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Estão levando a sério a semana de trabalho de 4 dias

O novo modelo, bem como a alternativa do dia útil de seis horas (em vez de oito), é objeto de um número crescente de estudos em vários lugares do mundo

05 de Julho

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Artigo Estão levando a sério a semana de trabalho de 4 dias

A semana de trabalho mais curta está se tornando um estilo de vida… acelera-se a tendência em direção aos quatro dias úteis.” Essa notícia foi publicada numa edição de 1971 do New York Times. Foi alarme falso. Mas agora há indícios de que o bebê está mais próximo de nascer.

Um indício é que já temos tecnologia para dar suporte à semana curta – apps que aumentam a produtividade e automatização –, o que não existia 50 anos atrás. E a maior disseminação dessa tecnologia é do interesse de corporações poderosas.

O segundo indicador é que grandes estudos e experimentos sobre a semana 4x3, tanto em nível país (Reino Unido, Suécia, Espanha, Japão e Islândia) quanto em empresas (a exemplo de Microsoft Japão e Unilever Nova Zelândia), têm recebido financiamento. No mínimo, quer dizer que há lideranças levando a sério o tema e cogitando mudar o modelo.

Os estudos

A Islândia foi pioneira em experimentos com a semana de trabalho de quatro dias; ela o fez entre 2015 e 2019, com 2.500 funcionários públicos – profissionais de creches, funcionários administrativos do governo, assistentes sociais, trabalhadores de hospitais. Esse número representa 1% da população do país. O resultado foi que não houve queda na produtividade. E, em julho de 2021, a BBC informava que 86% do país havia migrado para a semana mais curta ou, ao menos, ganhado o direito de fazê-lo.

A Suécia também fez um experimento em 2015, mas em escala menor, e nesse caso o resultado foi negativo. Algumas organizações de saúde governamentais, como a ala cirúrgica de um hospital universitário de Gotemburgo, adotaram a jornada de seis horas por dia (em vez de oito) nos cinco dias da semana. Mas, após 23 meses, a decisão do governo foi voltar às 40 horas semanais, sob a alegação de que sairia muito caro escalar o novo modelo. Os funcionários ficaram mais engajados, porém as organizações fizeram o teste contratando mais funcionários – e o custo subiu.

O Reino Unido começou em 6 de junho o maior dos experimentos até agora. Um total de 3,3 mil trabalhadores em 70 empresas reduzirão sua jornada para quatro dias por semana durante seis meses. Os participantes representam setores variados, como serviços financeiros, cervejaria e fabricação de automóveis. O estudo está sendo executado pela organização sem fins lucrativos 4 Day Week Global, em conjunto com think tanks e as universidades de Oxford e Cambridge e o Boston College.

As empresas do estudo britânico adotarão o trabalho “80-100-100”: precisa haver uma redução de 80% nas horas trabalhadas, mantendo 100% da remuneração usual e também 100% da produtividade. Como farão isso depende delas. Há uma forte hipótese de que isso pode ser alcançado só reduzindo as reuniões e usando mais tecnologias.

A Espanha também anunciou planos de testar a redução dos expedientes, e o Japão fez diferente: lançou em 2021 um plano para o maior equilíbrio entre vida e trabalho – a fim de reduzir as taxas de suicídio e outros problemas de saúde. E isso levou as grandes empresas a agir, fazendo experimentos.

Os fatores porte e confiança

Em abril, um projeto de lei na Califórnia propôs exigir que a semana de trabalho de quatro dias úteis fosse implementada, o que beneficiaria 3,6 milhões de trabalhadores. Foi rejeitado. Em maio, veio uma nova proposta: empresas com mais de 500 funcionários pagariam horas extras aos trabalhadores acima de 32 horas. O Comitê de Trabalho e Emprego do parlamento estadual recusou-se a avançar para uma audiência de política. Isso mostra que grandes empresas estão resistindo à mudança – com exceções, é claro.

As pequenas e médias parecem mais abertas à novidade. Por exemplo, a firma de advocacia britânica Arken, com 22 funcionários, implementou em definitivo a semana de quatro dias após um teste de nove meses. Os funcionários foram entrevistados, e 85% disseram que a decisão melhorou sua visão da empresa. Não houve queda na produtividade, embora a mudança de rotina tenha dado alguma dor de cabeça no início. A confiança é o fator de sucesso.

A agência de comunicação brasileira Shoot, parte do rating Melhores para o Brasil publicado na HSM Management nº 151, também testou em 2021 e adotou a prática em 2022. Ao CNN Brasil Business, o sócio Luciano Braga afirmou que a empresa está mais organizada em tempo e tarefas. Os funcionários foram divididos em duas equipes que se alternam: a primeira folga segunda-feira e a outra não trabalha na sexta-feira. “Todos sempre chegavam exaustos na segunda-feira, agora não mais”, disse Braga, e, segundo ele, a busca por vagas na empresa subiu mais de 300%.

O desafio de uma mudança dessas é grande: há o “pesadelo logístico” de organizar os horários das pessoas, é preciso não atrapalhar clientes e fornecedores nos dias off, e receitas e lucros têm de ser mantidos. Os testes – externos e internos – são cruciais.

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Na varredura

Uma regra da varredura de sinais de mudança é focar fenômenos “estranhos” que se repetem com padrões similares. A “great resignation” (grande renúncia) preenche os três requisitos. Mostra repetição e padrão, porque são muitas as pessoas deixando seus empregadores por livre e espontânea vontade, em muitos países (4,5 milhões só nos EUA) e com motivos iguais (exaustão e busca de realização pessoal). E a estranheza é observada em dois aspectos:

1. Os demissionários se importam pouco com o contexto econômico adverso. As renúncias ocorrem na esteira de uma pandemia que desestabilizou a economia global e atinge mesmo as economias mais fragilizadas – no Brasil, 600 mil pessoas pediram as contas em março de 2022 (dados do Cadastro Nacional de Empregados e Desempregados – Caged).

2. Eles desafiam as autoridades – e o autoritarismo. Há mobilização até na China, onde vigora o sistema de trabalho 9:9:6 – de trabalhar das 9h da manhã às 9h da noite seis dias por semana. Demandando mais pausas, os chineses jovens defendem o “tang ping” (“fique deitadão”).

Será que isso é uma pista de que o modelo da semana de trabalho de cinco dias (ou seis) está com a validade vencida? Alguns especialistas acham que sim. Nesse caso, a semana de quatro dias tem chances reais.

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