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Qual é o mapa da mina brasileiro?

Das cerca de 90 iniciativas existentes, em torno de 12 são realmente dedicadas à inovação. Mas o ecossistema dos clusters do País cresce, diversifica a atuação em relação a TI e aprende a lidar com as próprias características

Adriana Salles Gomes

Adriana Salles Gomes é diretora-editorial de HSM Management....

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O Brasil tem muitos problemas para resolver, logo o Brasil é um mercado comprador para clusters de inovação. Essa é uma lógica tão irrefutável quanto “penso, logo existo”, uma vez que, onde há um problema para resolver, há uma oportunidade para empreender e inovar. A pergunta é: em que medida a oferta está à altura da demanda? 

A oferta não para de crescer e hoje já há cerca de 90 iniciativas de clusters no Brasil, conforme a Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores, a Anprotec, um número significativo, se todos inovarem de fato. “Em um cluster, as empresas juntam-se para enfrentar e resolver problemas, por meio de pesquisa e desenvolvimento e de inovação”, confirma Sérgio Rezende, um dos maiores especialistas no assunto, ex- -ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação (2005-2010), que também comandou a agência Finep, uma das principais financiadoras de pesquisa e inovação do Brasil. 

No entanto, só uma dúzia de clusters brasileiros justifica esse nome. “Entre nossos ‘parques tecnológicos’, como os chamamos, poucos são clusters; a maioria é ocupada por empresas que usam tecnologia avançada, mas não inovam”, explica Rezende. E quanto aos clusters verdadeiros? São competitivos em inovação? Em uma análise criteriosa, veem-se neles motivos tanto de otimismo como de pessimismo em relação a isso. 

O otimismo se relaciona, por exemplo, com a atuação de incubadoras e aceleradoras. Um estudo de 2011 com 384 dessas entidades conta que 2,5 mil empreendimentos de base tecnológica incubados geram faturamento anual estimado em R$ 4,1 bilhões e 29,2 mil empregos do tipo que paga mais e exige maior qualificação profissional. Melhor ainda, a inovação está presente em 98% das empresas incubadas e só 28% se limitam ao mercado regional; 55% têm alcance nacional, e 15%, foco mundial, segundo o estudo, que foi realizado pela Anprotec e pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). 

Outra razão de otimismo, conforme Rezende, é que a história dos clusters de inovação está apenas começando no Brasil, quando em muitos países é antiga. Pesquisadores, só os temos de 1970 para cá, e foram eles, professores de universidades federais, que deram início a muitos clusters. 

O primeiro fundo de venture capital (VC), crucial, surgiu em 1999. Uma empresa só pode receber dinheiro público desde 2005, quando foi regulamentada a Lei da Inovação. Entre os aspectos negativos, o primeiro é a pouca sinergia entre os clusters brasileiros, como há em tantos lugares no mundo. Também se lamenta que, na maioria dos casos, sejam entidades públicas a organizar um cluster. A iniciativa privada ainda tem atuação discreta –fazem falta, por exemplo, grandes empresas que liderem a formação de clusters, chamando mais empresas para inovar. Outro problema está na baixa interação das empresas vista em muitos clusters; não há rede. 

> **Start-up Brasil, estratégia à la Israel?**
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> _Mercado saúda iniciativa, mas tem sugestões a fazer_
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> Nosso ecossistema de inovação deu um salto nos últimos dez anos, em recursos e capacidades, graças principalmente à Lei de Informática de 2004, e também à Lei de Inovação, de 2005. A previsão é de que o empreendedorismo inovador será estimulado pelo programa StartUp Brasil, lançado em 2012. Pode-se dizer, então, que o Brasil formula uma estratégia nacional? Vejamos o Start-Up Brasil, que se baseia em três pilares: capital (R$ 40 milhões previstos, até R$ 200 mil por startup –contanto que uma das 12 aceleradoras selecionadas também invista), conhecimento (reserva vagas para startups estrangeiras e intermedeia a relação com aceleradoras) e foco (software), além de ter princípios como descentralização regional e criação de empregos. Os resultados da primeira fase do StartUp Brasil são bons, segundo Virgílio Almeida, secretário de política de informática: das 150 startups previstas, 100 já estão desenvolvendo projetos –são de 15 estados do Brasil e de 10 países estrangeiros. Além disso, 73% das startups já tinham produtos funcionais em abril (ante 41% no início da aceleração) e 53% estão faturando. “Elas geraram empregos, porque as equipes cresceram 33%, e a inovação está ocorrendo, porque vieram nove prêmios de inovação.” Empreendedores e investidores viram na iniciativa competência e energia raras, aplaudindo a definição de metas e a liberdade de escolher a aceleradora. Preocupou-os a incerteza sobre a continuidade, fundamental a uma estratégia desse tipo, mas o segundo edital acaba de ser anunciado, para 100 empresas, e expandido (agora inclui hardware, por exemplo). O Brasil tem estratégias nacionais de inovação, mas, para alguns, precisaria ter uma estratégia maior que envolvesse a educação –universidades deviam ensinar a empreender e inovar mais. 

