Estratégia e Execução

Quando a aquisição funciona de verdade

Aquisições horizontais podem ter bom efeito sobre o desempenho das empresas adquiridas e também beneficiar os consumidores, como mostra estudo sobre as instituições de ensino superior privadas no Brasil

Compartilhar:

> Vale a leitura porque… 
>
> … o setor de ensino superior privado passou por um significativo processo de consolidação e, como educação é a vantagem competitiva econômica por excelência, sua qualidade interessa a todos. … os autores mediram o desempenho dos alunos após a fusão/aquisição, em um esforço de muitos modos inédito.

Não é preciso acompanhar a mídia especializada em economia e negócios para perceber o grande número de compras e fusões de faculdades que têm ocorrido nos últimos anos no Brasil. E isso está sendo acompanhado com muita atenção, já que novos – e grandes – grupos empresariais vêm se construindo na esteira desse processo. 

Essas transações também andam ocupando as páginas dos jornais mais populares, nesse caso por outro motivo: seu potencial impacto sobre a vida dos cidadãos, uma vez que muitos podem ser alunos atuais ou futuros das escolas envolvidas ou ter alguma relação com elas. O fato é que o ciclo de consolidação do setor de ensino superior brasileiro é expressivo, em parte levado à frente por empresas com ações negociadas em bolsa no País, porém não apenas. 

Segundo dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), autarquia federal vinculada ao Ministério da Educação (MEC), no Brasil existem por volta de 7 milhões de matriculados em cursos oferecidos por instituições de ensino superior, dos quais mais de 5 milhões em entidades privadas. 

Isso traz ao ciclo de consolidação desse segmento um questionamento extra: além do ganho de eficiência e rentabilidade normalmente esperado, o que essas operações de fusão e aquisição estão fazendo com a qualidade do ensino ofertado pelas organizações envolvidas? Foi essa a pergunta à qual procuramos responder, deixando de lado qualquer discussão ideológica sobre a presença de capital privado nesse setor. 

Simplesmente avaliamos o desempenho dos alunos concluintes de cursos oferecidos em instituições de ensino superior privadas adquiridas por empresas de capital aberto – sobre as quais há mais informações –, buscando evidências quanto à evolução do desempenho de seus alunos. 

**DOIS FATORES DE GESTÃO**

Quando começamos o estudo, sabíamos que duas situações poderiam emergir como resultado, ambas decorrentes de decisões gerenciais bem claras: 

• Descobriríamos uma melhora de desempenho dos alunos, que poderia ser atribuída à transferência de melhores práticas entre as organizações envolvidas na operação. 

• Registraríamos uma piora de desempenho, atribuída às sempre previstas políticas de corte de custos decorrentes de uma fusão ou aquisição. Sob a ótica das empresas adquirentes, os dois caminhos podem fazer sentido. A transferência de melhores práticas interessa a organizações preocupadas com a geração de vantagem competitiva sustentável, pois a melhora de desempenho decorrente faz com que mais alunos sejam atraídos para as instituições do grupo, potencializando a percepção positiva quanto à marca da consolidadora e contribuindo para um círculo virtuoso que, em algum momento, há de se refletir na valorização dos preços das ações. 

Já o corte de custos aumenta a rentabilidade mais velozmente e é uma política mais simples e rápida de implantar, embora não necessariamente tenha efeito positivo sobre o preço das ações no longo prazo, por ser um resultado pontual. Nós nos perguntamos sobre o que estaria prevalecendo: a transferência de melhores práticas (e a busca de vantagem competitiva sustentável) ou o corte de custos (e o ganho de rentabilidade no curto prazo)? 

> **Saiba mais sobre o estudo**
>
> O ponto de partida do estudo foi construir um banco de dados, que cruzou informações disponibilizadas pelas empresas de capital aberto adquirentes com informações consolidadas pelo governo sobre os cursos oferecidos em todo o País e o respectivo desempenho de seus alunos no Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade). 
>
> Utilizando a técnica estatística de diferenças-em-diferenças, analisamos um conjunto específico de instituições que foram adquiridas, envolvendo universidades (devem oferecer atividades de ensino, pesquisa e extensão, serviços/atendimento comunitário), centros universitários (em geral, menores que as universidades e com menor oferta de opções de pós-graduação) e faculdades (com menor oferta de cursos, tendendo a ser direcionadas para uma área específica do conhecimento). 
>
> O desempenho desse conjunto foi comparado com outro, formado pela totalidade das demais escolas no Brasil que oferecem os mesmos cursos. Os dados utilizados cobriram os anos de 2007 a 2012.

