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Liderança

5 min de leitura

O que processos seletivos diversos e algoritmos têm em comum?

Essa é uma conversa que pode soar desconfortável, mas você, RH, tem em mãos a chance de levar novas histórias e promover a diversidade em sua empresa

Carolina Utimura

11 de Dezembro

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Artigo O que processos seletivos diversos e algoritmos têm em comum?

Você sabe como funciona um algoritmo? De forma bem simplista: um algoritmo, na matemática, é um conjunto de regras e raciocínios para se chegar em um determinado resultado. Para a tecnologia, eles são a base do trabalho em machine learning e inteligência artificial.

O algoritmo nos traz o resultado com base nas variáveis que um ser humano insere, logo, existe um grande debate sobre a ética nessas novas tecnologias, visto que podem carregar um forte viés de quem o programa. Como nos casos icônicos, de fatores raciais, de gênero ou localização geográfica terem desdobramento para aprovação de crédito, sistemas de saúde ou ações prisionais. 

Se formos olhar em grosso modo, um processo seletivo é como um algoritmo. Temos em mente um resultado esperado, inserimos uma sequência de regras, raciocínios e parâmetros (pré-requisitos, testes, perguntas etc.), inserimos uma variável (o candidato) para o algoritmo processar e voilà: temos a nossa nova pessoa da empresa!

Mas, quem “programou” esse algoritmo? O que tomou como base para as premissas e regras de contratação para o processo? Vamos fazer, então, a engenharia reversa…

O espelho do líder

Quando olhamos as principais lideranças de uma companhia hipotética, o que todas elas têm em comum? Vemos que elas têm uma alta capacidade de pensar estrategicamente, olhando de forma holística os problemas e trazendo soluções. Elas estudaram nas “melhores faculdades” do país, as grandes privadas, federais ou estaduais.

Agem de forma autônoma, persistindo e tendo uma visão de dono sobre o negócio. Fizeram intercâmbio, o que ajudou a serem mais independentes. Conseguiram assim seu primeiro emprego, com menos de 20 anos, como estagiários em grandes organizações. Falam inglês fluente e tem familiaridade com as novas tecnologias.

Quando um algoritmo roda, ele traz a seguinte estrutura: 

Se <condição>, então <comandos da condição verdadeira>.

Senão <comandos da condição falsa>. 

Então, vamos programar um processo de trainee:

Se <a candidata Marina estudou em uma “faculdade de elite”, fez intercâmbio em outro país, tem inglês fluente, estagiou previamente em grandes organizações e tem menos de 29 anos>, então <está aprovada>.

Para captar essas informações, o processo da companhia coloca requisitos como a faculdade e experiência em multinacionais, insere um teste de inglês fluente e o entrevistador fica maravilhado em saber que a Marina fez seu ensino médio no Canadá. Que incrível, parece com a trajetória dele! Afinal, é a realidade que ele conhece e como classifica “talento”. 

A exclusão na pele

A outra candidata era a Deise, ela é uma mulher negra, da periferia e vem de uma família na qual sua mãe concentrou todas as responsabilidades de criar e sustentar seus filhos. Deise ralou muito para terminar o ensino médio público, depois disso, teve que trabalhar fazendo de um todo: do caixa do mercado ao telemarketing. Ali teve que ter contato direto com os clientes, solucionando problemas sob pressão.

Conseguiu juntar uma grana e se matriculou na faculdade mais acessível da cidade, já perto dos seus 30 anos de idade. Trabalhava como assistente em uma empresa familiar de dia e à noite, depois de três conduções, ia para a faculdade. Ouviu diversos nãos, teve que alisar seu cabelo porque seu chefe pediu e, constantemente, ajuda financeiramente sua família. Deise pega um trem e dois ônibus para fazer a entrevista, nem sabendo direito como vai pagar as passagens de volta e chega lá no prédio imponente e espelhado na Faria Lima, onde todos a sua volta parecem tão diferentes.

Então, rodamos o algoritmo na Deise: E se, então… reprovada. 

Uma reflexão urgente

É claro que não quero falar que um processo seletivo é tão simples assim, sabemos o grande desafio em selecionar as melhores pessoas. Porém, quais as réguas que estamos aplicando para abrir as portas das nossas empresas a um arquétipo de talento que não temos na liderança da companhia e, ainda mais, que não temos no nosso convívio social?

Será que o nosso processo permite que a Deise possa contar a sua história de vida? De todos os momentos que ela lidou com a pressão e resolveu problemas com maestria? Do seu nível de resiliência e persistência em buscar o que quer?

E como avaliamos o “gabarito” da Deise? Quem entrevista imagina qual arquétipo de candidato? Está na busca de um “control c + control v” de si próprio? Talvez a Deise não tenha todo o traquejo corporativo e seu inglês ainda é básico, mas essas são competências que acredito que a empresa pode desenvolver.

Não sei se, na mesma medida, é tão prático ensinar a Marina sobre ser resiliente quando recebe nãos, a ser persistente em querer mudar os costumes da companhia e ter a empatia de saber o que o consumidor final, o verdadeiro brasileiro, precisa. 

Semana passada, a Nasdaq, uma das maiores bolsas de valores do mundo, trouxe novas regras para que suas empresas listadas sejam mais diversas. Elas deverão publicar seus números de diversidade e ter, no mínimo, uma posição de direção assumida por um grupo minorizado. Países como Noruega, Espanha, França e Islândia possuem a exigência que mulheres representem pelo menos 40% dos conselhos de empresas de capital aberto. Esse movimento só tem um caminho: seguir em frente!

Essa é uma conversa que pode soar desconfortável, cheia de “mas, é que aqui...” e de mudar o que sempre foi assim. Porém, esse é o momento que você, RH, precisa levar ao board do negócio. Você tem em mãos a força de mudar esses “algoritmos”, de salvar o futuro da sua empresa e mais do que isso: deixar a Deise contar a sua história e alterá-la para sempre. 

Nos próximos meses, quero te ajudar a iniciar essa conversa, vamos juntos e seguindo em frente!

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Autoria

Carolina Utimura

Carolina Utimura é CEO da Eureca.

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