**CONCENTRAÇÃO NO SUL E SUDESTE** 

Entre os clusters inovadores do Brasil destacam-se os do Centro-Sul do País. Os de São José dos Campos e São Carlos, em São Paulo, e o de Santa Rita do Sapucaí, em Minas Gerais, são extremamente dinâmicos, por exemplo, mas o famoso cluster da Ilha do Fundão, no Rio de Janeiro, não entra na lista, por ter mais fabricantes do que inovadores. Uma exceção à regra, no Nordeste, é o cluster de Campina Grande, na Paraíba, que remonta à década de 1970. “Empresas de base tecnológica foram sendo criadas por professores da faculdade de engenharia da Universidade Federal da Paraíba, por conta das inovações que tinham feito, e houve o impulso de um diretor progressista, Linaldo Cavalcante”, relata Rezende, em uma história que lembra a de outro dos clusters mais fortes do País, o do Recife, escolhido como estudo de caso deste Dossiê. 

Um terceiro cluster promissor do Nordeste é o Parque Tecnológico da Bahia, em Salvador, implantado em 2012 pelo governo estadual, que ainda não tem densidade de cluster, mas vem evoluindo, perto de centros de pesquisa e universidades. 

Os segmentos preferidos dos clusters brasileiros são tecnologia da informação e da comunicação, energia e tecnologia limpa, economia criativa e ciências da vida. A seguir, HSM Management mapeia os diferenciais de quatro, mais privados: Certi, Florianópolis (SC). O desenvolvimento de empresas inovadoras na capital catarinense foi iniciado em 1984, com a criação da Fundação Certi pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Até hoje, esse é um dos casos mais admirados no Brasil e, se começou com o empurrão do poder público, ganhou relativa independência. 

A fundação teve origem na prática de pesquisa e desenvolvimento da UFSC, em atividades de seu laboratório do Departamento de Engenharia Mecânica, e, em dois anos, montou a incubadora Celta, que formou mais de cem empresas, muitas de hardware. O cluster se concentrou por quase dez anos em um prédio alugado perto da universidade, até que estruturou suas 75 empresas (70, ex-startups locais) no ParqTec Alfa, com 13 prédios. José Eduardo Fiates, que foi superintendente da Fundação Certi por nove anos, conta que o Celta continua incubando empresas –40, atualmente– e que estas têm exemplos inspiradores para seguir, como a Softplan, de sistemas integrados de gestão, que em 2013 faturou em torno de R$ 200 milhões e agora ocupa dois prédios do ParqTec Alfa. Ecossistema empreendedor de Campinas (SP). 

O cluster ligado às universidades Unicamp e PUC, que remonta a 1991, é conhecido. Há o pólo de alta tecnologia da Ciatec, o parque científico da Unicamp, mais de 220 empresas com 10 mil colaboradores. A agência Inova, criada pela Unicamp em 2003, já é líder de patentes entre as universidades brasileiras. 

Mas poucos conhecem os elos menores do ecossistema, que formam o círculo virtuoso de inovação. Por exemplo, o ecossistema campineiro conta com uma gama de incubadoras e aceleradoras, que apoiam startups com capital e conhecimento. Uma das mais novas é a aceleradora Baita, que já está entre as 12 certificadas do programa Start-Up Brasil; foi constituída formalmente este ano dentro do campus da Unicamp. “A localização é chave, porque nenhuma aceleradora faz o ecossistema prosperar se não houver interação entre todos os atores”, diz seu sócio Oswaldo Fernandes. 

