Em um mundo em que a complexidade cresce exponencialmente, projetos serão cada vez mais vistos como sistemas biológicos. Como sistemas são conjuntos de partes que interagem entre si, cada vez mais os projetos se estruturarão organicamente, fruto da interação humana em fluxo, das ideias e dos memes (a menor unidade de informação, que permite a transmissão cultural, no conceito de Richard Dawkins em O gene egoísta).
As características desses “projetos-sistemas” não podem ser explicadas pela mera soma de suas partes, porque evoluem dinamicamente a partir de interações complexas que costumam gerar resultados surpreendentes.
Por isso, o gerenciamento de projetos exigirá mais entendimento da natureza humana, abrangendo questões como consciência, empatia e amor, e terá de lidar com o impacto da transformação digital. Pensando nesse futuro próximo, abordamos a seguir os dois aspectos.
## O lado humano
__Liderança servidora.__ O papel que a “influência” possui na liderança vai ficar mais notável. A ação do líder cria memes de cultura que são clonados pelos membros da equipe, assim como a empatia se irradia por meio dos neurônios-espelho. Ao priorizar pessoas, o líder de projeto inspira seus liderados a superar limites e, como consequência, a potencializar o desempenho e os resultados.
__Equipe funcionando como equipe.__ Desde o surgimento do scrum e do mais forte meme dos últimos tempos – os squads –, ficou claro que a unidade de desempenho agora são equipes e não indivíduos. Essa tendência de os projetos serem realizados por squads será consolidada. Para a equipe realmente funcionar como equipe, deve haver visão sistêmica do trabalho e tem-se de enxergar gargalos. Eventualmente, o líder fará a equipe se subordinar a eles, usando pontos de estrangulamento do fluxo para elevá-los. O kanban ajudou muito nesse sentido, porém o modelo se expandirá nos próximos anos, para refletir projetos complexos.
__Colaboração.__ Não veremos mais inúmeros templates lidos por poucos. O futuro do planejamento está nas sessões colaborativas de diálogo, amparadas por canvas, story maps e outras ferramentas, que geram um modelo mental do projeto.
## O impacto da transformação digital
__Medição e fluxo.__ A medição do “fluxo” ou throughput de trabalho, informação fundamental nas abordagens ágil e lean, e na teoria das restrições, avança com a possibilidade de leitura por sensores de internet das coisas (IoT), cada vez menores e mais baratos, e assegurados por tecnologia blockchain. Indo além, sensores quânticos (quantum sensing) garantirão extrema sensibilidade e precisão. O futuro terá medições com reconhecimento de imagem, interpretação cognitiva de inteligência artificial e planejamento antecipado dos batches de trabalho em ferramentas de workflow automatizados, como RPA (automação robótica de processos), sem intervenção humana.
__Project ledger.__ Esse banco de dados especial tem estrutura simples, não fraudável, com muitos níveis de confirmação em cadeia e registra quem foi o produtor do deliverable (seja ativo físico ou de informação), o recebedor, a quantidade transacionada, o carimbo de tempo e as assinaturas (digitais, é claro). Cada medição, gerada automaticamente, reconfirma a entrega e a qualidade de todos os predecessores na cadeia, similar ao blockchain. O project ledger se torna a “single source of truth” do status do projeto, libertando os gestores de projeto para que ajam nos gargalos e bloqueios. E a informação dos projetos estará sempre atualizada em tempo real, sem esforço humano.
__Badges.__ Numa lógica similar às medalhas dos escoteiros, pode-se usar medalhas digitais para registrar competências ou capabilities. Com o project ledger disponível publicamente, é possível atribuir “badges de capabilities” pela capacidade demonstrada de produção de entregáveis nos projetos, tal qual a pontuação de motoristas no Uber. Credenciais dos profissionais, como a de engenheiro, poderão ser atribuídas pela experiência prática em projetos. As badges permitirão criar uma nuvem de profissionais de projetos, e plataformas de negócio podem dar “match” entre os que querem ofertar serviços de projeto e os que desejam consumir.
__“Componentização” do trabalho em projetos.__ Da mesma forma que a arquitetura de microsserviços resolveu a complexidade de integrações de grandes sistemas, devemos ver uma “componentização” do trabalho em projetos. Cada pacote de serviço terá um conjunto de ativos de entrada. Os ativos de saída são produzidos em um certo prazo e se conectam com outros pacotes. Caberá ao gestor compor o produto final único com o apoio de prestadores de serviço. As declarações do trabalho serão escritas como algoritmos. Os pagamentos, executados automaticamente por meio de smart contracts (que checam as entregas). Isso permitirá trabalhar com redes de organizações externas, o que pode resultar em inclusão de pequenas empresas e eliminar corrupção, cartéis e manipulação do poder.