> 192 é o número de fusões e aquisições no setor de ensino superior ocorridas entre 2007 e 2013. 
>
> 8% de todas as transações de fusão e aquisição do País entre 2007 e 2008 foram no setor de educação superior, segundo levantamento da PwC Brasil. Foi o auge.

> **O que torna uma integração eficaz**
>
> Mesmo quando reinventam seus negócios, empresas dificilmente perdem sua essência e as raízes. É por essa razão que uma decisão de aquisição deve ser precedida de um conhecimento ampliado sobre o que está sendo comprado, que extrapole os aspectos financeiros e de mercado e que mergulhe na cultura da organização em vista. 
>
> É possível que os casos bem-sucedidos na área de educação estejam fazendo isso: quais são as fortalezas da empresa a ser adquirida? As vulnerabilidades? Quem são seus líderes verdadeiramente influentes? Qual o estilo de liderança? Como a empresa se comunica e qual sua imagem perante seu público? Como são as relações com os colaboradores? Qual o clima interno? 
>
> Se respondidas e compreendidas antes de um processo de compra, essas questões podem economizar muita energia e dinheiro e favorecer o sucesso da operação realizada. Em todo o mundo, entre 45% e 70% das fusões e aquisições não são bem-sucedidas principalmente por causa de fatores culturais. Indivíduos não são meros ativos, transferidos sem resistências ou indagações. Talvez as empresas da área de educação, por lidarem eminentemente com pessoas, prestem mais atenção a isso e também busquem mais fortemente os fatores-chave de sucesso, evitando o que faz dar errado.
>
>
>
> **Quais são os fatores-chave de sucesso:**
>
> • Retenção de talentos essenciais 
>
> • Comunicação eficiente 
>
> • Retenção de executivos-chave 
>
> • Processo de integração cultura
>
>
>
> **O que faz uma fusão ou aquisição dar errado:**
>
> • Desconsiderar a importância da gestão de pessoas. 
>
> • Não gerenciar a complexidade existente no encontro  de duas culturas. 
>
> • Não promover a transferência de habilidades e  com petências. 
>
> • Não cuidar da retenção de talentos. 
>
> • Não gerenciar o clima tenso e de insegurança na  empresa adquirida. 
>
> por Angela Maciel, diretora da HSM Educação Executiva, com experiência em fusões e aquisições
>
>

**AS DESCOBERTAS**

Encontramos uma evolução favorável nas instituições adquiridas, mais evidente a partir do final do quarto ano após a aquisição. 

Ficou estatisticamente comprovado que o fenômeno da aquisição de instituições de ensino superior por empresas de capital aberto trouxe, sim, melhora relativa de qualidade para os alunos, em comparação com a média dos alunos dos mesmos cursos no restante das faculdades brasileiras. 

Devem ter prevalecido, na visão da gestão, as melhores práticas, tais como aperfeiçoamento e padronização nas estruturas e currículos dos cursos, melhor coordenação e preparação dos docentes, atenção à infraestrutura física e equipamentos das escolas etc. Tal efeito, decomposto pelas variáveis de controle do modelo estatístico usado, pode ser desmembrado assim: 

• Cursos. Notou-se um efeito mais pronunciado para ciências contábeis, publicidade e propaganda, sistemas de informação (bacharelado) e administração, em oposição a direito, jornalismo, letras (licenciatura), pedagogia (licenciatura) e turismo. 

• Grau de desenvolvimento organizacional. As faculdades responderam mais positivamente à fusão ou aquisição, seguidas pelas universidades; já os centros universitários tiveram o pior desempenho. 

• Regiões com maior impacto. O Nordeste teve o efeito positivo mais pronunciado das operações de fusão e aquisição, seguido do Sudeste. 

• O diferencial do grupo adquirente. A melhora não é generalizada; varia entre os diferentes grupos estudados, com gestão mais ou menos profissionalizada e qualificada. Qual foi a melhora mais expressiva? Ela pôde ser observada em cursos de graduação de sistemas de informação, 60 meses após a aquisição. 