Entre os elos menos óbvios está o Unicamp Ventures, rede de 255 empresas criadas por ex-alunos dentro da Unicamp, donas de um faturamento anual superior a R$ 1 bilhão e empregadoras de mais de 10 mil pessoas. “Essas empresas se uniram há oito anos, com apoio da Agência Inova, para retribuir a ajuda que tiveram, impulsionando o ecossistema local para criar e fomentar mais empresas”, explica Rosana Jamal, presidente do Unicamp Ventures e também sócia da Baita. Por sua vez, o Unicamp Ventures tem subprodutos, que são outros elos do ecossistema. Um é o Inova Ventures Participações, criado há três anos, que reúne 48 empreendedores que se tornam investidores das startups –já são quatro as empresas beneficiadas por isso. Ou como o Conselho de Startups, que oferece mentoria a 22 empresas locais. Ou ainda como o Desafio Unicamp, programa que apresenta patentes a estudantes para que explorem as possibilidades de negócio. A Liga Empreendedora, criada pelos estudantes, é mais um ator não óbvio do cluster. Ela veio estimular o empreendedorismo entre os alunos de graduação, que, assim, saem da universidade prontos para tomar a iniciativa –muitos dos formados, em vez de procurar emprego, montam empresa. O cluster de Campinas tem até elos externos e complementares, como a Associação Campinas Startup (ACS), com 30 a 40 startups que participam das atividades de coworking. 

**Tecnopuc, Porto Alegre (RS).** Universidade privada, a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) inaugurou o Tecnopuc em 2003 como um “habitat de inovação, onde tudo acontece”. “Em volta do parque temos todo um ecossistema para fomento do empreendedorismo inovador”, diz Rafael Prikladnicki, diretor do parque. Ao todo, são cerca de 120 empresas e a incubadora sozinha abriga hoje 26. O Tecnopuc e a incubadora também fazem parte de um ecossistema, a rede de inovação Inovapucrs, que inclui a Agência de Gestão e Empreendimentos e seu respectivo Programa de Aceleração de Empreendimentos, que, de acordo com Prikladnicki, identifica empresas com potencial de acesso a venture capital e busca alavancar o negócio, com consultoria (de mercado e de gestão), entre outros serviços de apoio. O Tecnopuc mantém acordo com a prefeitura para projetos específicos e atua em sinergia com os outros três parques da Grande Porto Alegre. 

> **Um cluster virtual, feminino**
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> _a RME conta com 13 mil empreendedoras ativa_
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> Para Gustavo Caetano, o empreendedor da Samba Tech e do San Pedro Valley que também preside a Associação Brasileira de Startups, a internet está liberando as empresas de estarem no mesmo lugar para interagir e inovar, o que pode fazer com que o cluster geográfico deixe, com o tempo, de ser um requisito de competitividade. Será? Vale a pena acompanhar a experiência de um cluster virtual brasileiro, que é a Rede Mulher Empreendedora (RME), que reúne 116 mil membros, se consideradas todas as seguidoras de Facebook, e 13 mil como um grupo fechado e ativo, que frequenta encontros presenciais regulares. “Nossos objetivos são muito parecidos com os de um cluster físico tradicional”, confirma Ana Lúcia Fontes, fundadora da RME, ex-executiva e empreendedora. Mulheres com alto potencial empreendedor integram a rede, porque costumam ter experiência corporativa e mostram-se motivadas a ter uma atividade profissional que as realize e proporcione flexibilidade de tempo. A RME facilita as conexões entre elas –que, em regra, fazem menos networking do que os homens– e lhes oferece conhecimento empreendedor e serviços de apoio. Esse conhecimento ultrapassa os elementos-chave da cartilha empreendedora. “Por exemplo, um erro a corrigir é muitas não estudarem o mercado, preferindo empreender em sua zona de conforto, focando beleza, vestuário ou a área de atuação anterior,”, explica Fontes. Outro desafio é que elas querem gerar impacto social no negócio, o que requer know-how à parte. 

