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Saúde mental

5 min de leitura

Tecnoestresse e o impacto na saúde do ambiente empresarial

O estresse causado pelo uso excessivo da tecnologia exige que empresas e indivíduos busquem alternativas para uma relação mais saudável com o mundo digital

Luiz Carlos de Oliveira Junior e Gustavo Gehrke Maierá

31 de Maio

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Artigo Tecnoestresse e o impacto na saúde do ambiente empresarial

As notificações no celular não param por nem um segundo. Você está ansioso e irritado com tantas mensagens. Horas e horas na frente de um computador estão provocando estresse. A vontade que surge é a de quebrar tudo? Se você mora em Nova Iorque pode ir ao Brooklyn e procurar pela “The Rage Cage”, um local onde se pode quebrar qualquer coisa, inclusive um celular premium ou outro eletrônico simples pagando US$64,99 para duas pessoas, ou “Trouble Makers”.

Para uma empresa em busca de benefícios que possam ser oferecidos aos seus colaboradores, uma sala da raiva nesse estilo, com eletrônicos disponíveis para destruição grátis, pode logo entrar na lista. Com o avanço do tecnoestresse, e o prejuízo para a vida das organizações, é possível que em breve isso passe a ser essencial.

O termo tecnoestresse foi introduzido na literatura em 1984 por Craig Brod no livro “Technostress: The Human Cost of the Computer Revolution”. O tecnoestresse era uma síndrome de adaptação ao uso das novas tecnologias de informação e comunicação que foram introduzidas no ambiente de trabalho.

A chegada do computador pessoal provocou muitas mudanças e ansiedade. Era o estresse da introdução à vida digital. Hoje o mundo é bem diferente e é quase impossível encontrar um aspecto da vida cotidiana, dentro e fora do trabalho, que não tenha sido transformado de alguma forma pelo mundo digital.

Se antes o computador era um só e estava preso à mesa de trabalho no escritório, hoje é onipresente em vários formatos que variam desde smartphones até wearables. Um levantamento realizado pela Gartner Research estimou que em 2017 existiam em todo o mundo 21 bilhões de aparelhos conectados, podendo alcançar o dobro deste número em 2025 com o avanço da Internet das Coisas. Logo nós mesmos estaremos conectados através de dispositivos intracranianos, como o dispositivo que está em desenvolvimento pela Neuralink de Elon Musk.

Incorporamos tudo o que faz parte da vida ao ciberespaço e destruímos a barreira entre usar tecnologias no trabalho, na vida pessoal e no lazer. Por força da pandemia mergulhamos definitivamente no ciberespaço, elevando o tecnoestresse a uma nova dimensão: estresse por viver online sempre.

E não há razões para crer que poderia ser diferente. Segundo pesquisa realizada pelo Hootsuite e We are Social, em 2020 todos os seres humanos juntos ultrapassaram 1,25 bilhão de anos conectados à internet. O Brasil é o terceiro país que mais utiliza internet no mundo, totalizando impressionantes 9 horas e 17 minutos por dia. A média mundial é de 6 horas e 43 minutos.

Ao mesmo tempo em que podemos melhorar a produtividade e o conforto com o uso de tecnologias digitais, em exagero também surgem problemas. Segundo a literatura científica em ciberpsicologia, a disciplina que estuda o comportamento humano no mundo digital, o tecnoestresse pode ser provocado por cinco condições ligadas ao uso de tecnologia: sobrecarga de informação, invasão constante da vida pela conexão ininterrupta, complexidade dos sistemas e ferramentas, sensação de insegurança e incerteza.

O excesso de informação, de interrupções constantes que roubam o foco do trabalho, somado ao estilo de vida inativo e abuso de alimentos não saudáveis, facilmente disponíveis nos aplicativos para delivery, armam uma bomba-relógio que destrói a saúde e a produtividade.

Como promover a saúde digital nas empresas?

Como não existe a opção de voltar a um mundo não conectado, o que pode ser feito para reduzir os prejuízos garantindo melhor saúde digital nas corporações? O que fazer quando a ferramenta que aumenta a produtividade também pode comprometê-la? Essas são questões que vários especialistas e organizações tentam responder. Uma delas, a coalizão para a inteligência digital, propõe um conceito de inteligência digital que inclui o uso equilibrado e saudável da tecnologia através de intervenções e treinamentos específicos neste tema.

Dessa maneira, assim como educamos as pessoas para melhor saúde física e mental, precisamos educá-las para viver no ciberespaço, para que sejam inteligentes no mundo digital.

CEOs que apoiam programas corporativos de acompanhamento e evolução da saúde têm conseguido benefícios substanciais, não somente pela melhoria direta do ambiente corporativo, mas também porque mais de 89% dos colaboradores de empresas que promovem esses tipos de programas recomendam sua empresa aos seus contatos, trazendo maior produtividade, engajamento e retenção de talentos.

Para cada dólar investido em programas corporativos de saúde, reduz-se US$3,27 em despesas médicas e US$2,73 em custos relacionados a absenteísmo. Está na hora de incluir a saúde digital nesses programas.

No ambiente de trabalho algumas medidas podem ajudar a prevenir ou reduzir o tecnoestresse. Estabelecer limites para o tempo de uso com pausas de desconexão são propostas simples. É possível criar santuários livres de acesso à internet nos quais os colaboradores podem mergulhar em períodos de trabalho focado, individual ou em equipe.

Com a adoção em massa do trabalho remoto, promover períodos ou dia da semana em que não se deve agendar reuniões virtuais tem sido prática de algumas organizações. Talvez seja necessário reconfigurar a cultura organizacional dando maior valor à capacidade de desconectar e focar, de dedicar tempo a uma única e importante tarefa de cada vez.

As mesmas tecnologias geradoras de tecnoestresse podem colaborar para a construção da saúde de várias maneiras. A cooperação de healthtechs com corporações que decidirem ser proativas no cuidado da saúde digital de seus colaboradores pode dar origem a parcerias interessantes ao oferecerem plataformas para psicoterapia online e acesso facilitado a academias de ginástica, por exemplo.

O uso de inteligência artificial tem permitido acompanhar o humor e sintomas de ansiedade, assim como plataformas e aplicativos que coletam dados e utilizam gamificação podem promover mudanças efetivas de hábitos de saúde, incentivar a prática de meditação, relaxamento e melhor controle de sono. Grandes plataformas como Fitbit Care, Apple Fitness+ e Nike Training Club funcionam dessa forma.

Depois de décadas discutindo a importância da inteligência emocional e do manejo do estresse no ambiente corporativo, chegou a hora de lideranças voltarem sua atenção para a inteligência digital de suas equipes, antes que seus times se percam nos perigos do ciberespaço colocando em risco a produtividade e o capital humano de suas empresas. Assim, não precisaremos quebrar nossos celulares, computadores ou outros dispositivos.

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Autoria

Luiz Carlos de Oliveira Junior e Gustavo Gehrke Maierá

Luiz Carlos de Oliveira Junior é médico psiquiatra, PhD em ciências da saúde, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Uberlândia, coordenador do grupo de pesquisa em estilo de vida digital (D-life), fundador do MEVBrasil.

Gustavo Gehrke Maierá é inovador insaciável, ajuda empresas a incluir pessoas através da educação tecnológica oferecida pela mesttra. Engenheiro Mecânico de formação, participou de capacitações na Fundação Dom Cabral, Endeavor e Singularity University.

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