Nesse caso, o desempenho dos alunos das escolas adquiridas melhorou em até 56% acima da evolução média nacional para o mesmo curso. 

> Você aplica quando… 
>
> … ao viver uma situação de fusão  ou aquisição, esforça-se para focar a transferência das melhores práticas e não apenas o corte de custos.

Compartilhar:

Artigos relacionados

Calendário

Não, o ano ainda não acabou!

Em meio à letargia de fim de ano, um chamado à consciência: os últimos dias de 2024 são uma oportunidade valiosa de ressignificar trajetórias e construir propósito.

Empreendedorismo
Um guia para a liderança se antecipar às consequências não intencionais de suas decisões

Lilian Cruz e Andréa Dietrich

4 min de leitura
ESG
Entre nós e o futuro desejado, está a habilidade de tecer cada nó de um intricado tapete que une regeneração, adaptação e compromisso climático — uma jornada que vai de Baku a Belém, com a Amazônia como palco central de um novo sistema econômico sustentável.

Bruna Rezende

5 min de leitura
ESG
Crescimento de reclamações à ANS reflete crise na saúde suplementar, impulsionada por reajustes abusivos e falta de transparência nos planos de saúde. Empresas enfrentam desafios para equilibrar custos e atender colaboradores. Soluções como auditorias, BI e humanização do atendimento surgem como alternativas para melhorar a experiência dos beneficiários e promover sustentabilidade no setor.
4 min de leitura
Finanças
Brasil enfrenta aumento de fraudes telefônicas, levando Anatel a adotar medidas rigorosas para proteger consumidores e empresas, enquanto organizações investem em tecnologia para garantir segurança, transparência e uma comunicação mais eficiente e personalizada.

Fábio Toledo

4 min de leitura
Finanças
A recente vitória de Donald Trump nos EUA reaviva o debate sobre o protecionismo, colocando em risco o acesso do Brasil ao segundo maior destino de suas exportações. Porém, o país ainda não está preparado para enfrentar esse cenário. Sua grande vulnerabilidade está na dependência de um número restrito de mercados e produtos primários, com pouca diversificação e investimentos em inovação.

Rui Rocha

0 min de leitura
Finanças
O Revenue Operations (RevOps) está em franca expansão global, com estimativa de que 75% das empresas o adotarão até 2025. No Brasil, empresas líderes, como a 8D Hubify, já ultrapassaram as expectativas, mais que dobrando o faturamento e triplicando o lucro ao integrar marketing, vendas e sucesso do cliente. A Inteligência Artificial é peça-chave nessa transformação, automatizando interações para maior personalização e eficiência.

Fábio Duran

3 min de leitura
Empreendedorismo
Trazer os homens para a discussão, investir em ações mais intencionais e implementar a licença-paternidade estendida obrigatória são boas possibilidades.

Renata Baccarat

4 min de leitura
Uncategorized
Apesar de ser uma ferramenta essencial para o desenvolvimento de colaboradores, o Plano de Desenvolvimento Individual (PDI) vem sendo negligenciado por empresas no Brasil. Pesquisa da Mereo mostra que apenas 60% das companhias avaliadas possuem PDIs cadastrados, com queda no engajamento de 2022 para 2023.

Ivan Cruz

4 min de leitura
Tecnologias exponenciais
A inteligência artificial (IA) está revolucionando o mundo dos negócios, mas seu avanço rápido exige uma discussão sobre regulamentação. Enquanto a Europa avança com regras para garantir benefícios éticos, os EUA priorizam a liberdade econômica. No Brasil, startups e empresas se mobilizam para aproveitar as vantagens competitivas da IA, mas aguardam um marco legal claro.

Edmee Moreira

4 min de leitura
ESG
A gestão de riscos psicossociais ganha espaço nos conselhos, impulsionada por perdas estimadas em US$ 3 trilhões ao ano. No Brasil, a atualização da NR1 exige que empresas avaliem e gerenciem sistematicamente esses riscos. Essa mudança reflete o reconhecimento de que funcionários saudáveis são mais produtivos, com estudos mostrando retornos de até R$ 4 para cada R$ 1 investido

Ana Carolina Peuker

4 min de leitura