> **Os elementos e a reputação**
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> _a virada passa pelo capital e pelo risco_
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> Entre os seis elementos-chave de um sistema de inovação [veja quadro na página 36], empreendedores e investidores reconhecem nossa vulnerabilidade em três: venture capital (VC), visão global e universidade. Mas, para virar o jogo, acham que o VC é o primeiro ponto a atacar, e é preciso reduzir sua percepção de risco, que o faz instável e focado no curto prazo. A reputação de não inovar do Brasil contribui para essa percepção e tem origem na principal métrica internacional da inovação: a patente. Em 2012, o Brasil tinha 41.453 patentes válidas, ante 2,2 milhões dos Estados Unidos, e, segundo a Organização Mundial de Propriedade Intelectual, registrou 365 patentes internacionalmente, enquanto os EUA encaminharam 121.026. No Brasil, patente não serve de indicador, porque a maior parte de nossa inovação é de software, tratado pela lei como direito autoral não patenteável e fácil de emular sem plagiar, o que desencoraja o esforço do registro, como explica o advogado Luís Felipe Luz. Mesmo quando a patente faz sentido, muitos não a perseguem, ou por não poderem esperar para lançar o produto e faturar –a concessão demora (até 14 anos)–, ou pelo receio de abrir informações. Falta educar o mercado nas métricas de inovação usadas aqui, como taxa de crescimento de venda de produtos inovadores, números de P&D e expansão internacional. A percepção de risco é acentuada pelo fato de o Brasil responsabilizar legalmente o investidor por dívidas trabalhistas, tributárias e consumeristas de uma empresa, o que ameaça até seu patrimônio pessoal. Isso desequilibra, de saída, a relação risco-recompensa na decisão de investir no Brasil e, ao mínimo recuo da recompensa potencial, o investidor se vai. Em 2013, os fundos VC somaram US$ 2,3 bilhões aqui, quase um quarto do valor de 2011. Menor o VC, menor o grau de inovação de ruptura, mais produtos B2B e menor a visibilidade.

**San Pedro Valley, Belo Horizonte (MG).** Três anos atrás, um cluster surgiu espontaneamente em BH, no bairro de São Pedro. Suas raízes remontam a 2005, quando o Google comprou a Akwan, startup fundada por professores da Universidade Federal de Minas Gerais para desenvolver sistemas de busca, e a transformou em seu centro de inovação na América Latina. Várias startups inovadoras foram atraídas por isso, até ultrapassando as fronteiras do bairro, e os empreendedores resolveram organizar-se informalmente, como explica um de seus idealizadores, o empreendedor Gustavo Caetano. Fundador e CEO da inovadora Samba Tech, que trabalha com soluções de vídeo online corporativas há sete anos e expandiu-se na América Latina há dois, Caetano conta que o que eles criaram foi uma “cultura de ajuda mútua”. 

“Vimos que era melhor nos unirmos, para promover a região e atrair investidores e talentos para trabalhar nas startups, do que tentar fazer isso individualmente”, diz ele. Deu certo, e tão rapidamente que, no ano passado, a revista The Economist publicou uma matéria sobre a efervescência local e o governo mineiro criou o programa de aceleração Startups and Entrepreneurship Ecosystem Development (Seed). O Seed beneficia 40 startups por ano, com capital semente entre R$ 68 mil e R$ 80 mil e seis meses de capacitação e apoio. Hoje, o San Pedro Valley tem cerca de 150 startups, de acordo com Caetano, de setores como educação, saúde, TI/telecom (principalmente com foco em mobile) e mídia/entretenimento. 

E os empreendedores estrangeiros, atraídos propositalmente pelo Seed, estão chegando. futurO Há duas boas notícias. A primeira é que clusters estão em expansão no Brasil. Exemplo disso é o Sapiens Parque, em implantação, que é o segundo de Florianópolis, patrocinado pelo governo estadual, mas gerido pela Fundação Certi. Ele vem se organizando como “um cluster de clusters”; ergueu 30 prédios e atrai inovadores oferecendo condições de competitividade como incubadora, aceleradora, laboratório de pesquisa e desenvolvimento por áreas etc. A visão é de longo prazo. 

“Em 2020, queremos ter gerado 30 mil postos de trabalho”, diz José Eduardo Fiates. A segunda boa notícia é que, por faltar capital de risco, há mais espaço para que as empresas estabelecidas se tornem parceiras de inovação das startups do Brasil; o Sapiens Parque, por exemplo, já atraiu a Petrobras. A esperança também é de que parques não muito inovadores hoje, como o da Ilha do Fundão, no Rio de Janeiro, reposicionem-se; no caso do Rio, o pré-sal pode ser o indutor. Por fim, o fato de que vários clusters estão se preocupando com a formação em empreendedorismo e gestão, como o de São Carlos, dá alento aos otimistas da inovação.

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