homofilia. 

**COMO MUDAR**

Qual a principal explicação dos pesquisadores para essa diferença entre o empreendedorismo masculino e o feminino? É a de que as mulheres ainda têm, sem dúvida, mais dificuldades do que os homens para ter acesso a recursos – isso pesa muito mais do que o fato de elas serem menos autoconfiantes e mais humildes. 

Em suma, não se trata de não serem capazes de criar startups ou de gerenciá-las adequadamente, e sim de não terem acesso a recursos em sua rede de relacionamentos. Como mudar isso? Segundo os pesquisadores, deve-se construir ativamente o acesso das mulheres ao capital.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Mercado de RevOps desponta e se destaca com crescimento acima da média 

O Revenue Operations (RevOps) está em franca expansão global, com estimativa de que 75% das empresas o adotarão até 2025. No Brasil, empresas líderes, como a 8D Hubify, já ultrapassaram as expectativas, mais que dobrando o faturamento e triplicando o lucro ao integrar marketing, vendas e sucesso do cliente. A Inteligência Artificial é peça-chave nessa transformação, automatizando interações para maior personalização e eficiência.

Uso de PDI tem sido negligenciado nas companhias

Apesar de ser uma ferramenta essencial para o desenvolvimento de colaboradores, o Plano de Desenvolvimento Individual (PDI) vem sendo negligenciado por empresas no Brasil. Pesquisa da Mereo mostra que apenas 60% das companhias avaliadas possuem PDIs cadastrados, com queda no engajamento de 2022 para 2023.

Regulamentação da IA: Como empresas podem conciliar responsabilidades éticas e inovação? 

A inteligência artificial (IA) está revolucionando o mundo dos negócios, mas seu avanço rápido exige uma discussão sobre regulamentação. Enquanto a Europa avança com regras para garantir benefícios éticos, os EUA priorizam a liberdade econômica. No Brasil, startups e empresas se mobilizam para aproveitar as vantagens competitivas da IA, mas aguardam um marco legal claro.

Governança estratégica: a gestão de riscos psicossociais integrada à performance corporativa

A gestão de riscos psicossociais ganha espaço nos conselhos, impulsionada por perdas estimadas em US$ 3 trilhões ao ano. No Brasil, a atualização da NR1 exige que empresas avaliem e gerenciem sistematicamente esses riscos. Essa mudança reflete o reconhecimento de que funcionários saudáveis são mais produtivos, com estudos mostrando retornos de até R$ 4 para cada R$ 1 investido

Transformação Digital, Estratégia
Este texto é uma aula de Alan Souza, afinal, é preciso construir espaços saudáveis e que sejam possíveis para que a transformação ocorra. Aproveite a leitura!

Alan Souza

4 min de leitura
Liderança
como as virtudes de criatividade e eficiência, adaptabilidade e determinação, além da autorresponsabilidade, sensibilidade, generosidade e vulnerabilidade podem coexistir em um líder?

Lilian Cruz

4 min de leitura
Gestão de Pessoas, Liderança
As novas gerações estão redefinindo o conceito de sucesso no trabalho, priorizando propósito, bem-estar e flexibilidade, enquanto muitas empresas ainda lutam para se adaptar a essa mudança cultural profunda.

Daniel Campos Neto

4 min de leitura
ESG, Empreendedorismo
31/07/2024
O que as empresas podem fazer pelo meio ambiente e para colocar a sustentabilidade no centro da estratégia

Paula Nigro

3 min de leitura
ESG
Exercer a democracia cada vez mais se trata também de se impor na limitação de ideias que não façam sentido para um estado democrático por direito. Precisamos ser mais críticos e tomar cuidado com aquilo que buscamos para nos representar.
3 min de leitura
Empreendedorismo, ESG
01/01/2001
A maior parte do empreendedorismo brasileiro é feito por mulheres pretas e, mesmo assim, o crédito é majoritariamente dado às empresárias brancas. A que se deve essa diferença?
0 min de leitura
ESG, ESG, Diversidade
09/10/2050
Essa semana assistimos (atônitos!) a um CEO de uma empresa de educação postar, publicamente, sua visão sobre as mulheres.

Ana Flavia Martins

2 min de leitura
ESG
Em um mundo onde o lucro não pode mais ser o único objetivo, o Capitalismo Consciente surge como alternativa essencial para equilibrar pessoas, planeta e resultados financeiros.

Anna Luísa Beserra

3 min de leitura