Fui reprovado em mais de vinte processos seletivos de estágio quando faltavam sete meses para a formatura. Eu procurava uma oportunidade para ser efetivado, já que na empresa pública em que eu trabalhava essa chance era zero. Apesar das várias negativas, não desisti.
A cada não que eu recebia, tentava entender o que deu errado e ajustava a minha abordagem. Finalmente a oportunidade veio. Fui contratado como estagiário do Grupo Amil, com uma regra, no mínimo, curiosa: “não pergunte sobre sua efetivação”. Pelos corredores, dizia-se que era impossível ser efetivado. Não dei ouvidos. Fiz o meu melhor.
Sem dúvidas os nãos iniciais me fortaleceram e me ajudaram a ser, em quatro meses, o mais novo contratado da empresa. E três anos depois, promovido a gerente de RH, fui transferido do Rio de Janeiro para São Paulo aos 25 anos.
A adversidade desperta em nós capacidades que, em circunstâncias favoráveis, teriam ficado adormecidas, como dizia o poeta Horácio. Não há vergonha alguma em ser reprovado, mas sim em desistir da luta, ou manter o discurso e a tática em time que está perdendo.
Esses dias, assistindo a uma reportagem de TV, senti que muitos brasileiros não têm medo de reprovação, mas não sabem como mudar a estratégia de busca de empregos e avaliação de novas carreiras.
A matéria mostrava uma jovem mãe desempregada em busca de oportunidades no mercado de trabalho. Ela atuava no comércio, mas foi demitida durante a pandemia. A personagem entregava o currículo físico, de loja em loja. A cada não que recebia, com sorriso no rosto, ela falava ao repórter que ela tentaria no próximo estabelecimento comercial. Ao final, a reportagem mostrou o obvio: ela não conseguiu atingir seu objetivo.
Não sei sobre as habilidades que a moça dispunha – a reportagem não abordou esse tema – mas um telespectador atento ao contexto do mercado de trabalho saberia que essa estratégia não teria um efeito positivo.
Primeiro, a [pandemia](https://revistahsm.com.br/post/o-poder-da-empatia-dos-ceos-durante-a-pandemia) acertou em cheio o comércio, não houve contratações no segmento, mas sim demissões com muitos negócios fechando durante a quarentena.
Segundo, com a aceleração da transformação digital, a forma de contratação de porta em porta deve, aos poucos, desaparecer, inclusive no comércio, segmento que antes da pandemia ainda resistia à digitalização dos processos.
## Tsunami da transformação digital
O progresso tecnológico está permitindo que as máquinas concluam em minutos muitas das tarefas que antes exigiam esforço de tempo e paciência dos seres humanos. Essa nova revolução da automação já estava redesenhando os empregos em um passado recente, mas surgiu como um tsunami no mercado de trabalho por conta da pandemia.
Quase todos os segmentos estão sendo transformados, alguns profundamente. É o caso do comércio, que tende a usar formatos híbridos entre o digital e o físico. E os empregos são inclinados a acompanhar essas mudanças. O vendedor nota dez do contato presencial pode não ter as habilidades exigidas para exercer um bom trabalho nesse novo formato online.
Na indústria, muitos profissionais competentes em suas funções podem ter seus empregos ameaçados porque não conseguiram surfar na onda de conhecimentos digitais, e não por falta de oportunidades no mercado.
O problema que enfrentamos globalmente é que a esmagadora maioria dos trabalhadores de hoje precisará desenvolver novas habilidades num espaço curto de tempo. Para tanto, será necessário um pacto entre governos, empresas e indivíduos para a busca dessas novas skills.
Como costumo postar nas redes sociais, os profissionais de hoje precisaram aprender, reaprender e desaprender. É necessário fazer um “*reset yourself”* na maneira em que o conhecimento é aprendido. Longe o tempo em que as competências adquiridas em uma graduação manteriam as pessoas no mercado de trabalho pela vida inteira. A agilidade das transformações é em tempo real – o que aprendemos agora, amanhã pode não ser mais útil.
Por isso, a preparação para esse futuro do trabalho, que eu digo que já é passado, é um dos principais problemas de negócios de nosso tempo. Não há tempo hábil para uma formação acadêmica de profissionais com a atual demanda reprimida no mercado. Essa transformação exige quase que uma instantaneidade do conhecimento.
## Habilidades esperadas do profissional
Como salientado no livro “The second machine age”, as novas tecnologias fazem hoje pelo intelecto humano o que os motores a vapor fizeram a nossa forma muscular durante a revolução industrial – as potencializam.
Portanto, é esperado dos profissionais do futuro papéis mais centrados em tarefas cognitivas estritamente humanas, tais como comunicação não-violenta, colaboração, adaptação às novas demandas e criatividade. Estas habilidades ajudam a descobrir novas perspectivas, geraram ideias inovadoras e estabelecem conexões emocionais, competências muito disputadas pelas empresas, em especial, em cargos de liderança
Precisamos nos reinventar todos os dias para um novo cenário. De acordo com pesquisa conduzida pelo Fórum Econômico Mundial, daqui a cinco anos, 35% das habilidades que hoje são consideradas essenciais vão mudar. Assim sendo, não há como buscarmos os mesmos resultados se não mudarmos nossas estratégias.
Todos nós já fomos demitidos e estamos em fase de transição, empregados ou não. A questão é como nos desapegamos do velho normal para seguirmos adiante no novo normal de cada dia. A minha dica é: [olhe para o futuro](https://revistahsm.com.br/post/planejar-ou-nao-planejar-a-carreira-eis-a-questao) e fortaleça seus conhecimentos. O conhecimento é um poder potencial, que só vira aprendizado depois de ser aplicado na prática.
Ganhamos conhecimento quando lemos, ouvimos, assistimos. Começamos a transforma-lo em aprendizado quando debatemos, aplicamos e compartilhamos. Porque quanto mais compartilhamos, ensinamos. E quando ensinamos, aprendemos.
Para finalizar e iluminar o nosso progresso na jornada do aprendizado, cito a tríade virtuosa ressaltada pelo filósofo e monge inglês Beda: generosidade, coerência e a humildade. Generosidade para ensinar o que sabemos. Coerência para praticar o que ensinamos. Humildade para perguntar o que não sabemos.